Acórdão nº 2176/10.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelTiago Miranda
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

I - Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a oposição movida por AA, NIF 10..., à execução fiscal nº 3...6 do Serviço de Finanças de G....

As alegações de recurso da Recorrente terminam com as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a oposição à execução deduzida por BB, NIF 10....2, revertido no processo de execução fiscal n.º 3...6 e apensos, instaurados pelo Serviço de Finanças de G..., dos quais é devedora originária a sociedade V..., Lda, NIPC 50...6, sendo objecto da referida oposição apenas a parte relativa às dívidas de IRC dos anos de 2002 e 2003, no montante de € 8.148,00, B. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com a decisão do Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição por se encontrar verificada a falta de fundamentação do despacho de reversão - referindo que é completamente omisso relativamente ao fundamento de direito e aos fundamentos de facto, limitando-se a retirar a responsabilidade do oponente da circunstância de o mesmo figurar como gerente no registo comercial da sociedade - entendendo-se que a sentença proferida enferma de erro de julgamento de facto e de direito, conforme se vai explanar.

  1. Visando identificar o erróneo julgamento da matéria de facto, em cumprimento do disposto no art.º 640º do CPC, cumpre apontar que, em complemento da factualidade assente na sentença recorrida, devem ser dados como provados os factos descritos no ponto 4 das alegações – que aqui se dão como integralmente reproduzidos -, de conformidade com os poderes que são concedidos ao Tribunal ad quem pelo art.º 662º do CPC, aplicável por via da al. e) do art.º 2º do CPPT, por se encontrarem documentalmente demonstrados nos autos e se reputarem essenciais à boa decisão da causa, assim se modificando o segmento relativo a factos provados (intercalando estes factos na ordem atribuída aos factos dados como provados na sentença, por uma questão de coerência): D. Entende a Fazenda Pública, face aos factos que devem ser dados como assentes que o Tribunal a quo fez um erróneo julgamento de direito ao julgar verificada a falta de fundamentação do despacho de reversão, considerando-o completamente omisso relativamente aos fundamentos de direito e aos fundamentos de facto.

  2. Sendo um acto administrativo tributário, o despacho de reversão está sujeito a fundamentação, atendendo ao princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos (nº 3 do art.º. 268º da CRP) densificado, no caso, no nº 4 do art.º 23º e nº 1 do art.º 77º da LGT, devendo incluir, além da indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (citado nº 1 do art.º. 77º da LGT), também a declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação (nº 4 do art.º 23º da LGT).

  3. São pressupostos da responsabilidade subsidiária a inexistência ou a fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (art.º 23º n.º 2 da LGT e art.º 153º n.º 2 do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (art.º 24º n.º 1 da LGT) G. No caso em apreço, o denominado despacho de reversão faz expressa referência às folhas 14,29,30, as quais se referem ao auto de diligências lavrado em 13/02/2007 (no qual se apurou a inexistência de bens penhoráveis), à informação e despacho de 08/11/2007 descrita em “D” e “E” dos factos dados como provados, e ao despacho de 08/11/2007, indicado em “F” da matéria de facto provada, sendo que este último contém os (sob o título) “fundamentos da reversão”.

  4. É indubitável que da fundamentação do despacho de reversão consta a alegação da “inexistência de bens penhoráveis da devedora originária para o pagamento da dívida tributária referente aos impostos identificados em fls. 17 e 18”, sendo que este não sofre de falta de fundamentação por dele não constarem as diligências efectuadas para o apuramento de bens, uma vez que tal exigência não consta da lei (neste sentido o acórdão do STA, processo 01087/12 de 2013/02/06, www.dgsi.pt).

    I. Dos fundamentos da reversão consta também que o oponente “à data das dívidas exercia a função de gerente”, sendo certo que as dívidas estão devidamente identificadas e discriminadas no anexo ao despacho de reversão.

  5. A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (nº 4 do art.º. 23º da LGT) não se impondo que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido (neste sentido o acórdão do STA, proferido em Pleno da Secção de Contencioso Tributário, processo 0458/13, de 2013/10/16, in www.dgsi.pt).

  6. Face ao exposto, entende a Fazenda Pública que, aquando da efectivação da reversão (23º n.º 4 da LGT), foram efectivamente alegados os respectivos pressupostos, nomeadamente, o exercício efectivo das funções de gerente, (art.º 24º n.º 1 da LGT) e a insuficiência de bens da devedora originária (art.º 23º 1 a 3 da LGT e 153º 1 e 2 b) do CPPT), bem como devidamente identificadas e discriminadas as dívidas em causa (conforme anexo ao despacho de reversão), o que se afigura bastante para se mostrar cumprida a fundamentação de facto do despacho de reversão.

    L. No que concerne à fundamentação de direito, a jurisprudência do STA (cf., entre outros, o ac. de 27/5/2003, proc. nº 1835/02) tem vindo a considerar que tal fundamentação se considere suficiente, não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível, impondo-se a verificação de duas condições: que se possa afirmar, inequivocamente, perante os dados objectivos do procedimento, qual foi o quadro jurídico tido em conta pelo acto e que se possa concluir que esse quadro jurídico era perfeitamente conhecido ou cognoscível pelo destinatário, hipotizando-se que o seria por um destinatário normal na posição em concreto em que aquele se encontra (acórdão do STA, processo 01860/13, de 12/02/2015, www.dgsi.pt).

  7. Dos fundamentos da reversão consta a menção aos artigos 153º n.º 2 a) do CPPT e art.º 24º n.º 1 da LGT. Não obstante não constar do despacho de reversão em que alínea do n.º 1 do art.º 24º da LGT se suportou a reversão, a circunstância de dele constar que o aqui recorrido/oponente exerceu a gerência da executada, no período a que respeitam as dívidas ali identificadas e em cobrança, tudo conforme certidão emitida pela Conservatória do Registo Comercial, apenas pode levar à conclusão de que tal indicação, articulada com o facto de não ter ocorrido qualquer alteração na gerência da devedora originária (sendo que o oponente não questiona o exercício das funções de gerência que o órgão de execução fiscal lhe imputa no despacho de reversão, admitindo, mesmo o exercício dessas funções na sua oposição) significa que o exercício da gerência abrangeu os períodos em que se inscreveram os prazos legais de pagamento ou entrega das dívidas tributárias (nos termos da al. b) do nº 1 do art.º 24º da LGT) e que, assim, impendia sobre o oponente o ónus da prova de que a falta de pagamento dessas dívidas não lhe era imputável (Neste sentido, vejam-se os acórdãos do STA, proferidos nos processos 01860/13, de 12/02/2015; 0345/14, de 08/04/2015; 0487/15 de 17/06/2015 e 087/14, de 25/03/2015, publicados em www.dgsi.pt).

  8. Tendo conhecimento de tal facto – de ser gerente aquando do pagamento das dívidas exequendas, já que não podia deixar de saber que havia exercido, de forma ininterrupta, a gerência da sociedade – e reportando-se o órgão de execução fiscal ao exercício das funções de gerência no período a que respeitam as dívidas, de conformidade com o registo comercial que instruiu o procedimento de reversão, o oponente ficou em condições/tinha obrigação de saber o quadro jurídico considerado – o regime previsto na alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, tendo sido este o enquadramento jurídico que o aqui recorrido fez em sede de oposição (cf. artigo 43º da oposição).

  9. A fundamentação do despacho de reversão encerra os aspectos, de facto e de direito, que permitiram ao oponente conhecer os pressupostos da reversão, a extensão temporal da responsabilidade subsidiária, bem como o quadro jurídico-normativo em que aquela se inseriu, não lhe podendo ser imputado qualquer vício atinente à falta de fundamentação.

  10. O despacho de reversão permitiu conhecer a motivação que lhe subjaz, permitindo ao intérprete posicionar-se ante o seu conteúdo, aderindo ou rejeitando os seus fundamentos, tal como demonstrou o oponente na presente acção.

  11. Aliás, conforme decorre dos factos que devem ser dados como provados, o oponente, aqui recorrido, foi revertido pela totalidade das dívidas que melhor constam do anexo ao despacho de reversão, sendo que aceitou a responsabilidade subsidiária que sobre si recaia relativamente a todas as dívidas, excepto as atinentes a IRC dos anos de 2002 e 2003, tendo delimitado a sua oposição apenas em relação a estas, posição que só é consentânea com o facto de ter compreendido de forma clara, suficiente e congruente os fundamentos da reversão.

  12. Pelo exposto, com ressalva do devido respeito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito, pois não faz a...

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