Acórdão nº 01879/10.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | Carlos de Castro Fernandes |
Data da Resolução | 03 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – A Representação da Fazenda Pública - RFP (Recorrente), veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, pela qual se julgou procedente a ação administrativa especial intentada por J.
(Recorrido) e que havia sido deduzida contra o despacho proferido pelo Sr. Diretor da Alfândega de Leixões e aqui referido e pelo qual se revogou o despacho de deferimento do pedido de isenção de imposto sobre veículos.
No presente recurso, a Recorrente (RFP) formula as seguintes conclusões: I.
o objeto do presente recurso é a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, de 13.07.2017, proferida nos autos em epígrafe, a qual julga procedente a ação administrativa especial apresentada por J.; II.
A douta sentença recorrida padece de vício de violação da lei ao considerar que não ocorreu violação do ónus de manutenção da residência em território nacional, previsto no nº 2 do art. 47º do CISV; III.
O conceito de "residência permanente" utilizado pela lei não pode, a nosso ver, ser entendido, como na douta sentença recorrida, ou seja, como um conceito desligado da norma fiscal que estabelece determinados condicionalismos, sobretudo quando, como é o caso, está em causa a concessão de um benefício fiscal.
IV.
Acontece que, em sede fiscal, ao nível dos requisitos legais para a concessão da isenção do ISV por ocasião da transferência de residência, o legislador do CISV consagrou determinadas condições, uma dessas condições é a obrigatoriedade do beneficiário manter a sua residência permanente em território nacional por um período mínimo de 12 meses, a contar da data da transferência da residência.
V.
Em matéria de benefícios fiscais vigora o princípio da legalidade (art. 8° da LGT), na dupla vertente de que apenas podem ser concedidos os benefícios fiscais que se encontrem expressamente previstos por lei formal e, nos termos e condições em que se encontram definidos na norma de isenção, como é o caso da obrigatoriedade de manter a residência permanente em território nacional por um período mínimo de 12 meses, previsto no n° 2 do artº 47° do CISV, estabelecendo expressamente este normativo que o referido prazo legal é contado desde a data em que ocorreu a transferência de residência.
VI.
Assim, a douta sentença recorrida, nos seus fundamentos, fez errada interpretação do conceito de residência permanente para efeitos do disposto no n° 2 do art. 47° do CISV, pelo que padece de vício de violação de lei; VII.
Contrariamente à fundamentação da douta sentença recorrida, a Administração Fiscal cumpriu o ónus da prova dos pressupostos do seu direito à revogação do benefício e consequente reposição do sistema de reposição regra; VIII.
E, assim, o ato administrativo de revogação do benefício fiscal não revela qualquer falha que mereça censura; IX.
A douta sentença recorrida, ao ter decidido dar provimento à ação pelas razões apontadas, violou o disposto no art. 47º, n° 2 do CISV e no art. 8° da LGT.
Finaliza a Recorrente pedindo que seja revogada a sentença recorrida.
O Recorrido apresentou contra-alegações, nestas concluindo que: 1.ª – O conceito fiscal de residência habitual constante do art.º 19.º da LGT e aplicável a todos os sujeitos passivos singulares nas suas relações com a Administração Tributária coexiste com a expressão “residência permanente” nas mais diversas situações e para os mais diversos tipos de tributação, sendo portanto de lhes atribuir idêntico significado e alcance.
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- Também no CISV o legislador com a expressão residência permanente usada no art.º 47.º, n.º 2 daquele diploma mais não pretendeu do que exigir ao sujeito passivo que fixasse a sua residência efetiva em Portugal em condições que demonstrem a intenção de a manter e ocupar como residência habitual.
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– Aliás, o conceito de residência permanente tal como vem sendo elaborado pela jurisprudência comporta situações como a que está em causa nos presentes autos e corresponde precisamente ao entendimento expresso pelo douto Juiz a quo na fundamentação da sentença recorrida.
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– Na verdade, numa ausência temporária justificável não existe propósito de desvinculação da residência não sendo afetada, por isso, a realidade traduzida no conceito de residência permanente sendo que a jurisprudência admite até a sua coexistência e adequação a situações de residências alternadas.
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É, pois, esta aceção de residência permanente elaborada pela jurisprudência e que no essencial corresponde à realidade também contemplada no conceito fiscal de “residência habitual” que deve estar presente na justa interpretação e aplicação da lei ao caso dos autos.
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- À luz do conceito de residência permanente assim elaborado as ausências do país do Autor, provocadas por razões prementes de saúde, não põem em causa o seu estatuto de residente permanente em Portugal.
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- As situações de aparente e meramente formal transferência de residência para o país para obtenção indevida do benefício fiscal que o legislador pretendeu combater com a introdução do ónus da “residência permanente” constante do art.º 47.º, n.º 2 do CISV nada têm a ver e não se confundem com a realidade em causa nos presentes autos.
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- Não sofre dúvidas, face a toda a prova produzida, a intenção do Autor de estabelecer a sua residência principal e permanente em Portugal, ou seja, de se fixar com caracter estável no nosso país, aqui estabelecendo o centro dos seus interesses.
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– Sendo que tendo fixado a sua morada real e efetiva em Portugal só por imperiosas razões de saúde e comprovada necessidade de tratamentos e exames médicos o autor se viu obrigado a deslocações e ausências mais ou menos prolongadas nos EUA, onde nesses períodos se instala em casa dos filhos.
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- Não têm assim o mínimo cabimento as suspeições e dúvidas da representante da Fazenda Pública sobre a genuinidade do regresso a Portugal e o propósito do autor manter, como mantém, a sua residência permanente no país.
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- Sendo certo que tais ausências, nas circunstâncias e pelas razões prementes que as ditaram não ferem o escopo da lei nem a realidade que a mesma visa alcançar com a disposição normativa do art.º 47.º, n.º 2 do CISV – uma efectiva e genuína transferência de residência do país terceiro para o território nacional.
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- É justo e correto no plano dos factos e da aplicação do direito o julgamento do meritíssimo Juiz a quo sobre a questão controvertida nos autos, não merecendo a sentença proferida qualquer censura e devendo, por isso, ser confirmada na íntegra com todas as legais consequências.
Termina o Recorrido pedindo que seja negado provimento ao presente recurso, sendo confirmada a sentença recorrida.
*Os autos foram com vista ao distinto magistrado do Ministério Público junto...
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