Acórdão nº 00765/18.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução15 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO AMS, devidamente identificado nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga [doravante TAF de Braga], de 27.09.2018, proferida no âmbito da Ação Administrativa que o Recorrente intentou contra o CENTRO NACIONAL DE PENSÕES, que julgou procedente a exceção de “intempestividade da prática do ato processual”, e, consequentemente, absolveu o Réu da instância.

Em alegações, o Recorrente formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) 1.

O Recorrente viu-se confrontado com a decisão do Douto Tribunal de improcedência total da ação por caducidade da mesma.

  1. Não podia o Recorrente estar mais em desacordo com o Douto Tribunal.

  2. Pois, ao ser tomada tal decisão, é ignorado que o Recorrente foi confrontado com um corte total e abrupto da pensão de invalidez decidido pela Recorrida.

  3. Em resumo, encontrando-se numa situação de necessidade e verdadeiro alarme social, a Recorrida decidiu deixar o Recorrente ao completo abandono, não lhe concedendo o mínimo de apoio social.

    “A questão a decidir, da procedência ou não da caducidade do direito de ação depende apenas de saber se o direito à segurança social consubstancia um verdadeiro direito fundamental ou se, ao invés, se trata de um direito “menor”.” Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, 09/11/2012, 00893/08.3BECBR, Rogério Paulo da Costa Martins (nosso negrito) 5. O Douto Tribunal deixou na sua decisão laivos daquela que deve ser, na nossa opinião, a solução: “Quanto a esta questão, e dada a dificuldade de interpretação no que se deve entender por direito fundamental, tem-se debruçado, quer a doutrina quer a jurisprudência, muitas vezes em sentido não unânime.

    (…) Apenas gera a sua nulidade quando afete de forma inaceitável o direito a uma existência condigna.” 6. Se por um lado, a própria Sentença agora recorrida admite que não existe uma posição unânime quanto a este tema, pelo que se deverá analisar in casu cada processo, sob pena de nos limitarmos a aderir a uma cartilha, com consequências desastrosas na vida das pessoas e, neste caso, efeitos nefastos na vida do Recorrente.

  4. Por outro lado, esta Sentença apresenta a solução: existirá nulidade quando seja afetado de forma inaceitável o direito à existência condigna.

  5. É precisamente esta questão que se encontra em discussão e, salvo melhor opinião, a Recorrente não tem qualquer dúvida que estaremos perante um ato administrativo nulo, na medida em que é ofendido o conteúdo essencial de um direito social, equiparável, neste caso, a um direito fundamental, não estando a respetiva impugnação sujeita a prazo - art.° 161 n.° 2 al. a d) e 162, ambos do Código de Procedimento Administrativo.

  6. Assim têm decidido os nosso Tribunais, não ignorando que estamos perante casos concretos e que cujas decisões têm influência na vida das pessoas.

  7. O Douto Tribunal, decidindo como decidiu demonstrou uma total insensibilidade social relativamente ao sustento do Recorrente.

  8. Examinemos o que dizem os nossos tribunais: “A Constituição não só consagra, assim, o direito à segurança social como também impõe ao Estado a organização, coordenação e subsidiação de um sistema de segurança social unificado e descentralizado, (...) Assim se, por um lado, se deve ter em conta os constrangimentos financeiros do Estado e a margem de escolha dos governos eleitos, em função do seu projeto político, por outro lado também há que proteger a confiança dos cidadãos criada pelo sistema de proteção social estabelecido que deve ser assegurado no seu conteúdo mínimo.

    No dizer de Rui Medeiros, in Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, tomo I, p. 634, «os direitos sociais contêm também - ou podem conter - um conteúdo mínimo, nuclear ou, porventura essencial diretamente aplicável».

    (…) Resulta em suma deste acórdão - que traduz o mais recente entendimento deste Tribunal - que se extrai do princípio da dignidade humana (artigo 1° da Constituição da República Portuguesa) um direito fundamental a um mínimo de existência condigna.

    (…) Estamos, portanto, perante um ato que, a confirmar-se a matéria articulada na petição inicial, restringe de maneira insustentável, o direito social à assistência na viuvez e na orfandade, sendo certo que os valores em causa, mesmo no somatório para as duas Recorrentes, não atinge o valor do salário mínimo nacional.

    A ser inválido o ato, será nulo, por ofensa do conteúdo essencial de um direito social, equiparável, neste caso, a um direito fundamental, não estando a respetiva impugnação sujeita a prazo - artigos133°, n.°2, alínea d) e 134°n.°2, ambos do Código de Procedimento Administrativo.

    Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, 09/11/2012, 00893/08.3BECBR, Rogério Paulo da Costa Martins. (nosso negrito e sublinhado) 12. O que era exigível ao Douto Tribunal - admitido na própria Sentença - e que agora se vem respeitosamente solicitar aos Venerandos Juízes Desembargadores - é que seja feita uma análise rigorosa da situação em concreto.

  9. O Recorrente deixou de auferir qualquer tipo de apoio do Estado Português (neste caso, aqui representado pela Recorrida), foi remetido ao abandono social, sendo deixado numa situação completa de pobreza.

  10. Injustamente a Recorrida decidiu suspender os pagamentos ao Recorrente.

  11. Veja-se o caso em concreto do Recorrente: - O Recorrente sofreu um acidente de viação em 04.12.2012; - Apurados todos os factos e respetivos danos, a seguradora responsável, LS veio a atribuir uma indemnização ao Recorrente no valor de €30.000,00 (trinta mil euros), que foi paga no dia 30.07.2014, com base numa incapacidade permanente parcial de 15%.

    - o Recorrente esteve de baixa médica desde essa data até julho de 2014 (pelo que não solicitou qualquer apoio à Recorrida); - apenas requereu a pensão de invalidez em 22.07.2014; - que lhe veio a ser deferida em maio de 2016; - um ano depois, em 01.06.2017 a Recorrida veio informar o Recorrente de que deveria devolver aquelas quantias por ela processadas e pagas.

    - A Recorrida comunicou ao Recorrente que a existência daquela indemnização afastava temporariamente o seu dever de lhe pagar a pensão, assim como “ab initio”, pelo que decidiu ainda que existia uma dívida de €17.600 a devolver a Recorrida, à luz do que dispõe o art.° 6 do DL n.° 187/2007 de 10 de maio que dita o seguinte: “Art." 6 - Responsabilidade civil de terceiro 1 - Existindo responsabilidade civil de terceiro pelo facto determinante da incapacidade que fundamenta a atribuição da pensão de invalidez, não há lugar ao pagamento das respetivas prestações até que o somatório das pensões a que o beneficiário teria direito, se não houvesse tal responsabilidade, atinja o valor da indemnização por perda de capacidade de ganho.

    2 - Quando não seja discriminado o valor da indemnização por perda da capacidade de ganho, presume-se que a mesma corresponde a dois terços do valor total da indemnização atribuída.” 16. Um dos pontos fulcrais neste processo é o momento do...

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