Acórdão nº 00126/12.8BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, em 11/03/2013, que julgou procedente a Oposição deduzida contra a execução fiscal n.º 1759200801051660, instaurada contra a firma “CNCC, Lda.”, para cobrança de dívidas respeitantes a IVA, relativas ao primeiro trimestre do ano de 2007, no valor de €6.781,75, revertida contra a oponente, MFJP, NIF 21xxx35, na qualidade de gerente e responsável subsidiária.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “A.

Julgou a Sentença recorrida procedente a oposição deduzida no processo de execução fiscal n.º 1759200801051660 e apensos, por dívidas de IVA, do ano de 2007, no montante global de €6,781,76, instaurado contra a originária devedora CNCC, LDA, NIPC 50xxx20, onde foi efectuada a reversão contra a oponente e aqui recorrida, considerando a douta sentença de que se recorre que a reversão deve ser extinta por não resultar provado nos autos que tenha exercido a gerência de facto da sociedade devedora originária, concluindo-se, pois, pela ilegitimidade na presente execução fiscal da gerência pela oponente/recorrida.

B.

Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito, por errada valoração dos elementos constantes dos autos de execução e deficiente análise crítica das provas que lhe cumpria conhecer, e consequente, erro na aplicação dos disposto nos art.º 74º da LGT e 342º do CC.

C.

A douta sentença considerou como assente a factualidade elencada no ponto III. nas alíneas A) a AG) do probatório.

D.

Porém, de molde a subsumir a situação real respigada dos autos à boa decisão da causa, o Probatório deverá ser corrigido de acordo com a verdade factual, ao abrigo do disposto no art. 712º, n.º 1 alíneas a) e b) do CPC, pois, não se concorda com a convicção do Tribunal, no que tange à factualidade dada como assente.

E.

Razão pela qual, entende a Fazenda Pública que, face aos elementos insertos nos autos, se deve corrigir o Probatório contemplando os seguintes factos: a. AH) Os documentos de fls. 168 a 170, 173 e 174, 175 e 176, foram juntos pela recorrida e não foi impugnada a assinatura da recorrida aposta nos mesmos; b. AI) A oponente assinou um contrato de leasing, cfr. depoimento da testemunha JJP; c. AF) No Relatório Inspectivo consta que a oponente foi nomeada gerente, vinculando-se a sociedade pela sua única assinatura.

F.

A douta sentença padece de erro de julgamento de facto que determinou a errada aplicação do direito, entendendo a FP que a acção de oposição deveria ser considerada improcedente, por provada a gerência de facto da oponente/recorrida.

G.

Decorre das diligências encetadas pelo OEF e dos elementos carreados para os autos, que se encontra devidamente documentada a gerência de facto da oponente consubstanciada nas declarações anuais, nas declarações modelo 10, nas declarações IES e nas declarações de rendimentos IRC – modelo 22, no campo (identificação do representante legal), onde a oponente se apresenta na qualidade de representante legal da devedora originária, referentes aos seguintes períodos de tributação: a. Declaração anual do ano de 2005, apresentada em 2006.06.27, cfr. FLS. 74 do PEF junto aos autos; b. IES do ano de 2006, apresentada em 2007.09.11, cfr. Fls. 75 do PEF junto aos autos; c. Declaração modelo 10 do ano de 2005, apresentada em 2006.02.27, cfr. Fls. 73 do PEF junto aos autos; d. Declaração modelo 22 do ano de 2006, apresentada em 2006.05.31, cfr. Fls. 76 do PEF junto aos autos; e. Declaração modelo 10 do ano de 2006, apresentada em 2007.03.19, cfr. Fls. 77 do PEF junto aos autor; f. Declaração modelo 10 do ano de 2007, apresentada em 2008.02.29, cfr. Fls. 78 do PEF junto aos autos; g. Declaração modelo 10 do ano de 2008, apresentada em 2009.02.25, cfr. Fls. 79 do PEF junto aos autos; h. IES do ano de 2008, apresentada em 2009.07.10, cfr. Fls. 80 do PEF junto aos autos; i. IES do ano de 2009, apresentada em 2010.07.07, cfr. Fls. 81 do PEF junto aos autos; j. IES do ano de 2010, apresentada em 2011.09.01, cfr. Fls. 82 do PEF junto aos autos.

H.

Ademais, a oponente apôs a sua assinatura na declaração de inscrição de início de actividade, cfr. fls. 72 do PEF junto aos autos, bem como no documento de abertura de conta do banco BES e no contrato de leasing, cfr. depoimento da testemunha JJP.

I.

Verificou-se que, a oponente se encontrava inscrita na Segurança Social, no período a que respeitam as dívidas, tendo sido entregues declarações de remunerações na qualidade de Membro de Órgão Estatutário (MOE), cfr. documento enviado pelo Instituto da Segurança Social, cfr. fls. 71 do PEF junto aos autos; J.

Partindo, pois, do pressuposto que quem se arroga perante uma entidade – Segurança Social – uma determinada qualidade e cargo e consta na folha de remunerações nessa sobredita qualidade e cargo, é por demais evidente que exerceu, no aludido período, as funções para as quais se encontrava legalmente habilitada.

K.

Salienta-se que, os documentos de fls. 168 a 170, 173 e 174, 175 e 176, foram juntos pela oponente, não tendo sido impugnada a assinatura aposta nos mesmos pela recorrida, e por conseguinte firmaram-se como genuínos.

L.

Ora, atendendo a essas circunstâncias, o depoimento prestado pela testemunha JJP, no qual declara que foi o próprio a assinar esses documentos, não é coerente e coincidente com a posição assumida pela recorrida, uma vez que a mesma não pôs em causa a sua genuinidade, pelo que se entende que não deveria ter sido valorado positivamente pelo douto Tribunal.

M.

De notar que, do confronto do documento a fls. 178 dos autos, referente ao extracto de conta do Banco Popular, com o depoimento da testemunha JJP, verifica-se que foram requisitados dez cheques, em 18.06.09, período em que a testemunha já era gerente de direito da devedora originária, pelo que somente se pode inferir que esses cheques foram assinados pela testemunha porquanto era ele o gerente de direito à data desses factos.

N.

No que concerne à conta do BES em nome da devedora originária, ficou demonstrado que foi a recorrida quem procedeu à sua abertura, mas não foi afastada a presunção natural de que era a recorrida a movimentar tal conta, uma vez que não ficou provado o alegado no ponto 16º da p.i. de que os cheques eram rubricados pelo JJP, conforme ficou estabelecido na ficha de assinaturas em arquivo na agência bancária.

O.

Por outro lado, não se compreende o facto de não ter sido valorado positivamente a confissão dessa testemunha na assinatura aposta pela recorrida num contrato de leasing.

P.

Para além dos indícios respeitantes à gerência de facto supra descritos, bem fundados, impõe-se que não descuremos que a recorrida constava como única sócia gerente na CRC, constituindo a forma de obrigar a sociedade mediante a sua assinatura, e consequentemente, os destinos da originária devedora dependiam exclusivamente da sua intervenção, sob pena de paralisação da mesma, neste sentido se pronunciou o Acórdão do TCASul, de 27-07-2007, proc. 01953/07.

Q.

Assim sendo, relevante para a decisão da questão é a forma de obrigar da sociedade. Ora, como vem provado, a sociedade obrigava-se com a assinatura da oponente, que tinha necessariamente que assinar os documentos relativos ao giro comercial da sociedade.

R.

Daqui decorre que a oponente tinha uma intervenção pessoal e activa na vinculação da sociedade, ou seja, a viabilidade funcional da devedora originária só era concretizada com a intervenção da oponente, designadamente na aposição da sua assinatura nos documentos para abertura de uma conta na BES como a mesma assume no ponto 16º da p.i., no contrato de leasing assumido pela testemunha JJP, bem como dos restantes indícios acima expostos, o que se subsume integralmente à noção de gerência de facto.

S.

De referir que sendo a recorrida também gerente de outra sociedade (“A RPP, Lda”), estava consciente da realidade empresarial, com as suas inerentes responsabilidades e obrigações perante terceiros, mediante o exercício de actos que, bem sabia, vinculavam a sociedade.

T.

Deste modo, é irrelevante que todos os restantes actos típicos da gerência sejam praticados por terceira pessoa (seu irmão), em sentido idêntico se pronunciou o acórdão do TCASul de 09-10-2007, proc. 01953/07.

U.

É mister concluir que a oponente detinha o controlo do destino da originária devedora pelo exercício de facto do cargo para o qual se encontrava nomeada.

V.

Por outro lado, as dívidas ao Fisco do ano de 2007, reportam-se a um período anterior ao da renúncia da oponente datada de 03.11.2008, tanto a constituição das dívidas bem como a respectiva data de vencimento (2008.10.06).

W.

Desta forma, para que se verifique a gerência de facto é indispensável que o gerente use, efectivamente, dos respectivos poderes, que seja um órgão actuante da sociedade, tomando as deliberações consentidas pelo facto, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros – Rúben Anjos de Carvalho - Francisco Rodrigues Pardal, Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado e Comentado, 2ª Edição, Coimbra, 1969, pág. 139.

X.

Sendo certo que a gerência não tem de ser exercida de forma ampla nem de modo continuado, bastando-se com a prática de algum acto que por si só seja revelador da externação da vontade da sociedade que o seu autor legalmente representa.

Y.

Ora, como vimos e vem abundantemente demonstrado nos autos de execução, e por conseguinte, a Administração Tributária logrou fazer prova de...

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