Acórdão nº 00311/15.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução30 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * * I – RELATÓRIO O INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, I.P.

[doravante IFAP], devidamente identificados nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos “(…) na parte em que aprecia e decide a matéria referente à prescrição do procedimento, prevista e regulada no Regulamento (CE,EURATOM) n° 2988/95 do Conselho, de 18/12, relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, uma vez que considera que esta questão não foi corretamente apreciada e decidida pelo Tribunal a quo (…)”.

Em alegações, o Recorrente formularam as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) 1ª. O recorrente IFAP,IP vem recorrer da sentença na parte em que aprecia e decide a matéria referente à prescrição do procedimento, prevista e regulada no Regulamento (CE,EURATOM) n° 2988/95 do Conselho, de 18/12, uma vez que considera que esta questão não foi corretamente apreciada e decidida pelo Tribunal a quo; 2º. Considera que a data do início da contagem da prescrição indicada pelo Tribunal a quo não é mais adequada, bem como a contagem do prazo de prescrição previsto no n.° 1 do artigo 3.° do Regulamento (CE,EURATOM) n° 2988/95 do Conselho, de 18/12, não está devidamente feita pelo Tribunal de 1a instância; 3ª. Entende, assim, salvo melhor entendimento, que o artigo 1.° e o n.° 1 do artigo 3.°, ambos do Regulamento (CE,EURATOM) n° 2988/95 do Conselho, de 18/12, não foram corretamente aplicados pelo Tribunal a quo à matéria controvertida; 4ª. De acordo com o artigo 1.° do citado Regulamento (CE,EURATOM) n° 2988/95 do Conselho, é definido o conceito de "irregularidade": "...1. Para efeitos da proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, é adotada uma regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito comunitário. 2. Constitui irregularidade qualquer violação de uma disposição de direito comunitário que resulte de um acto ou omissão de um agente económico que tenha ou possa ter por efeito lesar o orçamento geral das Comunidades ou orçamentos geridos pelas Comunidades, quer pela diminuição ou supressão de receitas provenientes de recursos próprios cobradas directamente por conta das Comunidades, quer por uma despesa indevida.."; 5ª. Nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 3.° do Regulamento (CE,EURATOM) n° 2988/95 do Conselho, referente ao prazo de prescrição de procedimento: ".1. O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no n° 1 do artigo 1°. (.) . O prazo de prescrição relativo às irregularidades continuadas ou repetidas corre desde o dia em que cessou a irregularidade. (.)"; 6ª. Podemos afirmar que a irregularidade in casu consubstancia-se na "não devolução das ajudas concedidas" e, neste caso, temos de considerar que, em 21/06/2010, foi enviado oficio pelo IFAP,IP de decisão final ao A. a informar que " .encontram-se reunidos os requisitos para a rescisão do referido contrato e a consequente devolução da quantia considerada indevidamente recebida no valor de €34.402, 34, acrescida dos juros ." sendo esta a data em que se pediu a devolução das quantias concedidas pelo IFAP,IP, sendo esta a data da irregularidade para inicio da contagem do prazo de prescrição, já que este não devolveu o solicitado; 7º. Pois, a irregularidade verificou-se porque não devolveu o A. aquele montante; ou, no máximo, (e também se mais não houvesse) tal irregularidade foi praticada em 28/03/2013 quando o IFAP,IP se lhe dirigiu solicitando-lhe o pagamento voluntário da quantia em dívida, de novo; 8ª. Por outro lado, podemos considerar que estamos aqui perante uma irregularidade continuada, que ainda subsiste no tempo, pois a recusa do A. em devolver o pedido persiste - pelo que o prazo de prescrição só se inicia no dia em que a irregularidade cesse ( cfr. 2.° parágrafo do art.° 3.° do Regulamento (CE Euratom) n° 2988/95); 9ª. Se assim, não se entender e à cautela de patrocínio, sempre se dirá que poder-se-á eventualmente considerar que a irregularidade ocorreu quando se descobriu, em maio de 2005, a existência de anormalidades que levou à notificação do Autor pela Direção Regional de Trás dos Montes do ex IFAP para se pronunciar sobre estas, sendo esta verificação que iniciou a rescisão unilateral do contrato (que ocorreu em 21/06/2010, com a notificação da decisão final) com a consequente necessidade de reposição das verbas comunitárias indevidamente recebida; 10ª. Não se aceita que, tal como é afirmado na sentença que ora se recorre, que o último pagamento é o termo inicial da prescrição do procedimento, pois “irregularidade” para efeitos do citado Regulamento é uma "...qualquer violação de uma disposição de direito comunitário que resulte de um acto ou omissão de um agente económico.” (vide n.° 2 do artigo 1.°), estando a irregularidade relacionada com uma conduta ou omissão do beneficiário das ajudas económicas; 11ª. Considerando-se quaisquer uma das datas acima indicadas como o termo inicial da contagem do prazo de prescrição, podemos afirmar que o mesmo não estava prescrito, sendo o pedido de reembolso eficaz e válido pois, "A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção” - cfr. parágrafo 3, do n.° 1 do art.° 3.° daquele Regulamento; 12ª. Aplicando esta norma ao caso dos autos, temos que após maio de 2005 (considerando este o termo inicial do prazo de prescrição) foi enviada, por várias vezes, correspondência ao recorrido, o que interrompeu o prazo de prescrição de 04 anos e tornou o pedido de reembolso atempado e eficaz; 13ª. Com efeito, como resulta do terceiro parágrafo daquele dispositivo legal - n.° 1 do artigo 3.° do citado Regulamento - aquele prazo de prescrição é suscetível de ser interrompido por qualquer ato que tenha em vista instruir ou instaurar procedimento de irregularidade, de que seja dado conhecimento ao beneficiário. Refere, igualmente, que o prazo corre de novo após a interrupção. , tendo-se verificado que houve, pelo menos, vários momentos que interromperam a contagem do prazo prescricional; 14ª. Não houve prescrição do procedimento, nos presentes autos. (…)”.

* Notificados que foram para o efeito, os Recorridos AA e BB e ainda CC não contra-alegaram.

* O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

* O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior não exerceu a competência prevista no nº.1 do artigo 146º do CPTA.

* Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* * II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir resume-se a saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito quanto à decidida prescrição do procedimento para recuperação da ajuda concedida visado nos autos.

É na resolução de tal questão que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.

* * III – FUNDAMENTAÇÃO III.1 – DE FACTO O quadro fáctico apurado na decisão recorrida foi o seguinte: “(…) 1) O Autor CC apresentou uma candidatura ao abrigo do “Programa Operacional Agricultura e Desenvolvimento Rural (PO AGRO) - Medida 1 (Modernização, Reconversão e Modernização de Explorações Agrícolas)” - cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 83 a 90 do sitaf; 2) Os Autores Manuel José e esposa prestaram, no âmbito daquele projeto, em 29/09/2003, imediatamente antes da disponibilização das ajudas financeiras ao Autor Hernâni, uma fiança no valor de 101 512,20 € [por acordo - cf. art. 25° da contestação].

3) Em 21.11.2003, entre o Instituto de Financiamento e Apoio ao desenvolvimento da Agricultura e Pescas, o Autor CC, na qualidade de beneficiário, e o Autor AA, na qualidade de garante, foi celebrado um contrato denominado “Contrato de Atribuição de Ajuda ao Abrigo do Programa Agro - Medida 1”, que foi também assinado pela Autora BB, na qualidade de garante - cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 91 a 97 do sitaf; 4) Da cláusula 12ª do contrato referido no ponto anterior consta o seguinte: “O Garante presta pelo presente uma fiança ao IFADAP, até ao limite de 101.512,20 (cento e um mil quinhentos e doze euros e vinte cêntimos), cobrindo até tal limite todas e quaisquer responsabilidades e obrigações do Beneficiário, contraídas perante o IFADAP e relativas a este contrato de atribuição de ajuda, pelo que, na qualidade de fiador e principal pagador, com renúncia ao benefício da excussão prévia, se compromete irrevogavelmente a pagar ao IFADAP quaisquer quantias, até ao referido limite, logo que tal seja solicitado pelo IFADAP” - cfr. documento a fls. 91 a 97 do sitaf; 5) Na sequência do contrato referido no ponto 2, o Autor CC recebeu do Instituto de Financiamento e Apoio ao desenvolvimento da Agricultura e Pescas o montante total de € 34.402,34, a saber: em 30/09/2003, Prémio 1 a...

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