Acórdão nº 01638/08.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. S.., Lda.

, devidamente identificada nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 22.07.2019, pela qual foi julgada improcedente a impugnação apresentada contra a liquidação de contribuições para a Segurança Social relativas ao ano de 2001, no valor de €714.816,58, referentes a ajudas de custo pagas aos seus trabalhadores.

1.2. A Recorrente S.., Lda.

terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «

  1. Na liquidação impugnada nos autos, não está em causa uma situação de autoliquidação de contribuições feita por parte da empresa Impugnante, ora Recorrente, mas sim uma liquidação oficiosa de contribuições efetuada por iniciativa do Instituto da Segurança Social, I.P. no seguimento de uma ação de inspeção e em suprimento da suposta obrigação do contribuinte, nos termos do artigo 33.º do Decreto-lei nº 8-B/2002, de 15 de janeiro.

  2. Toda a doutrina e a jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo tem defendido que as contribuições para a Segurança Social devem ser consideradas como impostos, ou, pelo menos, como equiparadas a impostos. (cfr., entre outros, os Acórdãos da 2ª Secção do S.T.A. de 26/02/2014, 23/05/2007 e 16/06/1999).

  3. Assim, a liquidação em causa, referente ao período de janeiro a dezembro de 2001, no montante de €714.816,58, é um ato administrativo de liquidação de tributo, sujeito ao regime de notificação dos atos tributários, nos termos dos artigos 36.º, nº 1 do C.P.P.T. e 77.º nº 6 da L.G.T. pelo que, ao direito de liquidar tais contribuições, é aplicável o regime de caducidade do direito à liquidação, previsto no artigo 45º da Lei Geral Tributária, que define o prazo de quatro anos para a notificação ao contribuinte dessa liquidação, pois o regime específico das quotizações e contribuições à Segurança Social não fixa um prazo geral de caducidade desse direito.

  4. Ora, no caso em apreço e dos elementos constantes dos autos, resulta provado que o ato de liquidação que determinou o quantum da obrigação tributária, ou seja, que a Impugnante era devedora à Segurança Social do montante de €714.816,58, foi o Relatório Final de Inspeção elaborado pelo Recorrido em 18/12/2007 – alínea A) dos factos provados – e notificado à Recorrente em 28/12/2007 – alínea C) da matéria de facto provada.

  5. Sendo certo que não foi alegado, provado e nem sequer consta dos autos deste Processo de Impugnação Judicial ou do Processo de Averiguações nº 46/2005, que se encontra apenso ao mesmo, que o Recorrido ISS, I.P. tenha notificado o contribuinte Recorrente da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, ou seja, do início do Processo de Averiguações nº 46/2005.

  6. Tendo a Recorrente recebido a notificação da existência desse PA nº 46/2005, que anexava os mapas de apuramento com as supostas remunerações não declaradas, apenas em 26/11/2007 – fls. 91 do PA apenso – não existindo assim qualquer facto integrante de causa suspensiva do prazo de caducidade, nos termos previstos no artigo 46º, nº 1, da Lei Geral Tributária.

  7. Pelo que se encontra efetivamente caducado o direito de liquidação das contribuições para a Segurança Social referentes aos meses de janeiro a dezembro de 2001, face à notificação da mesma efetuada à Recorrente apenas em dezembro de 2007, ou seja, muito depois do prazo legal de quatro anos previsto para o efeito, pois, sendo este um imposto de obrigação única, o termo inicial de contagem do prazo de caducidade corresponde ao dia 15 do mês seguinte àquele a que as contribuições dizem respeito (cfr. art.º 10, nº 2 do Decreto-lei nº 199/99, de 8 de junho e art.º 6 do Decreto Regulamentar nº 26/99, de 27 de outubro).

  8. E não obsta a esta conclusão o facto de a Recorrente não ter alegado e pedido a caducidade do direito à liquidação em causa na petição inicial deste Processo de Impugnação Judicial, mas só o fazer agora nestas Alegações de Recurso, pois estamos perante matéria de conhecimento oficioso pelo Tribunal, em qualquer altura do processo, em face do disposto no nº 1º do artigo 333.º do Código Civil.

  9. Assim, o preceituado nessa disposição legal, significa que está vedado ao Tribunal conhecer oficiosamente da caducidade convencional, mas já não da caducidade legal e quando a caducidade esteja estabelecida por norma imperativa, é evidente não estar na disponibilidade das partes, como sucede no caso da liquidação de tributos, que está prevista na legislação fiscal, são normas de direito público, sendo certo que, por natureza, as normas de direito público estão excluídas da disponibilidade das partes.

  10. De facto, estamos perante um ato de liquidação de tributos, como atrás foi dito, sendo certo que, em sede de direito tributário, a caducidade do direito à liquidação pode e deve ser conhecida oficiosamente pelo Tribunal, pelo que a Meritíssima Juíza a quo poderia e deveria ter conhecido logo da caducidade do direito à liquidação, mesmo que a Recorrente não tenha invocado ou peticionado a mesma na petição inicial, como foi o caso. (Cfr. entendimento perfilhado pelo Conselheiro Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e Processo Tributário anotado, vol. III, págs. 207 e 485, e seguido no Acórdão da 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo de 24/09/2003, no Processo nº 0564/02, disponível in www.dgsi.pt).

  11. Assim, salvo o devido respeito e melhor opinião, a Mma Juíza a quo errou quando entendeu, na douta Sentença recorrida, não conhecer da questão da caducidade do direito à liquidação das contribuições para a Segurança Social por parte do Recorrido, fazendo uma incorreta interpretação das normas legais atrás referidas, nomeadamente do artigo 333.º nº1 do Código Civil.

  12. Situação que importa agora legalmente corrigir e que se coloca à consideração dos Venerandos Desembargadores, pois nada impede que tal caducidade possa ser decidida em sede de Recurso, pelas razões jurídicas atrás defendidas.

  13. Temos assim que a liquidação em causa nos autos deveria ter sido notificada ao contribuinte Recorrente no prazo de caducidade de quatro anos previsto para o efeito, o que não aconteceu, como já foi provado, pelo que caducou o respetivo direito de liquidação das contribuições para a Segurança Social referentes aos meses de janeiro a dezembro de 2001, caducidade essa que se invoca para todos os efeitos legais, requerendo-se assim aos Venerandos Desembargadores a anulação da liquidação impugnada, por violação do disposto no artigo 45.º, nº 1, da Lei Geral Tributária.

  14. No caso de assim não se entender, o que não se concebe, cumpre referir que, no caso em apreço, e ao contrário do que sustenta a Mma Juíza a quo na douta Sentença recorrida, ocorreu a prescrição das eventuais dívidas à Segurança Social, concretamente a dívida de contribuições e cotizações de janeiro a dezembro de 2001, pelas seguintes razões.

  15. Como é referido na douta Sentença recorrida, o prazo de prescrição das dívidas em causa é de 5 anos, (artigo 60.º nº 3 da Lei nº 4/2007, de 16 de janeiro e artigo 187.º nº 1 da Lei nº 110/2009, de 16 de setembro) a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida, ou seja, a partir do dia 15 do mês seguinte àquele a que as contribuições dizem respeito, nos termos do nº 2 do artigo 10.º do Decreto-lei nº 199/99, de 8 de junho e do artigo 6.º do Decreto Regulamentar nº 26/99, de 27 de outubro, sendo que a prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida, conforme consta da mencionada Lei de Bases do Sistema de Segurança Social e do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

  16. Assim, a questão essencial a decidir no presente Recurso, por força da prescrição alegada pela Impugnante nos autos é saber se o Ofício nº 503856, de 08/09/2005 junto pelo Recorrido na sua contestação como Documento nº 2 – fls. 119 dos autos – é uma diligência que pode ser considerada como facto suscetível de levar à interrupção do prazo de prescrição, nos termos legais, pois temos fundadas dúvidas, apoiadas pela doutrina e jurisprudência aplicáveis à matéria, de que o recebimento de tal ofício por parte da Recorrente tenha interrompido o referido prazo de prescrição de cinco anos.

  17. É que a liquidação de contribuições feita pelo Recorrido ISS.,I.P. teve apenas e tão só em conta na sua elaboração os elementos recolhidos pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção Distrital de Finanças do Porto e constantes do seu Relatório da Inspeção Tributária de 29/11/2004 e posteriormente enviado ao Recorrido, pois nunca nenhum representante ou funcionário do ISS, I.P. se deslocou às instalações da Impugnante S.., Lda. para averiguar ou consultar quaisquer documentos ou outros elementos, fosse o que fosse, referentes à empresa Recorrente, para liquidação do eventual montante em falta.

  18. Assim, está mais do que provado que o Recorrido ISS, I.P. não efetuou qualquer diligência com o objetivo específico de averiguar ou apurar qual o montante final a liquidar na liquidação oficiosa de contribuições em causa, pois o montante de €714.816,58, que consta da mesma, já estava mais do que fixado e determinado desde 29/11/2004, data do Relatório da Inspeção Tributária, o que demonstra que o ISS, I.P. apenas se “aproveitou” do trabalho realizado pela Direção Distrital de Finanças do Porto e nada fez para chegar ao montante final objeto da liquidação oficiosa.

  19. Sendo certo que o tal ofício de 8 de setembro de 2005, que supostamente interrompeu a prescrição neste caso, também não serviu para esse objetivo de conduzir à liquidação da dívida, pois, no mesmo, pede-se à Recorrente para comparecer e para apresentar vários documentos jurídicos relacionados com a empresa, mas que nada tinham a ver com a suposta irregularidade...

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