Acórdão nº 01918/09.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCeleste Oliveira
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Seção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* 1. RELATÓRIO O BANCO (...), S.A., inconformado com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a acção administrativa especial por si intentada, contra o despacho do Chefe do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão, o Exmo. Senhor Dr. C., datado de 13.04.2009, exarado na Informação n.º 08/2009 do referido Serviço, notificado através do Ofício n.º 26805/0208, de 13.04.2009, que indeferiu os requerimentos de prova do preço efectivo na transmissão de imóveis, apresentados pelo ora Autor, em 30.01.2009, nos termos do disposto no artigo 129.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (Código do IRC), com referência à alienação de três prédios urbanos sitos na freguesia de Ermesinde, concelho de Valongo, na freguesia de Mafamude, concelho de Vila Nova de Gaia e na freguesia de São Paio de Oleiros, concelho de Santa Maria da Feira, inscritos nas correspondentes matrizes prediais urbanas, respectivamente, sob os artigos nºs (...), (...)e (...) interpôs o presente recurso formulando nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que a seguir se reproduzem.

“III. CONCLUSÕES 1.ª A douta sentença recorrida julgou improcedente a ação administrativa especial deduzida pelo ora Recorrente contra o despacho do Chefe do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão, o Exmo. Senhor Dr. C., datado de 13.04.2009, exarado na Informação n.º 08/2009 do referido Serviço, notificado através do Ofício n.º 26805/0208, de 13.04.2009, que indeferiu os requerimentos de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis, apresentados pelo ora Autor, em 30.01.2009, nos termos do disposto no artigo 129.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (Código do IRC), com referência à alienação de três prédios urbanos sitos na freguesia de Ermesinde, concelho de Valongo, na freguesia de Mafamude, concelho de Vila Nova de Gaia, e na freguesia de São Paio de Oleiros, concelho de Santa Maria da Feira, inscritos nas correspondentes matrizes prediais urbanas, respetivamente, sob os artigos n.os (...), (...)e (...); 2.ª Não pode, todavia, proceder o entendimento da sentença recorrida; 3.ª Salvaguardando o devido respeito, considera o Recorrente que a sentença em apreço incorre em erro de julgamento sobre a matéria de direito e erro de julgamento sobre a matéria de facto; 4.ª Em primeiro lugar, a sentença recorrida incorre em erro de julgamento sobre a matéria de direito, devendo, por conseguinte, ser objeto de anulação; 5.ª No que concerne ao primeiro erro de julgamento sobre a matéria de direito, aquele respeita à invocada inconstitucionalidade do artigo 129.º, n.º 6, do Código do IRC por violação do princípio da reserva à intimidade da vida privada, ínsito no artigo 26, n.º 1, da CRP; 6.ª De facto, tal violação consubstancia-se, desde logo, na circunstância de o eventual acesso à informação bancária do sujeito passivo e dos seus administradores, como condição do deferimento do requerimento apresentado nos termos do artigo 129.º do Código do IRC, determinar o alargamento do núcleo de pessoas que tomam conhecimento de informações protegidas, relativas ao sujeito passivo – e até de terceiros –, sem que este último tenha à sua disposição qualquer garantia de defesa ou alternativa que não seja a de autorizar o levantamento do sigilo bancário; 7.ª Ora, muito embora se reconheça o direito do Estado a cobrar impostos, assim como o objetivo de combate à fraude e evasão fiscal, tal não pode restringir, sem mais, o direito à intimidade da vida privada, quer do sujeito passivo, quer dos terceiros envolvidos; 8.ª O legislador pretendeu consagrar, naquele n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC um regime especial de derrogação do sigilo bancário que visou exigir ao sujeito passivo a apresentação das autorizações para aceder à sua informação bancária e à dos seus administradores, renunciando voluntariamente ao sigilo bancário e providenciando pela renúncia voluntária ao mesmo sigilo de um terceiro, seu administrador à data da transmissão, não tendo, para esse efeito, acautelado minimamente a possível violação daquele direito à reserva da intimidade da vida privada; 9.ª Todavia, não pode justificar-se um levantamento, de forma leviana, do sigilo bancário, com a existência do sigilo fiscal, pois se assim fosse, então não se justificaria o sigilo bancário perante a administração tributária, o que seria, com o devido respeito, absurdo; não pode o Estado, in casu, a administração tributária, pretender conhecer detalhes sobre a vida pessoal dos seus cidadãos de modo absolutamente discricionário e arbitrário, como o que ora se escrutina; 10.ª Por outras palavras, a atuação da administração tributária deve, assim, ser balizada pelos princípios jurídico-constitucionais que se impõem e que protegem e garantem os direitos dos cidadãos/contribuintes, como seja o princípio da reserva da intimidade da vida privada; 11.ª Neste contexto, não é admissível o que se pretende com o n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC: sem a obtenção e apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário – i.e., sem que o seu direito de reserva da intimidade da vida privada, e o de terceiros, seja violado – o sujeito passivo não pode, na prática, afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 12.ª Pelo que, é por demais evidente que o n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC, quando determina expressamente que apenas e só com a obtenção e apresentação das autorizações de derrogação do sigilo bancário – ou seja, que apenas através da violação do direito do sujeito passivo e de terceiros à reserva da intimidade da vida privada – será possível afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC, incorre aquele em violação do direito à reserva da intimidade da vida privada, previsto no artigo 26.º, n.º 1, da CRP, o que se invoca para os devidos efeitos legais, razão pela qual a referida decisão deve ser anulada, com as demais consequências legais; 13.ª Mas, para além da violação do referido princípio/direito uma outra ocorre em consequência da concretização do comando ínsito naquele n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC, qual seja, a violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva; 14.ª Efetivamente, o efeito imediato da consagração do regime legal previsto na referida norma é o de que o sujeito passivo, ainda que absolutamente convicto da razão que lhe assiste, se retraia no que respeita à utilização do expediente legal em causa, sob pena de sacrificar o seu direito à reserva da intimidade da vida privada; 15.ª Com efeito, o sujeito passivo depara-se, perante aquele n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC, com uma situação em que ou autoriza a derrogação do seu sigilo bancário e obtém de terceiros as autorizações relativas a essa derrogação ou se vê irremediavelmente privado de afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC e, inclusive, de impugnar judicialmente a própria liquidação de imposto ou, se a este não houver lugar, as correções ao lucro tributável efetuadas por efeitos da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 16.ª Pelo que, não pode deixar de concluir-se, em sintonia com a jurisprudência firmada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 442/2007, que o disposto no n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC origina que o sujeito passivo renuncie a “(…) um instrumento fundamental de tutela dos direitos (…)”, daí resultando uma evidente violação do princípio do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, a qual se materializa na decisão sub judice, que, por isso, deverá ser anulada com fundamento na violação das normas constantes dos artigos 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4, e 268.º, n.º 4, todos da CRP; 17.ª No que respeita à invocada inconstitucionalidade do artigo 129.º, n.º 6, do Código do IRC por violação do princípio da proporcionalidade, ínsito no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, verifica-se, desde logo, uma colisão com aquele princípio, no que se refere às mencionadas vertentes da adequação e da necessidade porquanto, embora se reconheça que o eventual controlo e acesso à informação bancária do sujeito passivo poderá, em face do objectivo mediato de combate à evasão e à fraude fiscal que presidiu à consagração do regime legal previsto no artigo 129.º, justificar aquele acesso, já nada poderá justificar que o mesmo se concretize da forma leviana que resulta da aplicação do n.º 6 daquele preceito; 18.ª Existe, assim, uma manifesta desadequação dos meios em face dos fins a atingir, pois, não é aceitável que o exercício do direito consignado no artigo 129.º tenha como decorrência imediata o acesso à informação bancária do sujeito passivo e, fundamentalmente, de terceiros. Isto porque, a derrogação do sigilo bancário prevista naquele n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC pressupõe que o sujeito passivo voluntariamente renuncie ao carácter sigiloso da sua informação bancária e que providencie por essa renúncia de um terceiro, sob pena de não poder lançar mão do expediente legal que lhe permite afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 19.ª Este atropelo desregrado das garantias de confidencialidade das informações bancárias do contribuinte, não sujeito a qualquer controlo de legalidade, afigura-se manifestamente desadequado e desnecessário e, por esse motivo, inteiramente desproporcional; 20.ª E nem sequer se invoque que o acesso à informação bancária do requerente e dos respetivos administradores é essencial ou imprescindível ou constitui o único meio de prova possível ou adequado para demonstrar qual foi o preço efetivo, pois, com efeito, é a própria administração tributária que vem referir, no Ofício-Circulado n.º 20.136, de 11 de março de 2009, da Direção de Serviços do IRC, que o...

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