Acórdão nº 00540/16.0BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução07 de Novembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. L. , Lda, devidamente identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 04.12.2018, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial apresentada contra as liquidações de IRC dos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, por considerar que a impugnante não fez a prova, que lhe competia, da materialidade das operações faturadas pelos emitentes a que os autos se reportam.

1.2.

A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: « I. A Recorrente impugna a decisão de facto, considerando incorretamente julgados o ponto 3. da matéria de facto dada como provada, pois considera que nenhuma prova foi feita, bem como a factualidade constante dos números I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI, XII e XIII da Matéria de Facto Não Provada, que considerou ter ficado provada.

  1. As razões da discordância da decisão da matéria de facto ora impugnada, resultam desde logo da violação das regras do ónus da prova. Com efeito, III. nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, existe uma presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes, bem como dos dados que constam da sua contabilidade e escrita, pelo que é à AT que cabe o ónus da prova da verificação dos respetivos indícios ou pressupostos da tributação.

  2. Para fazer cessar a presunção de veracidade a favor do contribuinte, prevista no artigo 75.º da LGT, é suficiente que a AT demonstre a existência de “indícios fundados” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente refletem e comprovam.

  3. Só que no caso dos autos, não ficaram demonstrados por parte da AT quaisquer indícios fundados, pelo que lhe caberia o ónus da prova dos mesmos, o que não ocorreu.

  4. Sem prescindir, mesmo que se considere ter ocorrido a cessação da presunção de veracidade da contabilidade e, consequentemente, passar para o Contribuinte o ónus da prova da existência dos factos tributários, sempre haveria lugar à aplicação do regime previsto no artigo 100.º do CPPT. Ou seja, no caso de dúvida a decisão deveria ser favorável à Impugnante.

  5. Aliás, a não ser assim, sempre seriam inúteis as impugnações sempre que confrontadas com os relatórios da inspeção tributária.

  6. Sem prescindir, o teor do ponto 3 da matéria de facto provada corresponde na íntegra ao teor dos relatórios da Inspeção Tributária sem qualquer filtragem, resultando daí meras conclusões, pelo que matéria de direito e não de facto, IX. pelo que deverá ser retirada dos factos assentes toda a matéria conclusiva por se tratar de matéria conclusiva e, como tal, de direito.

  7. Acresce que relativamente aos factos incluídos no referido ponto 3 não deveriam ter sido considerados provados.

  8. Com efeito, a ora Recorrente impugnou ambos os relatórios da Inspeção Tributária através da presente ação, meio idóneo e único admissível para o fazer.

  9. Ora, não poderá ser dado aos relatórios o valor probatório que lhe foi atribuído pelo Tribunal recorrido, quer porque o relatório foi elaborado sem o respeito pelo contraditório por parte da ora Recorrente, quer porque em sede da presente ação foi o mesmo impugnado.

  10. Sublinhe-se que o relatório da inspeção tributária foi efetuado sem qualquer obediência ao principio do contraditório, pois que toda a informação, colaboração e prestação de esclarecimentos por parte da ora Recorrente à Inspeção Tributária, foi inócua e não foi atendida sem qualquer fundamento que o justificasse.

  11. Ora, o valor probatório do relatório de inspeção está condicionado pela aplicação do princípio do contraditório.

  12. Assim, o valor probatório do relatório da inspeção tributária só poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas.

  13. Acresce que, tal como resulta do disposto no artigo 76.º da LGT as informações prestadas pela inspeção tributária fazem fé, apenas quando fundamentadas e se basearem em critérios objetivos, nos termos da lei, o que não sucedeu, pois que as informações constantes dos relatórios não se fundamentam em critérios objetivos, mas em meras considerações puramente subjetivas e sem qualquer sustentação de facto, contrariando até as informações e documentos que foram entregues à Inspeção Tributária pela Contribuinte, ora Recorrente.

  14. Aliás, nenhum dos Relatórios da Inspeção Tributária indica, com clareza e congruência, os elementos de facto e de direito que levaram a Inspeção Tributária a considerar como faturas simuladas as faturas emitidas pelos fornecedores de serviços em causa.

  15. A alegada situação dos Contribuintes à data da emissão das faturas objeto dos presentes autos em nada colide com a prestação dos serviços que constam daqueles documentos contabilísticos, tanto mais que foram validadas pela Administração Tributária a totalidade das vendas efetuadas pela ora Recorrente nos períodos em análise.

  16. Resulta, assim, dos relatórios meros juízos de probabilidade, que o Tribunal, sem qualquer justificação, transformou em decisão, apesar do teor dos mesmos não ser suportado por nenhum outro elemento de prova, bem antes pelo contrário.

  17. A ora Recorrente impugna, ainda, a decisão de facto, pois considera ter ficado provado, ao contrário do decidido, a totalidade da matéria de facto que o Tribunal deu como não provado, pois que considera que foi feita prova de tais factos, designadamente resultante da prova testemunhal produzida.

  18. Na verdade, os depoimentos das testemunhas revelaram-se suficientemente consistentes e coerentes, demonstraram conhecimento direto acerca dos factos em discussão nos presentes autos, o que seria mais do que suficiente para convencer o Tribunal que os serviços constantes das faturas desconsideradas pela Administração Tributária correspondiam a verdadeiras aquisições realizadas pela Impugnante àquelas sociedades comerciais, ao contrário do que consta em termos meramente conclusivos da fundamentação da convicção do Tribunal.

  19. Na verdade, quanto à testemunha P., o mesmo revelou conhecimento direto e preciso acerca da totalidade da matéria de facto em discussão. Na verdade, a referida testemunha confirmou ter trabalhado, em nome da sociedade J., uma das sociedades a que se reportam as faturas que a AT considerou não serem verdadeiras, com a Recorrente. Confirmando que trabalhou a feitio, como é que se desenvolvia o trabalho. O grande volume de negócio. Mais confirmou que a Impugnante dava muito trabalho a fazer fora, quer à sua empresa, quer a outras, com quem se cruzava "a carregar para os carros". Descreveu com pormenor a atividade desenvolvida, os documentos contabilísticos emitidos, os meios de pagamento. Relativamente às datas o mesmo não foi preciso, não sendo, pois de excluir o seu depoimento apenas com base numa incerteza quanto à data precisa em que deixou de ser gerente da sociedade, tudo conforme se alcança das transcrições das suas declarações que se efetuaram e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

  20. Quanto à testemunha J-., tal como se demonstrou na transcrição do seu depoimento, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, o mesmo foi claro, preciso, conciso, demonstrando conhecimento direto dos factos em discussão, tanto mais que fez a contabilidade da sociedade Impugnante. Por outro lado foi quem acompanhou sempre a inspeção efetuada à Impugnante, objeto dos presentes autos.

    Revelou conhecimento preciso das razões que determinaram a ação de fiscalização, as empresas que determinaram tal ação de fiscalização, a prévia confirmação de todas essas empresas através do numero de contribuinte junto do portal das Finanças. Revelou conhecimento acerca de todo o processo produtivo, dos fornecedores da Impugnante e dos respetivos clientes. De que apenas os subcontratados pela Impugnante foram postos em causa e nunca os clientes desta. Sabia o nº de funcionários da Impugnante ao longo da sua existência, bem como a capacidade média produtiva, que referiu situar-se nos 50.000,00 € mensais, apresentando a sociedade impugnante vendas superiores a 100.000,00 € mensais, demonstrando a impossibilidade daquela em produzir o que vendia. Revelou que havia uma componente de subcontratação e uma componente de gastos com o pessoal, sendo que aquela correspondia a cerca de 60 a 70 % dos gastos da Impugnante. Confirmou os meios de pagamento, as instruções que dera quanto ao valor a pagar em numerário que era permitido por lei.

  21. Ou seja, tal testemunha tem conhecimento direto de toda a factualidade em discussão nos presentes autos, devendo o seu depoimento ter sido valorado quer para o afastamento da matéria incluída no nº 3 da matéria de facto dada como provada, quer, essencialmente, para a prova da matéria de facto constante da relação dos factos dados por não provados, tudo tal como se alcança da transcrição do seu depoimento.

  22. Deverá, pois, ser alterada a decisão da matéria de facto, sendo retirada da matéria de facto provada todo o conteúdo do ponto 3, e adicionada à matéria de facto dada como provada os pontos nºs I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI, XII e XIII da Matéria que o Tribunal considerou como não provada, XXVI. devendo, consequentemente, ser proferida decisão a julgar a ação totalmente procedente e a anular as liquidações efetuadas pela AT.

    Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente com as legais consequências, designadamente alterada a decisão da matéria de facto e, consequentemente, anuladas as liquidações efetuadas pela AT, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.

    ».

    1.3.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    1.4.

    Os autos foram com vista ao EPGA que, em 08.03.2019, emitiu parecer em que conclui pela improcedência do recurso, com base no seguinte entendimento: «(…) A recorrente discorda quer dos factos dados como provados quer dos não provados e da convicção do tribunal, ou seja, o que pretende...

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