Acórdão nº 00302/20.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução09 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo: I.RELATÓRIO 1.1.

AA, residente Rua ..., ..., ..., intentou a presente ação administrativa para efetivação de responsabilidade civil contra o ESTADO PORTUGUÊS, pedindo, em síntese, a respetiva condenação no pagamento de indemnização, no montante de € 23.000,00, a título de danos não patrimoniais, e de quantia a liquidar em incidente de liquidação, correspondentes à quantia exequenda que deixou de receber, bem como os honorários da mandatária na presente ação.

Para tanto, alega, em síntese, que o Estado violou a sua obrigação de proferir uma decisão em prazo razoável, tendo o processo executivo que instaurou para cobrança da quantia exequenda, reconhecida por sentença judicial, devido à sua demora ( 9 anos), não ter permitido a cobrança coerciva de dívida de terceiros, o que comportou os danos cujo ressarcimento vêm peticionados.

1.2. Citado, o Estado o contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Excecionou a prescrição da obrigação de indemnizar e a impropriedade do meio processual utilizado quanto ao pedido de pagamento de quantia para compensação dos honorários da mandatária da presente ação.

Por impugnação, alegou, em síntese, que o decurso do prazo legal de um processo não origina, ipso facto, a ilicitude da conduta que fundamenta a responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito fundado na ofensa ao direito de obtenção de decisão em prazo razoável.

O Autor não concretiza que atos processuais foram proferidos para além dos limites temporais. Ademais, a tramitação do processo executivo não revela a existência de qualquer atraso processual.

Por outro lado, os danos morais alegados e a compensação a título de honorários e despesas com advogado não constituem fundamento da obrigação de indemnizar, não se mostrando verificados os pressupostos para a formulação do pedido genérico quanto aos danos patrimoniais.

1.3. O Autor replicou, pugnando pela improcedência das alegadas exceções.

1.4. Proferiu-se despacho saneador, que julgou improcedentes as exceções invocadas pelo Estado e, fixou-se o objeto do litígio, bem como os temas da prova.

1.5. Realizou-se a audiência final, e proferiu-se sentença contendo a mesma o julgamento de facto e de direito, onde se julgou parcialmente procedente a presente ação, a qual consta da seguinte parte dispositiva: «Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal julga parcialmente procedente a presente ação e, em consequência, condena Estado Português a pagar ao Autor a quantia de € 9.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a presente decisão.

Condena-se o Autor e o Demandado em custas, nas proporções de 75% e 25%, respetivamente.

Registe e notifique.» 1.6. Inconformado, o Autor interpôs recurso jurisdicional contra a sentença proferida, que termina com a formulação das seguintes Conclusões: «1.

As presentes alegações de recurso têm como objeto a matéria de facto e de direito, da sentença proferida pelo TAF Aveiro – Unidade Orgânica 1, Proc. n.º 302/20.0BEAVR, que condenou o Réu no pagamento ao Recorrente da quantia de 9.000,00€ por atraso processual.

2.

O Recorrente discorda da fundamentação do Tribunal a quo, considerando que o mesmo efetuou uma errada interpretação e valoração da prova que dispunha, bem como errada aplicação do direito substantivo e processual.

3.

Quanto aos pontos b), c), d), e), o) e q) dos factos não provados, entende o Recorrente que o Tribunal a quo errou na valoração da prova testemunhal produzida sobre tais factos, bem como, da prova documental junta aos autos.

4.

Tais factos não provados, estão desde logo em expressa contradição com os pontos 18), 22), 47), 48), 49), 50) e 51) dos factos provados.

5.

Consta dos documentos 9, 10, 11 e 12 juntos com a P.I., os vários pedidos de emissão de certidões judiciais atestando o estado do processo, manifestando a sua dificuldade económica e financeira, expondo a cobrança do IVA, da fatura emitida que não recebeu, pela AT solicitando o andamento do processo.

6.

Consta do ofício enviado pela própria Autoridade Tributária a 22/10/2020 com a ref.ª ...56 o seguinte: Este Serviço de Finanças não tem documentos nem meios que permitam dar resposta à quantidade de certidões judiciais entregues pelo contribuinte/autor para prova do não recebimento do IVA em dívida” o que significa que foram entregues.

7.

Este Tribunal no ponto 49 dos factos provados reconhece que “(...) a D...,Lda., executou a sentença e penhorou bens do Autor, tendo aí novamente a AT reclamado o alegado crédito de IVA” 8.

A AT no seu ofício a 22/10/2020 com a ref.ª ...56 informa, relativamente ao IVA da fatura em causa que: “O valor de 6.002,58€ foi pago no Processo de Execução Fiscal ...17, extinto em 09/02/2007, com acréscimos de 1.513,78€ de juros de mora e 269,40€ de custas processuais.” 9.

A testemunha BB, Economista e à época TOC do Recorrente que depôs a 25/02/2022 (01:39:00 até 02:14:00) acompanhou o Recorrente em algumas ocasiões, foi um testemunho foi muito espontâneo, verídico e esclarecedor no que respeita a estes pontos, nomeadamente, nas notificações da AT, no envio da declaração desacompanhada do pagamento, na junção das certidões, etc.

10.

É do conhecimento comum e decorre da lei, as notificações para pagamento, a emissão de nota de cobrança, tudo isso são decorrências legais para garantia da legalidade do processo de execução fiscal, procedimentos que a AT não pode dispensar.

11. O Tribunal a quo dá como não provado que o Recorrente “Pagou o IVA que não recebeu”, quando dos factos provados 3, 47, 50 e 51 à contrario resulta juntamente com o ofício enviado pela AT, e depoimento testemunha de CC a 25/02/2022 (01:08:10 até 10:38:30), resulta o contrário.

12.

Quanto à perda da isenção do IMI da sua casa, salvo devido respeito, não há necessidade de comprovação documental, já que decorre da lei enquanto efeito automático – Orçamento de Estado de 2005, art. 39º que altera o Estatuto dos Benefícios Fiscais, e apenas foi revogado no Orçamento de Estado do ano de 2017.

13.

Por tudo o exposto, o Recorrente que o Tribunal errou na valoração da prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente testemunhal, bem como, na valoração da prova documental junta aos presentes autos, e ainda, na aplicação e valoração das regras de direito aplicáveis.

14. Deste modo, deverão os pontos b), c), d), e), o) e q) dos factos não provados, serem dados como provados, passando a integrar o elenco dos factos provados.

15. Quanto aos pontos a), g), j), k), l), m) e s) dos factos não provados, uma vez mais, o Recorrente considera que o Tribunal a quo errou de forma circunstancial na valoração da prova testemunhal efetuada sobre estes pontos.

16. Desde logo, relativamente à única testemunha que o Tribunal a quo confere credibilidade, DD depôs a 25/02/2022, que quanto a estes factos, foi extremamente conciso, espontâneo e verdadeiro descrevendo o ambiente dos populares e vizinha relativamente ao Recorrente, inclusive situações que o mesmo presenciou.

17. Também as restantes testemunhas, nomeadamente, CC e BB, foram descrevendo situações idênticas que se passaram com elas próprias.

18. Todas as testemunhas foram unânimes em afirmar que o Recorrente após esta situação se viu obrigado a emigrar para “dar solução à vida dele”.

19. Ora, tudo isto, que foi sendo dando conta ao Tribunal através dos vários requerimentos que foram juntos (doc. 9, 10, 11 e 12 juntos com a P.I.), do estado de espírito do Recorrente, dos problemas económicos e financeiros do Recorrente e conforme ponto 18 dos factos dados como provados.

20. É o próprio Tribunal a quo no ponto 50. dado como provado “A sua irmã CC, vendo a aflição do autor e sua mulher ao saberem que a sua casa de habitação seria vendida (...)”. Certamente, que a aflição do Recorrente vai para além dos normais níveis de aflição do dia-a-dia de cidadão comum.

21. Os atos em causa, despoletaram e arrastaram específicos problemas de convivência do Recorrente com vizinhança, populares, trabalhadores, fornecedores, e familiares que, assumiram notória dimensão e particular gravidade com capacidade para determinar, num homem de reação normal, forte envolvimento psíquico.

22. Inclusive a Testemunha EE que depôs dia 25/02/2022 (02:15:00 a 02:23:00) manifestou ao longo de todo o seu depoimento o sui generis que todo aquele caso era.

23. Todas as testemunhas indicadas tiveram discursos espontâneos, verdadeiros, circunscritos apenas aos factos de que tinha efetivamente conhecimento, razão pela qual entende o Recorrente que os seus depoimentos foram manifestamente mal valorados quanto a estes pontos.

24. Por tudo o exposto, deverão tais pontos a), g), j), k), l), m) e s) dos factos não provados, considerados provados, e passar a integrar o elenco dos factos provados.

25. Quanto aos pontos f), h), i) dos factos não provados, entende o Recorrente que o silogismo efetuado pelo Tribunal a quo, parte de premissas erradas.

26. O Recorrente alegou que, não fora a demora processual, teria sido pago pelo produto da venda dos imóveis penhorados aos executados no âmbito do processo de execução que foi posteriormente suspenso. – o que ficou provado – ponto 51.

27. Essa suspensão de execução, que se manteve anos a fio, permitiu que, não havendo a venda desses imoveis para pagamento ao Recorrente, eles ficassem livres para constituição de outras garantias e se fossem endividando e constituindo garantias nos imoveis objeto de penhora.

28. Quanto às garantias, datas de constituição e respetivo valor, foi junto aos presentes autos a Lista de Credores dos Executados, bem como, a sentença de graduação de créditos. Que por si só são elementos suficientes, para concluir que os Executados se endividaram e constituíram garantias posteriores.

29. O Tribunal a quo que considera que “(...) ainda que do rateio efetuado no processo de insolvência, em resultado do qual o Autor recebeu a quantia de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT