Acórdão nº 00635/09.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução31 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório AM., S.A. [sociedade incorporante da OS., S.A], com o NIPC (…), e a Representação da Fazenda Pública interpuseram recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 03/07/2018, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação de IRC e respectivos juros compensatórios, do exercício de 2005, no montante global de €85.519,46, que originou a emissão da Demonstração de Acerto de Contas número 2009 0000002…., da qual resultou o montante a pagar de €18.822,95.

A Recorrente, AM., S.A., terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1. O presente recurso vem interposto da parte da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela AM... S.A. contra a liquidação de IRC que lhe foi dirigida, com respeito ao exercício de 2005.

  1. Tendo por base a fundamentação da decisão recorrida, defende a Recorrente que a Sentença está ferida de anulabilidade. Esta resulta, de um deficiente julgamento quanto à matéria de direito mobilizada.

  2. Entende a Recorrente que o Tribunal fez, em relação à correcção realizada ao nível da desconsideração fiscal do custo relativo a prémios de seguro de doença em favor de familiares dos trabalhadores da empresa, uma interpretação e aplicação inidóneas do Direito consequentemente aplicável.

  3. As despesas suportadas pela Impugnante com a parte dos seguros de saúde contratados relativa aos cônjuges e filhos dos seus colaboradores não poderão deixar de ser consideradas um custo fiscalmente dedutível, desta feita por pura aplicação do n.º 1 do artigo 23.° do Código do IRC.

  4. No caso em apreço, a Impugnante suportou os encargos em causa por motivos intrinsecamente empresariais, sentindo-os, portanto, como o cumprimento, não só de um ímpeto de cariz social e comunitário, mas também de um interesse próprio.

  5. Os pagamentos aos familiares dos trabalhadores são, assim, causa societatis, e, nessa medida, indispensáveis nos termos do artigo 23.° do Código do IRC.

  6. A dedutibilidade fiscal destes encargos, designadamente os suportados com os prémios de seguros de doença relativos aos familiares dos trabalhadores, foi já confirmada em diversas decisões do Centro de Arbitragem Administrativas, bastando, para o efeito, aqui referir, por todos, a proferida no âmbito do Processo n.° 4/2012 - T, cuja consulta está disponível em www.caad.org.pt.

  7. Sobre a correcção ao nível da tributação autónoma das despesas referentes a juros de ALD, portagens e estacionamentos, a sentença recorrida apenas se limitou a constatar que o tipo de encargos em causa - Juros de ALD, Portagens e Estacionamento - a própria Impugnante não refuta que estão relacionados com veículos ligeiros de passageiros. Assim sendo, caem dentro da previsão do artigo 81°, n° 3 e 5 do CIRC (...) e como tal sujeitas a tributação autónoma.

  8. Ao tributar 5% das despesas com reintegrações, rendas ou alugueres, seguros, despesas com manutenção e reparação, combustíveis e impostos incidentes sobre a utilização de viaturas ligeiras de passageiros, o legislador pretende tributar o uso privado das mesmas. Uso privado esse que se presume e que se quantifica com base naquela percentagem forfetária de 5% sobre o valor da despesa em causa.

  9. No entanto, o mesmo legislador teve o cuidado de afastar da incidência deste dispositivo aquelas situações em que esta tributação forfetária se revelaria injusta e desadequada, nomeadamente quando se trata de utilização de viaturas alugadas pelo sujeito passivo para a sua actividade e afectas à exploração do serviço público de transportes, e, bem assim, aquelas situações em que o uso privado das viaturas já é tributado na esfera do trabalhador, configurando uma remuneração em espécie, como é o caso das viaturas relativamente às quais haja sido celebrado o acordo previsto n° 8) da alínea b) do nº 3 do artigo 2° do Código do IRS.

  10. Esta técnica de quantificação da intensidade de uso privado com base numa percentagem forfetária surge assim como o menor dos males, ainda que constitua sempre uma entorse ao princípio da tributação do rendimento real.

  11. No entanto, esta presunção é evitável e desnecessária no que respeita às despesas com portagens e estacionamento, visto que o controlo da afectação destas despesas, de ocorrência pontual e localizada no tempo e comprovável documentalmente, se afigura muito facilitado e 100% fiável.

  12. Também os juros decorrentes de contratos de ALD das viaturas ligeiras de passageiros detidas pela Impugnante não são passíveis de tributação autónoma.

  13. É que na raiz da opção pelo financiamento da aquisição de quaisquer viaturas por parte das empresas em lugar da sua aquisição com fundos próprios, estão, sobretudo, motivos que são comuns a qualquer outro financiamento. Deste modo, será indiferente, para uma empresa que queira adquirir uma frota de viaturas, contrair um empréstimo de longo prazo sem utilização específica ou celebrar contratos de ALD, se chegar à conclusão que os encargos que lhes estão associados são idênticos. Tal como deverá ser indiferente, para efeitos fiscais, que uma determinada empresa obtenha um empréstimo junto de um banco de um milhão de euros para adquirir uma frota de automóveis a um juro de 5% ao ano ou que celebre contratos de ALD no valor de um milhão de euros relativamente a idêntico número de viaturas, à taxa de 5% ao ano.

  14. A aceitar-se a sujeição dos encargos de ALD à tributação autónoma em questão estar-se-ia a estabelecer, no plano tributário, uma distinção infundada entre os sujeitos passivos de IRC, consoante o seu nível de endividamento, o que atentaria contra os princípios da tributação do rendimento real, da igualdade e da capacidade contributiva.

  15. Do que vem de ser dito é, pois, forçoso concluir que a sentença recorrida fez uma qualificação errónea dos supra referidos encargos para efeitos de IRC, devendo, nesta medida, ser anulada.

    TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, POR PROVADO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE A ANULAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA NA PARTE DE QUE ORA SE RECORRE.”****A Recorrida não contra-alegou.

    ****A Recorrente, Fazenda Pública, terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1º- A douta decisão de que se recorre não traduz uma correcta valoração e interpretação da matéria fáctica dada como provada, nem tão pouco uma correcta interpretação e aplicação da lei e do direito atinentes, em prejuízo da apelante. Na verdade, 2º- Relativamente à primeira questão controvertida, dos encargos com seguros de saúde dos trabalhadores, entendeu o respeitoso tribunal a quo que o critério utilizado pela impugnante na atribuição dos seguros de saúde aos seus trabalhadores, ao incidir exclusivamente sobre a remuneração que pelos mesmos é auferida, cumpre com os requisitos da objectividade e de identidade, previstos na alínea b), do n.º 4, do artigo 40.º do Código do IRC.

    1. - Discordamos frontalmente da asserção retro transcrita e expendida pelo respeitoso tribunal a quo, porquanto, conforme plasmado foi no relatório inspectivo, exigia-se que o benefício de contratos de seguros de doença fossem estabelecidos segundo um critério objectivo e idêntico para todos os trabalhadores, ainda que não pertencentes à mesma classe profissional, ao abrigo das exigências vertidas no art. 40º do CIRC, especificamente da al. b) do seu nº 4.

    2. - Ora, cada contrato de seguro de saúde, dos que foram analisados pelos serviços de inspecção, contém coberturas e abrangências próprias, distintas de todos os outros, sugerindo até, uma graduação na sua atribuição a certos trabalhadores, podendo mesmo falar-se, dado o nível de diferenciação, entre um contrato para trabalhadores acima de certo plano remuneratório e os restantes e, nestes, entre uns que abrangem...

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