Acórdão nº 01426/05.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório HQB, Lda., contribuinte fiscal n.º 50xxx92, com sede em Rua M…, Santa Maria de Lamas, Santa Maria da Feira, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 11/06/2014, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as seguintes liquidações adicionais de IVA:[imagem que aqui se dá por reproduzida]A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “- A Administração Tributária tomou a iniciativa de em procedimento de inspecção tributária alheando-o por completo da realidade que representava a impugnante, da sua organização empresarial, da sua estrutura económico-financeira, da sua representatividade no meio industrial de transformação de produtos de cortiça e, - Reconduziu a sua actuação àquilo que de errado se passava nos seus fornecedores (ECC e CV), extrapolando para a impugnante os eventuais vícios e irregularidades verificados naqueles… - No caso em apreço, a impugnante logrou provar a subsistência das transacções, - Que, face aos elementos probatórios dos autos, o M° Juiz as deveria ter relevado como verdadeiras, julgando a procedência da impugnação in totum, - Mesmo que assim não o entendesse, em obediência aos princípios orientadores do ordenamento jurídico, o constitucional e, neste caso particular, o tributário, os da igualdade, da legalidade, da imparcialidade, da boa-fé, e, em especial, o consagrado no n°1, do artigo 100º do CPPT, a decisão deveria contemplar a procedência total da pretensão da impugnante.

Termos em que, Concedendo-se provimento ao recurso, Deve a decisão em recurso ser revogada, anulando a liquidação do IVA referente aos exercícios de 2001 e 2002, incluindo os juros compensatórios. JUSTIÇA.”*A Recorrida não contra-alegou.

*O Ministério Público junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.

*Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

*II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar estarem verificados os pressupostos legais que legitimam a actuação da AT em recusar o direito à dedução de IVA por existência de “facturação falsa”.

*III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: «3. Fundamentação 3.1 Matéria de facto dada como provada.

Com base nos documentos junto aos autos e no processo administrativo (PA) apenso considera-se provada a seguinte matéria de facto, com relevância para a decisão: 1. A sociedade impugnante, “HQB, Lda.” foi constituída em 31-1-2000 para o exercício da actividade de “comércio, indústria, importação e exportação de produtos de cortiça” - fls. 317 e 318 do PA; 2. Em 31/5/2004, em Relatório homologado por despacho de 22/6/2004, a AT concluiu que as sociedades “ECC, Lda.” e “CV, Lda.” são simultaneamente utilizadores e emitentes de facturas falsas e que tal informação deve ser tida em conta a fim de documentar processos de eventuais utilizadores – fl. 42 a 51 do PA; 3. Ao abrigo da ordem de serviço nº 36362, de 4 de Junho de 2004, decorreu acção de inspecção entre 28-6-2004 e 8-11-2004, a cargo da Direcção de Finanças de Aveiro, na qual foram efectuadas correcções ao IRC e IVA dos anos de 2001 e 2002, conforme consta do Relatório Final datado de 9-12-2004 – fls. 27 a 424 do PA; 4. A informação referida em 2 supra foi notificada à agora Impugnante juntamente com o Projecto de Relatório – fls. 29 do PA; 5. As correcções efectuadas em sede de IVA foram calculadas com base em métodos de avaliação “meramente aritmética resultante de imposição legal” e as correcções à matéria tributável do IRC foram efectuadas “com recurso a métodos indirectos” de avaliação – quadro de fls. 103- vº do PA; 6. Do ponto III. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável do Relatório extracta-se o seguinte: “ III.2 SITUAÇÃO DE FACTO Neste ponto passamos a descrever alguns procedimentos levados a efeito para a obtenção de todos os dados por nós considerados relevantes para o desenvolvimento do processo.

De resto, estabelece o artigo 6° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), o procedimento de inspecção visa "a descoberta da verdade material, devendo a administração tributária adoptar oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objectivo".

Nesse sentido e dando cumprimento ao artigo 44° do RCPIT foi recolhida toda a informação disponível sobre este sujeito passivo objecto de inspecção e outros obrigados tributários com o qual este tenha tido relações económicas.

Daí que, no âmbito do processo de averiguações em curso, à facturação falsa no sector da cortiça, emissão e utilização (processo esse com origem no cruzamento de informações de outros processos de inspecção tributária e na informação solicitada ao núcleo de informática da D.S.E.P.C.P.LT. onde se procedeu ao cruzamento das declarações anuais de diversos sujeitos passivos — Anexos O e P), se tenha previamente: -Notificado a sociedade "HQB", em 9 de Maio de 2003, na pessoa do seu gerente, Senhor QCB, no sentido desta nos remeter fotocópias das Facturas, Guias de Remessa, Guias de Transporte, Talões de Pesagem, Extractos de Conta Corrente e comprovativo dos meios de pagamento, relativos aos fornecedores identificados nessa mesma notificação.

(…) Em resultado do trabalho prévio acima aludido, v.g. da análise da resposta à nossa notificação pessoal, datada de 9 de Maio de 2003, constatamos que a sociedade "HQB" nos exercícios de 2001 e 2002, declarou ter realizado transacções com fornecedores constantes da aludida notificação, a saber: 1. ECC, Lda — NIPC: 50xxx15, (Exercícios de 2001 e 2002); 2. CV, Lda — NIPC: 50xxx63, (Exercício de 2002).

Da análise documental efectuada, já no decurso do procedimento de inspecção, à contabilidade do Sujeito Passivo, relativa aos exercícios de 2000, 2001 e 2002, verificamos que este contabilizou as seguintes facturas dos aludidos fornecedores (facturas das quais foram retirados os respectivos duplicados), a saber: ECC, Lda — NIPC: 50xxx15 Exercício de 2001[imagem que aqui se dá por reproduzida]Nota: Estas são as facturas que se encontram efectivamente registadas na contabilidade da empresa "HQB".

No entanto, do relatório de inspecção efectuado à empresa "CV, Lda", verifica-se que terá ficado por registar a factura nº 1-667 datada de 9 de Outubro de 2001, no valor de 19.649.000$00 acrescido de 3.340.330$00 de IVA.

Não deixa de ser um pouco estranho, o facto da empresa "HQB" ter deixado de contabilizar uma factura de valor bem significativo, ter prescindido do direito à dedução de 3.340.330$00 de IVA, para além da consequente omissão à componente "Compras de Mercadorias", quando a empresa emitente, CV, Lda", a registou na sua contabilidade.

Em relação aos fornecedores em questão importa informar: III.2.1 INDÍCIOS DE OPERAÇÕES FICTÍCIAS — JUNTO DOS EMITENTES Aquando do envio do Projecto de Conclusões do Relatório de Inspecção, juntou-se informação elaborada na sequência dos procedimentos de inspecção levados a efeito às sociedades CV e ECC, empresas dos mesmos sócios, onde se prova que estas sociedades estão indiciadas no crime de fraude fiscal pela utilização e emissão de "Facturas Falsas", e cujos pontos mais significativos passamos a descrever: - Prática continuada de crimes fiscais perpetrados pelos gerentes das sociedades acima identificadas; - As compras registadas pelas sociedades ECC e CV nos anos de 1999 a 2002 são, na sua quase totalidade, suportadas por facturas falsas; - Confrontado com o facto da quase totalidade das compras registadas estarem suportadas por facturas timbradas em nome de "pseudo-fornecedores", o mesmo respondeu que tem a noção de que foi enganado, o que não acreditamos, pelo facto de todos eles serem já bem conhecidos no meio há bastantes anos; - Questionado acerca da possibilidade de nos identificar os "fornecedores reais", o mesmo não identificou nenhum fornecedor; - Todas as compras suportadas por este tipo de facturas eram pagas sempre em dinheiro, apesar dos elevadíssimos montantes envolvidos; - Após o inicio do procedimento de inspecção a estas empresas, o qual durou quase um ano, não mais se registaram movimentos de entradas e/ou saídas de carros carregados com cortiça ou produtos derivados, o que evidencia bem o tipo de actividade que estas empresas desenvolviam efectivamente.

III.2.2 INDÍCIOS DE OPERAÇÕES FICTÍCIAS — JUNTO DO UTILIZADOR III.2.2.1 - ANÁLISE QUALITATIVA DAS AQUISIÇÕES EFECTUADAS À ECC E CV Como atrás já foi referido a "HQB" contabilizou nos exercícios de 2001 e 2002, diversas facturas das sociedades ECC e CV.

A saber:[imagem que aqui se dá por reproduzida]Analisadas em pormenor as compras efectuadas pela "HQB" às empresas ECC e CV, salientamos que as mesmas são essencialmente rolhas de qualidade Extra/Superior/1° e cortiça de boa qualidade.

Estas aquisições são no mínimo muito estranhas, na medida em que: - Nas conclusões dos procedimentos de inspecção levados a efeito àquelas sociedades, podemos ler (e segundo declarações de um funcionário com a categoria profissional de Torneiro Mecânico) entre outras coisas que: "...nestas instalações - da CV e ECC - basicamente entram rolhas das qualidades 5°s e 6°s, trazidas pelos clientes das firmas, destinadas a serem colmatadas nestas instalações. Há mais de 10 anos que não dão entrada nestas instalações nem se, produzem rolhas extras, superiores, 1º, 2° ou 3°. Mais disse, que há muitos anos, que não entram nas instalações destas firmas, fardos de cortiça ou cortiça a granel...

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