Acórdão nº 02484/04.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelIsabel Costa
Data da Resolução13 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - Relatório J. e Outros melhor identificados nos autos, intentaram, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, ação administrativa especial, contra o Município (...), indicando como contrainteressado o F., na qual pedem que seja declarada a ilegalidade (i) das normas do Plano de Pormenor das (...) (PPA) que qualificam os terrenos dos AA. como “Zona Mista” (quanto à parte escrita, os art.os 16.º a 21.º do respetivo Regulamento e, quanto à parte desenhada, entre outras, as Pl (...) de Implantação, de Trabalho da zona Norte e as referentes às Malhas 1 e 9, que representam, de modo gráfico, a incidência territorial daquelas prescrições normativas sobre os terrenos dos AA.), (ii) das normas do PPA que excluíram os AA. do âmbito da operação de reparcelamento dos terrenos abrangidos pelo PPA e dos mecanismos de perequação compensatória (quanto à parte escrita, as normas que resultam das pág. 23-25 do Relatório do PPA e, quanto à parte desenhada, a Planta de Reparcelamento, de acordo com a qual se pode verificar que os proprietários dos prédios identificados como L4 e L11, onde se incluem os prédios dos AA., não estão incluídos no quadro de atribuição dos direitos de edificação) e (iii) do PPA enquanto regulamento administrativo (art.º 69.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22/09, que desenvolve as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo).

Por sentença, datada de 25.02.2017, o referido tribunal absolveu o Réu da instância por julgar verificada a exceção dilatória inominada da falta do pressuposto processual previsto no n.º 2 do artigo 73º do CPTA referente ao carácter imediatamente operativo das normas impugnadas.

Inconformados, J. e Outros interpuseram recurso jurisdicional dessa sentença para este TCA Norte tendo, na alegação apresentada, formulado as seguintes conclusões: 1ª – A sentença recorrida ignorou que a planificação – atos dos planos de pormenor, como são as normas/soluções do PPA que vêm impugnadas nesta ação, têm uma natureza imediatamente operativa: seja pelo grau analítico das suas previsões, seja pelo facto de vincularem direta e imediatamente entidades públicas e privadas, os efeitos das normas/soluções que vêm impugnadas produzem-se no estatuto jurídico-urbanístico dos solos e na esfera jurídico-económica dos seus proprietários sem a intermediação de qualquer ato administrativo; 2º - O momento da definição do estatuto jurídico-urbanístico de uma propriedade e do regime aplicável aos seus proprietários é o da aprovação/publicação do plano de pormenor; a partir desse momento, as propriedades objeto desse plano e os respectivos proprietários ficam imediatamente com o estatuto aí definido. Tudo o que se passa depois é mera execução das já pormenorizadas soluções urbanísticas dos planos de pormenor. No entanto, o que se pretende aqui impugnar e a lei admite que se impugne é a definição do regime dos solos e dos seus proprietários que resultam do Plano, da sua fase declarativa do Direito.

  1. - As normas/soluções do Plano de Pormenor das (...) que vêm impugnadas nesta ação definem a situação dos terrenos/moradias em causa e dos respectivos proprietários de forma plena e definitiva, não carecendo para os efeitos aí pretendidos da prática de quaisquer outros atos administrativos. A definição do estatuto dos solos em causa (Zona Mista destinada à construção de concretos edifícios) e a exclusão dos proprietários dos mesmos (os AA) dessa operação de reparcelamento/mecanismos de perequação, resultam diretamente do PPA: esse estatuto e essa exclusão são determinados no PPA, não sendo necessário para o efeito a prática de qualquer ato administrativo. Com a aprovação e publicação do PPA estes solos têm essa classificação e respetivo regime e os seus proprietários ficam excluídos dos referidos regimes de reparcelamento/perequação.

  2. - As normas/soluções do plano de Pormenor das (...) que vêm impugnadas produzem efeitos jurídico imediatos no estatuto jurídico-urbanístico destes terrenos e na esfera jurídica dos seus proprietários (os AA), vinculando direta e imediatamente todas as entidades públicas e privadas nos seus precisos termos, pelo que, afectando diretamente direitos e interesses legalmente protegidos dos AA, a sua impugnabilidade resulta também da sua eficácia externa (artigo 268º, nº 5, da Constituição). Como ensina o Prof. Alves Correia, não carecem de ato administrativo de aplicação, para apurar da sua impugnabilidade, as normas/soluções dos planos que vinculam direta e imediatamente os particulares, como é o caso dos planos de pormenor e das normas/soluções do PPA que vêm aqui impugnadas.

  3. - Sendo assegurado aos AA o direito fundamental de impugnar normas administrativas com eficácia externa lesivas dos seus direitos e interesses legalmente protegidos e revestindo as normas/soluções do PPA que vêm impugnadas uma evidente eficácia externa, a interpretação que a sentença recorrida fez do artigo 73º, nº 2, do CPTA, no sentido de que as normas/soluções do Plano de pormenor das (...) que classificam os terrenos dos AA (com moradias aí construídas e onde estes vivem) como “Zona Mista”, destinando esses terrenos à construção e edifícios nos termos aí pormenorizadamente regulados, e que excluem os AA do âmbito da operação de reparcelamento e dos mecanismos de perequação compensatória aí previstos, não são imediatamente operativas, porquanto necessitam, por referência aos concretos efeitos lesivos que poderão vir a produzir na esfera jurídica dos AA, de atos administrativos de concretização e/ou aplicação dos comandos contidos nessas mesmas normas, é manifestamente inconstitucional por violação dos referidos artigos 20º e 268º, nº 5, da Constituição.

  4. - O facto de, segundo a sentença recorrida, a segunda das normas/soluções do PPA que vêm impugnadas nesta ação resultar, não especificamente do Regulamento desse Plano, mas do seu Relatório, é indiferente para aferir da sua impugnabilidade direta: independentemente dessa sede formal, o que resulta efectivamente do PPA (do bloco de legalidade PPA) é que os AA foram excluídos da operação de reparcelamento dos terrenos abrangidos pelo PPA e dos mecanismos de perequação compensatória aí prescritos, o que é uma norma/solução do PPA. Em qualquer caso, a norma/solução aqui impugnada resulta, nos termos legalmente previstos, da Planta de Reparcelamento do PPA, que foi invocada, pelo que é norma/solução do PPA, relativamente à qual valem todos os requisitos de impugnabilidade, designadamente a eficácia externa que se estabelece no artigo 268º, nº 5 da Constituição.

  5. - A impugnabilidade direta das normas/soluções do PPA que vêm questionadas nesta ação resulta ainda de uma adequada interpretação-articulação do regime geral de impugnação de normas administrativas (neste caso, o artigo 73º, nº 2, do CPTA) com o regime especial de impugnação contenciosa dos planos urbanísticos que vinculam direta e imediatamente entidades públicas e privadas (artigos 3º e 7º do RJIGT e artigos 11º e 13º da Lei de Bases da Política do Ordenamento do Território e de Urbanismo, vigentes ao tempo da propositura desta ação.

  6. - Na tese da sentença recorrida, as normas/soluções dos planos de pormenor nunca seriam diretamente impugnáveis, pois careceriam sempre de posteriores atos administrativos, o que, com o devido respeito, não faz sentido e contraria o regime legal.

  7. - Nas ações em que os AA impugnaram as declarações de utilidade pública expropriativa dos seus terrenos não foi conhecida qualquer questão relativa à validade das normas/soluções do PPA que aqui se impugnam (cfr. nosso requerimento de 07.06.2016).

Os Recorridos Município (...) e F. contra-alegaram pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

O Ministério Público junto deste TCA foi notificado para se pronunciar, não tendo emitido pronúncia.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

II – Objeto do recurso A questão a decidir, nos limites das conclusões das alegações apresentadas pelo Recorrente a partir da respectiva motivação (cfr. artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, todos do CPC de 2013, ex vi artigo 140º do CPTA) consiste em saber se a sentença recorrida incorreu em erro ao julgar verificada a exceção dilatória inominada da falta do pressuposto processual previsto no n.º 2 do artigo 73º...

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