Acórdão nº 00029/08.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelTiago Miranda
Data da Resolução25 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 19 de Março de 2015, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação judicial movida por A., NIF (…), com domicílio Fiscal na Rua (…), contra a liquidações adicional de IRS do ano de 2003 e juros compensatórios, no valor total de € 837.007,03, de que de que resultou o valor global a pagar de € 793.789,54, após compensação da liquidação anterior com o n.º 2004 5003053928, referente a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e respectivos juros compensatórios.

As alegações de recurso da Recorrente terminam com as seguintes conclusões: CONCLUSÕES: A. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida em 19.03.2015 pelo Douto Tribunal a quo, que julgou procedente a impugnação contra a liquidação adicional do exercício de 2003, nº 2007 5004567762, de que resultou o valor global a pagar de €837.007,03, referente a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e respectivos juros compensatórios, B. a qual após compensação da liquidação anterior com o n.º 2004 5003053928, originou a emissão da nota de demonstração de acerto de contas n.º 2007 00001307168, no montante total a pagar de € 793.789,54, com data limite de pagamento de 19-12-2007.

  1. Considerou a douta sentença de que se recorre, procedente a Impugnação sub judice por entender que, na sequência da invocação pela impugnante/recorrida do vício de fundamentação da liquidação e falta de verificação dos pressupostos que permitem o recurso a métodos indirectos na avaliação da matéria tributável, não subsiste o fundamento/critério utilizado pelos Serviços de Inspecção Tributária.

  2. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito, por errada valoração dos elementos constantes dos autos e ausência da análise crítica das provas que lhe cumpria conhecer, e consequentemente, erro na aplicação do disposto nos artigos 74º, 75º, 87º, 88º e 90º, todos da LGT e art. 100º, nº 3 do Cód. Procedimento e de Processo Tributário.

  3. Os Serviços de Inspecção Tributária (doravante, SIT) aquando da acção de inspecção efectuada a coberto da Ordem de Serviço n.º O1200605500, de âmbito geral ao exercício de 2003, pela necessidade de análise de trespasse de farmácia ocorrida no ano de 2003, concluíram que estavam reunidos os pressupostos necessários à aplicação dos métodos de avaliação indirecta para a determinação da matéria tributável, em sede de IRS e quanto ao exercício de 2003, pela impossibilidade de comprovar e quantificar de forma directa e exacta os elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, porquanto consideraram que, “dados os contornos da operação, tendo sido declarado um valor de trespasse no montante de, 349.158,00€, substancialmente inferior ao valor de mercado, vemos impossibilitada a comprovação e quantificação directa e exacta de todos os elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, à luz da al. d) do art. 88º da Lei Geral Tributária, pelo que proceder-se-á à avaliação indirecta da matéria tributável, à luz do disposto nos art. 87º b) do mesmo diploma legal e art. 39º do Código do IRS.

    (cfr. ponto 5 dos Factos Provados, pág. 7 da decisão).

  4. Estamos perante o apuramento de uma mais-valia em sede de Categoria B de IRS, regime geral de tributação, derivada de um trespasse.

  5. A norma de incidência objectiva que sujeita a tributação a mais-valia obtida é o art. 2º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, alínea c) do CIRS, e o próprio art. 2º, n.º 2, alínea c) do CIRS remete expressamente para o conceito de mais e menos valias do art. 43º do CIRC, H. Sendo certo que o art. 32º do CIRS contém uma norma remissiva genérica para a determinação de rendimentos empresariais e profissionais, que deverão seguir as regras estabelecidas no Código de IRC.

    I. E na quantificação dos rendimentos, subsidiariamente, como ficou supra exposto, é legítimo o recurso a métodos indirectos.

  6. Com efeito, a impugnante atribuiu ao trespasse, o valor de €349.158,00, nele incluindo o estabelecimento referido com todos os seus pertences, designadamente, móveis, utensílios, balcões, máquinas, mercadorias, respectivas licenças, alvará e o direito ao arrendamento.

  7. Ou seja, na contabilidade do sujeito passivo, os Serviços de Inspecção Tributária verificaram que o valor de realização da venda da farmácia, no total de 349.158,00€, é composto por três verbas: o valor líquido do Imobilizado Corpóreo à data do trespasse, no montante de 21.918,00€, o valor das Mercadorias existentes na farmácia no montante de 193.134,00€ e o valor do Imobilizado Incorpóreo/Alvará no montante de 134.106,00€.

    L. O que leva à conclusão incontestada de que o valor do imobilizado incorpóreo, que inclui o valor do alvará, mas também a clientela, foi quantificado em €134.106,00, retirando credibilidade à escrita da impugnante e, inviabilizando a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, no que concerne ao apuramento da respectiva mais-valia.

  8. Por outro lado, no exercício de 2002, o volume de negócios do sujeito passivo, respeitante exclusivamente a venda de mercadorias, ascendeu ao montante de € 1.406.655,28.

  9. Tal valor de trespasse, materializa assim, uma manifesta discrepância entre esse valor declarado e o valor de mercado do trespasse, o qual, de acordo com o conhecimento existente de operações da mesma natureza, nunca é inferior a 1,5 vezes o volume de negócios do exercício imediatamente anterior ao da celebração do contrato, podendo este factor ser maior em função designadamente da capacidade de obtenção de lucros e da localização do estabelecimento comercial.

  10. A correcção à matéria tributável encontrada tem por base o indicador/coeficiente de “1,5”, multiplicado pelo volume de negócios declarado pela impugnante no exercício imediatamente anterior à data de realização do contrato de trespasse, de € 2.109.983,00.

  11. Tendo por referência o que se deixou expresso, e também partindo da análise da declaração de rendimentos da Impugnante, a omissão de proveitos ao resultado líquido da Categoria B de IRS, consubstanciada pela divergência quantitativa entre o valor de mercado e o valor constante do contrato de trespasse do estabelecimento que constituía o património comercial da Impugnante, encaminha, por si só para a impossibilidade de apuramento da matéria tributável de forma directa e exacta.

  12. E, vigorando no ordenamento jurídico o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, o recurso aos métodos indirectos assume carácter subsidiário e excepcional, na medida em que, nos termos do art. 75º da LGT, se presume a veracidade dos elementos de escrita e dos elementos e apuramentos declarados, caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei comercial e fiscal, a não ser que se verifiquem erros, inexactidões ou outros fundados indícios de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte. Neste sentido, Acórdão do TCAN de 26/01/2006, recurso nº 00381/04.

  13. Nesta conformidade, cremos que se encontra plenamente justificado o recurso à avaliação indirecta da matéria colectável, com recurso a métodos indirectos ou presuntivos, embora tendo em atenção a situação específica da farmácia trespassada, nomeadamente o volume de negócios e o valor atribuído ao imobilizado e às existências.

  14. As correcções à matéria tributável foram efectuadas em conformidade com a alínea b) do art. 87º, alínea a) do art. 88º ambos da LGT e art. 39º do CIRS, na redacção vigente à data, normas que regulam a realização da avaliação indirecta, por impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável, sendo entendimento dos SIT que o valor declarado do trespasse é manifestamente inferior ao valor de mercado.

  15. Preceitua a alínea b) do art. 87° da LGT, actual n°1, alínea b), que a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto.

  16. Dispõe o art. 88°, alínea d), do mesmo diploma, que no caso de impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de métodos indirectos, pode resultar da existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativa maior do que a declarada (cfr. Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 03-07-2012, proc. Nº 04397/10 e de 11-06-2013, proc. Nº 06122/12) V. Quanto à alegada errónea quantificação da matéria tributável, cabe notar que compete à Administração Tributária o ónus de indicar e fundamentar os critérios utilizados na determinação da matéria tributável por métodos indirectos, fazendo assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, não em meras suspeitas ou suposições.

  17. Ora, afigura-se-nos que o Relatório de Inspecção Tributária apresentou de forma objectiva e coerente os critérios que utilizou na determinação da matéria tributável, designadamente, ao quantificar o valor do trespasse da farmácia em 1,5 do volume de negócios do ano de 2002.

    X. Efectivamente, o valor calculado para o referido trespasse mostra-se aceitável e ponderado, tendo a Administração Tributária, de acordo com o conhecimento de operações da mesma natureza, entre outras situações, diligenciado no sentido de aferir do valor de mercado do trespasse.

  18. Para a Administração Fiscal encontrar aquele montante, foram...

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