Acórdão nº 00171/09.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução25 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório I., S.A.

, contribuinte n.º 500 137 242, devidamente identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 25/02/2016, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC, do exercício de 2005, no valor total de €162.701,83.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1 - Não há prova nos autos de que a sociedade V. pertença à sociedade recorrente, mas aquela sociedade tinha apenas em comum alguns dos accionistas da I., que à data desempenhavam funções de administração da sociedade recorrente - depoimento da testemunha J. - páginas 2 e 3 e depoimento da testemunha A. - página 76.

2 - Por outro lado, ficou provada a existência de relações especiais entre a sociedade recorrente e a sociedade V., relações essas que ao longo do procedimento inspectivo nunca foram sequer desmentidas.

3 - Contudo, não ficou provado que a existência dessas relações especiais tenha implicado qualquer diferença de tratamento na relação comercial estabelecida entre a sociedade V. e a sociedade recorrente, quando comparada com as relações comerciais estabelecidas com outros clientes da sociedade V. e com as relações comerciais estabelecidas com outros fornecedores da sociedade recorrente - depoimento da testemunha P. - páginas 47 e 58 e depoimento A. - páginas 76 e 80.

4 - Ficou também provado que a sociedade V. tinha muitos outros clientes, para além da sociedade recorrente, pelo que não ficou demonstrado que aquela empresa tenha sido constituída pela sociedade recorrente, com meros intuitos de evasão fiscal e muito menos que o circuito fosse meramente documental, conforme pretende fazer crer a Administração Tributária.

5 - Com efeito, os diversos depoimentos das testemunhas arroladas pela sociedade recorrente e também o depoimento do próprio técnico da fiscalização tributária confirmaram que todos os circuitos documentais corresponderam a reais movimentações de mercadorias, tendo sido liquidados todos os impostos inerentes – depoimento da testemunha P. – páginas 45 e 46 e depoimento da testemunha A. – página 76.

6 - As testemunhas arroladas pela sociedade recorrente atestaram que as importações através da trading V. foram a forma encontrada pela I., com o objectivo de contornar a existência de agentes exclusivos em Portugal, e de penetrar no mercado norte-americano - depoimento do Dr. J. - página 4 e depoimento da testemunha A. - página 81.

7 - Por outro lado, as mesmas testemunhas atestaram que as compras efectuadas à sociedade V. consistiram em aquisições efectivas de madeira, cujas respectivas facturas chegavam às instalações da sociedade recorrente por correio, sendo a mercadoria devidamente conferida, como aliás sucede com todos os outros fornecedores – depoimento da testemunha J. - páginas 4 e 11 e depoimento da testemunha P. - páginas 45 e 46.

8 - As mesmas testemunhas foram unânimes ao afirmar que nunca tiveram um procedimento diferente com o fornecedor V., em relação a todos os outros clientes/fornecedores, de tal forma que algumas apenas se aperceberam das relações especiais existentes entre as duas sociedades, aquando da apreensão de documentos efectuada na sede da sociedade recorrente, e quando confrontadas com uma ficha de assinaturas do Banco - depoimento da testemunha J. - páginas 2 e 3, depoimento da testemunha P. - página 47 e depoimento da testemunha A. - páginas 82 e 83.

9 - Ficou provado que a sociedade recorrente comprava mais barato ao fornecedor V. do que directamente a outras empresas fornecedoras, uma vez que os preços dados por estas últimas incluíam normalmente uma comissão destinada a uma qualquer trading europeia, detentora de contratos de agenciamento ou representação para o espaço europeu - depoimento da testemunha J., que inclusivamente deu como exemplo concreto F., representante exclusivo do fornecedor S. em Portugal, e ao qual a sociedade recorrente teria de pagar uma comissão de agenciamento - página 4.

10 - Assim, uma empresa fora do espaço europeu, e por isso fora da esfera de influência contratual dessas tradings europeias, conseguia negociar preços de compra mais competitivos, o que comprovadamente sucedeu no caso concreto aqui em causa.

11 - Para além disso, normalmente, as empresas fornecedoras vendiam nas condições FOB - Free on Board, isto é, a sociedade recorrente, para além do preço a pagar pelos produtos, teria de suportar o custo do respectivo frete/transporte até ao porto de descarga, acrescido de todos os encargos na origem, enquanto que o fornecedor V. vendia nas condições CIF Leixões - Cost and Freight Porto de Leixões - depoimento da testemunha J. - página 6 e depoimento da testemunha A. - página 77.

12 - Ora, do depoimento do técnico que efectuou a inspecção tributária, resultou claro que na análise a que procedeu para concluir que a sociedade recorrente comprava mais caro ao fornecedor V. do que se comprasse directamente a outros fornecedores, o mesmo não teve em conta estas condições específicas que, no ramo de negócio aqui em causa são determinantes, uma vez que os custos de transporte da mercadoria são de valor muito significativo, nem sequer a questão das comissões anteriormente pagas a agentes exclusivos.

13 - A testemunha A. arrolada pela sociedade ora recorrente chegou mesmo a afirmar que numa importação de um contentor de madeira da China, os custos de frete e despacho podem significar entre 2.500,00 € e 3.000,00 dólares - página 77. Por outro lado, a testemunha J. afirmou mesmo que estes custos representam cerca de 10% a 12% do valor da mercadoria - página 6.

14 - Para além disso, os preços a que a sociedade ora recorrente comprava à V. incluíam uma margem comercial desta empresa, que naturalmente se destinava a fazer face aos custos quer de funcionamento, quer de financiamento da respectiva actividade de trading.

15 - Contudo, no cálculo dessa margem efectuado pelo mesmo técnico de fiscalização, não foi sequer tida em conta a nota de crédito número 1098/04 emitida a favor da sociedade recorrente, no valor de 4.687,20 €, para abatimento à factura 3.312/04, de 22 de Dezembro de 2004, conforme aliás o mesmo admitiu expressamente no seu depoimento.

16 - A sociedade recorrente juntou ao respectivo processo de impugnação judicial diversas ofertas de fornecedores efectuadas directamente à sociedade recorrente - documentos números 49 a 52 - e pela sua análise facilmente se prova que, além dos preços serem mais caros, a sociedade recorrente ainda teria de lhes acrescer os custos inerentes ao transporte para Portugal, quando a V. fornecia o mesmo material a preços inferiores e nas condições CIF Leixões, ou seja, a I. só teria de suportar o custo do transporte de Leixões para os seus armazéns.

17 - Aliás, esta mesma circunstância foi confirmada pelo depoimento da testemunha J. - página 6 e pelo depoimento da testemunha A. - página 77.

18 - Por outro lado, o fornecedor V. não vendia mais caro à sociedade recorrente do que a outros clientes, conforme erradamente consta do relatório da inspecção, uma vez que ficou demonstrado que as eventuais diferenças de preços se deviam ao facto da sociedade recorrente comprar àquela empresa madeira de qualidade superior, em termos de grading, sendo que essa diferenciação não consta do descritivo das respectivas facturas - depoimento da testemunha J. - página 9 e depoimento da testemunha Maria João - páginas 65 e 66.

19 - Por tudo isto, a Meritíssima Juiz “a quo” deveria ter dado como factos provados que o objectivo das relações comerciais entre a sociedade V. e a Impugnante era o de a segunda conseguir entrar no mercado norte-americano, bem como que a diferença entre os preços praticados pelos fornecedores e os facturados à impugnante resultasse a margem da V..

20 - Em relação às compras efectuadas aos fornecedores R. e pela D., ficou provado através do depoimento das testemunhas arroladas pela sociedade recorrente que esta comprou àquelas duas empresas vários lotes de madeiras desclassificadas, pelo que não sabia se os conseguiria utilizar e qual o aproveitamento que era possível efectuar dos mesmos.

21 - Com efeito, tratava-se de aparas de material, ou seja, réguas de madeiras de reduzidas e muito heterogéneas dimensões, que se destinavam à produção de parquete mosaico (a sociedade impugnante é o único produtor ao nível mundial deste produto, nestas dimensões), destinado a satisfazer sobretudo as encomendas do mercado externo - Inglaterra - Portable FloorMarkers - empresa produtora de pavimentos de dança destinados ao mercado global.

22 - Com efeito, a actividade daquelas duas sociedades (R. e D.) é a importação de madeiras, serração de madeiras e venda destes produtos e mercadorias a um mercado constituído maioritariamente por carpintarias mecânicas.

23 - Na sua actividade regular, vão acumulando restos de madeiras e lotes não susceptíveis de venda, pelas suas características, pela falta de qualidade, dimensões não comerciais, algum defeito particular, etc.

24 - Estas madeiras eram propostas à sociedade ora recorrente e vários negócios foram concretizados, da seguinte forma: tendo em conta as condições não classificáveis dos lotes em causa, o fornecedor facturava todas as medidas aos preços normais, com o compromisso da sociedade ora recorrente, após a utilização das referidas madeiras na sua produção e, depois de verificar o respectivo rendimento ou grau de aproveitamento, identificar o valor do mesmo lote e acertar contas com o fornecedor.

25 - Por sua vez, no momento da entrega dos materiais, o fornecedor facturava e a sociedade recorrente efectuava o pagamento integral da factura, porque apenas após a respectiva utilização se aferia o valor real do fornecimento, e por isso a I. não tinha interesse na compra, se a mesma viesse...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT