Acórdão nº 00232/16.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução12 de Abril de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: DMAC (Travessa T…, FF...

) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra que, em acção intentada contra o Município FF...

(Av.ª S…, FF...), absolveu o réu.

*Conclui (sic): 1) O douto Tribunal "a quo" veio proferir a sentença sem a realização de julgamento, pelo que deve a sentença ser declarada nula e respeitar-se a lei processual administrativa.

2) Como consta dos autos foram instalados pelo Município três contentores do lixo, imediatamente em frente à sua residência, na sua linha de visão directa, impedindo a vista que anteriormente era para a muralha, passando a ser para os contentores do lixo.

3) O Autor e demais habitantes próximos passaram a conviver e ter de suportar os odores do lixo, a putrefação, a falta de higiene e a existência de ratos no local; 4) Têm igualmente de suportar a poluição sonora causada pelos camiões do lixo que diariamente removem os resíduos, entre as 6 e as 7h da manhã.

5) A solução adoptada pelo Município de colocar os contentores naquele local sacrificou espaço insubstituível que antes se destinava a estacionamento dos residentes e restante população que se deslocava às igrejas próximas.

6) Na Rua 5 de Outubro não se encontram quaisquer contentores, bem como na zona histórica não se encontram quaisquer contentores pois foram removidos ao abrigo da intervenção e regeneração das muralhas - e é nesta mesma zona histórica da R. 5 de Outubro que a casa do A. se encontra (embora a direção seja Travessa Terreiro do Amara!, pelas fotos e no mapa comprova-se que a casa está de facto na R. 5 Outubro) 7) Os contentores que servem a população idosa (e os demais) estão todos localizados (com excepção dos contentores em causa) nos parques de estacionamento abaixo da muralha onde existem acessos por escadas.

8) A R. retirou todos os contentores na zona histórica da muralha da R. 5 de Outubro e passou-os para os parques abaixo.

9) A largura da estrada nesta parte histórica da R. 5 de outubro (vulgo R da muralha) é exatamente a mesma ao longo da sua extensão, podendo tanto passar um automóvel, autocarro, incluindo o próprio camião de recolha de lixo que por vezes faz toda esta parte da muralha.

10) Obviamente que caso todos os contentores estivessem localizados nos parques de estacionamento da Av. Infante D. Pedro (abaixo da muralha), os mesmos camiões de recolha de lixo deixariam de atravessar a zona histórica.

11) Acresce que a malha urbana da Zona Histórica da Muralha de Buarcos (tanto a Sul e Norte) são iguais e que historicamente todos os contentores de ambas zonas que estavam na Rua 5 de Outubro 12) A Zona Histórica da Muralha da Rua 5 de Outubro teria na sua extensão total, espaço bastante para albergar os contentores de lixo, bastando recordar que há alguns anos autocarros e camiões circulavam na sua totalidade e este funcionava em dois sentidos.

13) A manutenção da situação actual implica que uma pequena parte dos moradores, e em especial o Autor, tenham de suportar exclusivamente os danos de falta de higiene, de poluição visual e sonora, e perturbação do seu descanso, sem fundamento bastante para tal, visto existirem outras alternativas, que salvaguardam a conservação das muralhas e prejudicam menos o Autor e demais residentes/ cidadãos.

14) Não sendo todos os cidadãos residentes na zona histórica tratados de forma igual, estando uns obrigados a sofrer a lesão dos seus legítimos interesses e outros em circunstâncias idênticas livres de tais lesões.

15) Juntam-se em anexo 9 fotografias (doc. 1 a 9) que bem demonstram o inverso da interpretação do douto Tribunal, as quais foram tiradas após a prolacção da douta sentença, pelo que se justifica sua junção e comprovam tudo quanto o A. alega, bem como o mapa da zona histórica de Buarcos - doc. 11.

16) Como se alcança ao nível do piso térreo os contentores são a única visão da casa do A.

17) A decisão da Administração de colocar os contentores no local viola a tutela geral da personalidade, alvo de protecção jurídica contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à personalidade física ou moral do sujeito, conforme definido no artigo 70.° do Código Civil (CC).

18) No âmbito da tutela geral da personalidade, estabelecida no artigo 70.° do CC, são vários os direitos protegidos e que têm vindo a ser alvo de desenvolvimento doutrinário e jurisprudencial, nomeadamente, 19) O direito ao repouso, ao sono e à tranquilidade, que constituem "uma emanação dos direitos fundamentais de personalidade, nomeadamente à integridade fisica e moral da pessoa e a um ambiente de vida sadio, direitos esses acolhidos quer em Convenções Internacionais, como a DUDH (art. 24.°) e a CEDH (art. 8.º, n.° 1), encontrando-se também constitucionalmente consagrados, nos arts. 17.º e 66.º da CRP” 4 [Ac. do STJ de 30-05-2013, Processo 2209/08.0TBTVD.L1.S1, Juiz Relator: Granja da Fonseca]; 20) O direito a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, cujo "escopo é a conservação do ambiente e consiste na pretensão de cada pessoa a não ter afectado, hoje, já o ambiente em que vive e em, para tanto, obter os indispensáveis meios de garantia. E, para lá desse núcleo essencial, deparam-se aí, conjugando o artigo 66º [da CRP] com outros aspectos: O direito a promover a prevenção, a cessação ou a «perseguição judicial», de actos tendentes à degradação do ambiente» [J.

Miranda - Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo 1 (art°s 70 a 79º), 2005, pg. 682]5 [5 Ac. de 19-04-2012 Processo 3920/07.8TBVIS.C1.S1, Juiz Relator: Álvaro Rodrigues] e 21) Também é pacífico que "como é consabido, a poluição sonora (ruídos prejudiciais, sobretudo nas horas consagradas ao descanso reparador da generalidade das pessoas) constitui uma das variantes dos atentados ao direito a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado” 6 [6 Idem] e que, 22) Os contentores conforme estão localizados representam também uma forma de poluição visual, igualmente violadora do direito a um ambiente sábio e ecologicamente equilibrado.

23) Ainda no âmbito da tutela da personalidade do Autor, desenvolvida pelo artigo 70.° do CC, a falta de salubridade do local representa um perigo para a sua saúde e dos restantes moradores, violando o seu direito à saúde - integrando os direitos de escopo mais amplo como o direito à vida e o direito à integridade física, consagrados nos artigos 24.° e 25.° da CRP, respectivamente.

24) Na sua actuação a Administração Pública deve obedecer ao princípio da igualdade, princípio estruturante do estado de direito democrático, consagrado no artigo 13.° da CRP, 25) Assim, as diferenças de tratamento que se verifiquem têm de fundamentar-se em razões materiais objectivas e atendíveis, sendo este um limite à margem de discricionariedade da Administração 26) As restrições aos direitos dos cidadãos devem ainda obedecer ao princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.°, n.° 2, in finem, da CRP, que impõem um limite às restrições dos direitos constitucionalmente protegidos dos cidadãos, devendo ser apenas efectuada na medida do necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos; 27) As decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos dos particulares, só podem afetar essas posições na medida do necessário e em termos proporcionais aos objectivos a realizar, conforme determinado no art. 7.º, n.° 2 do CPA.

28) Estamos perante uma violação do princípio da adequação quando o direito que é restringido não é o efectivamente idóneo para salvaguarda do interesse que se pretende tutelar; 29) Existe ainda uma violação do princípio da proporcionalidade na sub-vertente da necessidade quando se demonstra que existe outro meio para a salvaguarda do interesse que se pretende proteger; 30) O acto administrativo que infrinja princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis é anulável, quando a lei não preveja outra sanção, conforme define o artigo 163.°, n.° 1 do CPA.

31) O Autor pretende ver este acto substituído por novo acto administrativo, não lesivo dos seus direitos, nos termos do artigo 67.°, n.° 4, ai. b) do CPTA,*Sem contra-alegações.

*O Exmº Procurador-Geral Adjunto, notificado, não ofereceu parecer.

*Cumpre decidir, dispensando vistos.

*Os factos, enunciados como provados pelo tribunal “a quo”: 1) O A. é proprietário de um prédio urbano, destinado a habitação, de rés-do-chão e 1.º andar, sito na Travessa T…, em Buarcos, FF..., descrito na Conservatória do Registo Predial da FF... sob o n.º 4615/20071206 (acordo e cfr. doc. de fls. 67 a 69 do suporte físico do processo).

2) Através de e-mail enviado no dia 28/10/2014, PMR, cunhado...

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