Acórdão nº 00741/18.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelCarlos de Castro Fernandes
Data da Resolução02 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – AA (Recorrente), melhor identificada nos autos, veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto pela qual se negou provimento à impugnação que deduziu contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa intentada contra a liquidação de IRS de 2013 e contra a correspetiva liquidação de juros compensatórios.

No presente recurso, a Recorrente apresentou as seguintes conclusões Na versão em tempo corrigida pela Recorrente.

: 1ª.

O Tribunal a quo na douta sentença recorrida não apreciou as seguintes questões suscitadas pela Recorrente na petição de impugnação de fls. ...: - Que a interpretação do art. 2º, nº 4, al. b), do CIRS, no sentido pugnado no relatório de inspecção de a antiguidade do trabalhador se circunscrever à antiguidade na empresa em que cessou funções, era violador do princípio da igualdade e da proporcionalidade constitucionalmente consagrados – cfr., art. 13º e 18º, nº 2 da CRP – cfr., 234 e ss da petição; - Que, por força do princípio da segurança jurídica, tendo em conta o firme entendimento jurisprudencial existente à data no sentido de a antiguidade do trabalhador, para efeitos do disposto no art. 2º, nº 4, al. b), do CIRS, abarcar aquela verificada ao abrigo de uma anterior entidade patronal, este normativo deveria ser interpretado neste sentido – cfr., 253 e ss da petição; 2ª.

Do que se segue a nulidade da sentença proferida por omissão de pronúncia – cfr., art. 608º, nº 2 e 615º, nº 1, al. d) do Cód. Proc. Civil; 3ª.

Pela análise da factualidade alegada e da prova documental junta aos autos, a Recorrente entende, com o devido respeito, que deveriam ser dados como provados e levados à matéria de facto dada como provada (arts. 640º, 662º, nº 1, do CPC), outros factos relevantes para a boa decisão da causa, designadamente que: - O mandatário da Recorrente não foi notificado do relatório final de inspecção; - Aquando da revogação do contrato de trabalho com o Banco 1... a Recorrente não recebeu qualquer indemnização por força do termo daquele contrato de trabalho, designadamente, com base no número de anos de serviço prestados àquela entidade; - Constituía um uso instituído e consolidado no mercado, que a antiguidade do trabalhador correspondia a todo o tempo de serviço prestado nas diferentes instituições de crédito portuguesas; - O ACT do Sector Bancário foi subscrito pelo Banco 2... e pelo Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários e Independente da Banca; - A Recorrente foi filiada no Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários desde que iniciou funções no Banco 1... (1998) e até 1 de Agosto de 2013; 4ª.

Sem prejuízo do que antecede, entendendo-se que, face à matéria alegada pelas partes e à documentação junta aos autos, se afigura necessário à boa instrução da causa, a produção da prova testemunhal arrolada pela Recorrente para prova da factualidade por si alegada em sede de petição de impugnação (referente, designadamente, à matéria de facto alegada pela Recorrente em 143 a 159, 171 a 179, 184 a 188 da sua petição de impugnação) requer-se a V. Exas. que seja determinada a baixa do processo à 1ª instância de modo a serem inquiridas aquelas testemunhas – cfr., art. 662º, nº 1, nº 2, al. c), nº 3, al. c) do CPC; 5ª.

A Administração Tributária, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa, não apreciou todas as questões fáctico-jurídicas enunciadas pela Recorrente na reclamação graciosa que apresentou o requerimento de fls. ... - vd. 15 supra -, omitindo, dessa forma, o dever que sobre ela recaía de se pronunciar sobre todas as questões submetidas à sua apreciação, o que convoca a ilegalidade da decisão proferida por violação do disposto nos art. 56º, nº 1, da LGT e 13º, nº 1 do CPA; 6ª.

Tanto mais que o objecto imediato da impugnação judicial apresentada passa por ser a anulação daquela decisão, devendo a existência de um vício no procedimento de reclamação graciosa conduzir à anulação da decisão que indeferiu a reclamação graciosa apresentada pela Recorrente – cfr., Ac. STA de 25.6.09, Proc. nº 0345/09, de 15.10.08, Proc. nº 542/08 e de 16.6.04, Proc. nº 1887/03; 7ª.

Sendo que o princípio da preferência pela apreciação judicial do caso não quadra à hipótese dos autos, pois o mesmo, tal como se alcança do disposto nos arts. 68º, nº 2 e 111º, nºs 3 e 4 do CPPT, apenas tem como alcance os casos em que os procedimentos graciosos ainda não foram decididos ou só foram intentados após a instauração do processo judicial; 8ª.

A pari, a Administração Tributária não apreciou, na decisão final do procedimento de reclamação graciosa, a argumentação deduzida pela Recorrente no âmbito do direito de audição que, tempestivamente, exerceu naquela sede, e, como tal, mostra-se existir violação do direito de audição o que convoca a nulidade do procedimento e a anulação da decisão proferida - arts. 161º, nº 1 e nº 2, al. c), d) e l) e 163º, nº 1, do CPA; vd., tb, art. 60º, nº 1, da LGT e o nº 1, do art. 13º do CPA; 9ª.

De igual modo, como está reconhecido nos autos (“por erro administrativo, os Serviços de Inspecção Tributária não tiveram conhecimento do requerimento referido na p.i. (subscrito pelo mandatário constituído), do que resultou que o mesmo não tenha sido notificado do relatório final de inspecção” – vd., fls. ...), foi violado o direito de audição que assistia à Recorrente no âmbito da inspecção de fls. ..., o que deverá conduzir à anulação das liquidações impugnadas – cfr., art. 60º da LGT e 60º do RCPIT; 10ª.

Os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados, devendo as notificações dos mesmos conter a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências e a data em que o mesmo foi prolatado – cfr., arts. 36º, nº 1 e 2 do CPPT e 77º, nº 6 da LGT; Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade, Contencioso Tributário, vol. I, pg. 197, Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anot., Vol. I, pg. 323 José Casalta Nabais, Direito Fiscal, 5ª ed., pg. 370, Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento e Processo Tributário, pg., 119; 11ª.

O que tudo resulta e tem que ser conjugado com o direito constitucional à notificação e a uma tutela jurisdicional efectiva – cfr., art. 268º, nº 3, da CRP, Ac. STA de 6.5.09, Proc. nº 0270/09, Domingos Pereira de Sousa, Direito Fiscal e Processo Tributário, pg. 299; 12ª.

Não obstante a Recorrente ter mandatário constituído, a Administração Tributária não promoveu, como se impunha, a notificação do relatório final de inspecção na pessoa do seu mandatário, ou seja, na pessoa do aqui signatário – cfr., art. 40º, nº 1, do CPPT; 13ª.

Como tal, não tendo ainda sido válida e eficazmente notificado à Recorrente o relatório de inspecção que está na base das liquidações que se lhe seguiram é manifesta a ineficácia do relatório de inspecção e a ineficácia e a caducidade das liquidações operadas com base naquela peça procedimental – cfr., art. 45º e 46º da LGT; 14ª.

A notificação do relatório final de inspecção que constitui “a peça fulcral do procedimento inspectivo” constitui também o último acto do procedimento inspectivo, o qual culminará nas liquidações adicionais de imposto (se for o caso) – cfr., art. 61º, nº 1 e nº 2 do RCPIT; João Damião Caldeira, O tempo e o espaço no procedimento tributário de inspecção: limites à prática de actos de inspecção, Revista Fiscal, Julho/Agosto 2012, pg. 22; Paulo Marques, O procedimento de inspecção tributária, pg. 297; 15ª.

Só com a válida notificação do relatório de inspecção é que se pode dar por terminada o procedimento inspectivo e que o sujeito passivo fica a saber quando é que terminou a inspecção, não podendo sem essa notificação retirar, designadamente, consequências da violação do prazo estabelecido no art. 36º, nº 2, do RCPIT para a sua conclusão (questão que é manifestamente relevante tendo em conta que a falta de conclusão do procedimento inspectivo no prazo de 6 meses estabelecido no art. 36º, nº 2, do RCPIT conduz a que qualquer liquidação adicional que decorra daquele procedimento seja inválida – Ac. TCAS de 9.12.08, Proc. nº 02504/08); 16ª.

Sem a notificação do relatório de inspecção fica o sujeito passivo impedido de, entre o mais, fazer uso do direito que a Lei lhe confere no art. 64º, nº 1, al. a) e nº 2 do RCPIT, o que se reveste de magna importância por razões de certeza e segurança jurídica de modo a vincular a Administração Tributária às conclusões que ela própria expressou e impedindo-a de, posteriormente, actuar contra o sujeito passivo de modo distinto daquelas conclusões – cfr., Joaquim Freitas da Rocha e João Damião Caldeira, Regime Complementar do Procedimento de Inspecção tributária, pg. 341; 17ª.

Em face do que antecede, se por mais não fosse, impõe-se a conclusão de que a falta da válida notificação à Recorrente do relatório de inspecção consubstancia a preterição de uma formalidade essencial que deverá conduzir à invalidade das liquidações que se lhe seguiram e que estão em causa nos presentes autos; 18ª.

Acresce que, nos termos dos arts. 58º, nº 1, do RGIT e 29º, nº 1, al. c) do RGIT, o sujeito passivo tem o direito de, até ao termo do procedimento de inspecção – o qual ocorre com a válida notificação do relatório de inspecção -, peticionar a redução da coima que lhe seja aplicável pelas infracções cometidas e apuradas no âmbito do procedimento inspectivo; 19ª.

Como tal, a ausência da notificação válida do relatório de inspecção não pode, em caso algum, ser havida como a preterição de uma formalidade não essencial sob pena de, mais uma vez, a Recorrente ficar impedida de lançar mão de um direito que o legislador...

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