Acórdão nº 00543/16.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução03 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Exm.ª Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 15.07.2020, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida por A (...), Lda., contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) dos exercícios de 2011 e 2012 e respetivos juros compensatórios no valor global de € 65.350,34.

1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: A. A douta sentença sob recurso julgou procedente a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) com os nºs 2015 83100 e 2015 831003, emitidas em 2015/03/, relativa aos exercícios de 2011 e 2012, e respetivos juros compensatórios, resultantes das correções meramente aritméticas ao lucro tributável declarado pela impugnante, efetuadas pela AT em sede de procedimento inspetivo.

B. As correções em causa resultaram do facto de a AT considerar que as faturas emitidas pela sociedade B.., Lda, e contabilizadas pela impugnante, consubstanciam operações fictícias, sendo o gasto inerente a estas aquisições desconsiderado para o apuramento do lucro tributável, nos termos do artº 23º do IRC, uma vez que tal custo não pode ser considerado como custo fiscal indispensável para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

  1. A douta sentença de que se recorre concluiu pela procedência da presente impugnação, e consequente anulação das liquidações impugnadas, reconhecendo, ainda o direito da impugnante a juros indemnizatórios, considerando que a AT não cumpriu com o ónus que lhe incumbia de recolha de indícios fundados e seguros de estar perante operações simuladas.

  2. Para tal, conclui que a AT recolheu, apenas, um único indício que envolve a impugnante – que é o facto de o pagamento das faturas em causa ter sido efetuado em numerário -, mas que o Tribunal considera que se mostra escasso e frágil, não permitindo suportar a conclusão a que chegou a AT; E. Quanto aos restantes indícios, concluiu o Tribunal a quo, que os mesmos se mostram frágeis e conclusivos e que são todos completamente estranhos à impugnante.

    F. Decidiu, a final, o Tribunal a quo, que não tendo a AT feito prova do bem fundado da formação do seu juízo, a questão relativa à legalidade da sua atuação terá de ser resolvida contra ela.

  3. A sentença recorrida considerou como assente a factualidade elencada nos pontos 1 a 14 do ponto III. FUNDAMENTAÇÃO, dos quais aqui se destaca, por terem relevância para a discussão, os pontos 7. a 14., que ora se dão por integralmente reproduzidos, por economia e desnecessidade de repetição, alicerçando-se a sua convicção na ponderação crítica: (i) dos documentos constantes do processo administrativo apenso, designadamente, o relatório de inspeção tributária; (ii) dos documentos e coisas móveis juntos pela Impugnante aos autos; (iii) dos depoimentos prestados; e (iv) das declarações de parte prestadas, tudo conforme indicado em cada um dos itens do probatório.

  4. Com o devido respeito, não se conforma a FP com o que assim foi decidido, sendo outro o seu entendimento, como a seguir se argumentará e concluirá, entendendo que a mesma errou no julgamento que efetuou, quer de facto, quer de direito.

    I. Entende a FP, com o respeito devido pela decisão proferida, que os factos vertidos nos pontos 7. a 13. do probatório não resultam da prova produzida nos autos, tendo o douto Tribunal baseado a seleção destes factos na prova testemunhal, a qual, face à matéria que está em causa, não consubstancia prova idónea nem suficiente para considerar os referidos factos como provados.

  5. Nos presentes autos foi produzida prova documental e testemunhal sobre a matéria controvertida, tendo sido ouvidas diversas testemunhas que, no entendimento da FP, e com o devido respeito por opinião diversa, não demonstraram que os serviços descritos nas faturas consideradas pelos SIT como simulados, tenham ocorrido na realidade.

  6. Em sede de inquirição de testemunhas foram ouvidos o gerente da impugnante (em depoimento de parte), o sócio da impugnante e a companheira deste e responsável pelos recursos humanos da sociedade, dois funcionários da impugnante, um amigo dos sócios e uma contabilista externa à impugnante.

    L. Resulta, pois, claro que o testemunho de todos os depoentes não pode considerar-se isento nem credível, dada o manifesto interesse económico ou pessoal no desfecho da presente impugnação, sendo sabido que, perante indícios, sérios e credíveis, de simulação, não basta ao contribuinte criar a dúvida sobre os mesmos, pois é ele quem invoca o seu direito a ver relevados negativamente na determinação da matéria colectável os custos que diz ter suportado, motivo porque a dúvida a esse propósito lhe é desfavorável - Cfr. o douto Acórdão do TCA Norte, de 2010/03/11, processo nº 02794/04 – VISEU.

    V.

    ainda, por todos, os doutos Acórdãos do TCA Norte, de 2010/01/28, processo nº 04871/04 – VISEU e de 2012/05/03, processo nº 00607/08.8BEPNF.

  7. Entende, pois, a FP que, para além dos factos levados aos pontos 7. a 14. do probatório não resultarem da prova testemunhal produzida, esta também não se revela suficiente para infirmar a prova concludente e objetiva produzida pelos SIT, mesmo analisada em conjunto com outra provas produzidas nos autos, uma vez que não constam dos mesmos elementos que a corroborem, como veremos.

  8. E mesmo conjugando esta prova com as coisas móveis juntas aos autos pela impugnante, o resultado da sua apreciação não tem a virtualidade de provar que os artigos de vestuário em crise foram adquiridos para serem utilizados em campanhas publicitárias.

  9. Para além de não existir uma correspondência entre as alegadas campanhas e as aquisições em crise, as faturas nº 31, datada de 07-12-2011 (documento nº 47 da petição inicial) e nº 38, datada de 15-12- 2011 (documento nº 49 da petição inicial), referem, na respetiva descrição, “camisolas ….100% algodão”, o que está em contradição com os modelos apresentados pela impugnante como sendo os modelos adotados nas campanhas publicitárias.

  10. Ficou também por explicar quantas peças foram, em média, distribuídas por campanha, o que seria pertinente, face ao número desmedido de peças adquiridas (13.056, em 2011 e 20.458, em 2012), num total de 33.514, o que corresponde, na situação hipotética de terem sido realizadas dez campanhas por ano, - o que não se concede -, a que teriam sido distribuídas, em cada campanha, uma média de 1.305 camisolas (13.056/10), em 2011 e 2.045 camisolas (20.458/10), em 2012, o que não nos parece razoável.

  11. No que à restante prova tida nos autos diz respeito, a ação inspetiva efetuada à impugnante teve por base a informação obtida em outro procedimento inspetivo realizado à B, fornecedora da impugnante, concluindo-se que, nos anos de 2011 e 2012, esta empresa emitiu faturas/vendas a dinheiro à impugnante, nos montantes de € 109.789,80 e € 145.775,91, referentes a vendas de tshirts, pólos, sweats e camisolas, tendo, para pagamento dessas faturas, sido emitidos pela impugnante, cheques ao portador, de valores significativos, que confessadamente foram levantados pela administração da emitente dos mesmos - a impugnante, ao balcão, para alegadamente ser entregue em numerário à B.

  12. No decurso do procedimento inspetivo desencadeado à impugnante, em 30-07-2015 foi esta notificada, para prestar por escrito esclarecimentos sobre a sua situação fiscal nos anos em causa e esclarecer e comprovar as operações realizadas com a B, provando a sustentabilidade da mesma, designadamente, juntando documentos (…), tais como a correspondência trocada, o pedido de orçamentos, os preços praticados e os serviços, notas de encomenda e guias de transporte, a prova dos serviços contratualizados e os contratos realizados, a justificação dos respetivos gastos incorridos, identificando os serviços a que os mesmos foram imputados, bem como a identificação para cada fatura, dos meios de pagamento utilizados. Mais foi solicitado à impugnante que, em conformidade com a prova a realizar, fosse também provada a imprescindibilidade dos referidos gastos.

  13. Em resposta, nenhum documento foi junto, limitando-se a impugnante a afirmar que as aquisições em crise se destinavam a campanhas publicitárias, não as identificando, nem tendo demonstrado/justificado a imprescindibilidade dos gastos e não tendo, também, identificado os serviços/campanhas a que os mesmos foram imputados.

  14. Já no âmbito do procedimento inspetivo efetuado à B, os SIT concluíram que existem indícios de que esta empresa é emitente e utilizadora de faturas que não têm subjacentes operações reais, pois não reunia condições para fornecer à impugnante as t-shirt’s, camisolas, pólos e sweats referidas nas faturas/vendas a dinheiro por ela emitidas, quer por se tratar de transmissões fora do âmbito da atividade exercida (prestação de serviços na estampagem de tecidos), quer por ausência de prova de aquisição da mercadoria que alegadamente transmitiu à impugnante.

  15. Mais concluíram os SIT que as aquisições de artigos de vestuário registadas na contabilidade da B, são suportadas por documentos emitidos em nome de fornecedores que à data da emissão dos mesmos, não detinham uma estrutura empresarial adequada (técnica e humana) suscetível de executar as operações aí registadas.

    V. No entanto, a douta sentença recorrida considerou, não só que a AT não recolheu indícios suficientes, mas também que a prova testemunhal e as coisas móveis juntas pela impugnante, contrariaram os indícios recolhidos pelos SIT, o que não se concede, constatando-se que a douta sentença recorrida aventa, ela própria, justificações no sentido de descredibilizar e desvalorizar os indícios recolhidos pelos SIT.

  16. Com todo o respeito devido, que é muito...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT