Acórdão nº 00473/16.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução28 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO EB-Engenharia, SA, NIPC 50xxx34, com sede na Zona Industrial C…, P…, instaurou contra o Município de OB, com sede na Praça do Município, acção administrativa, pedindo a condenação deste a pagar-lhe: -a quantia de € 295.376,00, acrescida dos juros moratórias vencidos e vincendos, contados à taxa legal supletiva para as obrigações comerciais desde 15 de setembro de 2015 até integral pagamento, somando os já vencidos a soma de € 12.551,45; -nos restantes danos em que venha a incorrer futuramente por conta dos danos descritos a liquidar futuramente; -o montante de € 20.000 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, acrescido dos juros moratórios vincendos, contados à taxa legal supletiva para as obrigações comerciais desde a citação até integral pagamento.

Por saneador sentença proferido pelo TAF de Aveiro foi julgada procedente a excepção de caso julgado e, bem assim, a excepção inominada prevista no artigo 38°/2 do CPTA e absolvido o Réu da instância.

Deste vem interposto recurso.

*Alegando, o Autor concluiu: 1. Na ação administrativa especial em que se a sentença recorrida fundou as exceções que julgou verificadas, apenas se formou caso julgado sobre ter decorrido o prazo para a Recorrente instaurar a ação de anulação do ato administrativo, tendo o seu direito a anular esse ato caducado; 2. A ação improcedeu porque o Tribunal considerou que a ação foi proposta já depois de decorrido o prazo legal para instauração da ação administrativa especial de anulação desse ato, e apenas este é o caso julgado formado nessa 1ª ação.

  1. Ao julgar verificada a exceção inominada fundada no art. 38º, n.º 2, do C.P.T.A., o Tribunal a quo incorre nos seguintes erros: não tem em conta que, por jurisprudência pacífica, resultante de um acórdão do Pleno do S.T.A., nos contratos de empreitadas de obras públicas o empreiteiro não tem de impugnar os atos administrativos, pelo que a não instauração da ação de impugnação da legalidade do ato (ou, o que é o mesmo, a instauração dessa ação fora do tempo) não extingue qualquer direito do empreiteiro, nomeadamente o de, em ação administrativa comum, reclamar indemnizações; 4. Por outro lado, a sentença considera que a pretensão da Recorrente na presente ação é um dos “efeitos complementares ou "executivos” associados às sentenças anulatórias, hoje enunciados no artigo 173.° do CPTA”, quando, na realidade, a pretensão da Recorrente é ser indemnizada dos prejuízos que sofreu com o acionamento da garantia e em nada se confunde com esses efeitos; 5. Pela presente ação, a Recorrente exerce a responsabilidade do R. pelo acionamento da caução prestada no âmbito dum contrato de empreitada de obras públicas, formulando pedidos de condenação do R. Recorrente no pagamento de uma indemnização pelos danos que sofreu, ao abrigo do disposto nos arts. 4º, n.º 1, e), do ETAF e 37º, n.º 1, l), do CPTA.

  2. Ora, todas as questões relativas à execução do contrato de empreitada de obras públicas são "questões" a decidir através do instrumento processual da ação comum, retirando qualquer relevância à qualificação dogmática das posições da Administração a elas subjacentes como atos administrativos destacáveis ou como meras declarações negociais, já que a opção legislativa foi a de, qualquer que fosse a sua natureza, as submeter à apreciação dos Tribunais através do meio processual ação comum; 7. Diferentemente, e incorrendo em erro, a sentença recorrida decidiu que a Recorrente não pode instaurar uma ação comum se não interpôs tempestivamente uma ação administrativa especial, dizendo o seguinte: “tal ato configurava e configura um acto administrativo lesivo dos "direitos” da Autor, impugnável à data da sua prática, dentro do respetivo prazo legal em sintonia com o disposto nos artigos 120.° (atual 148.º) do CPA e 51.° e ss. do CPTA”; 8. Acresce que, contrariamente ao que afirma a sentença recorrida, a indemnização por responsabilidade civil não é um dos efeitos complementares ou executivos associados às sentenças anulatórias, hoje enunciados no artigo 173.° do CPTA; 9. Com efeito, a pretensão da Recorrente na presente ação consiste em ser indemnizada dos prejuízos que sofreu com o acionamento da garantia de boa execução de obra e a pretensão indemnizatória não está compreendida no art. 137º do C.P.T.A.; 10. A presente ação situa-se no domínio da responsabilidade civil da Administração, pelo que, nos termos do art. 38º, n.º 1, do C.P.T.A., o tribunal pode conhecer, a título incidental, da ilegalidade de um ato administrativo que já não possa ser impugnado; mas isto nem sequer releva para a boa decisão da causa pois, como já se viu, o empreiteiro não tem de impugnar a legalidade do ato de acionamento das garantias; 11. E, de todo o modo, a Recorrente não pretende obter pela ação administrativa comum o efeito que resultaria da anulação do ato inimpugnável, pois, na realidade, da anulação do ato impugnável não resultaria a indemnização da Recorrente; 12. Estando demonstrado que a sentença proferida na primeira ação apenas decidiu que já havia decorrido o prazo para a instauração da ação especial de anulação do ato, e também que são consideradas como "questões" a decidir através do instrumento processual da ação comum, já que a opção legislativa foi a de, qualquer que fosse a sua natureza, as submeter à apreciação dos Tribunais através do meio processual da ação comum, está já afastada a possibilidade de ocorrer caso julgado impeditivo da presente ação; 13. Nos termos do art. 581º do C.P.C., são requisitos do caso julgado a identidade de sujeitos, de pedidos e de causas de pedir, mas no caso não existe identidade de pedidos, pois na primeira ação, a Recorrente pedia a anulação do ato; na presente ação, pede uma indemnização pelos danos que sofreu com o ato.

  3. Que não se trata do mesmo pedido resulta com toda a evidência do disposto no art. 38º, n.º 1, do C.P.T.A., que admite que na responsabilidade civil da Administração por atos administrativos ilegais, o tribunal pode conhecer, a título incidental, da ilegalidade de um ato administrativo que já não possa ser impugnado, pelo que, se houvesse identidade de pedidos entre a impugnação e a indemnização, este preceito legal não faria sentido; 15. Mas no caso, a Recorrente não pediu, nem tinha de pedir, a título principal ou incidental, a anulação do ato de acionamento de garantias; e dispondo o art. 621.º do C.P.C., a respeito do alcance do caso julgado, que a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga, não é correto entender que uma sentença que se limitou a declarar caducado o direito a impugnar um ato administrativo por via duma ação especial fez precludir o direito a responsabilizar a administração pelo meio processual próprio, a ação comum, que não está sujeita a esse mesmo prazo e que é o meio processual próprio para dirimir as “questões” emergentes de contratos de empreitada de obras públicas; 16. A título subsidiário: um dos fundamentos da presente ação consiste em que, quando executou as garantias, o Recorrido não tinha um orçamento da obra de reparação (arts. 112º e sgs. da p.i.); pela execução das garantias, o R. embolsou quase o triplo do preço que pagou à A. por todo o trabalho de execução das claraboias (art. 119º da p.i.); o concurso público lançado pelo R. para a obra de reparação de pretensos defeitos inclui um conjunto de trabalhos que nada têm a ver com os pretensos defeitos denunciados pelo R. à A. (arts. 121 e sgs. da p.i.); o R. lançou o concurso para substituição de todas as caixilharias dos vão de cobertura e o ITECONS recuperou a reparação das claraboias mas não a sua substituição total e integral (art. 127 da p.i.).

  4. Ora, tudo isto são factos posteriores à instauração ação administrativa que correu termos sob o n.º 928/14.0BEAVR, e não foram nesta apreciados, nem sobre eles se formou caso julgado, porque de modo algum se pode entender que uma sentença que julgou caducado o direito a impugnar um ato administrativo fez caso julgado sobre o valor que o dono de obra pode reter da caução; 18. Este entendimento – que foi perfilhado na sentença recorrida – incorre em notória violação do disposto no art. 621.º do C.P.C., a respeito do alcance do caso julgado, que dispõe que a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga; 19. A sentença recorrida violou os preceitos legais citados.

    Nestes termos, julgando procedente a apelação e revogando-se a sentença recorrida, far-se-á JUSTIÇA! *O Réu juntou contra-alegações, concluindo: 1.

    Conforme dispõe o artigo 580.° e 581.° do CPC, a exceção de caso julgado pressupõe a repetição de uma causa já julgada, com uma tríplice identidade, sujeitos, causa de pedir e pedido.

  5. Há identidade de pedidos quando numa e noutra ação se pretende obter o mesmo efeito jurídico, ou seja, terá de ser o mesmo direito subjetivo cujo reconhecimento se pretende, independentemente da sua expressão quantitativa e da forma de processo utilização, o que significa não ser exigível uma rigorosa identidade formal entre os pedidos.

  6. Na primeira ação, peticionava a Recorrente a anulação do ato que, entre o mais, determinou o acionamento das garantias e, na presente ação, pretende a recorrente, através de uma ação de responsabilidade civil, reaver o valor das garantias que foram acionadas a título de indemnização.

  7. Perante o exposto, é notório que o efeito jurídico pretendido pela Recorrente é o mesmo em ambas as ações, ou seja, o que pretende é obter o valor correspondente ao montante da garantia acionada.

  8. Deste modo, tendo a primeira ação decidido definitivamente o litígio e tendo inclusivamente a decisão sido confirmada pelos Tribunais Superiores, não pode agora a Recorrente através da presente ação obter o efeito jurídico pretendido com a anterior ação.

  9. Tal corresponderia à destruição dos efeitos jurídicos já produzidos pelo ato...

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