Acórdão nº 00419/12.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelPaulo Moura
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: A FAZENDA PÚBLICA interpõe recurso da sentença que julgou procedente a Impugnação deduzida pela «X..» contra a liquidação de IRC do ano de 2010, no valor de € 57.231,89, por entender que o Tribunal a quo faz uma errada interpretação e subsunção da lei ao caso em apreço.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: A. Assim, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de ERRO DE JULGAMENTO EM MATÉRIA DE DIREITO quanto à interpretação e aplicação do artigo 9º, n.º 1, alínea b) do Código do IRC.

B. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra a autoliquidação de IRC relativa ao exercício de 2010 no valor de € 57 231,89.

C. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento em matéria de direito, considerando que o Tribunal a quo faz uma errada interpretação e subsunção da lei ao caso em apreço, pois contrariamente ao julgado procedente, entende a Fazenda Pública, que não goza a recorrida, da isenção prevista no artigo 9º alínea b) do Código do IRC.

D. A L.., ora impugnante, é uma pessoa colectiva de direito público , constituída como Associação de Municípios deI, II, III, IV, V, VI, VIIeVIII, através de escritura pública outorgada em.11.19, cfr. estatutos da X.. publicados no D.R. n.º de..19, III Série, fls. 17216 a 17221 e republicados no D.R. n.º de..20, III Série, fls. 12158 – (24) a 12158-(29).

E. De acordo com o artigo 2º dos Estatutos da Impugnante republicados no D.R. n.º de..20, III Série “1. A associação tem por objecto imediato a reciclagem, valorização, tratamento e aproveitamento final dos resíduos sólidos entregues pelos municípios associados, e por outras entidades que a associação venha a admitir, bem como a gestão, manutenção e desenvolvimento das infra-estruturas necessárias para o efeito.

  1. A associação pode ver ampliado aquele seu objecto imediato e vir a prosseguir quaisquer fins compreendidos nas atribuições dos municípios associados, com excepção daqueles que, pela sua natureza ou por disposição legal, devam ser exercidos directamente por eles.

  2. Pode ainda, a associação, por si ou associada a terceiros, dedicar-se: a) Ao tratamento de resíduos sólidos; b) Ao tratamento de resíduos industriais ou hospitalares; c) À exploração de actividades de natureza energética conexas com o seu objecto.(…) F. O thema decidendum, radica em saber se a ora recorrida se encontrava abrangida pelas isenções vertidas nas alínea b), do n.º1, do artigo 9º, à data da liquidação de IRC ora controvertida.

    G. A ora recorrida, sustenta, beneficiar da isenção prevista no artigo 9º, alínea b) do Código do IRC.

    H. A actividade de gestão de resíduos hospitalares é uma actividade comercial.

    I. É própria impugnante/recorrida, que admite na douta petição inicial, o exercício de actividade empresarial ““(…) Tendo em conta que a actividade empresarial da X.. se resume à recolha e tratamento de resíduos hospitalares, bem se percebe também, como já dissemos, que os respectivos (e eventuais lucros só sejam possíveis porque a X.. aproveita todo Know How e uma estrutura montada para a sua actividade principal de serviço público,(..) (…) Ademais, os proveitos resultantes desta actividade empresarial acessória são sempre aplicados no desenvolvimento das condições em que é levada a cabo a actividade principal.(…)” J. A isenção de IRC das associações de municípios está condicionada ao carácter não comercial, industrial ou agrícola de quaisquer actividades por elas desenvolvidas, independentemente de serem desenvolvidas a título principal ou acessório.

    K. O artigo 9º alínea b) do Código do IRC, refere o exercício de actividades comerciais, industriais ou agrícolas, sem distinguir se se trata de uma actividade exercida a título principal ou a título acessório.

    L. Para efeitos de enquadramento na isenção de IRC prevista no artigo 9º, do Código de IRC, releva o não exercício das actividades ali discriminadas e não o destino (distribuição de lucros /investimento na actividade principal) ao resultado obtido pelo exercício dessas actividades.

    M. Mais, se o legislador tivesse pretendido distinguir o exercício a título principal do exercício a título acessório, das actividades previstas no artigo 9º n.º 1 alínea b), para efeitos de aplicação da isenção aqui prevista, certamente o teria dito tal como o fez para as pessoas colectivas de mera utilidade pública, cfr. artigo 10º n.º 1 alínea c) , que passamos a citar:“ 1.Estão isentas de IRC: (…) c) As pessoas coletivas de mera utilidade pública que prossigam, exclusiva ou predominantemente, fins científicos ou culturais, ou de caridade, assistência ou beneficência , solidariedade social ou defesa do meio ambiente.(…)” N. Decorre, implicitamente, da alínea b) do n.º 1 do artigo 9.ºdo CIRC, que basta o exercício de uma das actividades ali elencadas, seja a título principal, seja a título acessório para que a associação de municípios não se mantenha abrangida pela isenção aqui prevista.

    O. Atento o exposto entende a Fazenda Pública, que a recorrida não preenche os requisitos de incidência subjectiva para beneficiar da isenção automática prevista na alínea b) do artigo 9º do Código do IRC.

    P. Deste modo, é entendimento da Fazenda Pública que a douta sentença não poderá manter-se, sendo imperioso que se conclua pela improcedência da impugnação judicial, por não estar a liquidação ora em apreço ferida de qualquer ilegalidade, sendo que esta por ser legal, deverá manter-se na ordem jurídica.

    Assim, decidindo como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de ERRO DE JULGAMENTO EM MATERIA DE DIREITO quanto à interpretação e aplicação da lei ao caso em apreço, designadamente, enquadrando a recorrida na isenção prevista na alíneas b), do n.º 1 , do artigo 9º do Código do IRC Termos em que, Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

    A Recorrida apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma: A. Inconformada com a decisão a Fazenda Pública interpôs o presente recurso, a cujas alegações se apresenta agora resposta.

    B. Entende a recorrida que a decisão de que vem interposto o presente recurso não merece censura, não lhe sendo imputável qualquer erro de julgamento de direito, por a mesma se encontrar em conformidade com as exigências de fundamentação impostas pelo artigo 123º do CPPT e pelos nºs 2 e 3 do artigo 659º do CPC, ou, bem assim, qualquer nulidade das previstas no artigo 125º do CPPT e no artigo 668º do CPC..

    C. Pelo contrário, a recorrente limitou-se a uma vez mais reiterar aquele que é o seu posicionamento originário - impugnado - face às questões jurídicas suscitadas.

    D. A Fazenda Pública limitou-se, enfim, a repetir nesta sede, os mesmos dogmas ou preconceitos que já tinha tomado públicos no relatório que fundamenta o acto tributário impugnado, basicamente assentes em falsos pressupostos, num incompreensível desconhecimento da matéria de facto e numa profunda ignorância do alcance das funções e do serviço públicos.

    E. A respeito da questão central dos presentes autos, a de saber se a X.. exerce ou não, a título principal, uma actividade comercial e industrial, o Tribunal a quo não hesita em responder negativamente. E fá-lo com a consciência de que, como consta dos estatutos da Impugnante publicados em Diário da República e não colocado em causa pela AT, o objecto imediato da X.. é a reciclagem, valorização, tratamento e aproveitamento final dos resíduos sólidos entregues pelos municípios associados e por outras entidades que a associação venha admitir, bem como a gestão, manutenção e 5 desenvolvimento das infra-estruturas necessárias pata o efeito; assim sendo, a actividade exercida pela X.. tratamento e eliminação de outros resíduos não perigosos reveste natureza eminentemente dum serviço público - vulgarmente designado de recolha e tratamento de lixo urbano - pois, a circunstância de tal actividade poder ser exercida por privados (o que não é o caso), não retira esse carácter de serviço público (pelo menos, no sentido de utilidade pública).

    F. Ora, assim não pensa a recorrente, que coloca a noção de "actividade exercida a título principal' no centro das soluções que propõe: todo o Direito a que a recorrente recorre - uma vez estabelecida a sua posição de não aplicação à X.. da isenção de IRC - para apurar o lucro tributável e as tributações autónomas da empresa tem esse conceito como pressuposto.

    G. A tese prosseguida pela recorrente merece, no entanto, alguns esclarecimentos: pela actividade comercial ou industrial (ou, ainda, agrícola) que consubstancia o objecto de uma sociedade comercial entende-se, nos termos do n.º 4 do artigo 3º do Código do IRC, uma actividade que consista na realização de operações económicas. Depois, de acordo com a Doutrina unânime, por actividade económica entende-se uma actividade que em regra gera lucros distribuíveis pelos sócios (cfr., por todos, JORGE MANUEL COUTINHO DE ABREU, Curso de Direito Comercial, VoI. II – Das Sociedades -, págs. 8 e seguintes). De resto, é o que se recolhe da lei: segundo o artigo 980º do Código Civil, o "contrato de sociedade é aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade”.

    H. Sublinhe-se, neste momento, que, nem nas associações do regime geral (cfr. o artigo 157º do Código Civil), nem nas associações municipais, o lucro pode ser repartido pelos associados.

    I. Ora, a noção de "actividade exercida a título principal” tem de ser interpretada por remissão para os conceitos...

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