Acórdão nº 01669/07.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução11 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 16.03.2020, pela qual foi julgada procedente a impugnação deduzida por A.

contra a liquidação adicional de IRS do ano de 2002, no valor de € 179.943,53, por falta de fundamentação substancial do ato em questão.

1.2. A Recorrente Fazenda Pública terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «A- Vem o presente recurso interposto contra a sentença proferida nos presentes autos que julgou a impugnação procedente e, em consequência anulou a liquidação adicional de IRS referente ao ano de 2002 e respetiva liquidação de juros compensatórios, integrante da própria dívida de imposto, no valor total global de € 179.943,53.

B- Com a ressalva do sempre devido respeito por melhor opinião, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto considera existir erro de julgamento em matéria de facto, na medida em que o douto Tribunal considerou, erradamente, que a AT não logrou comprovar os pressupostos fáctico-jurídicos fundamentadores da sua correção, uma vez que a prova circunstancial produzida pela AT, não permite a formulação de um juízo minimamente seguro e consistente no sentido que o impugnante auferiu no ano de 2002 rendimentos de Categoria E.

C- O Impugnante em 2003 submeteu a sua declaração de rendimentos de IRS Modelo 3 sem que tivesse submetido o Anexo E relativo aos rendimentos de capitais, ocultando desta forma o montante de € 402.240,23 a título de juros.

D- No decurso de uma ação inspetiva realizada ao Sport (...), com referência aos anos de 2001 e 2002 verificaram os SIT que o aqui Impugnante havia recebido da sociedade “M., S.A.” um cheque no montante de € 4.489.180,00, em substituição do Sport (...), segundo este, para amortização de uma dívida que o clube tinha à data com o Impugnante no valor total de € 5.486.776,87.

Nesse sentido foi o impugnante objeto de uma ação inspetiva, aos exercícios de 2002 e 2003 de âmbito parcial - IRS, realizada a coberto da OI200505472,.

E- Não há, nem houve à data qualquer dúvida que o destinatário da quantia em causa que (valor recebido pelo impugnante da sociedade “M. SA”) era em primeira linha o Sport (...), mas foi entregue ao ora impugnante para amortização de uma dívida que este [impugnante] detinha sobre o clube, que em face de algumas amortizações efetuadas em 2001, encontrar-se-ia em dívida, em 2002, apenas o montante de € 4.086.940.85. Contudo, o impugnante recebeu efetivamente o montante de € 4.489.180,00 com a entrega do cheque emitido pela sociedade M., S.A.

F- A sentença proferida pelo Tribunal a quo não aborda a questão do recebimento por parte do Impugnante de um cheque de montante superior ao valor que se encontrava em dívida, pelo que caí desta forma em errada valoração da prova produzida na medida em que transfere a presunção inicial legalmente prevista nos termos dos art.º 6º e 7º do CIRS que assiste à AT de exigir ao Impugnante a comprovação exata dos montantes auferidos por conta de um “pretenso mutuo”, para a obrigatoriedade da AT encetar um conjunto de diligências instrutórias e investigatórias realizando a prova que anteriormente cabia ao Impugnante, no âmbito do procedimento tributário de liquidação de impostos. Realiza, pois e ressalvado o devido respeito por melhor opinião, uma ilegal inversão do ónus da prova.

G- Antes de tudo, a sentença recorrida devia ter aferido se o Impugnante deu cumprimento ao disposto nos artigos 6º e 7º do CIRS e só numa fase seguinte e, em caso afirmativo, determinar que a AT não fez o que lhe competia! Pois perante os indícios recolhidos a AT goza da presunção inserta no artigo 6º do CIRS.

H- Como se pode aferir do RIT, os SIT, em obediência ao disposto nos artigos 58º e 63º da LGT, no apuramento da verdade material, efetuaram várias diligências quer junto do Sport (...), quer junto do Impugnante, ou seja, junto das partes envolvidas e que seriam as únicas que podiam esclarecer as divergências/incoerências apuradas na contabilidade, para que estas exibissem os contratos que consubstanciaram os empréstimos; que esclarecessem a decomposição da dívida em capital e juros perante a incoerência das respostas obtidas e porque o pagamento efetuado em 15/11/2002 não evidenciava o valor da amortização do capital e dos juros. Tal nunca foi esclarecido nem pelo Impugnante, nem pelo Sport (...).

I- A sentença proferida pelo tribunal a quo em erro de julgamento de facto ao afirmar que “não evidencia a AT a realização de quaisquer diligências investigatórias no sentido de dissipar as dúvidas apuradas.

J- Uma coisa é certa, com o pagamento ao Impugnante do montante de € 4.489.180,00 em 15/11/2002, o capital que o Sport (...) devia ao Impugnante fica pago (€ 4.086.940,85) pelo que o restante valor (€ 402.240,23) recebido pelo Impugnante só poderia ser imputado a título de pagamento de juros. O Impugnante nunca contestou o recebimento da quantia de € 4.489.180,00 através do cheque emitido pela M. S.A., nem tão pouco explicou porque estava a receber um montante superior ao que alegadamente lhe era devido.

K- Incorre o Tribunal a quo em erro de julgamento de facto quando afirma que “não consta do probatório um único facto que permita sustentar que o montante em causa foi efetivamente recebido ou colocado à disposição, por qualquer via, pelo aqui impugnante, sendo que não está sequer em causa, tal como não alude a AT, qualquer presunção de rendimento de categoria E previsto no artigo 6º do CIRS (tais como remunerações de contratos de mútuo ou lançamentos em contas correntes de sócios), carecendo então sem dúvida de qualquer suporte factual a afirmação de que aqueles rendimentos foram auferidos pelo Impugnante, como considerado pela AT.” L- Perante os factos conhecidos pelos SIT, concluíram estes que o valor pago pela M., S.A., em 15/11/2002 (€ 4.489.180,00), absorve todo o capital em dívida (€ 4.086.940,85) pelo que o remanescente entre o valor em divida e o valor recebido será considerado como tendo sido recebido a título de juros.

M- Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 1145.º do Código Civil (C.C.), em caso de dúvida o contrato de mútuo se presume oneroso, os SIT procederam ao cálculo dos juros tendo por base o valor total do capital, que era do seu conhecimento, emprestado ao Sport (...), a declaração da composição da divida efetuada pelo Sport (...) e os valores constante da conta corrente.

N- Ora, o artigo 6º do CIRS consagra uma presunção relativamente a rendimentos de capitais de que os mútuos são remunerados e que os mesmos vencem juros a partir da data do contrato.

O- A AT fez prova dos pressupostos do seu agir, (artigo 74º, nº 1 da LGT), ou seja, no caso concreto, encontram-se reunidos os factos índice que permitem à AT fazer o enquadramento do valor de € 402.240,23 recebido pelo Impugnante como rendimentos da categoria E, nos termos do disposto no artigo 5º, nº 1 e nº 2, alínea a) do CIRS.

P- A AT goza da presunção inserta no nº 2 do artigo 6º do CIRS, e quem tem a favor uma presunção judicial, escusa de provar o facto que a ela conduz, nos termos do disposto no artigo 350º, nº 1 do C.C.. Ou seja, para que o beneficiário de uma presunção legal a possa invocar e assim ficar dispensado de provar o facto a que ela conduz, tem previamente de provar o facto base.

Q- Desta forma, tendo em conta a previsão prevista no artigo 6º, nº 2 do CIRS, a AT para beneficiar desta presunção teria que provar o facto base, ou seja, que o montante recebido pelo Impugnante no valor de € 402.240,23, resultou dos contratos de mútuo celebrado com o Sport (...).

R- E, com o devido respeito por opinião diversa tal ficou demonstrado ao longo do RIT., concluindo-se neste que o valor pago pela sociedade M. S.A. em 15/11/2002 absorveu todo o capital em dívida, sendo considerado o remanescente no valor de € 402.240,23 recebido a título de juros. E, tal montante, é a factualidade relevante para a liquidação do imposto, nos termos do artigo 5º, nº 1 e nº 2 e nº 2 do artigo 6º do IRS, uma vez que a sua proveniência é conhecida, ou seja, resulta do pagamento de juros associados aos contratos de mútuo celebrados entre o Impugnante e o Sport (...). Aliás, se dúvidas existissem que o Impugnante havia celebrado contratos de mútuo com o Sport (...), estas seriam dissipadas com a leitura do documento 10 – declaração de débito – junto pelo Impugnante com a douta pi.

S- A parte que exerce o direito de ação, no caso de impugnação do ato tributário, é que deve exercer a atividade probatória relativamente aos factos que servem de fundamento à ação, de acordo com o princípio do dispositivo, sob pena de ver inferida a pretensão que deduziu em juízo.

T- Desta forma, cabia ao Impugnante afastar a presunção do nº 2 do artigo 6º do CIRS, o que não sucedeu, pois o Impugnante não demonstrou que o montante de € 402.240,23, não foi recebido a título de juros.

U- Erra assim, em nossa modesta opinião, manifestamente, a sentença caindo em erro de julgamento quando subverte o ónus probatório para a responsabilidade da AT, isto porque, verificado o facto tributário, ónus que foi cumprido pela AT, discordando o Impugnante, reitera-se, é ónus deste provar que o montante de € 402.240,23 não foi recebido a título de juros, e assim afastar a presunção que sobre ele pendia. Não pode o Tribunal a quo olvidar que é a AT que goza da presunção inserta no artigo 6º do CIRS e não o impugnante.

V- Em face da divergência encontrada pelos SIT entre a conta corrente do Impugnante, bem como dos valores declarados por este, e a conta corrente do Sport (...), a presunção de veracidade que impende sobre a declaração de rendimentos do Impugnante deixa de se verificar, nos termos do disposto no nº 2, alínea a) do artigo 75º da LGT. Ficando pelo supra exposto afastado o disposto no artigo 100º do CPPT, isto porque da prova...

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