Acórdão nº 01991/08.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução06 de Outubro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO A.

REPRESENTAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 21/05/2020, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por F... SA., NIPC 50...65, com sede no ..., contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e Juros Compensatórios, dos exercícios de 2000, 2001 e 2002, no valor total de €131.192,72.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “A. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença que julgou procedente a impugnação que a “F... SA.

”, com os demais sinais dos autos, na sequência de indeferimento de recurso hierárquico interposto do indeferimento de reclamação graciosa, deduziu contra as liquidações adicionais de IVA n.ºs ...16, ...22 e ...25, referentes, respectivamente, aos anos de 2000, 2001 e 2002, nos valores de € 87 082,71, € 29 564,06 e € 2 485,07 e correspondentes juros compensatórios no valor global de € 131 192,72.

B.

Os actos de liquidação resultaram de correções de natureza meramente aritmética efetuadas em sede de acção inspectiva à impugnante, aos exercícios de 2000, 2001 e 2002, titulada pela Ordem de Serviço n.º ...03, conforme descrição no capítulo III do Relatório de Inspecção Tributária (RIT) e que se reportam a três tipos de correcção, sendo a do ponto III-1. relativa a “obras em contrato de consórcio”, a do ponto III-2. relativa a “imposto dedutível referente a sujeito passivo com actividade cessada” e a do ponto III-3. relativa a “regularização anual do prorata do ano de 2000”.

C.

Uma leitura atenta da PI, bem como das petições em sede de Reclamação Graciosa e Recurso Hierárquico, mostra-nos que as correções de IVA levadas a juízo que nos ocupam, são as refletidas nos pontos III-1.

e III-2.

, pelo a impugnante não põe em causa a correcção reflectida no ponto III-3. do RIT, embora a liquidação relativa ao ano de 2000 com três correções tenha sido anulada integralmente.

D.

A douta sentença recorrida, apesar das questões suscitadas no articulado inicial da impugnação, decidiu no sentido da procedência no seu todo, incluindo uma questão que não foi fundamento de impugnação, anulando a liquidação do ano de 2000 na totalidade, sendo certo que uma parte substancial da mesma, que se cifra em € 36 968,32, se reporta à correcção da regularização anual do prorata, conforme ponto III-4. do RIT, levado ao probatório no ponto 5 dos factos provados, o que acabou por pesar na fixação do valor da acção em € 131 192,72, que inclui aquele valor, correspondente à correcção não impugnada.

E.

Não tendo o Meritíssimo Juiz a quo conhecido dessa questão, mas não esclarecendo cabalmente a delimitação do objecto da acção, impõe-se um melhor esclarecimento e eventual correcção da matéria de facto assente, com a consequente correcção do valor da acção fixado, já expurgado daquela correcção, o qual que se fixaria em € 94 224,40.

F.

E deste modo, apenas poderia decidir anular a liquidação do ano de 2000, já não no valor de € 87 082,71, mas tão só na parte influenciada pela correcção impugnada, devendo-o referir expressamente.

Além do mais, G.

Entendeu o Tribunal a quo quanto à questão da falta de fundamentação do relatório de inspecção, da decisão da reclamação graciosa e da decisão do recurso hierárquico, “A fundamentação contida no relatório no que concerne à correcção relativa a “Obras em contrato de consórcio” explícita os factos em que se sustentou, extraídos da contabilidade analítica da impugnante. Porém, nada se alcança quanto à motivação de direito da referida correcção, como bem refere a Impugnante.

(…) No que concerne à correcção relativa a “Imposto dedutível referente a sujeito passivo com actividade cessada”, verifica o Tribunal da análise ao RIT que esta correcção estriba-se em termos de direito no disposto no artigo 22.º n.º 11 do CIVA, de molde a indeferir o pedido de reembolso, porém, ao nível da factualidade verificamos que, mais uma vez, a mesma se mostra insuficiente.

(…) Desta feita, entendido o dever de fundamentação expressa na sua dimensão formal, afigura-se-nos que, no caso concreto, a administração tributária não externou as razões de facto e de direito que estão na base da decisão em termos que as tornam apreensíveis para o seu destinatário porquanto compulsado o RIT e seus Anexos verificamos que o mesmo padece de fundamentação insuficiente, porquanto o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão….” H.

Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, com fundamento em erro de julgamento - sobre a matéria de facto e de direito - relativamente às correções constantes dos autos, pelas razões que passa a expender.

I.

Extrai-se do RIT e da PI que, considera a impugnante serem ilegais as liquidações adicionais de IVA emitidas com relação ao ano de 2000, excepto na parte influenciada pela correcção da regularização anual do prorata, e aos anos de 2001 e 2002, nas duas correcções aí descriminadas.

J.

Não tendo o douto Tribunal a quo selecionado, dos autos, todos os factos relevantes para a decisão, impõe-se a necessidade de realizar tal tarefa em sede de recurso, aditando-os à factualidade dada como provada.

K.

Assim, há que aditar à matéria de facto provada o seguinte facto, por via da correcção no ponto 9 do probatório, passando a referir-se que “Em 27/05/2003, a Impugnante apresentou Reclamação Graciosa relativamente às liquidações referidas em 8…”, excepto, quanto à liquidação do ano de 2008, no valor de € 87 082,71, onde apenas impugna a correcção relativa a obras em contrato de consórcio, no montante de € 50 114,39, L.

Evitando, assim, que o Tribunal venha, como fez, a proferir decisão de anulação total das liquidações pelo montante fixado quanto ao valor da acção - € 131 192,72, e acabe por incluir implicitamente no seu relatório pronúncia sobre factos não impugnados.

M.

Deste modo, a RFP sustenta que, com base nos documentos constantes dos autos, bem como com a leitura agora reponderada dos autos, parece-nos que se impõe uma decisão diferente quanto à matéria de facto dada como provada e não provada, invocando, para tanto, a necessidade de aditar o facto acima já melhor identificado.

N.

No que se refere à decisão jurídica propriamente dita, uma vez feita a leitura da decisão de direito plasmada, na sentença recorrida, temos que, relativamente ao segmento delimitado pela questão “a)” saber se as liquidações impugnadas padecem de falta de fundamentação, a sentença recorrida concluiu pela procedência do invocado pela impugnante, decisão com a qual a RFP não concorda.

O.

Decorre do n.º 3, do artigo 268.º, da Constituição da República Portuguesa (CRP) que, os actos administrativos carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legitimamente protegidos, pelo que a decisão de correcção da matéria tributável não pode deixar de se mostrar acompanhada da correspondente fundamentação.

P.

Os contornos dessa fundamentação recolhem-se, na lei ordinária, do artigo 77.º, da Lei Geral Tributária (LGT), que determina que ela se revista de uma sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.

Q.

Sabemos que a fundamentação dos actos administrativos, visa, além do mais, dar a conhecer as razões por que foi decidido de uma maneira e não de outra, de molde a permitir aos seus destinatários uma opção consciente entre a sua aceitação e a sua impugnação contenciosa.

R.

É, conforme a jurisprudência do STA, um conceito relativo, que varia em função do tipo legal de acto, dos seus antecedentes e de todas as circunstâncias com ele relacionadas, designadamente as típicas condutas administrativas, que permitam dar a conhecer o iter cognoscitivo e valorativo que levou a que fosse decidido dessa maneira e não de outra, estando suficientemente fundamentado quando um destinatário normal se aperceba das razões de ser da decisão e para se atingir aquele objetivo basta uma fundamentação sucinta, mas que seja clara, concreta, congruente e que se mostre contextual.

S.

Note-se que a fundamentação do acto administrativo é suficiente se, no contexto em que foi praticado, e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.

T.

Uma vez compulsados os autos, resulta das conclusões do RIT que, em virtude da ação de inspecção levada a cabo, pelos Serviços da Inspecção Tributária (SIT), da Direção de Finanças ..., à aqui Recorrida, relativa aos exercícios de 2000, 2001 e 2002, resultaram correções à matéria tributável do IVA, com origem em imposto indevidamente deduzido, com os fundamentos constantes a fls. 3 a 9, da sentença recorrida.

U.

Mais, a Impugnante acaba por contextualizar e dar conhecimento, nos presentes autos, da situação sub judice, como assim o reflete o ponto 14º, da sua PI, o qual aqui transcrevemos, para todos os devidos e legais efeitos, “Para atingir os objectivos propostos, a ora impugnante procedeu à facturação da parte da empreitada a imputar ao outro consorciado, liquidando IVA à taxa de 5% (verba 2.16 da Lista I), deduzindo o IVA suportado, na parte correspondente, relacionado com os encargos com materiais e subempreitadas incorporados.” V.

Os objetivos propostos, referenciados no ponto anterior, consistiam, de acordo com o ponto 13º, da PI, em “(…) salvaguardar um duplo aspecto: - Permitir à aqui Impugnante “(…) realizar o lucro que normalmente obteria com a realização de qualquer empreitada...

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