Acórdão nº 00532/14.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução26 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório J. F. M. S. F., CF (…), residente na Rua (…) M., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 18/12/2018, que julgou improcedente a oposição deduzida à execução fiscal, revertida contra si e inicialmente instaurada à sociedade “A. – F. . T., V. . C., S.A.”, relativamente a dívidas de IRS e IVA, no valor de €5.231,61.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

  1. O presente recurso tem por objeto a sentença proferida pelo TAF do Porto, de 18.12.2018, que julgou improcedente a oposição à execução fiscal, na qual se pugnou pela extinção quanto a ela do processo de execução fiscal n.º 359021001036700 e apenso, instaurado pelo Serviço de Finanças de V. N. . F. 2, para cobrança coerciva de dívidas de IRS, relativo ao período de 2010 e IVA, respeitante ao período de 2010/05, cuja quantia exequenda ascendia a € 5.231,61, por dívidas da responsabilidade da sociedade A..

  2. O Tribunal a quo considerou o referido despacho de reversão devidamente fundamentado e perfeitamente percetível, determinando a improcedência do alegado pela Recorrente quanto à fundamentação do mesmo, C) tendo ainda considerado que não foi carreada para os autos prova da inexistência de culpa sua no que à presumível insuficiência patrimonial do devedor principal concerne, D) tendo decidido a questão contra a ora Recorrente, condenando-a.

  3. A sentença de que ora se recorre padece de diversos vícios que determinam a sua revogação.

  4. Em primeiro lugar, a sentença labora em erro de julgamento, ao considerar que não foi produzida prova suficiente para afastar a culpa da Recorrente na insuficiência do património para pagamento das dívidas, G) o qual é cometido pela inobservância de cuidado na apreciação da prova levada a julgamento, quer documental quer testemunhal.

  5. No que respeita à prova documental, foi junto aos autos (através do Documento n.º 3 da petição inicial) o extrato da conta denominada “J. M. S. F.”, no qual se encontram listados uma série de movimentos respeitantes ao ano de 2010 e consta um saldo de € 24.953,71.

  6. Contudo, apenas foi incluído na matéria de facto dada como provada o empréstimo de € 332,72, que tem como descritivo “empréstimo de J.”.

  7. Entende a Recorrente que da análise do documento em questão decorre, desde logo, que foram efetuados diversos empréstimos pela Recorrente à sociedade e que esses atos revelam diligência e sentido de compromisso.

  8. Por essa razão, deve a matéria de facto ser alterada, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 662.º do CPC aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, no ponto relativo aos factos dados como provados, aí se incluindo todos os montantes emprestados pela Recorrente, por esses factos resultarem provados do referido Documento n.º 3 da petição inicial.

  9. Sobre a inexistência de culpa da Recorrente, foi unânime no testemunho de ambas as testemunhas inquiridas, que o facto de terem saído dois dos administradores da sociedade, os quais constituíram novas sociedades com o mesmo objeto, foi um fator determinante na forte quebra das vendas da devedora originária, derivada da concorrência particularmente intensa.

  10. A acrescer à prova documental junta, resulta também desses testemunhos que a administração da sociedade, onde se incluía a Recorrente, teve de injetar capitais próprios na sociedade.

  11. Ora, é patente que a Recorrente, ao conceder empréstimos à devedora originária, num momento em que a mesma enfrentava dificuldades, o crédito da Recorrente poderia, com elevadíssima probabilidade, não vir a ser ressarcido pelo que, O) a Recorrente foi além do que lhe seria exigível enquanto administradora, assumindo riscos para o seu património pessoal, tudo no interesse e tendo em vista a recuperação da sociedade devedora.

  12. Contudo, apesar de o Tribunal ter dado esses factos como provados, não concluiu pela não comprovação da inexistência de culpa na alegada insuficiência do património, o que não é aceitável.

  13. O erro de julgamento também se verifica na apreciação da prova da alegada insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária para assegurar o pagamento da dívida.

  14. A Recorrente alegou na oposição que o despacho não se encontrava devidamente fundamentado a este respeito, designadamente por nada referir quanto à alegada insuficiência do património da devedora originária.

  15. O Tribunal a quo entendeu que se encontrava perfeitamente percetível e auxiliou-se do Acórdão proferido pelo STA, no recurso n.º 0458/13, nos termos do qual a fundamentação se basta com a simples alegação dos pressupostos e com referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária.

  16. Conforme se pode verificar, no despacho de reversão é apenas feita a seguinte referência “(…) Insuficiência de bens da devedora originária (art.º 23.º/2 e 3 da LGT): decorrente de situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal”.

  17. Ou seja, não foi determinada a medida da insuficiência de bens da devedora. Cabia à AT identificar quais os bens que existiam e o valor dos mesmos, de modo a que fosse possível se compreender a insuficiência e confirmando-se, a apenas se reverter a parte da dívida que não podia ser respondida por esses bens.

  18. Sobre esta necessidade de comprovação da insuficiência de bens pronunciou-se o TCA Norte, em 21.12.2017, no âmbito do recurso n.º 00361/14.4BEVIS, tendo aludido ao Ofício Circulado n.º 60043/2005, de 25 de janeiro, da Direção de Serviços de Justiça Tributária, o qual asseverou que “(…) não é o facto de ter sido declarada insolvente que permite concluir, sem mais, ser manifesta a insuficiência patrimonial da devedora originária para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido”.

  19. Nesse mesmo Aresto foi referido que “No caso em apreço, a Administração Tributária nem sequer identifica os bens que integram o património da sociedade devedora originária, o que só por si impossibilita a formulação de qualquer juízo fundado acerca da insuficiência desses bens para assegurar o pagamento da dívida exequenda revertida, cujo montante ascende a 1.968,72 €, tão pouco quantifica o valor desses bens.

    É certo que tais bens poderão vir a revelar-se, em concreto, insuficientes para assegurar o pagamento da dívida exequenda, no entanto, cabia ao órgão de execução fiscal demonstrá-lo, o que no caso não fez”.

  20. Mais foi estabelecido que – embora no caso dos nossos autos nem essa afirmação tenha incluído no despacho – “Dizer apenas que têm um “valor reduzido” não permite ao revertido saber com segurança se o valor atribuído é adequado e proporcional aos bens existentes, assim como saber qual a previsível extensão da sua responsabilidade. Havendo veículos penhoráveis impõe-se em primeiro lugar proceder à penhora, lavrando-se o respectivo auto com indicação do estado de conservação e do valor estimado (cfr. al. c) do artigo 221º do CPPT). A circunstância de um técnico lhe atribuir uma “valor reduzido” nem é impeditiva da penhora nem da quantificação desse valor, uma vez que se pode prognosticar a possibilidade de alienação dos veículos ou dos seus componentes, ainda que seja com destino à sucata. Mesmo com este destino, são bens redutíveis a um valor pecuniário que precisa de ser estimado para efeitos de determinar o quantum de responsabilidade do devedor subsidiário” (sublinhado nosso).

  21. Em face de tal entendimento, não tendo a AT clarificado a medida da insuficiência dos bens, a reversão afigura-se ilegal, não apenas por ter a AT incumprido o ónus de prova que sobre si recaía no que àquele pressuposto diz respeito, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 23.º da LGT e no n.º 2 do artigo 153.º do CPPT, Z) como ainda por ter sido fundamentado de forma insuficiente o despacho de reversão, em desrespeito pelo disposto no n.º 1 do artigo 77.º da LGT e do n.º 3 do artigo 268.º da CRP.

    A

  22. O Tribunal a quo, ao não ter entendido neste sentido laborou em erro de julgamento, pois que apesar de, do ponto de vista dos requisitos formais do despacho de reversão, o mesmo se encontrar fundamentado pela alegação da insuficiência de bens, BB) esta teria de, inevitavelmente, concretizar a medida da insuficiência, nem que não fosse, em sede de contestação à oposição deduzida, o que não ocorreu.

    CC) Assim, nenhum dos factos dados como provados pela sentença permite sustentar o sentido da decisão tomada pelo Tribunal a quo (designadamente, que se encontram verificados os pressupostos legais de que depende a reversão) pelo que, a mesma deve ser revogada.

    DD) Deste modo, deve a matéria de facto ser alterada, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 662.º do CPC aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, no ponto relativo aos factos dados como não provados, neste se incluindo a questão da ausência de prova da insuficiência do património da A., por não ter este facto resultado como provado destes autos.

    EE) Em suma, a sentença proferida pelo Tribunal a quo deve ser revogada e substituída por decisão que julgue procedente a oposição deduzida com as demais consequências legais.

    Termos em que deve a sentença ser revogada e substituída por outra que declare procedente a oposição apresentada, com as demais consequências legais, assim se fazendo inteira e acostumada justiça.

    ****A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    ****O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.

    ****Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    ****II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo...

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