Acórdão nº 00133/16.1BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução28 de Outubro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo: I.RELATÓRIO 1.1.

UNIÃO DE ... & A..., LDA, pessoa coletiva nº ..., com sede no ... e morada na Avenida ... Viseu, intentou, com pedido de citação urgente, ação administrativa contra o MUNICÍPIO DE VISEU, com sede institucional na Praça ... Viseu, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 4.340.020,64€, acrescida de juros de mora vincendos a partir da data de citação até efetivo e integral pagamento, a título de indemnização pelos danos patrimoniais que alega ter sofrido, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito.

Para tanto, alega, em síntese que é titular de 18 concessões de transporte público de passageiros em autocarro, as quais abrangem 11 concelhos, e que entre essas concessões incluem-se seis na zona sul de Viseu.

Sucede, que por deliberação camarária de 22/04/2022, o Réu ratificou a criação das linhas nºs 19 e 23 dos Serviços de Transportes Públicos de Viseu, que se haviam iniciado, respetivamente, em 19 de outubro e 3 de dezembro de 2001, as quais iam para além do perímetro urbano de Viseu, ou seja, para localidades que lhe estavam concessionadas, sem que, para a criação dessa linhas, o Réu tivesse adotado o necessário procedimento pré-contratual.

Inconformada com essa deliberação, interpôs recurso contencioso de anulação, tendo o STA anulado a referida deliberação, por acórdão de 05/05/2010, considerando ilegal a criação das linhas 19 e 23 por falta de concurso público.

Sucede que aquelas linhas continuaram a funcionar, e só na sequência da ação de execução desse acórdão, que correu termos no TAF de Coimbra e de cuja sentença interpôs recurso para o TCAN, sendo que, entre estes momentos, o Réu realizou o concurso público para concessão do serviço público de transportes coletivos urbanos e locais para as freguesias de ... e ... em Viseu, tendo por deliberação de 20 de dezembro de 2012 adjudicado as linhas 19 e 23 à mesma empresa que até aí explorara tais linhas.

Em consequência do funcionamento ilegal das linhas 19 e 23 sofreu uma diminuição de receitas que não teria registado se não tivesse sofrido durante o período de tempo decorrido entre 2001 e 2012 não tivesse que suporta a indevida concorrência dos STUV.

Ademais teve de recorrer aos tribunais, tendo suportado despesas.

Pretende, por isso, ser indemnizada pela diminuição das receitas que teve de suportar e das despesas tidas com os vários processos judicias.

Termina, pedindo a procedência da ação.

1.2.

Citado, o Réu contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.

Invocou a exceção da prescrição perentória do direito indemnizatório que a Autora vem exercer nos autos, sustentando que a mesma teve conhecimento do seu direito em 30 de junho de 2010, pelo que o prazo de 3 anos previsto no artigo 498.º do Cód. Civil encontra-se há muito ultrapassado, à data em que foi instaurada a presente ação.

Quanto à defesa por impugnação, impugnou a quase totalidade dos factos alegados pela Autora, apresentando uma versão diferente, alegando, em suma, que a Autora não concretiza em factos que a causa da diminuição das suas receitas foi a criação das linhas 19 e 23 e não prova os prejuízos que alega, uma vez que, o único documento que junta para esse efeito – doc. n.º17- é apenas um estudo orientado para acolher as teses que a Autora pretende fazer valer, não podendo ser considerado um documento isento e imparcial.

Mais alega que não se conhecem os documentos contabilísticos, de análise financeira, de exploração carreira a carreira, ou quaisquer outros, que fundamentem e comprovem as teses expendidas.

Invoca ainda que a diminuição de receitas da Autora e de todas as operadoras de transportes similares, tem entre outras mais longínquas e conhecidas razões, a desertificação das aldeias e da generalidade dos meios rurais; a emigração e, bem assim, o aumento de fluxo as cidades e grandes centros; o envelhecimento da população residentes; o decréscimo acentuado da natalidade nas últimas décadas ou o acesso generalizado de todas as famílias a veículos próprios/particulares.

Termina, pedindo a procedência da matéria de exceção ou, para o caso de assim se não entender, a improcedência da ação e a sua absolvição dos pedidos deduzidos.

1.3.

A Autora replicou concluindo pela improcedência da exceção invocada pelo Réu.

1.4.

Realizou-se audiência preliminar, em que se proferiu despacho saneador, julgando-se improcedente a exceção da prescrição, identificou-se o objeto do litígio e enunciaram-se os temas da prova. Conheceu-se dos requerimentos de prova apresentados pelas partes e designou-se data para a realização de audiência final.

1.5.

Prosseguiram os autos para julgamento, e concluída a audiência em 29/10/2018, foi proferida sentença, datada de 31/03/2021, decidindo de facto e de direito, onde se julgou parcialmente procedente a presente ação, a qual consta da seguinte parte dispositiva: «Nestes termos, julga-se a presente acção parcialmente procedente, por provada e em consequência, condena-se o Réu a pagar à Autora o montante de 150.000,00 € (cento e cinquenta mil euros) acrescido de juros de mora vincendos a partir da data da citação até efetivo e integral pagamento.

Custas pelo Réu e Autora na proporção do decaimento, com dispensa do pagamento do remanescente.

Registe e notifique.» 1.6.

Inconformado com o assim decidido, o Réu interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: «I. O presente recurso é interposto da douta Sentença proferida nos autos e que julgou a presente acção destinada à efectivação de responsabilidade civil extracontratual contra o Município de Viseu parcialmente procedente.

II. Alegava a A. e ora Recorrida que a criação das linhas n.º 19 e 23 dos Serviços de Transportes Públicos de Viseu (STUV) pelo Município de Viseu, que entende ilegal, e a sua exploração de 2001 a 2012, foi causa directa e imediata da diminuição das suas receitas, pois se não tivessem sido criadas tais linhas a A. seria a única a prestar o serviço de transportes de passageiros em autocarro nas localidades que as mesmas servem.

III. Pese embora o Município Réu e ora Recorrente entenda que o Mmº Tribunal a quo fez uma correcta valoração de toda a prova produzida, entende-se, também, que analisada e ponderada toda a matéria de facto dado como assente, não podia o Tribunal ter decidido como decidiu, não podendo restar dúvidas – salvaguardado o devido e maior respeito – que a presente acção deveria ter sido julgada total e liminarmente não provada e improcedente.

IV. Como se pode ler na Decisão em recurso, para prova dos seus alegados “prejuízos” a Recorrida juntou unicamente aos autos um Relatório de Avaliação do impacto da entrada em funcionamento das linhas 19 e 23 dos STUV nas concessões da A. na zona sul de Viseu, que teve apenas como objecto a análise das receitas globais das seis concessões da sua actividade, na zona e nos períodos considerados, nada existindo - nem neste estudo, nem em qualquer outro elemento de prova – sobre custos, despesas e encargos que a Recorrida também teve - e tem – nessas concessões.

15 V. Assim sendo, o Tribunal a quo entendeu que a Recorrida não logrou provar – como lhe cumpria – a existência de quaisquer prejuízos, não estando assim preenchido um dos pressupostos necessários à condenação do ora Recorrente, a existência de dano.

Assim, – lê-se na mesma – não poderá ser a autora indemnizada na medida em que faz o seu pedido e apresenta apenas as receitas e mesmo essas receitas respeitam a todos os locais”. (negritos e sublinhados nossos) (cfr. pág. 18 da Decisão recorrida). Acresce que, VI. No que respeita ao nexo de causalidade, muito embora o Tribunal a quo entenda que não resultou provado qualquer prejuízo acaba por fazer uma análise no sentido de saber se a criação das linhas 19 e 23 foi causa directa e imediata da diminuição de receitas. (cfr. pág. 15 da Decisão recorrida).

VII. Com o devido e maior respeito, entende-se que não havendo dano fica esvaziada a questão da causalidade adequada, não havendo fundamento para aferir do nexo de causalidade entre criação das linhas 19 e 23/diminuição de receitas.

VIII. Mas, ainda que assim não se entenda, o certo é que, mesmo nesta análise, o Tribunal a quo entendeu que relativamente à “diminuição de receitas” – que, reiteramos, não pode isoladamente significar “prejuízos” – não há qualquer nexo de causalidade entre aquela diminuição e a criação das linhas 19 e 23, não estando, assim, preenchido outro dos pressupostos necessários para que possa existir responsabilidade civil por parte do ora Recorrente, o nexo de causalidade. ACONTECE QUE, IX. Mesmo entendendo que não há danos e que a diminuição de receitas não teve como causa a criação das linhas 19 e 23, o Tribunal a quo decide que, embora não se possa indemnizar a Recorrida pelo montante pedido, há-que indemnizar porque houve diminuição de receitas, e fixa uma indemnização com recurso à equidade no montante de 150.000,00€, X. Com o devido e maior respeito, o Mmº Tribunal a quo nunca podia ter decidido neste sentido, pois não estando preenchidos o pressuposto dano e o de nexo de causalidade, dois dos pressupostos de que a lei faz depender a condenação em responsabilidade civil extracontratual, não há qualquer obrigação de indemnizar, seja pelo montante pedido, seja por qualquer outro montante! XI. Não podia o Tribunal a quo ter “dado o salto” para a condenação numa indemnização com o recurso a juízos de equidade! Primeiro, porque não estão preenchidos todos os requisitos necessários para que haja condenação – como o próprio Tribunal decide; depois, e por essa razão, porque não há quaisquer factos que possam servir de referência e sustentar esse juízo de equidade.

XII. Por tudo o exposto, ao decidir como decidiu, a Decisão recorrida: – Padece de falta total de fundamentação e contradição entre os fundamentos e a decisão, por inexistência absoluta de...

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