Acórdão nº 01906/13.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução13 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública do Norte (…) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que julgou totalmente improcedente acção intentada em representação da sua associada M. F. A. S. contra Escola Superior de Enfermagem (…).

O recorrente conclui: I. A boa gestão de recursos e a natureza prioritária do processo disciplinar, não podem justificar a prática de atos processuais por uma Instrutora, que se encontra sob suspeita num processo disciplinar suspenso.

  1. Tendo a Instrutora eleito o correio eletrónico como instrumento de notificação, sempre camuflando o seu endereço com as designações "S. G." ou "S. G. (IGEC)", usando sucessivamente o endereço --@ig.mctes.pt e x.x@igec.mec.pt, sem dar conta que o e-mail --@ig.mctes.pt havia sido eliminado, inquina o ato sancionatório de nulidade por violação do princípio da boa-fé nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA, ex vi do n.º 2 do artigo 266.º da CRP e artigo 6.º-A do CPA.

  2. Não é espetàvel que a arguida se apercebesse da eliminação do endereço de correio da Instrutora, dado que ambos os endereços utilizados pela Instrutora sempre foram utilizados de forma camuflada e não lhe havia sido comunicada a eliminação de um dos endereços de correio eletrónico utilizados pela Instrutora.

  3. O arguido em processo disciplinar pode não apresentar na sua contestação toda a sua defesa, tanto mais, dada a natureza sensível dos factos (assédio) que a trabalhadora pretendia suscitar na inquirição de algumas das testemunhas que arrolou.

  4. Estando vedado à Instrutora o conhecimento da lógica da organização da defesa, a inquirição de testemunhas num processo suspenso não pode relevar de mera irregularidade.

  5. Outrossim, da maneira descrita a Instrutora inquina o ato decisor de nulidade, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA, por violação do direito fundamental da trabalhadora Maria de Fátima a um processo imparcial, consagrado no n.

    º 10 do artigo 32.º e n.º 2 do artigo 266.º da CRP.

  6. Constitui erro notório na apreciação da prova pelo tribunal a quo a ligação de um e-mail à participação disciplinar para justificar a não prescrição do procedimento disciplinar, quando existem fundadas dúvidas sobre a autoria daquela comunicação eletrónica, VIII. O que, com a devida vénia, se vive nos presentes autos Sem contra-alegações.

    *O Exmº Procurador-Geral Adjunto foi notificado nos termos do art.º 146º do CPTA, não tendo emitido parecer.

    *Dispensando vistos, cumpre decidir.

    *Os factos, fixados como provados na decisão recorrida: 1. Em 7/11/2011, foi efetuada uma “Participação” pelo Presidente da Escola Superior de Enfermagem do P..., nos termos do art.º 40.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que exercem Funções Públicas, com o seguinte teor: “(…) Aos sete dias do mês de Novembro do ano de dois mil e onze, eu, P. J. P. G., a desempenhar funções de Presidente da Escola Superior de Enfermagem do P..., venho participar os seguintes factos: 1. Nas datas que passarei a indicar, foram-me dirigidos os documentos infra referidos que, apesar dos diferentes meios de remessa e dos endereços de origem, todos identificam como emitente a trabalhadora desta Escola, M. F. A. S.; Assim, 2. Na data de 25 de Fevereiro de 2010, foi-me remetido um e-mail, com o endereço --@sapo.pt, assinado por F. S., do qual constam diversas insinuações de carácter injurioso, com ameaças de divulgação pública de "factos" que alega ter conhecimento; 3. Na data de 31 de Dezembro de 2010, foi-me remetido um e-mail, com o endereço --@sapo.pt, assinado por M. F. A. S., no qual é efectuada uma ameaça de comunicação à tutela de factos inerentes ao funcionamento interno da escola, o que, dado o carácter abstracto e subjectivo da expressão "desse e doutros factos", revela a intenção claramente intimidatória da referida missiva; 4. Na data de 1 de Janeiro de 2011, foi-me remetido, para conhecimento, um e-mail, com o endereço correio@--.com, assinado por M. F. A. S., com uma comunicação ao MCTES em que se refere uma participação efectuada na véspera, por fax, pela mesma remetente àquele ministério. Ao não dar conhecimento do teor da referida participação feita ao MCTES, e constando desta comunicação (da qual me dá conhecimento) nova ameaça de divulgação pública de factos que a mesma não identifica e que, por isso, à data desconhecia, persiste a trabalhadora no comportamento intimidatório, com o intuito de constranger o meu normal exercício de funções; 5. Na data de 3 de Maio de 2011, foi-me remetido um e-mail, com o endereço --@esenf.pt (endereço institucional da ESEP atribuído à trabalhadora), assinado por M. F. A. S., no qual se me dirige novamente com expressões desadequadas e inoportunas, acerca de uma nota interna que lhe foi dirigida; 6. Na data de 7 de Maio de 2011, foi-me remetido mais um e-mail, com o endereço --@sapo.pt, assinado por M. F. A. S., do qual consta nova ameaça de reacção e/ou retaliação (por "acção judicial que certamente se seguirá") à instauração de qualquer eventual processo disciplinar contra a mesma, em virtude do disposto na nota interna n.º 2/2011, que se anexa, no qual mais uma vez se refere a, citando, “nomes, datas, locais, condutas e tudo o mais que eu achar adequado”, usando mais uma vez expressões vagas e abstractas, e no qual se refere, sem que se consiga identificar ou justificar o propósito, a uma pessoa que ameaça arrolar como testemunha, identificando-a com vários elementos de identificação, e que, apesar de não o referir, se trata da minha esposa, como tão bem o sabe a trabalhadora até porque aquela é, actualmente, estudante desta Escola; 7. Na data de 12 de Outubro de 2011, foi-me, por último, dirigido um requerimento subscrito pela trabalhadora da ESEP M. F. A. S. que, sob a ameaça de denunciar ao ministério uma suposta "situação ilegal", solicita que seja colocada em mobilidade interna a exercer funções da categoria de técnica superior no Gabinete de apoio à regulamentação e implementação dos estatutos. Funções essas que a mesma recusou quando há dois anos lhe foi proposta a mobilidade interna para aquelas funções. No mesmo exacto dia da apresentação do referido requerimento, sem que lhe tivesse sido dada qualquer resposta, remete-me a referida trabalhadora, para conhecimento, por e-mail, uma denúncia efectuada ao Ministério das Finanças, com base na matéria exposta no requerimento que me apresentou; 8. Ora dos referidos documentos, que se juntam e aqui se dão por inteiramente reproduzidos, são perceptíveis várias acusações que, além de infundadas (conforme apurado pelos vários processos de averiguações levados a cabo pela IGMTES), atenta a gravidade das mesmas, consubstanciam ameaças ilegítimas que têm, aparentemente, como fim único coarctar a liberdade e independência do exercício de funções inerentes ao cargo que ocupo, para a partir daí, poder beneficiar de um ilegítimo tratamento de favor.

    1. De salientar, ainda, que o conteúdo de alguns dos referidos e-mails insinua acusações pessoais que me são dirigidas, manifestamente ofensivas e lesivas da minha boa imagem; 9. Ao alargar à minha esfera familiar as ameaças que me vinha dirigindo, a trabalhadora sobe mais um patamar na escalada de intimidação, procurando, através do envolvimento de terceiros que me são próximos, encontrar uma qualquer fragilidade que a ameaça directa não lhe proporcionou, sempre no intuito de constranger/coarctar a minha actuação livre e isenta enquanto dirigente máximo da instituição que presido. Tal actuação demonstra a perversidade do comportamento desta trabalhadora e são bem elucidativos de uma atitude ofensiva e mal-intencionada; 10. Aliás, o requinte a que se dá, ao indicar o endereço electrónico onde supostamente encontrou o endereço postal da minha esposa, traduz, não só um escrutínio patológico à minha vida pessoal e familiar - o que só por si é ameaçador -, mas constitui um claro sinal de que é real o risco desta escalada na coacção ultrapassar a violência psicológica, culminando em agressões físicas a mim e/ou aos meus familiares; 11. Acresce que em vários dos e-mails referidos, a trabalhadora dirige-se-me ultrapassando os meios institucionais estabelecidos na ESEP, nomeadamente a relação hierárquica estabelecida, pelo que são competentes para conhecer das questões laborais os coordenadores de cada serviço, ao qual deveria ter recorrido; 12. De sublinhar, ainda, a reincidência deste género de actuação, tal como ficou demonstrado pela quantidade e decurso temporal dos referidos documentos, insistindo em matéria que, primeiro, por denúncias anónimas e, posteriormente, por denúncias da mesma trabalhadora foram averiguadas, em várias ocasiões pela IGMCTES, sempre com o arquivamento dos respectivos processos por falta de qualquer prova testemunhal ou outra, excepto na última denúncia da qual ainda não temos notícia de desenvolvimento pela entidade que a recebeu.

      Deste modo, Entendo poderem estar em causa os deveres de correcção, lealdade e obediência subjacentes ao que deverá ser o exercício de funções pública, bem como, e sobretudo, uma insustentável agressão por violência psicológica, nutrida por injúrias continuadas - sem que nada as sustenha - e ameaças declaradas, impensável na relação de um trabalhador para com um seu superior hierárquico.

      Junta-se: dez documentos.

      (…)” - (cfr. fls. 6 e 7 do Processo Administrativo – I Volume - apenso aos autos e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido).

    2. Dos documentos anexos à “Participação” referida no ponto antecedente, consta, para o que ora interessa, o seguinte: “(…) De: F. A.

      --@sapo.pt Enviado: quinta-feira, XX de Fevereiro de XXXX 21:38 Para: --@esenf.pt Assunto: Confidencial Exmo. Sr. Presidente da Escola Superior de Enfermagem do P...

      Porquanto me dirigirei de imediato a L…, acompanhada da minha mãe, em dia de Conselho de Ministros, para comunicar...

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