Acórdão nº 01558/07.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução19 de Maio de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Recorrente (A..., S.A.), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, pela qual foi julgada totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de indeferimento da reclamação graciosa da autoliquidação de IRC do exercício de 2003, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: «Quanto às conversões de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo e às cessões (aquisições) de posições contratuais em contratos de trabalho sem termo 1. A douta Sentença recorrida desconsidera indevidamente que o entendimento unânime da própria AT vai no sentido de que a (i) conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo e que (ii) as aquisições de posição contratual (de empregador) em contratos sem termo, devem ambas contar positivamente para o benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens.

  1. Assim o afirma a AT na Informação Vinculativa proferida no Processo nº 2691/..., averbada de Despacho concordante do Exmo. Subdirector-Geral, de 26.11.2007; na Informação nº ...02, da DSIRC, Proc. nº ...02; no Despacho da Exma. Directora do Serviços de IRC, exarado na Informação nº ...07, da mesma DSIRC; na Informação nº ...07 da DSIRC, sancionada por Despacho concordante de 26.11.2007, da DSIRC; despachos administrativos proferidos nos recursos hierárquicos mencionados nos docs. 4, 5 e 6 aqui juntos.

  2. Estas Informações/Pareceres administrativos são supervenientes em relação à apresentação da PI e nos presentes autos o Tribunal a quo denegou a produção de prova testemunhal e a apresentação de alegações escritas.

  3. Ainda no mesmo sentido, pode ver-se o Parecer da DSBF (Direcção de Serviços de Benefícios Fiscais) exarado na Informação nº ...5, de 24.01.2005.

  4. Bem como os despachos administrativos proferidos nos recursos hierárquicos mencionados nos docs. 6, 7 e 8 juntos à Pl.

  5. Por se tratar de matéria relevante para a decisão de mérito, e estar provada documentalmente, deve ser aditado aos “factos provados” que a própria AT considera que (i) as conversões de contratos de trabalho a termo em contratos sem termo e que (ii) as cessões de posição contratual em contratos de trabalho sem termo, devem ambas contribuir positivamente para o benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens (CLEJ).

  6. Ainda no mesmo sentido, veja-se a douta Sentença do TAF do Porto, Juízo Liquidatário, de 29.06.2011, transitada em julgado, Proc. 942/05, e a doutrina fiscal acima citada.

  7. A lei (artigo 17º do EBF) não distingue a forma de contratação, pelo que esta pode ocorrer por meio de aquisição de posição contratual (de empregador) em contrato de trabalho sem termo.

  8. Atentos os sobreditos entendimentos administrativos inequívocos da AT, por imposição do disposto no nº 3 do artigo 68º-A da LGT os mesmos deveriam ter sido vertidos em circular administrativa, não podendo o contribuinte ser prejudicado pela inércia da AT.

  9. A douta Sentença omitiu e, consequentemente, violou aquele artigo 68º-A nº 3 da LGT.

  10. Foi legitimamente confiado naquele entendimento da própria AT que o contribuinte reclamou o aproveitamento do benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens tendo em conta também os casos de transformação dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo, e de aquisição de posição contratual em contratos de trabalho sem termo.

  11. Não se vislumbrando qualquer razão de fundo para que a AT tivesse conferido tratamento diferenciado ao caso dos presentes autos, em prejuízo e discriminando negativamente o contribuinte no caso concreto – ao contrário do tratamento que conferiu a outros contribuintes em casos, iguais, de transformação de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo, e de aquisição da posição contratual de empregador em contratos sem termo.

  12. A douta Sentença violou os princípios da igualdade entre os contribuintes, da justiça e do dever de imparcialidade no tratamento conferido a todos os contribuintes, consagrados nos artigos 266º nº 2 da CRP, 5º e 6º do CPA e 55º da LGT.

  13. A douta Sentença violou os artigos 55º do CPPT e 68º-A nº 1 da LGT, segundo os quais a AT está juridicamente vinculada às orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza emitidos pela própria AT, sobre a interpretação das normas tributárias que estiverem em vigor.

  14. A douta Sentença violou o dever da administração pública actuar segundo o princípio geral da boa-fé, previsto nos artigos 6º-A do CPA e 266º nº 2 da CRP – do qual decorre que a AT tem um especial dever de colaboração com o contribuinte, não podendo adoptar posturas contraditórias com orientações anteriormente preconizadas, em desrespeito da segurança jurídica e da protecção da confiança e legítimas expectativas dos contribuintes (cfr. artigos e 2º, 9º b) e 266º nº 2 da CRP).

    Sem prescindir, 16. A douta Sentença padece de errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 17º nº 1 do EBF.

  15. Com efeito, as conversões dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo, bem como as aquisições de posição contratual de empregador em contratos de trabalho sem termo, estão abrangidas pelo benefício fiscal previsto naquele preceito legal.

  16. É ilegal o apelo feito, na interpretação do artigo 17º nº 1 do EBF, ao disposto no artigo 7º nº 2 do DL 34/96, de 18/4, o qual é relativo outrossim a incentivos financeiros para a criação de postos de trabalho para jovens desempregados, à procura do 1º emprego, ou para desempregados de longa duração – nada tendo pois que ver com o benefício fiscal do artigo 17º nº 1 do EBF. 19. Os regimes do artigo 17º nº 1 do EBF (benefício fiscal) e do artigo 7º nº 2 do DL 34/96, de 18/4 (incentivos financeiros), são totalmente distintos e autónomos.

  17. Ao contrário da douta Sentença recorrida, o que importa verificar é se houve “efectiva criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo, com idade não superior a 30 anos”, 21. e não se houve “criação líquida global de postos de trabalho” ou se houve “um aumento do número global de trabalhadores da empresa”. 22. A contratação de trabalhadores por tempo indeterminado, quer ela ocorra “ex novo”, quer surja por vontade das partes no decurso de relação de trabalho preexistente, respeita o interesse público extrafiscal do legislador na criação do benefício fiscal do artigo 17º do EBF: a criação de emprego estável para jovens (cfr. artigo 2º nº 1 do EBF).

  18. Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, o artigo 17º nº 1 do EBF não encerra qualquer lacuna jurídica, já que estabelece ele próprio os critérios a que deve obedecer a aferição da “criação líquida de postos de trabalho”. 24. A douta Sentença viola o artigo 11º nº 4 da LGT, segundo o qual está vedada a integração de quaisquer lacunas em matéria de benefícios fiscais por via da aplicação analógica do preceituados noutros diplomas legais.

  19. Já que os benefícios fiscais integram os “elementos essenciais” dos impostos, abrangidos pelo princípio fundamental da legalidade e tipicidade (cfr. artigos 8º da LGT e 103º nº 2 e 3 da CRP) e, por via disso, pela reserva de lei (cfr. artigo 165º nº 1 i) da CRP) – princípios, estes, violados pela douta Sentença.

  20. A douta Sentença, por isso, padece de erro de julgamento quando, na interpretação de normas sobre benefícios fiscais (como é o caso do artigo 17º do EBF), apela a conceitos oriundos de diplomas legais não fiscais e que nada têm que ver com benefícios fiscais – como é o caso do referido DL 34/96, de 18/4.

  21. O artigo 17º nº 1 do EBF, com efeito, deve ser interpretado segundo as regras gerais e especiais de interpretação e aplicação das leis sobre benefícios fiscais,.

  22. A douta Sentença viola o artigo 9º do EBF, segundo o qual as normas que estabelecem benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica.

  23. E a “interpretação extensiva” admitida naquele artigo 9º do EBF vai no sentido de “estender” os benefícios fiscais, e não de os restringir (no mesmo sentido, o artigo 10º do EBF) – atenta a “unidade do sistema jurídico” (artigo 9º nº 1 do CC, ex vi do artigo 11º nº 1 da LGT).

  24. A douta Sentença viola o artigo 9º nº 2 do CC (ex vi do artigo 11º da LGT), segundo o qual não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

  25. Por isso, não se pode acrescentar o requisito da prévia condição de desempregado do trabalhador, para que o mesmo conte para a criação líquida de postos de trabalho a que se reporta o artigo 17º nº 1 do EBF.

  26. O artigo 17º do EBF, interpretado no sentido de que nele não cabem as transformações de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalhos em termo, tão pouco os casos de aquisição de posição contratual de empregador em contratos de trabalho sem termo, padece de inconstitucionalidade formal e material, por violação dos princípios da legalidade e tipicidade das normas sobre benefícios fiscais, consagrados nos artigos 103º nº 2 e 3 e 165º nº 1 i) da CRP.

  27. O artigo 17º nº 1 do EBF, interpretado no sentido de que nele não cabem os casos de conversões, nem as cessões de posição contratual em contratos sem termo, padece igualmente de inconstitucionalidade material por violação dos princípios da liberdade de iniciativa económica privada, da liberdade de organização empresarial e de funcionamento eficiente dos mercados, no quadro de uma equilibrada concorrência empresarial, consagrados nos artigos 61º nº 1, 80º, alínea c), e 81º, alínea e), da CRP.

  28. Em matéria de interpretação de normas sobre benefícios fiscais, um dos “elementos essenciais dos impostos”, é ilegítimo apelar, em nome da “unidade ou coerência valorativa do sistema...

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