Acórdão nº 00670/21.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução13 de Maio de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: I.RELATÓRIO 1.1.

PRÓTOIRO – FEDERAÇÃO PORTUGUESA DAS ASSOCIAÇÕES TAURINAS, com o NIPC (…), e sede na Rua (…), vem, nos termos do disposto nos artigos 112.º, n.º 2, alíneas a) e g), e 114.º, n.º 1, alínea c) do CPTA, requerer, contra o MUNICÍPIO (...), indicando como Contrainteressada a Sociedade «BA---, LDA.», NIPC (…), com sede no (…), o decretamento de providência cautelar, tendo em vista, por um lado, a suspensão da eficácia dos atos (deliberações) praticados pela Câmara Municipal (...), por via dos quais foi determinada a demolição do edifício «Praça de Touros (...)», e aprovada a edificação, nesse local, de um novo edifício, denominado «Praça Viana», e, por outro, o embargo da obra de demolição da «Praça de Touros (...)», que se encontra a ser executada pela Contrainteressada.

Pede, para o efeito, que a presente ação cautelar seja julgada procedente, por provada, e que, em consequência, seja “decretada a suspensão de eficácia dos atos acima identificados de demolição do edifício da Praça de Touros (...) e de edificação da Praça de (…), com as legais consequências; [...1 decretado o embargo total da obra de demolição e de construção, sita no imóvel identificado como Praça de Touros – Lote “J” do Plano de Pormenor do Parque da Cidade de (...), com as legais consequências; [...1 ordenado ao Requerido Município para assegurar que a referida obra fica, imediata e efetivamente, suspensa e que, por conseguinte, não sofre qualquer alteração até ser proferida a decisão definitiva no processo principal”.

Para tanto, alega, em síntese, que se encontram verificados os pressupostos positivos de atribuição das providências cautelares requeridas.

Aduz que atua investida da legitimidade ativa que lhe é conferida ao abrigo da Lei da ação popular, na medida em que tem como fins, entre outros, a defesa e promoção do mundo rural, da tauromaquia, do património edificado relacionado com a cultura tauromáquica e do ordenamento do território.

No que se refere ao fumus boni iuris, sustenta que os atos suspendendos são nulos, ou quando muito anuláveis, pois violam diversas disposições regulamentares, designadamente decorrentes do Plano de Urbanização da Cidade de (...) e do Plano de Pormenor do Parque da Cidade de (...), posto que determinam uma alteração na volumetria, área de implantação, da cércea e dos materiais do edifício originário.

Ademais tais atos não foram precedidos dos pareceres obrigatórios da CCDR-Norte, da Direção Regional da Cultura do Norte, da DGPC do Ministério da Cultura, nem da Divisão de Património, como se impunha.

Aduz, ainda, que não houve lugar a discussão pública do projeto antes de ter sido determinada a demolição do edifício, e a consequente construção do novo imóvel.

Prossegue, referindo que a preservação e salvaguarda do edifício, na sua configuração originária, exsurge como um dever constitucional, por se tratar de património de importância cultural.

Sustenta que a demolição do edifício foi aprovada pela Entidade Requerida sem que, para tal, esta detivesse a competência legal necessária, nem licenças administrativas, e tudo em preterição do procedimento que legalmente se impunha seguir, mais pugnando pela falta de fundamentação dos atos suspendendos que, segundo aduz, apenas referem de forma genérica e conclusiva as razões que determinaram a aprovação do projeto.

Adicionalmente, afronta a alteração introduzida ao Plano de Pormenor do Parque da Cidade, datada de setembro de 2019, invocando a ilegalidade das disposições regulamentares (designadamente por falta de consulta prévia à CCDR-Norte e à APA) que, a essa altura, foram alteradas, razão por que entende deverem as mesmas ser desaplicadas, no caso concreto. Aduz, ainda, que as alterações patenteadas no Plano não foram precedidas de consulta pública, e que deveria, em todo o caso, ter havido lugar a uma avaliação de impacto ambiental e a um estudo de impacto ambiental.

Vem, ainda, sustentar que o lote de terreno “J”, onde se situa o edifício, se encontra localizado numa zona ameaçada pelas cheias, com envolvente de estrutura verde urbana (recreio e lazer), e que, como o projeto do novo edifício aumenta a implementação, tipologia e função originárias do edifício, também por essa razão tem de se ter por inválido o Plano de Pormenor do Parque da Cidade e as normas de alteração desse regulamento.

Refere, também, que o edifício em causa é património edificado com qualidade arquitetónica, urbanística ou paisagística, representativo da cultura de tauromaquia, razão por que se trata de um bem de interesse para toda a comunidade, que, por isso, tem de ser preservado.

No que concerne ao periculum in mora, vem a Requerente invocar que o não decretamento das providências requeridas gerará, até à decisão a proferir no processo principal, uma situação de facto consumado, com a demolição do edifício original e a consequente edificação do imóvel com as novas configurações, tornando, pois, inútil a sentença a prolatar naquele processo.

Mais refere que o decretamento das aventadas providências não causará qualquer prejuízo ao interesse público, antes o acautelando.

1.2. Citada, a Entidade Requerida apresentou oposição, na qual se defendeu por exceção e por impugnação.

No que tange à sua defesa por exceção, invoca a ilegitimidade da Requerente para figurar, na presente ação cautelar, como parte ativa, mais aduzindo que, por referência ao processo principal, se constatará a inimpugnabilidade dos atos suspendendos identificados nas alíneas a), b), c) e d) do petitório do requerimento cautelar, a nulidade parcial do processo, decorrente do erro na forma de processo relativamente ao pedido formulado na alínea e) e, ainda, a caducidade do direito de ação.

No que concerne à sua defesa por impugnação, pugna pela não verificação do critério de decisão cautelar patenteado no fumus boni iuris, refutando todas as causas de invalidade que a Requerente imputa aos atos suspendendos.

Sustenta, ainda, que a Requerente não logrou demonstrar, por intermédio de uma alegação cabal e concretizada, os prejuízos de difícil ou impossível reparação, específicos, reais e atuais, decorrentes do não decretamento das providências requeridas.

Prossegue, asseverando que, em todo o caso, é manifesta a prevalência do interesse público, traduzido na dotação de um espaço desportivo para a população vianense, mais invocando que a refuncionalização do edifício em apreço está integrada na estratégia municipal de elevação do MUNICÍPIO (...) a Cidade Europeia do Desporto em 2023, que poderá gorar-se com a paralisação da empreitada.

Refere, ainda, que o decretamento das providências requeridas impediria o Município de dar cumprimento ao contrato de colaboração desportiva celebrado com a Escola Desportiva de (…), afetando centenas de alunos e atletas de diversas modalidades, que contavam com o referido equipamento para levar a efeito as suas atividades desportivas.

Mais aduz que a concessão das aventadas providências implicaria a paralisação da empreitada por tempo indeterminado e indefinido, agravando, naturalmente, os custos com a realização da obra, o que também feriria, do ponto de vista económico-financeiro, o interesse público, causando, assim, danos superiores aos que a Requerente invoca que podem vir a ser sofridos no caso de não serem decretadas as providências.

A final, pede que as exceções dilatórias invocadas sejam julgadas procedentes, com consequente absolvição da instância cautelar.

Na eventualidade de assim não ser entendido e determinado, pede que a presente ação cautelar seja julgada improcedente, por não provada, com a absolvição dos pedidos, e demais consequências legais.

Juntou o procedimento administrativo (“P.A.”).

1.3. Citada, a Contrainteressada não apresentou oposição.

1.4. A Requerente foi notificada da oposição e da junção do P.A.

1.5. Através do despacho de fls. 662 e 663 do SITAF, foi liminarmente admitido o requerimento cautelar.

1.6. A Entidade Requerida veio aos autos juntar resolução fundamentada (fls. 2186 a 2208 e 2214 a 2223 da paginação eletrónica).

1.7. Proferiu-se despacho a dispensar a produção de prova, por se considerar que os autos contêm elementos de prova bastantes para o apuramento, a título indiciário, dos factos com relevância para a decisão a tomar na ação cautelar, indeferindo-se os requerimentos probatórios apresentados pelas partes, sendo esse despacho do seguinte teor: « Requerimentos probatórios das partes Nos seus articulados, e para prova do alegado, a Requerente e a Entidade Requerida arrolaram, respetivamente, 5 e 7 testemunhas.

Vejamos.

Nos termos do disposto no artigo 118.º, n.º 4 do CPTA, não podem as partes, no âmbito dos processos cautelares, arrolar um número de testemunhas superior a cinco, razão por que, desde logo, se constata que a Requerida não se conteve nos limites plasmados em lei.

Em todo o caso, dimana do n.º 3 do artigo 118.º do CPTA que “[o] juiz pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias, não sendo admissível a prova pericial”.

Do normativo transato, extrai-se que o juiz tem o poder de ordenar a realização de diligências de prova apenas quando estas se revelem necessárias para o esclarecimento das questões a decidir, sempre atendendo ao caráter iminentemente sumário que, em sede cautelar, carateriza a apreciação dos factos em litígio, e das exigências de celeridade que se impõem e sobrelevam neste tipo de processo (neste sentido, cf.

MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª edição, Almedina, 2017, pp. 961 e 962).

A acrescer a tudo isto, a Requerente vem, ainda, no requerimento de fls. 2670 a 2672 do SITAF, sustentar que o procedimento administrativo junto aos autos pela Entidade Requerida não se encontra completo, solicitando a este Tribunal que ordene a junção de elementos documentais adicionais.

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