Acórdão nº 00620/21.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2022
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 10 de Março de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: I- RELATÓRIO 1.1.
M...
, residente na Rua (…), intentou a presente ação administrativa contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, com sede na Avenida 5 de Outubro, n.º 175, apartado 1194, 1054-001 Lisboa pedindo a condenação da Ré a reconhecer que é a entidade responsável pelo pagamento das despesas com medicamentos e tratamentos para a doença profissional contraída pela Autora no exercício de funções públicas, desde a data de entrada da presente petição inicial em juízo, condenando-se também a Ré em todas as custas e encargos do processo.
Para tanto, alega, em síntese que, por causa e no desempenho das suas funções de assistente administrativa especialista no Centro Distrital de Aveiro do Instituto da Segurança Social, I.P., contraiu uma doença, qualificada e reconhecida como doença profissional, designada de “periartrite escapulo-humeral” direita, de que resultou uma incapacidade permanente parcial para o trabalho de 6%, que reclama que até ao fim da sua vida, tenha de recorrer a medicamentos e a cuidados médicos.
Por ofício de 28/11/2008, a Ré informou a Autora da remição de pensão por doença profissional.
A autora demandou o “ISS” para pagamento dos montantes de despesas que suportou no ano de 2013, em ação que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, com o processo n.º 743/14.1BEAVR, no qual foi proferida decisão que absolveu o “ISS”, considerando que a responsabilidade por esse pagamento seria da “CGA” De seguida, a Autora recorreu à Provedoria de Justiça, que instou a CGA a pronunciar-se, a qual recusou assumir qualquer responsabilidade quanto ao pagamento das despesas reclamadas pela Autora.
A própria Provedoria pronunciou-se no sentido de não ser da responsabilidade da CGA o pagamento das despesas médicas reclamadas pela Autora.
E a Ré sempre se recusou a assumir a sua responsabilidade no pagamento das despesas médicas e medicamentosas decorrentes da doença profissional contraída pela Autora.
Do preâmbulo do D.L. n.º 503/99, de 20/11 consta o princípio geral da atribuição à CGA da responsabilidade pela reparação em todos os casos de incapacidade permanente, pelo que, pese embora o disposto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 5.º desse diploma, considerando que a autora ficou a padecer de uma incapacidade permanente parcial, atento o disposto no n.º3 desse art.º 5, entende que cabe à Ré e não à entidade empregadora a responsabilidade pelo pagamento das despesas reclamadas.
A Autora identifica vários acórdãos dos quais retira que é à CGA que compete assegurar o pagamento das despesas em causa na ação.
Conclui pedindo a procedência da ação.
1.2. Citada, a Ré apresentou contestação, na qual suscita a questão prévia do valor da ação, que sustenta dever fixar-se em 30.000,01€ por se estar perante uma causa de valor indeterminável nos termos do n.º 2 do art.º 34.º do CPTA.
No mais defendeu-se por impugnação, alegando, em síntese, não desconhecer a jurisprudência citada pela Autora, mas dela discordar.
Sublinha que a regra geral no que concerne à reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais, é a de que cabe à entidade empregadora reparar os danos decorrentes daqueles eventos, dado que é aquela que se aproveita do trabalho realizado.
Nota que embora perceba a tentação fácil de com base no art.º 34.º, n.º1 do D.L. n.º 503/99, de 20/11 apontar-se a CGA como entidade responsável pela reparação em espécie, há que contar também com a previsão do artigo 6.º do mesmo diploma, que determina expressamente que caso o serviço detenha autonomia administrativa e financeira tem de inscrever no seu orçamento as verbas para fazer face às despesas decorrentes do acidente, sendo que nos restantes casos, em que o serviço não detenha autonomia, tais despesas são suportadas pelo orçamento do Ministério das Finanças.
Essa responsabilidade não cabe à CGA, não sendo os sinistrados seus trabalhadores, nem sendo a sua vocação verificar a consistência da documentação que permite o abono dessas despesas ou tratamentos em espécie.
Ademais, caso fosse responsável, então a efetiva avaliação quanto à justificação das despesas efetuadas pela Autora sempre teria de ser feita de acordo com o parecer da Junta Médica competente, assim como teria de competir aos serviços da CGA a avaliação das condições legalmente exigidas para o pagamento das despesas estabelecidas no art.º 6.º do D.L. 503/99, de 20/11, designadamente, do seu n.º7 e bem assim dos condicionalismos determinados no n.º11 do art.º 11 do mesmo diploma.
De contrário estar-se-ia a dar cobertura ao envio indiscriminado de todo o tipo de despesas efetuadas com medicamentos, tratamentos ou assistência médica por parte dos interessados que fossem subscritores da CGA ou não, sem qualquer relação com a concreta doença profissional certificada nis termos do D.L. n.º 503/99, de 20/11.
Conclui, pugnando pela improcedência da ação e pela retificação do valor da causa.
1.3. O TAF de Aveiro proferiu despacho saneador-sentença, que indeferiu a produção da prova requerida, considerando-se que os autos continham já todos os elementos necessários ao conhecimento do mérito da decisão, fixou o valor da ação em € 30.000,01 e conheceu do mérito julgando a ação procedente, dela constando o seguinte segmento decisório: «Em face do exposto, porque provada, julga-se a presente acção procedente e, consequentemente, declara-se e reconhece-se que a Ré Caixa Geral de Aposentações é a entidade responsável pelo pagamento à A. das despesas com medicamentos ou medicamentosas e tratamentos para a doença profissional contraída no exercício das funções públicas, desde a data da entrada da presente petição inicial em juízo.
Custas a cargo da Ré.
Registe e notifique.» 1.4. Inconformada com a decisão que julgou a ação procedente, a Ré CGA interpôs a presente apelação cujas alegações encerra com a formulação das seguintes Conclusões: «1.ª A CGA não desconhece a jurisprudência que vem recentemente defendendo uma interpretação do art.º 5.º e do art.º 34.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11, segundo a qual os encargos emergentes de acidentes de trabalho (sejam em dinheiro sejam em espécie) são da sua responsabilidade. Mas a verdade é que tais decisões – uma delas invocadas na página 18 da Sentença recorrida (Acórdão do TCA Norte de 24.03.2017, Processo n.º 2714/14) – interpretam tal preceito no sentido de que a CGA é responsável pela “...
avaliação e reparação dos encargos deles emergentes (em dinheiro ou em espécie) – (cfr. súmula do Acórdão do TCA Norte de 24.03.2017, Processo n.º 2714/14) 2.ª A Sentença recorrida parece ter decidido ir um pouco mais longe, ao declarar que a CGA “...
é a entidade responsável pelo pagamento à A. das despesas com medicamentos ou medicamentosas e tratamentos para a doença profissional contraída no exercício das funções públicas, desde a data da entrada da presente petição inicial em juízo.”, parecendo, assim, arredá-la da possibilidade de avaliação do cabimento dessas despesas em face da Lei.
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É certo que a Sentença recorrida também estabelece, na página 21, que a A. tem direito ao pagamento das despesas com medicamentos e tratamentos para a doença profissional “...
desde que preencha as demais condições legalmente previstas (cf. artigos 4.º, 6.º, n.º 6 e 7 e 29.º e ss. do Decreto-Lei n.º 508/99, 20.11.”.
Mas existem outras condições legalmente previstas para além das constantes nos “...artigos 4.º, 6.º, n.º 6 e 7 e 29.º e ss. do Decreto-Lei n.º 508/99” 4.ª Embora a Sentença recorrida tenha chamado à colação a jurisprudência vertida no Acórdão do TCA Norte de 24.03.2017, Processo n.º 2714/14, a mesma nada refere quanto à exigência de aplicação das outras condições legalmente previstas para as doenças profissionais, que constam nos artigos 8.º, 25.º, 35.º, 61.º, 86.º e 93.º do Decreto-Lei n.º 248/99, de 2 de julho (regime aplicável ao caso concreto, na medida em que a doença profissional...
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