Acórdão nº 02847/07.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução19 de Maio de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Recorrente (Fazenda Pública), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em que foi julgada totalmente procedente a impugnação judicial deduzida pela Recorrida (Câmara Municipal (...)) contra a liquidação adicional de IVA do período de 0412 no montante de €3.800.000,00 e liquidação de juros compensatórios no valor total de €259.441,10, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: «A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IVA, n.º ...49, referente ao período de 0412, no montante de € 3.800.000,00, acrescido dos respetivos juros compensatórios.

B. Alegava a Impugnante, em suma, ter havido erro nos pressupostos de facto, bem como violação do princípio da verdade material.

C. A sentença do Tribunal a quo julgou a impugnação apresentada procedente, por erro nos pressupostos de facto da operação tributária, anulando, em consequência, as liquidações impugnadas.

D. Com tal decisão, e com todo o respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se.

Senão vejamos E. A questão principal a resolver nos presentes autos prende-se como o enquadramento fiscal a dar à operação que deu origem à emissão de fatura, por parte da Impugnante, consubstanciada no aditamento ao contrato-programa, enquanto cedência dos direitos de gestão do parque habitacional, à AA--- (EM), em contrapartida de uma compensação de €20.000.000,00.

F. Defende a AT que a operação é sujeita a IVA, e dele não isenta (nos termos dos art.s 1º, 2º e 4º do CIVA).

G. Contrapõe a Impugnante, que a referida operação configura uma operação de financiamento do Município, via EM, sendo a transferência dos direitos aqui em causa, meramente instrumental da operação de obtenção de financiamento, por parte da CM_. H. Enquadrando como tal a operação como sujeita a IVA, embora dele isenta, nos termos do n.º 28 do art. 9º do CIVA (na redação então em vigor).

DITO ISTO, I. Considerou o Tribunal a quo que resultou provado que o aditamento ao contrato-programa, foi o resultado de uma operação de financiamento da impugnante (via empresa municipal), face às limitações ao endividamento impostas pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento.

J. Concluindo assim que o aditamento ao contrato-programa não serviu para a mera cedência de um direito que a impugnante detinha, mas sim e apenas para o financiamento da CM_ junto de entidades bancárias.

K. Estando dessa forma a operação aqui em causa isenta de IVA, à luz do que estatuía, à data, o n.º 28 do art. 9º do CIVA.

L. Alicerça, ainda, a sentença, a sua decisão na jurisprudência emanada do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), remetendo para a decisão proferida no caso Sparekassernes Datacenter, no Proc. c-2/95.

CONTUDO, com o assim doutamente decidido, não pode a Fazenda Pública conformar-se, com a seguir passaremos a expor.

M. Desde logo porque, afinal de contas, continua-se sem perceber, a acolher o entendimento vertido na douta decisão, qual o serviço que foi prestado, e que terá levado à obrigação de emitir fatura. Quem prestou esse serviço? E quem terá beneficiado desse serviço? N. Tendo em conta a posição assumida pelo Tribunal a quo, de duas umas: ou este concluía que, afinal não foi prestado qualquer serviço pela Impugnante (embora tenha emitido fatura), e não haveria lugar a isenção; ou se concluía que tinha sido prestado um serviço de natureza financeira (pelo sindicato bancário, e não pela Impugnante), e também não haveria lugar a isenção de IVA na fatura emitida.

O. Pelo que erra a sentença proferida ao fundamentar a anulação das liquidações no facto da Impugnante ter prestado um serviço, sujeito a IVA mas dele isento, por força do n.º 28 do art. 9º do CIVA.

Senão vejamos P. No caso dos autos, foi a própria Impugnante que enquadrou a operação, materializada no aditamento ao contrato-programa celebrado entre a CM_ e a EM, através da qual, foi transferida a gestão do parque habitacional daquela para esta, como uma prestação de serviços sujeita a IVA (ainda que isenta). Q. É a própria Impugnante que declara, ao emitir a referida fatura, que prestou um serviço à EM.

R. Ora, que serviço será esse? Certamente não terá sido uma operação de financiamento, porque a CM_ não prestou qualquer serviço de natureza financeira, como resulta cristalino dos autos, nem à EM, nem a qualquer outra entidade, com o referido aditamento.

S. Pelo que, sempre estaria viciada de erro o enquadramento no plano do direito, dos factos apurados na douta sentença proferida, quando considerou que a operação estava sujeita a imposto, mas dele isenta.

ASSIM, T. Entende a Fazenda Pública que, o enquadramento correto a dar à operação é a prestação de um serviço de cedência de direitos (por meio da qual se operou a transferência da gestão do parque habitacional à EM), por contrapartida da antecipação das rendas futuras que caberia à EM gerir, no âmbito do contrato-programa.

U. Assim, a razão da celebração do aditamento ao contrato-programa não poderia ser a obtenção de crédito pela Impugnante, como concluiu erradamente a sentença proferida, mas sim a cedência dos direitos de gestão do património habitacional daquele município.

V. Porque está em causa o facto tributário que deu origem à obrigação de emissão de fatura (fatura essa emitida pela própria Impugnante, não às instituições financeiras, representadas pelo sindicato bancário, mas sim à EM).

W. Assim, caso aderíssemos à tese subscrita na douta decisão sob recurso – que concluiu que a operação que esteve em causa, foi uma operação (de financiamento) entre a CM_ e as entidades bancárias (por intermédio da EM), não se percebe a que título teria sido emitida a referida fatura.

X. Sendo que o cerne da questão sub judice, estaria no enquadramento fiscal a dar à operação constante da fatura (sujeita a IVA, como pretende a AT, ou isenta de IVA, como pretende a Impugnante).

Y. Por todo o exposto, consideramos que a sentença proferida errou, ao considerar a operação como tendo sido uma prestação de serviços de financiamento (enquadrada no n.º 28 do art. 9º do CIVA), e como tal, isenta de IVA.

Ainda que assim não se entenda, mas SEM PRESCINDIR, Z. Com todo o respeito que a decisão proferida nos merece, entendemos que a mesma incorre em manifesto erro de enquadramento jurídico da factualidade em causa nos presentes autos.

AA. Conclui a sentença, a final, que a operação aqui em causa “se encontra isenta à luz do que estatuía à data o n.º 28.º do artigo 9.º do CIVA”.

BB. Contudo, a sentença não identifica, no âmbito de que alínea – sendo aquela norma constituída pelas alíneas a) a h) – da referida disposição legal, se enquadra o direito à isenção.

CC. Errando assim a decisão sob recurso, com todo o devido respeito, por falta de conveniente enquadramento normativo.

DD. Ainda que se possa admitir, embora sem conceder, que a decisão remeta para a aplicação da al. a) da referida disposição legal, que aquela cita e reproduz (a fls. 17 da sentença), a mesma nunca poderia ser aplicável ao caso sub judice.

EE. Desde logo porque esta isenção apenas pode ser considerada nas operações de financiamento, em que o sujeito passivo é a própria entidade que concedeu o crédito (veja-se a letra da lei “por quem os concedeu”).

FF. Operação de financiamento, no âmbito da qual, a instituição financeira está sujeita a imposto, emitindo a respetiva fatura, a qual está isenta de IVA por força da al. a) do n.º 28 da citada disposição legal.

GG. Pelo que, nunca poderia ser isenta de IVA, à luz do disposto na al. a) do n.º 28 da referida norma, a operação que deu origem à emissão de fatura, como julgou erradamente a sentença do Tribunal a quo.

Ainda que assim não se entenda, e sem prescindir, Quanto ao apelo à aplicação da JURISPRUDÊNCIA emanada pelo TJUE – no Proc. C-2/95 HH. O Tribunal a quo fundamenta a sua decisão na jurisprudência emanada do TJUE, no processo C-2/95 (caso Sparekassernes Datacenter), II. Segundo a qual “(...) a isenção prevista pelo artigo 13º, letra B, alínea d), n.os 3 e 5, não está subordinada à condição de a prestação ser efetuada por um estabelecimento que se encontre em relação jurídica com o cliente final do banco. O facto de uma operação, visada pelas referidas disposições, ser efetuada por um terceiro, mas se apresentar para o cliente final do banco como uma prestação deste último, não impede a isenção dessa operação”.

JJ. Ora, este acórdão visava interpretar a norma do direito comunitário, emanada da redação do art. 13º B) al. d) n.º 3 da 6ª Diretiva n.º 77/388/CEE, de 17/05/77 (redação mantida no atual artigo 135º n.º 1 al. d) da Diretiva IVA).

KK. A referida norma foi transposta para o direito nacional, nomeadamente na redação do art. 9º n.º 28 (atual n.º 27) al. c) do CIVA.

LL. Ora, entende a Fazenda Pública que a jurisprudência emanada do referido Acórdão do TJUE, não tem aplicação ao caso dos autos, incorrendo assim a sentença em erro na fundamentação da decisão.

MM. Desde logo, porque, no caso dos presentes autos, em nenhum momento esteve em causa a aplicação do referido dispositivo legal.

NN. Pelo que, com todo o respeito, não nos parece correto apelar à jurisprudência emanada do referido acórdão.

OO. Mas ainda que assim não fosse, o referido acórdão do TJUE foi proferido a propósito das isenções concedidas nas operações bancárias, e da questão de se saber se elas respeitam apenas às operações realizadas pelas próprias instituições financeiras, ou as mesmas podem abranger as entidades que não se encontram em relação direta com o cliente final.

PP. Concluindo o TJUE que a isenção de IVA, abrange operações financeiras efetuadas por terceiros (que tenham emitido fatura em nome e por conta da entidade bancária), não relevando assim a qualidade do sujeito passivo, mas apenas a natureza da...

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