Acórdão nº 00907/15.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução08 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Universidade de Coimbra (Paço (…)) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra, que julgou procedente acção administrativa intentada por S.

(R. (…)).

A recorrente conclui: 1.ª A sentença recorrida, ao julgar procedente a acção, incorreu em erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do regime transitório previsto no n.º 3 do art. 8.º do D.L. n.º 205/2009 e por ofensa aos princípios da igualdade e proporcionalidade consagrados no art. 266.º n.º 2 da CRP.

  1. O Autor não tem o direito a ser contratado como Professor Auxiliar por tempo indeterminado sem a realização de concurso pois o regime transitório previsto no artigo 8.º do ECDU não é aplicável à sua situação – com horário reduzido desde sempre – e que, por esse facto, não tem o tempo de serviço de tempo completo.

  2. Face ao contrato que estava em vigor em 01.09.2009, o Autor não tinha quaisquer expectativas de beneficiar do regime previsto no artigo 32.º do ECDU na redacção anterior ao DL n.º 205/2009, salvo a renovação, e muito menos do regime previsto no anterior artigo 11.º n.º 2, pelo que não se verificava na situação do Autor a razão de ser – protecção da confiança – subjacente à criação do regime transitório, intencionalidade normativa essencial a qualquer interpretação das normas em causa (cf. Artigo 9.º n.º 1 e 3 do Código Civil).

  3. O Autor foi contratado em 01.05.2003 num contexto de excepção, e nunca foi considerado pela Ré que aquele se encontrava abrangida pelo regime transitório, caso contrário ter-lhe-ia sido aplicado o regime de renovação e prorrogação previsto na anterior redacção do artigo 32.º do ECDU mantido em vigor pelo artigo 8.º do DL n.º 205/2009, o que não sucedeu, pelo que face à teleologia subjacente ao regime transitório, o mesmo não é aplicável à situação do Autor, tendo o Tribunal a quo incorrido em erro de julgamento ao decidir em sentido contrário.

  4. Ainda que o regime transitório pudesse ser aplicável à situação do Autor, este não cumpriria as exigências do mesmo, para beneficiar da contratação como professor auxiliar por tempo indeterminado, pois não reunia os 5 anos de tempo de serviço como Assistente Convidado para beneficiar do regime previsto na anterior redacção do artigo 11.º n.º 2 do ECDU por força do previsto no n.º 3 do art. 8.º do DL n.º 205/2009.

  5. A exigência dos cinco anos prevista na anterior redacção do artigo 11.º n.º 2 do ECDU servia não só para comprovar a experiência do docente no exercício da função como para demonstrar que existiria uma necessidade da instituição daquele docente que justificaria uma contratação como docente de carreira com vínculo por tempo indeterminado. Assim, só a excepcionalidade de alguém ter exercido as funções de assistente ou professor auxiliar convidado a tempo integral durante pelo menos 5 anos é que, face aos níveis de experiência adquiridos e a comprovação da existência da mesma por parte da instituição, permitiria a contratação como professor auxiliar em regime de tempo integral - situação na qual o Autor não se encontra.

  6. O segmento normativo do artigo 11.º n.º 2 ECDU na redacção anterior - onde se exige a vinculação...à respectiva escola durante, pelo menos, cinco anos - deve ser, à luz do artigo 9.º do Código Civil, interpretado de acordo com a unidade do sistema jurídico e presumindo um legislador razoável, pelo que os cinco anos aí exigidos devem ser prestados em regime de tempo integral.

  7. Da interpretação da referida norma, tendo em conta a sua especialidade e intencionalidade, o sistema em que está inserida e os princípios da igualdade e proporcionalidade constitucionalmente impostos, não pode resultar um tratamento igual para situações formal e substancialmente diferentes em função do próprio quadro jurídico aplicável, pelo que não podem ser tratados de igual forma os docentes que exerciam as funções a tempo integral e os docentes que as exerciam a tempo parcial.

  8. Ao atender à pretensão formulada o Tribunal a quo abre portas a uma flagrante injustiça e ao sério prejuízo para a Administração, pois permite a contratação a tempo integral de alguém que a Administração entende só seria necessário a tempo parcial.

  9. Estamos na presença de um acto lesivo do interesse público, situação que a Universidade de Coimbra, enquanto entidade pública, não pode deixar de acautelar na tarefa de interpretação da Lei, pelo que se requer a este Venerando Tribunal se digne determinar a revogação do entendimento da decisão recorrida, sob pena de lesão irreversível do interesse público.

  10. O Autor não poderia beneficiar do regime de contratação previsto no artigo 11.º n.º 2 do ECDU, já que não esteve vinculado à Ré – nem até à conclusão do doutoramento, nem posteriormente – como Assistente Convidado ou Professor Auxiliar Convidado durante 5 anos em regime de tempo integral.

  11. Ao decidir nos termos em que decidiu, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do regime transitório previsto no n.º 3 do art. 8.º do D.L. n.º 205/2009 e por ofensa aos princípios da igualdade e proporcionalidade consagrados no art. 266.º n.º 2 da Lei Fundamental.

  12. Pelo exposto, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em sua consequência, deve a sentença recorrida ser revogada por se verificarem os vícios que lhe são imputados, proferindo-se acórdão que julgue improcedente a acção administrativa, assim se fazendo Justiça! O recorrido conclui: 1.ª O presente recurso jurisdicional foi interposto contra a douto e irrepreensível sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra a 4 de Novembro de 2019, que reconheceu que o Autor tinha direito o ser contratado como Professor auxiliar ao abrigo do regime transitório constante do art.° 8º. n.° 3, do DL n.° 205/2009, de 31 de Agosto, condenando a Universidade de Coimbra a praticar os actos necessários a esse efeito e a processar e pagar as respectivas remunerações.

  13. Salvo o devido respeito, a tese sustentado pelo Universidade recorrente nas quatro primeiras conclusões das suas alegações não só se alicerça em factos novos e nunca antes trazidos ao processo - o que por si só justifica a improcedência das mesmas por em sede de recurso não se poderem invocar novos factos -, como, em qualquer dos casos, é claramente errado e só possível para quem litigue de forma menos séria, uma vez que basta atentar aos factos dados por provados pelo aresto em recurso nos pontos n.°s 4 a 9 da factologio assente para se poder constatar que o A. preenchia os requisitos exigidos para beneficiar do regime transitório constante do n.° 3 do art.° 8º do DL n° 205/2009.

    Para além disso, 3.ª A tese alicerçada pela Universidade recorrente nas conclusões 5ª a 12ª das suas alegações - os cinco anos de ligação à Universidade têm de ser em regime de tempo integral - é manifestamente errada e desprovida de qualquer apoio no texto - que se limita a exigir cinco anos de ligação à Universidade e nunca que tais anos sejam em determinado regime de preslação de serviço - e no espírito da lei - cujo objectivo foi por termo à precaridade dos assistentes convidados há vários anos logo que obtivessem o doutoramento -. procurando Induzir em erro este douto Tribunal através da citação de jurisprudência que nada tem a ver com o regime transitório nem com o que se deve entender por ligação à Universidade, mas antes com o que se deve entender por serviço efectivo para efeitos de admissão a um procedimento concursal.

    Na verdade, 4º Resulta claramente do art.° 8º/3 do DL. n° 205/2009 e do art.° 11°/2 da anterior redacção do ECDU que para que um assistente convidado venha a beneficiar do regime transitório apenas é exigido que tenha estado vinculado à instituição universitária por cinco anos, em parte alguma se exigindo que esse vínculo seja por tempo indeterminado ou a termo ou seja em exclusividade, tempo integral ou tempo parcial.

    5º Acresce que, se o legislador tivesse pretendido que os cinco anos de ligação à Instituição tivessem de ser prestados em regime de tempo integral seguramente o teria dito em sede de disposições transitórias - até por não ignorar que os assistente convidados prestavam o seu trabalho em regime de tempo parcial - pelo que se o não fez foi justamente por a sua intenção ser a de acabar com a precaridade da situação dos assistente convidados que já tinham uma ligação à instituição há muito tempo - mais de cinco anos -, de forma a que com a conclusão do doutoramento pudessem ser integrados nos quadros de pessoal como Professor Auxiliar e assim se dar por finda uma precaridade que se vinha arrastando há anos.

  14. Consequentemente, não se pode nem ignorar o texto da lei - onde se exige apenas uma ligação funcional de cinco anos e já não um concreto regime de prestação de serviço durante tais anos - nem o espírito que presidiu à mesma e à instituição do regime transitório - por termo à precaridade dos assistentes convidados que já viessem exercendo funções há vários anos logo a partir do momento em que obtivessem o doutoramento -, razão pela qual a interpretação sufragada pela Universidade recorrente viola frontalmente o disposto no art.° 9º do Código Civil.

  15. Acresce que, não se pode ignorar que ao nível do ensino superior e do regime jurídico dos respectivos docentes não há qualquer norma a determinar que o regime de trabalho a tempo parcial é contabilizado proporcionalmente para efeitos de antiguidade, daí resultando que o tempo de trabalho a tempo parcial é contabilizado na sua plenitude para todos efeitos legais, excepto para efeitos remuneratórios (v.

    PAULO VEIGA E MOURA, Comenlários aos Estatutos das Carreiras de Docente do Ensino Universitário e Politécnico. 2009, pág. 118).

  16. Contra o exposto, não se argumente com a jurisprudência invocada pela Universidade recorrente, a qual não só se reporta a um processo anterior a 2009 e à ampla reforma do emprego público...

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