Acórdão nº 00071/21.6BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelCeleste Oliveira
Data da Resolução03 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A--, SA, melhor identificada nos autos, inconformada com a sentença proferida no TAF de Aveiro, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida e relativa à liquidação de IMT e juros compensatórios no montante de €31.154,64, deduziu o presente recurso formulando nas respectivas alegações de recurso as seguintes conclusões que se reproduzem.

[imagem que aqui se dá por reproduzida]*** *** A Recorrida não apresentou contra-alegações.

*** ***O Exmo. Procurador - Geral Adjunto, junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do recurso não merecer provimento.

*** ***Com dispensa dos vistos legais, cumpre agora decidir, já que a tal nada obsta.

*** *** OBJECTO DO RECURSO: Questões a apreciar e decidir: Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim, as questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as de saber se a sentença padece de erro de julgamento da matéria de facto e da matéria de direito.

*** *** 2. FUNDAMENTAÇÃO O Tribunal a quo estabeleceu a seguinte matéria de facto:[imagem que aqui se dá por reproduzida]*** ***IV- O DIREITO Cumpre, agora, entrar na apreciação do recurso.

Relembre-se que está em causa a liquidação de IMT e juros compensatórios no montante de €31.154,64.

A Recorrente não se conforma com a sentença que julgou improcedente a sua pretensão pugnando pelo erro de julgamento de facto e de direito.

Do erro de julgamento de facto No que concerne ao erro de julgamento da matéria de facto considera a Recorrente que deveria ter sido julgado como não provado, o seguinte ponto da matéria de facto “Não resultou provado que o imóvel tenha sido efectivamente entregue à ora impugnante para que dele beneficiasse como proprietária, ou que aquela sobre o mesmo imóvel tivesse praticado quaisquer atos de uso, fruição ou disposição” (conclusão b) do recurso).

Sobre esta matéria, e com referência ao julgamento da matéria de facto, crê-se pertinente apontar que com a revisão do CPC operada pelo DL n.º 329-A/95, de 12.12, e pelo DL n.º 180/96, de 25.09, foi instituído, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto.

Importa, porém, ter presente que o poder de cognição deste Tribunal sobre a matéria de facto ou controlo sobre a decisão de facto prolatada pelo tribunal “a quo” não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento de facto - art. 640º do novo CPC, que regula esta matéria depois da alteração introduzida pelo D.L. nº 303/07, de 24-08, porquanto, por um lado, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no art. 640º nºs 1 e 2 do CPC, e, por outro lado, o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade (vide sobre esta problemática A.S. Abrantes Geraldes in: “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, págs. 250 e segs.

).

Daí que sobre o recorrente impende um especial ónus de alegação quando pretenda efectuar impugnação com aquele âmbito mais vasto, impondo-se-lhe, por conseguinte, dar plena satisfação às regras previstas no art. 640º do CPC. É que ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 662.º, n.º 1 do CPC, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.

Diga-se ainda que a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador que se mostra vertido no art. 607, nº 5º do CPC, sendo certo que na formação da convicção daquele quanto ao julgamento fáctico da causa não intervém apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também factores não materializados, visto que a valoração, por exemplo, de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação e/ou na respectiva transcrição.

À luz desta perspectiva temos que se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

Aliás e segundo os ensinamentos de M. Teixeira de Sousa ” … o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente …” (in: “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, pág. 348) Neste sentido cfr. Acd do TCA proferido em 15/11/2018, no âmbito do processo nº 02790/11.6BEPRT, disponível in: www.dgsi.pt.

.

Presentes os considerandos que antecedem e na sequência dos mesmos temos que para que possa ser atendida nesta sede a divergência quanto ao decidido em 1.ª instância no julgamento de facto deverá ficar demonstrado, pelos meios de prova indicados pelo recorrente, a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, exigindo-se, contudo e para tanto, que tais elementos de prova sejam inequívocos quanto ao sentido pretendido por quem recorre, ou seja, neste domínio, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, o que significa que o Recorrente tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (neste sentido cfr. Acd., ainda inédito, proferido no âmbito do processo nº 1619/14.8BEPRT de 27/10/2021).

Retornando ao caso em apreço, cumpre referir que a Recorrente nas suas alegações de recurso não cumpre com o dever que lhe é imposto no art. 640º do CPC.

Senão, vejamos.

Preceitua o aludido normativo que: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios...

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