Acórdão nº 00442/18.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.RELATÓRIO 1.1. AA (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, pela qual foi julgado totalmente improcedente a impugnação judicial das liquidações adicionais de IVA e respetivos juros compensatórios relativos ao ano de 2014, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: «i) Vem o presente recurso da sentença que julgou que julgou improcedente a impugnação judicial. Mas salvo o devido respeito fê-lo em erro de julgamento quer da matéria de facto quer de direito.

ii) No ponto 5 da matéria assente, consagrou a recorrida: a Impugnante pagou o valor a que aludimos no ponto 3 supra à sociedade “ BB”, o qual inclui o valor do IVA liquidado, e referido em 4 – cfr. mensagem de correio eletrónico de 25-06-2019, junta aos autos em 26-06-2019; mas tal mensagem de correio eletrónico refere ainda que as facturas do ano de 2014 foram regularizadas com IVA e o mesmo foi liquidado nas declarações de IVA dos períodos correspondentes.

iii) Desta forma, deve o ponto em causa ser reformulado e dar-se como assente: A Impugnante pagou o valor a que aludimos no ponto 3 supra à sociedade “ BB”, o qual inclui o valor do IVA liquidado, e referido em 4 e as facturas do ano de 2014 foram regularizadas com IVA e o mesmo foi liquidado nas declarações de IVA dos períodos correspondentes.

iv) Doutro passo, deve ainda dar-se como provado o constante do ponto 37º da PI: a emitente das facturas liquidou e cobrou o IVA, que a impugnante pagou com o preço, tendo esse imposto sido entregue nos cofres do Estado e a AT, mesmo fiscalizando a actividade daquela, nunca corrigiu essa liquidação, aceitando a operação, fazendo seu o imposto liquidado pela vendedora e pago pela compradora, facto não impugnado e constante do relatório de inspecção tributária efectuado à empresa “ BB” que a AT não quis juntar no decurso dos autos, invocando o sigilo fiscal, e que agora foi por aquela disponibilizado à impugnante/recorrente e cuja junção se requer nos termos do artigo 651.º, n.º 1 do CPC, em conjugação com o artigo 425.º do CPC.

  1. Nos termos do art.º 55º da LGT, “A administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários”.

    vi) Este artigo 55º da LGT, em sintonia com o art.º266º, nº 2, da C.R.P., impõe aos órgãos da administração tributária uma actuação respeitadora dos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade.

    vii) O princípio da justiça – considerado doutrinariamente como tendo natureza compósita, como sendo princípio de princípios, densificável através de vários outros subprincípios (como o da igualdade, da proporcionalidade, da imparcialidade, da participação dos particulares ou da boa-fé) – isto sob pena de se estar perante um princípio demasiado vago, nada operacional e destituído de aplicação direta a casos concretos – significa que a Administração deve procurar alcançar o ideal da equidade do caso concreto, agindo de modo a que a cada qual se lhe dê o que lhe é devido.

    viii) A razoabilidade é um critério de aplicação das normas administrativas e do controlo judicial da mesma complementar do da proporcionalidade. Este é analítico da bondade da solução concreta depois de passado o crivo da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito da mesma, ao passo que a razoabilidade funciona como um critério sintético de avaliação da bondade dos argumentos utilizados em prol da situação concreta a decidir e dos valores presentes.

    ix) A proporcionalidade é utilizada como critério jurídico defensivo das limitações e dos direitos fundamentais pelo legislador e pela Administração, mas pode e deve ser utilizada fora daí como critério geral de toda a actividade administrativa.

  2. Pelos serviços que a impugnante/recorrente pagou à prestadora dos serviços, esta liquidou e cobrou o IVA, que aquela pagou com o preço, tendo esse imposto sido entregue nos cofres do Estado e a AT nunca corrigiu essa liquidação, aceitando a operação, fazendo seu o imposto liquidado, acrescendo que a emitente foi fiscalizada e alguma correcção referente às facturas em causa foi efectuada.

    xi) Assim, mal se compreende que a AT pretenda agora obviar à consideração do imposto respectivo, no qual a sentença recorrida alinha. Se a AT não diligenciou pela correcção daquela liquidação – que sustenta ser indevida – como pretende agora cobrar o mesmo imposto? Querendo receber duas vezes? A duplicação de colecta é doutrinal e jurisprudencialmente considerada uma «heresia» no nosso sistema fiscal (TEIXEIRA RIBEIRO, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 120.º, página 278, e acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29-11-1989, processo n.º 011877), devendo ser conhecida oficiosamente, pela Autoridade Tributária e Aduaneira ou pelos Tribunais, nos termos do artigo 175.º do CPPT.

    xii) A não ser assim, a AT estaria a locupletar-se com um imposto que considera não ser devido, numa clamorosa violação dos princípios por que deve pautar a sua actividade, designadamente os da justiça, da razoabilidade, boa-fé e proporcionalidade e estaria a reduzir a letra morta o desígnio de neutralidade prosseguido pelo imposto sobre o valor acrescentado.

    xiii) Por outro lado, quanto à tese defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira e pela sentença recorrida, que se reconduz a que o IVA indevidamente indicado nas facturas relativo a uma prestação de serviços ser devido cumulativamente com o que é liquidado devidamente com base na mesma prestação, para além de ser incompatível do referido artigo 205.º do CPPT, é contrária ao princípio da neutralidade, numa situação em que não é detectável enriquecimento sem causa, nem perda de receitas fiscais, como tem vindo a ser entendido pelo TJUE.

    xiv) Pelos serviços que a impugnante/recorrente pagou à prestadora dos serviços, esta liquidou e cobrou o IVA, que aquela pagou com o preço, tendo esse imposto sido entregue nos cofres do Estado e a AT nunca corrigiu essa liquidação, aceitando a operação, fazendo seu o imposto liquidado, acrescendo que a emitente foi fiscalizada e alguma correcção referente às facturas em causa foi efectuada.

    xv) Não nos parece cabível que a impugnante/recorrente fique à mercê da actuação da AT que pode vir, como veio, a emitir a liquidação adicional em data em que já não é possível a regularização do art.º 78º do CIVA e da actuação e opções do transmitente, suportando a adquirente (mais para mais numa situação em que inexiste qualquer comportamento fraudulento ou evasivo) um encargo económico que tem na sua origem um erro daquele, vendo-se o Estado a aumentar a sua receita de imposto. Se isto não é injusto, irrazoável e desproporcional, não sabemos o que se possa ser! Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogar-se a decisão recorrida, com as legais consequências.» 1.2.

    A Recorrida (Fazenda Pública), notificada da apresentação do presente recurso...

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