Acórdão nº 00635/06.8BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Cardoso
Data da Resolução21 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I- RELATÓRIO 1.

AB & Cª., S.A.

, NIPC 50xxx38, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 09/06/2009, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC do ano de 2000 e respectivos juros compensatórios, no valor total de € 802.904,95.

  1. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «1 Constatou-se e ficou provada a entrega total do preço em 27/12/1999 pela SV através do depósito bancário feito por esta junto do Balcão do Crédito Predial Português no valor de Esc. 250.000.000$00, a favor da impugnante-recorrente AB e C.a, SA.

  2. O artigo 43°, n° 5 do CIRC, determina que "Considera-se também transmissão onerosa a promessa de compra e venda ou de troca, logo que verificada a tradição.".

  3. Estando previsto no seu artigo 18°, sob o título "Periodização do lucro tributável", no seu n° 1, o seguinte: "Os proveitos e custos, assim como outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios.".

  4. O que interessa para efeitos contabilísticos não é propriamente a transferência da propriedade jurídica, mas outrossim a da chamada propriedade económica — o que está de acordo com o princípio contabilístico do predomínio da realidade económica sobre a aparência jurídica.

  5. No mesmo sentido, vão as instruções emanadas do Ofício-Circulado 14, de 23/11/1993, da Direcção de Serviços do IRC, "1. Nos termos do Art° 18° do CIRC os proveitos e custos, assim como as outras componentes positivas ou negativas, do lucro tributável são imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios. 2. Assim, e competindo aos Serviços de Fiscalização no âmbito de análise interna ou externa o controlo da matéria colectável, determinada com base em declaração do contribuinte, devem os mesmos, sem prejuízo da penalidade ao caso aplicável, fazer as correcções adequadas ao resultado líquido do exercício a que os custos ou proveitos digam respeito, quando, nos termos do art° 18° do CIRC, não sejam consideradas componentes negativas ou positivas do lucro tributável do exercício da sua contabilização.".

  6. Nos termos dos artigos 13.

    ° do RCPIT, a administração fiscal tem ao seu dispor a possibilidade de em cada ano proceder à análise interna (análise da declaração Modelo 22) e externa (análise de todos os documentos de suporte da contabilidade da empresa e na própria empresa) das empresas.

  7. No ano de 2000, aquando da apresentação da competente modelo 22, respeitante ao exercício de 1999, a administração fiscal teve possibilidade de proceder à inspecção ou interna ou externa daquele mesmo ano. O que não aconteceu.

  8. Quanto à questão do prazo de caducidade, o artigo 45.

    °, n° 1, da Lei Geral Tributária, preconiza o prazo de 4 anos, para a administração fiscal liquidar os tributos, referindo o seu n° 2, que aquele prazo passa a ser de 3 anos quando se trate de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo.

  9. Aprovada que foi a LGT em 17 de Dezembro de 1998, e conforme o artigo 5.

    °, do Decreto-Lei n° 398/98, de 17/12, o novo prazo de caducidade do direito à liquidação passou a ser aplicável a partir de 1 de Janeiro de 1998.

  10. A data de realização da escritura não é de todo relevante para efeitos de contagem do prazo de caducidade, mas, caso fosse relevante, que não é, a relevância seria do ano do exercício em que foi efectuada a escritura, isto é o ano de 2000.

  11. Apenas em 2004 a administração fiscal resolveu proceder à fiscalização externa da RECORRENTE AB, relativamente ao exercício de 2000.

  12. Por esse motivo, não estavam os Serviços em tempo, ou condições, de corrigir e liquidar o ano de 1999, pois este havia caducado em 31 de Dezembro de 2003.

  13. A liquidação adicional a ser efectuada teria de ser ao exercício de 1999, e esse exercício/liquidação estava, sem margem para dúvida, ferido de caducidade.

  14. Conforme opinião do Prof. Diogo Leite de Campos e da Dra. Mónica Horta Neves Leite de Campos, em "Direito Tributário", 1997, pág. 227, os juros compensatórios só serão devidos se a declaração de rendimentos não for entregue atempadamente ou não for entregue de todo.

  15. A declaração foi entregue, não tendo contudo apurado imposto a pagar.

  16. Não deviam ter sido aplicados juros compensatórios, em sede de liquidação adicional, pois a Impugnante-recorrente ao não apurar imposto a pagar teve, quando muito, apenas uma interpretação diferente, da Administração Fiscal, do conceito de encargo, Acórdão STA, de 16/03/1994, processo n° 16211.

  17. Não houve ilicitude ou uma actuação culposa por parte do contribuinte, que provocasse um retardamento da liquidação, pois a Impugnante-recorrente entregou atempadamente a sua declaração modelo 22, resultando apenas uma diferença de critérios quanto à qualificação de determinadas verbas como encargos.

  18. Porque não foi apurado imposto a pagar aquando da entrega da declaração modelo 22, não há lugar à aplicação de juros de mora, por falta de pagamento de imposto.

  19. Após a venda feita, a recorrente, vendedora dos prédios, continuou, como continua devedora dos montantes que foram pagos aos credores hipotecários pela compradora, o que foi verificado pelos Serviços de fiscalização tributária, pois o respectivo débito sempre se manteve na contabilidade da Impugnante-recorrente.

  20. A recorrente é totalmente alheia a qualquer negócio que tenha existido com referência aos créditos hipotecários que oneravam os seus prédios vendidos.

  21. SV, como investidora imobiliária, tinha interesse próprio em se substituir aos credores hipotecários pois não perdia o valor pago, pois o crédito iria manter-se e ficava com os prédios livres de hipotecas, podendo elaborar o seu projecto imobiliário, apresentá-lo na Banca e obter financiamento que não obteria se os prédios se mantivessem hipotecados.

  22. No negócio celebrado, convivem duas instituições jurídicas diversas — o direito de propriedade e o direito de substituir os credores que são instituições jurídicas de natureza diversa e inconfundível entre si e que podem conviver no mesmo negócio.

  23. AB e Ca., SA ficou devedora de SV dos montantes pagos por esta aos credores hipotecários para libertação das hipotecas..

  24. Do Relatório fiscal, dos factos dados por provados no processo e dos documentos juntos ao processo não resulta que o pagamento feito pela SV aos credores hipotecários seja ou tenha sido feito como obrigação acessória da venda dos prédios e com exoneração da recorrente no pagamento futuro desses créditos.

  25. A inexistência desta libertação de responsabilidades no pagamento por parte da recorrente, implica necessariamente a tributação de um rendimento que a sociedade AB e C.a, SA nunca recebeu, na medida em que não passa de um terceiro numa operação de transmissão de créditos que, por natureza, é celebrada entre o credor original e um novo credor, e a que a devedora é alheia, pois não tem que a autorizar nem tem que a aceitar.

  26. O pagamento das dívidas pela sociedade SV não exonerou a sociedade impugnante-recorrente AB e C.a, SA de solver tais dívidas, quer tal pagamento venha a ser feito a SV, à sociedade MTI Inc., ou, até, a outro qualquer terceiro a quem tal crédito seja transmitido ou tenha sido transmitido.

  27. O passivo da sociedade impugnante-recorrente AB e C.a SA resultante do distrate das hipotecas, mantém-se, bem como a obrigação do pagamento, não constituindo a transmissão dos créditos hipotecários, um qualquer lucro ou rendimento da sociedade impugnante-recorrente, pelo que não se pode enquadrar na tributação do "rendimento real", nem no conceito de "base do imposto" nos termos do disposto no artigo 3.° do Código de IRC, 28.

    Apesar das ilações da administração Tributária, colhidas pela sentença, nunca em momento algum do seu relatório é questionado o preço constante da escritura de compra e venda.

  28. Apesar da sentença dizer que estes factos foram dados por não provados, a verdade é que está provado no processo que foi a sociedade SV quem pagou as dívidas que oneravam os bens imóveis alienados, pelo que ficou, a partir de então credora da recorrente da importância de Esc. 315.789.489$00 (€1.575.151,34) cujo crédito cedeu à sociedade MTI Inc..

  29. Com referência ao preço do contrato, é sobre o preço real, acordado pelas partes e constante da declaração negocial, que incide qualquer tributação, nomeadamente IRC, na mesma terminologia utilizada pelo artigo 104.° n.°2 da Constituição da República Portuguesa.

  30. O valor patrimonial atribuído aos mesmos prédios pela própria administração fiscal decorrente da avaliação fiscal que fez após o negócio, (cujos documentos estão no processo) é manifestamente inferior ao preço que consta da referida escritura pública, no valor de Esc. 250.000.000$00 / € 1.246.994,70, e que corresponde ao preço concretamente acordado pelas partes no uso da sua liberdade contratual.

  31. Face à posição que a impugnante-recorrente teve, desde o início, de sempre confessar devedora dos valores dos créditos que foram hipotecários, se a Administração Tributária duvidasse do valor real dos prédios, (E NÃO TIVESSE ACEITE A PRÓPRIA AVALIAÇÃO QUE FEZ DESSES PRÉDIOS APÓS A SUA VENDA), sempre poderia e deveria ter procedido a nova e específica avaliação fiscal dos prédios, o que não fez porque sabe que o valor real dos prédios, era o valor patrimonial determinado pela Administração Tributária em 2001.

  32. O contribuinte só tem o ónus de provar a ilegitimidade do acto caso a Administração Tributária demonstre, previamente, que se mostravam verificados todos os pressupostos (vinculativos) do acto de liquidação adicional que levou a cabo.

  33. Incumbia à Administração Tributária, no caso vertente, o ónus da prova da existência do facto...

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