Acórdão nº 00125/20.6BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução30 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo: I.RELATÓRIO 1.1.

AA, intentou a presente ação administrativa contra o MUNICÍPIO DE VILA POUCA DE AGUIAR, pedindo a anulação do despacho do senhor Vereador do Pelouro com poderes delegados proferido a 11/12/2019, no âmbito do processo administrativo nº ...8, que ordena a reposição da situação no estado anterior da obra “construção de muro e colocação de portão”, o qual foi notificado à Autora no dia 19 de dezembro de 2019 ou, subsidiariamente, a declaração de nulidade do mesmo despacho.

Para tanto alegou, em síntese que, o despacho em causa é nulo por violar o seu direito de propriedade privada constante do art.º 62 Constituição e por ausência de forma legal que sustente o procedimento.

O referido despacho não concretiza a razão pela qual o Réu considera os espaços em causa como do domínio público, nem o fundamento probatório em que se sustenta, não havendo qualquer prova em como a construção do dito muro ocupe espaço do domínio público, assacando-lhe, inclusivamente, falta de fundamentação.

1.2. Citado, o Réu contestou, impugnando a versão dos factos apresentada pela Autora, sustentando, em síntese, que o despacho impugnado é plenamente válido, uma vez que a colocação de paus, arames, pedras ou outros obstáculos num caminho que obste à sua utilização pelo público em geral, como no caso, constitui um ato ilegítimo de turbação.

Nos termos do artigo 21.º do DL 280/2007, de 07/08 impunha-se-lhe que tivesse proferido o ato impugnado, determinando a autora á reposição da situação no estado em que o caminho se encontrava antes da ocupação levada a cabo com a implantação do muro e portão em causa.

O caminho ocupado, é um caminho público uma vez que, conforme a jurisprudência um caminho será público quando se verifique que o mesmo está no uso direto e imediato do público e que a sua utilização é imemorial, pelo que, verificando-se esses requisitos, impunha-se-lhe que garantisse o acesso público da generalidade da população ( art.º 25.º do referido DL).

Pugna pela improcedência da ação.

1.3. Por despacho de 24/03/2021, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela determinou a suspensão da instância, nos seguintes termos: «(…) o despacho impugnado consiste, para além da sua fundamentação, numa ordem de reposição da situação no estado anterior da obra de construção de um muro e colocação de um portão no Lugar ..., freguesia ..., concelho ....

Por outro lado, considerando a causa de pedir, a questão controvertida principal prende-se com a atribuição da dominialidade do terreno onde foi construído esse muro e colocado o referido portão, uma vez que a Autora alega que o mesmo lhe pertence e a Entidade Demandada que se trata de domínio público.

Nesse sentido, a questão da definição da titularidade da coisa imóvel aqui em causa assume natureza prejudicial relativamente ao objeto da causa, uma vez que a solução jurídica da mesma depende daquela questão prévia.

Ora, como decorre do artigo 1311º do Código Civil, a defesa da propriedade faz-se através da ação de reivindicação, mediante a qual o proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence.

Contudo, a competência material para a apreciação da ação de reivindicação pertence aos Tribunais Judiciais, como resulta, entre outros, dos Acórdãos do Tribunal de Conflitos de 20/11/2014 - Proc. nº ...4-70, de 26/01/2017 – Proc nº 052/14 e de 24/05/2017 – Proc. nº ...7.

E, como decorre do artigo 15º, nº 1 do CPTA, “quando o conhecimento do objeto da ação dependa, no todo ou em parte, da decisão de uma ou mais questões da competência de tribunal pertencente a outra jurisdição, pode o juiz sobrestar na decisão até que o tribunal competente se pronuncie”.

Todavia, a suspensão fica sem efeito se a ação da competência do tribunal pertencente a outra jurisdição não for proposta no prazo de dois meses ou se ao respetivo processo não for dado andamento, por negligência das partes, durante o mesmo prazo, devendo, nesse caso, prosseguir o processo do contencioso administrativo e a questão prejudicial ser decidida com efeitos restritos ao mesmo (cfr. n.os 2 e 3 do mesmo preceito legal).

Como referem MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, em anotação à referida disposição legal (in Comentários ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Coimbra, Almedina, 2017), “constitui questão prejudicial a questão que, sendo da competência de outro tribunal, se revele essencial para a apreciação do fundo da causa e possa, por si só, modificar a situação jurídica que tenha de ser dirimida na decisão a proferir (Acórdão do STA de 3 de julho de 2003, Processo nº 648/03). É o que, v.g., sucede quando se coloque a questão da titularidade do direito de propriedade sobre um bem acerca do qual exista litígio ou controvérsia entre as partes no âmbito da relação jurídica submetida ao tribunal administrativo (Acórdão do STA de 3 de março de 1994, Processo nº 30248).

“(…) Na hipótese considerada neste artigo 15º, é o juiz que remete as partes para um tribunal de diferente jurisdição para dirimir uma questão prejudicial que não é da sua competência, suspendendo para esse efeito a instância. E, no caso de o processo dever prosseguir no contencioso administrativo, por aplicação do disposto nos n.ºs 2 e 3, o juiz decide a questão prejudicial no próprio processo, a título incidental, por ela ser necessária à apreciação da causa dependente”.

Isto posto, atendendo aos motivos acima explanados, decide-se, ao abrigo do artigo 15º, nº 1 do CPTA, suspender a instância até à prolação de decisão, com trânsito em julgado, do tribunal competente sobre a questão da titularidade do terreno onde foi construído o muro de vedação e colocado o portão por parte da Autora, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do mesmo preceito legal.

Nessa medida, aguardem os autos pelo prazo de dois meses, devendo a Autora informar, até ao final desse período, se propôs entretanto a ação judicial respetiva.

Notifique.

Mirandela, 24 de março de 2021.».

1.4. Inconformada com o teor deste despacho, a Autora interpôs recurso de apelação.

1.5. Por decisão proferida em 17/05/2021, a 1ª Instância não admitiu o recurso de apelação interposto pela Autora, tendo aquela reclamado dessa decisão para o TCAN.

1.6. Por decisão da relatora proferida em de 09/03/2022, a reclamação foi julgada procedente constando o seu dispositivo do seguinte teor: «Nestes termos, em face do...

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