Acórdão nº 01947/11.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | Luís Migueis Garcia |
Data da Resolução | 03 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: ACCM (Praça C…, 4050-453 Porto) interpõe recurso jurisdicional na presente acção administrativa comum intentada contra o Ministério da Justiça (Praça do Comércio, 1149-019 Lisboa) e Instituto dos registos e Notariado, I. P.
(Avª 5 de Outubro, n.º 202, 1064-803 Lisboa).
*A recorrente conclui: 1. Pelas razões no texto em pormenor explicitadas, deve aditar-se ao elenco factual constante da decisão recorrida, uma al. J) 1, em que se diga: A A. intentou acção administrativa especial com vista à condenação do ali e aqui 1º Réu na prática do acto administrativo de atribuição da licença para instalação do novo cartório notarial de A..... à A. e à anulação do acto administrativo a que se refere a al. H).
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Como deve alterar-se a al. K) para aí se passar a começar por dizer: A Licenciada OS não procedeu à instalação do cartório notarial no prazo de 90 dias a contar da atribuição da licença, nem tomou posse do cartório, e, no prazo da contestação à acção referida em J) 1, foi deliberado pelo júri do concurso, o seguinte: (fls 240 a 244 do PA (…) … 3. Pelas razões no texto em pormenor explicitadas, deve alterar-se a al. L) do elenco factual da sentença recorrida, para aí se dizer: A deliberação do júri foi homologada por Despacho do Secretário de Estado da Justiça de 14706/2009, tendo a Autora em 23/06/2009 que lhe fosse atribuída a licença de A..... (novo cartório). (fls. 244 e 246 do PA).
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Pelas razões no texto em pormenor explicitadas, deve aditar-se ao elenco factual constante da decisão recorrida, uma al. T), em que se diga: Por força dos mecanismos do cartório deficitário e da prestação de reequilíbrio, a Ordem dos Notários pagava, mensalmente, em 2008 e 2009, aos titulares dos cartórios nessas circunstâncias, uma importância a apurar trimestralmente, correspondente à diferença entre o valor da facturação e a de 7.750,00 €..
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Como deve aditar-se-lhe uma al. U), em que se diga: Em 2008 e 2009, a média das despesas de funcionamento de dois cartórios notariais que abriram ao público no ano de 2008 foram, num caso, entre 2.500,00 € e 3.000,00 €, e, no outro, entre 3.000,00 € e 3.500,00 €.
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O que, tudo, pode fazer esse Tribunal Central Administrativo Norte, nos termos do art. 662º, nº 1, do CPC, aplicável por força do art. 1º do CPTA.
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Um procedimento concursal, cujos resultados estão sujeitos a publicação obrigatória não pode considerar-se findo antes de se verificar a publicação desses resultados, pois até aí são os mesmos ineficazes, nos termos do art. 130º do CPA.
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Pelo que é válida a desistência apresentada depois de conhecidos esses resultados, mas antes de verificada essa publicação.
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A renúncia a direitos pode ser tácita, desde que decorra de actos que com toda a probabilidade a exprimam, nos termos do art. 217º do CC.
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Quer a desistência, quer a denúncia, implicam a perda do direito em causa, nos termos do art. 110º do CPA.
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Mas o que uma declaração de desistência quando apresentada depois de conhecido que foi atribuída uma licença para um cartório notarial à declarante, sempre significa é que não pretende prevalecer-se dessa licença. Logo, que, voluntariamente, a perde. E, logo, que não irá a declarante tomar posse do cartório a que respeita essa licença. Isto, se interpretada a declaração como o faria um declaratário normal e é assim que tem de ser, nos termos do art. 236º do CC.
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Assim sendo, como é, no caso, em Maio de 2008, quando a desistência foi apresentada e, seguramente, em Julho de 2008 quando, pela primeira vez, os RR. decidiram não considerar válida a desistência, declarar caduca a licença atribuída, considerar prejudicado o requerimento da A. e sujeitar a licença a novo concurso – cfr. al. F) do elenco factual da sentença recorrida - estavam em condições de fazer diferente e correctamente.
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Como o estavam quando, em Novembro de 2008, praticaram novo acto, errado de todas e cada uma das mesmas maneiras – cfr. al. H) do elenco factual da sentença recorrida.
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E como o estavam quando, finalmente, em 19 de Novembro de 2008 - de forma diametralmente oposta e agora correctamente – decidiram atribuir a licença perdida à A. – cfr. al. K) do elenco factual da sentença recorrida.
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Como o impõe o art. 40º, nº 3, do EN e como aí não deixa de se dizer.
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Sendo que esse acto, praticado no decurso do prazo para a contestação de acção administrativa interposta com vista à anulação do anterior, tem o sentido de revogação deste, nos termos do art. 141º, nº 1, do CPA e, logo, tem eficácia retroactiva nos termos do art. 145º, nº 2, do CPA e, por equivaler a anulação judicial, obriga à reconstituição da situação que existira não fosse o acto revogado, nos termos do art. 173º do CPTA.
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Por tudo o que, efectivamente, deve considerar-se para todos os efeitos que a A. tomou posse do novo Cartório Notarial de A..... em 29/9/2008, que é a data limite para tomada de posse do mesmo se nada de anormal se tivesse passado e tivesse sido logo atribuída à A. a respectiva licença.
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Pelo que devem os RR. ser condenados no pedido formulado sob a al. A) da p. i.. 19. E pelo que, decidindo em contrário, violou a sentença recorrida, os arts. 110º, 141º, nº 1 e 145º, nº 2, do CPA, os arts. 217º e 236º do CC, mas, sobretudo, o art. 40º, nº 3, do EN.
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Diz a sentença recorrida que a data a que deveriam os RR. ser condenados a ver retroagir a antiguidade da A. seria antes a de 30/11/2008 por ser a data até à qual poderia a Notária OS tomar posse do Cartório cuja licença lhe fora atribuída e que haveria sempre que aguardar pelo decurso desse prazo por só então se verificar a caducidade da licença ou, no rigor das coisas seria, antes, a de 30 de Março de 2009, pois sempre teria a A. ao seu dispor, um prazo de 90 dias úteis para instalar o cartório, nos termos do art. 37º, nº 1, do EN.
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Mas, quanto à primeira data, já se viu que não haveria que aguardar pelo prazo de tomada de posse da Notária OS, que já se sabia que não ia acontecer e quanto à segunda, se aquele prazo do art. 37º, nº 1, do EN é estabelecido a favor do notário e, no caso, sabendo-se, como se sabe, que a A. já há muito e por várias vezes requerera lhe fosse atribuída a licença do cartório de A....., essa nunca usaria esse prazo e, de imediato, instalaria o Cartório.
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Mas, de todo o modo, o único argumento que conduziu o Senhor Juiz a não determinar qualquer retroacção foi apenas e só ter entendido que o não poderia fazer porque isso seria condenar em objecto diverso do pedido.
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Mas a verdade é que seria condenar em menos do que o pedido, mas no mesmo objecto, pois se o que se pediu foi a retroacção de um determinado efeito jurídico a uma determinada data, se o Juiz o declarar quanto a uma data que lhe é posterior, está, naturalmente, a condenar no mesmo objecto do que se pediu, mas em termos inferiores ao que se pediu.
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Assim, poderia perfeitamente o Senhor Juiz a quo ter feito o que quereria ter feito, nos termos do art. 661º, nº1, do CPC, aplicável por remissão do art. 1º do CPTA.
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Pelo que, decidindo em contrário, violou a sentença recorrida, o art. 661º, nº 1, do CPC, aplicável por remissão do art. 1º do CPTA.
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Diz-se na sentença recorrida que a A. só teve os prejuízos que teve porque foi incauta, que, se fosse prudente, deveria ter tomado posse no Cartório de F....., e que não tinha razão para confiar que lhe viesse a ser atribuído o Cartório de A......
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Ora, a prudência, ao contrário do afirmado pelo Senhor Juiz a quo, não só não aconselhava a A. a tomar posse do Cartório de F....., como a impedia de o fazer, pela simples razão de que, se o fizesse a A., teria que manter esse Cartório em funcionamento durante um período mínimo de 2 anos, nos termos do art. 35º do EON.
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E tanto tinha a A. razão para confiar que lhe viesse a ser atribuído o novo Cartório Notarial de A..... que isso veio efectivamente a acontecer e agora quer os RR, quer o Senhor Juiz a quo reconhecem que o direito assim o impunha.
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A A. não tinha efectivamente alternativa. Se tomasse posse do Cartório de Vila Nova de F..... tinha que manter esse cartório em funcionamento pelo menos 2 anos, o que o mesmo é dizer que, então, se viesse a ser-lhe reconhecido o direito de tomar posse do de A..... – como estava convicta viria a acontecer, e como veio – já nunca o poderia fazer.
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Pelo que esperou a A. até ao último momento possível para fazer as despesas que fez – o quase termo do prazo para a tomada de posse em F....., já com prorrogação desse prazo, que, ainda assim, solicitou - e para, ao menos, não perder uma e outra das licenças, a que lhe fora atribuída e a que, antes, queria e tinha esperança lhe viesse a ser atribuída, sendo que, efectivamente, veio.
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Logo, não sofreu a A. os prejuízos cuja indemnização reclama porque os quis sofrer, mas, antes, porque os RR. apenas muito tarde lhe reconhecerem o seu direito. impôs que os sofresse.
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Ou seja, tivessem os RR. atempadamente feito o que mais tarde reconheceram que teriam que ter feito – e acabaram por fazer – não teria a A. sofrido esses prejuízos.
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Pelo que o comportamento dos RR. é causa adequada dos prejuízos da A., nos termos e para os efeitos do art. 563º do CC.
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E pelo que, decidindo em contrário, violou a sentença recorrida, o art. 35º, nº 3, do EN e o art. 563º do CC.
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Não colhendo nenhum dos argumentos da sentença recorrida, a verdade é que o reconhecimento do direito da A. a ver a sua posse do novo Cartório Notarial de A..... retroagir a 29/9/2008, nos termos em que foi formulado, é válido pedido a ser feito em acção administrativa comum, nos termos do art. 37º, nº 2, als. a), c) e d), do CPTA aplicável.
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No caso, o direito da A. resulta do facto de os RR., no prazo de contestação de acção destinada, além do mais, à anulação de acto ilegal de sujeição a novo concurso de licença deixada vaga por aquela a quem havia sido atribuída, reconhecerem essa ilegalidade e, nos termos do art. 141º, nº 1...
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