Acórdão nº 00264/18.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2022
Magistrado Responsável | Luís Migueis Garcia |
Data da Resolução | 10 de Março de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: A...
(Rua (…)), em acção administrativa intentada contra o Instituto da Segurança Social, I. P.
(R. Rosa Araújo, n.º 43, 1250-194 Lisboa), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra, que absolveu o réu da instância.
Conclui: 1) Salvo o merecido respeito, a sentença recorrida corre o risco de consagrar na nossa ordem jurídico-administrativa uma nova categoria de decisões administrativas: a das decisões administrativas que são tomadas antes do término da instrução.
2) É que o Tribunal a quo entende que a (única) decisão impugnável é a que foi tomada quanto ao estado de invalidez do A., em 17/10/2016, depois aposta no “Formulário do Acordo”, datado de 12/10/2017.
3) Contudo, já depois dessa decisão, o A. foi notificado, em 14/03/2017, para comparecer a (novo) exame médico, este realizado em 30/03/2017 (cfr. pontos J) e K) da fundamentação de facto da sentença), e foi deste (novo) exame médico que saiu o Relatório Médico a que nos referimos como segundo ato impugnado, corporizado no preenchimento do Formulário E213 que, por sua vez e no que materialmente releva, foi vertido no sobredito “Formulário do Acordo”, preenchido e enviado à entidade luxemburguesa em 12/10/2017 (cfr. pontos L), M), P), Q) e R) da fundamentação de facto da sentença).
4) A decisão não podia estar já tomada, em relação a esta diligência instrutória e ao procedimento que a integra, o qual, sendo autónomo do anterior, foi inclusive tramitado sob um número de processo diferente (processo n.º 201700074967, quando o anterior, que culminou na decisão de 17/10/2016, era o processo n.º 201600274245 - cfr. ponto T) da fundamentação de facto da sentença).
5) Aliás, em 03/07/2017, o A. foi ainda notificado pelo Réu para vir pronunciar-se sobre a impossibilidade de auferir, em simultâneo, o subsídio de desemprego e a pensão que poderia vir a ser atribuída pela entidade luxemburguesa (cfr. ponto N) da fundamentação de facto da sentença), o que não tem qualquer sentido, a considerar-se que já havia decisão e a mesma era desfavorável ao A., pois nenhuma pensão lhe poderia ser atribuída face ao teor da decisão (a mesma vincula inelutavelmente a entidade luxemburguesa).
6) Admitir a tese da sentença seria, pois, admitir que a diligência instrutória de 30/03/2017 (exame médico) fosse sancionado, quanto aos seus fundamentos e conclusões, por ato administrativo anterior, de 17/10/2016; 7) E, assim, jamais podia o A. reagir contra as ilegalidades decorrentes dessa fase procedimental, pois o prazo de reação contra a (suposta) decisão final do procedimento já tinha passado, no momento em que teve conhecimento do resultado do exame médico de 30/03/2017 e seus fundamentos, o que só sucedeu em 07/02/2018 (cfr. pontos T) e U) da fundamentação de facto da sentença; aliás, a nomeada aposição da decisão no “Formulário do Acordo” só foi conhecida já no decurso da ação, com a notificação do pa., daí a ampliação da instância requerida).
8) Deste modo, ao julgar que o Relatório, datado de 30/03/2017 e produzido na sequência do novo exame médico ocorrido nessa data, não é passível de impugnação, porque a decisão final do procedimento é a decisão de 17/10/2016; 9) Bem assim, concomitantemente, ao entender que a por nós designada “Decisão da Chefe de Equipa do CNP, datada de 12/10/2017” (trata-se, no fundo, da referida “aposição” do ato de 17/10/2016 no “Formulário do Acordo”, como designa o Tribunal) não é ato impugnável (juízo este que precede os demais na sistemática da sentença, mas não em termos procedimentais); 10) Ao julgar ademais que a pretensa exceção não seria possível de sanação, porque a sobredita decisão já estava consolidada quando o A. intentou a ação; 11) Isto quando o A. só conheceu o sentido e fundamentos do Relatório de 30/03/2017 em 07/02/2018 (cfr. ponto T) da fundamentação de facto da sentença; aliás, o A. só teve conhecimento da nomeada aposição da decisão no “Formulário do Acordo” já no decurso da ação, com a notificação do pa., daí a ampliação da instância requerida); 12) A sentença incorre em ostensivo erro de julgamento, por violação do art. 89.º, n.ºs 1, 2 e 4, als. i) e k) e do art. 7.º (princípio pro actione) do CPTA, bem como, atentos os vícios invocados na pi. e não conhecidos sequer, dos arts. 161.º, n.º 2, al. c), 152.º, n.º 1, als. a) e c), 153.º, n.ºs 1 e 2, 58.º e 115.º do CPA e 16.º, 17.º, n.º 1, als. c), f) e g) e 54.º do DL n.º 360/97.
13) Mais: o A. assacou mesmo vícios geradores de nulidade contendentes com o sentido e conteúdo do Relatório de 30/03/2017 (cfr. arts. 46.º a 49.º e 58.º a 60.º da pi.), os quais, seguindo a tese do Tribunal, sempre ditariam a nulidade da decisão de 17/10/2016 e tinham que ser conhecidos, falecendo também por aqui a intempestividade da ação quanto a este ato.
14) Ocorrendo, portanto, novo erro de julgamento por violação das mesmas normas jurídicas elencadas e até a nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, ex vi art. 1.º do CPTA, que se argui.
15) Acresce, bem assim e determinantemente, que, ao entender que o direito do A. de reagir contra o ato administrativo morreu antes de estarem criadas todas as condições ao seu nascimento (decurso de todos os trâmites procedimentais e conhecimento dos seus resultados e, assim, de todos os fundamentos da decisão), a sentença viola, em concreto, o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, consagrado nos arts. 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP e ínsito ao art. 6.º, n.º 1 da CEDH.
16) Em suma, jamais pode a sentença recorrida (rectius, saneador-sentença) manter-se na ordem jurídica, impondo-se a respetiva revogação por este TCA-Norte.
Sem contra-alegações.
*A Exmª Procuradora-Geral Adjunta junto deste tribunal foi notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1, do CPTA, não emitindo parecer.
*Dispensando vistos, vêm os autos a conferência Cumpre decidir, mantendo-se a instância regular.
* Os factos, julgados provados pelo tribunal “a quo”: A) Em data não concretamente apurada do ano de 1993, o Autor emigrou para o Luxemburgo, onde trabalhou como pedreiro entre 22/08/1993 e 01/08/2004 – cfr.
requerimento de fls. 41 a 39 do PA; B) O Autor efectuou descontos para a Segurança Social luxemburguesa durante onze anos – Facto admitido por acordo; C) E para a Segurança Social portuguesa durante dois anos – Facto admitido por acordo; D) Em 26/07/2016 o Autor entregou no ISS, IP – C. Distrital de Coimbra, uma “Declaração – Pedido de Pensão à Instituição Estrangeira Competente”, mediante a qual requer uma pensão por invalidez, indicando, no campo “1.2.
Países onde exerceu actividade”, “Luxemburg” – cfr.
recibo de entrega de documentos, de fls. 41 a 39 do PA; E) Juntamente com o documento descrito na alínea anterior, o Autor entregou os documentos identificados no “recibo de entrega de documentos”, de fls. 38 do PA, – cfr.
recibo de fls. 38 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e faz parte integrante desta decisão; F) Em 22/09/2016 o Autor compareceu nos serviços do Réu para exame médico – cfr.
doc. de fls. 99 do PA, facto que também é admitido por acordo das Partes; G) Em 09/02/2017 a Directora de Núcleo do CNP determinou a notificação ao Autor da informação constante do modelo CNP 502.610 – Área Internacional, Regulamento CEE, Pensão de Invalidez, de onde se extrai o seguinte: “(…) Data do Requerimento: 26/7/2016 Concluída a instrução do processo, verifica-se que o Requerente não reúne as condições legais para a atribuição da prestação acima referida, pelos seguintes motivos: (…) X - Não se encontrar nas condições previstas no art.º 2.º n.º 1 e n.º 3 e art.º 17.º do Dec-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, por em CVIP realizada em 17/10/2016, ter sido considerado: X – Não incapaz (…)” – cfr.
doc. de fls. 45 do PA; H) Por ofício n.º 000/505/312, de 10/02/2017 o Réu comunicou ao Autor que “a Comissão de Verificação de Incapacidades Permanentes, por deliberação de 2016/10/17, considerou que V. Exa. não reúne as condições de incapacidade permanente, determinantes da atribuição da pensão de invalidez relativa, exigidas no art. 14 do D.L. 187/2007, de 10/05. (…) poderá, no prazo de 10 dias a partir da data da recepção deste ofício, requerer novo exame por Comissão de Recurso (…). Na falta de resposta, no prazo referido, considera-se o requerimento INDEFERIDO com o fundamento indicado. (…)” – cfr.
ofício de fls. 98 do PA; I) Por fax datado de 21/02/2017, o CNP, remeteu ao Centro Distrital de Coimbra um ofício com o assunto “Preenchimento de relatório médico – Formulário E213; Nome – A...”, mediante o qual “solicita o preenchimento do formulário E213 relativamente ao beneficiário mencionado e informa que “[o] formulário destina-se a ser enviado à instituição competente do seguro de pensões na Suíça para que possa ser avaliado o direito à respectiva pensão, devendo ser anexados eventuais exames auxiliares de diagnóstico ou relatórios de especialidade. O beneficiário foi submetido à junta médica em 17/10/2016. (…)” – cfr.
ofício de fls. 174 do PA; J) Por ofício do Réu de 14/03/2017 o Autor foi notificado para comparecer a exame médico no dia 30/03/2017 – cfr.
ofício de fls. 97 do PA; K) Tendo o Autor comparecido e realizado o dito exame médico no dia 30/03/2017 – facto admitido por acordo; L) E no âmbito do qual foi elaborado, nesse dia...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO