Acórdão nº 00301/14.0BEMDL-S2 de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | Paulo Ferreira de Magalhães |
Data da Resolução | 30 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO AA e mulher BB, CC e mulher DD, EE e mulher, FF, GG e filhas HH e II, e JJ e marido KK [devidamente identificados nos autos], Autores na acção que intentaram contra o Município de Mirandela [também devidamente identificado nos autos], na qual foi requerida, em suma, a sua condenação na execução de obras e pagamento de indemnização, inconformados com o despacho proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, datado de 21 de março de 2022 [pelo qual, entre o mais, foi admitido o documento atinente ao relatório pericial elaborado pelo LNEC no âmbito do processo crime n.º 285/14....], vieram apresentar recurso de Apelação.
* No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencaram a final as conclusões que ora se reproduzem: “[…] A - O presente recurso vem interposto do douto despacho de 21.03.2022, que admitiu o relatório pericial elaborado pelo LNEC no âmbito do processo-crime n.º 285/14....
, cuja junção foi requerida pelo Réu em 11.02.2022, (requerimento ...59 e ...19) invocando “ser demais manifesta a sua relevância considerando a similitude entre o objeto do Proc. n.º 285/14.... e os presentes autos” B - O despacho recorrido é do seguinte teor: “Nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 423.º do CPC, após o limite temporal previsto no n.º 2 deste mesmo artigo (“20 dias antes da data em que se realize a audiência final”), apenas é admitida a junção dos documentos cuja apresentação não tenha sido até aquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
In casu, o documento que o R. pretende juntar aos autos é o relatório pericial elaborado pelo LNEC no âmbito de um inquérito-crime em que se discute, precisamente, o apuramento/confirmação da eventual existência de ilícitos de natureza criminal na ocorrência do desmoronamento parcial dos prédios dos aqui AA. e produção dos respectivos danos.
Pese embora o Tribunal tenha emitido já pronúncia neste autos sobre a perícia elaborada pelo LNEC em sede do referido inquérito-crime, certo é, porém, que a mesma teve por pressuposto o indeferimento da prova pericial requerida pelo R., o que, no entanto, foi objecto de revogação pelo TCAN, no Acórdão supra referido.
Por conseguinte, sendo ordenada a produção de prova pericial nos presentes autos e uma vez que o objecto da perícia a realizar, nos precisos termos referidos pelo TCAN [“saber se a causa da derrocada foi a violação de regras legais, regulamentares ou técnicas que devessem ter sido observadas na fase de construção, no que concerne ao planeamento, direcção e execução da obra ou para protecção das forças da natureza”], se sobrepõe, em grande medida, com o da perícia realizada pelo LNEC naquele inquérito-crime, o que é por demais evidenciado pelo quesito ii) do elenco de quesitos enviado pela Procuradoria do Juízo de Competência Genérica de Mirandela ao LNEC em 25.06.2018 [“é possível concluir pela existência de violação de regras legais, regulamentares ou técnicas que devessem ter sido observadas nas fases de construção, respeitante ao planeamento, direção e execução ou para proteção das forças da natureza?”], é manifesta a utilidade na junção aos autos do documento em causa.
Pelo que, não assiste razão aos AA. em qualquer dos fundamentos que aduzem para se oporem à respectiva junção.
Assim, estando preenchidos os requisitos do n.º 3 do art.º 423º do CPC e inexistindo qualquer outro motivo obstativo, defiro a junção aos autos do referido relatório C - Assim, entende o despacho recorrido que estando preenchidos os requisitos do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, admite a junção aos autos do relatório pericial elaborado pelo LNEC realizado no âmbito do processo 285/14.....
D - Entendem os ora recorrentes que a decisão que admite a perícia, é passível de criticas, daí o fundamento de interposição do presente recurso, isto porque, o Tribunal Central Administrativo do Norte no seu Acórdão de 18.06.2021, proferido no apenso 301/14...., não admitiu junção a aos autos da perícia do LNEC, a realizar no âmbito do processo de inquérito crime n.º 285/14...., da Procuradoria do Juízo de competência Genérica de Mirandela, mas apenas admitiu a produção da prova pericial, circunscrita apenas “ao apuramento da questão de saber se a causa da derrocada foi a violação de regras legais, regulamentares ou técnicas que devessem ter sido observadas na fase de construção, no que concerne ao planeamento, direcção e execução da obra ou para protecção das forças da natureza.” E - Além disso, a perícia realizada pelo LNEC no processo crime n.º 285/14...., que se encontra ainda em fase de inquérito, foi determinada pela Exma. Senhora Procuradora a fim de se apurar/a existência ou não de ilícito de natureza criminal e a quem poderá vir a ser imputada a responsabilidade pelos danos causados em três edifícios construídos nos Lotes n.º nº ..., n.º... e n.º....
F - O Município de Mirandela não é assistente/ofendido no processo crime n.º 285/14.....
G - Nem o assistente/ofendidos, aqui recorrentes, apresentaram queixa contra o Município de Mirandela, aqui recorrido.
H - Não tendo por isso, o Município de Mirandela, legitimidade a qualquer titulo para intervir no processo crime n.º 285/14...., muito menos para formular quesitos à perícia solicitada ao LNEC.
I - O artigo 421º, n.º 1, do CPC dispõe o seguinte: “Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 355º do Código Civil; se porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova.
“ J - Ora, para que se verifiquem as condições do aproveitamento num processo da prova pericial realizada noutro processo, a doutrina é unânime em considerar que têm que ocorrer quatro requisitos cumulativos. Em primeiro lugar, é necessário que seja a mesma, em ambos os processos, a parte contra quem foram produzidos os ditos meios de prova. Em segundo lugar, é suposto que a parte tenha tido a possibilidade no primeiro processo de exercer o contraditório quanto à admissão e produção daquele meio de prova. Em terceiro lugar, é suposto que o regime de produção dessas provas no primeiro processo ofereça às partes garantias pelo menos iguais às do segundo. Em quarto lugar, é suposto, ainda, que não tenha sido anulada a parte do processo relativa à produção da prova que se pretende invocar.
K - Assim, se faltar o terceiro requisito, ou seja, se as garantias oferecidas no primeiro processo forem inferiores às oferecidas no segundo, a prova produzida no primeiro processo pode ser aproveitada e ser feita valer em termos probatórios apenas como princípio de prova, como decorre do n.º 1 do citado artigo 421º.
L - Por seu turno, se falhar algum dos outros requisitos (nomeadamente, a identidade das partes em ambos os processos, bem como, a possibilidade no primeiro processo de exercer o contraditório quanto à admissão e produção daquele meio de prova, como se verifica no presente “não podem tais provas ser objeto de qualquer aproveitamento.
M - De facto, subjacente a tal normativo está o princípio que nenhuma prova deve ser admitida no processo sem que...
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