Acórdão nº 00238/14.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelCristina Travassos Bento
Data da Resolução14 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* I - Relatório A., com o NIF (...), e melhor identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional de apelação da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a oposição judicial por si deduzida contra o processo de execução fiscal nº 0450200801091263, originariamente instaurada contra a sociedade comercial denominada “P., Lda.” por dívidas emergentes de IVA, IRS, IRC e IS do período de 2008 a 2011, contra si revertidas.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: - Enferma a Douta Decisão recorrida de erro de julgamento no que tange à matéria de facto, ocorrendo também na Douta Decisão erro no que se refere à Decisão de direito, decorrente não só da errónea aplicação do direito aos factos dados por provados, mas de igual modo, decorrente da incorrecta aplicação e interpretação da lei.

- No que tange à decisão sobre a matéria de facto, enferma a mesma de omissão sempre deveras restritiva, já que, para além da matéria fáctica dada por assente, outra havia que, por ser relevante para o desfecho da lide, e por ter sido comprovada quer por documentos não impugnados, quer pelo depoimento das testemunhas, deveria ter sido também considerada provada.

- De facto, e conforme decorre da Douta Decisão em crise, e conforme decorre também da análise dos autos, para fazer prova dos factos por si alegados, arrolou o ora recorrente três testemunhas.

- Duas das testemunhas eram antigos funcionários da sociedade gerida pelo recorrente, e a terceira foi técnico oficial de contas da mesma.

- De qualquer modo, todas as testemunhas depuseram com clareza e credibilidade, demonstrando conhecimento directo dos factos.

- Ora, factos existem que foram objecto do depoimento das referidas testemunhas, e que por serem relevantes, deveriam ter sido dados por assentes.

- De igual modo, factos há que, constantes de documentos não impugnadas, deveriam ter sido valorados de forma a terem sido dados por assentes.

- Em concreto, quer porque os indicados depoimentos, quer porque resultava da prova documental, deveriam ser dados por provados outros factos que a Sentença não considerou.

- Assim, deveriam ter sido dados por assentes os seguintes factos: · Que os créditos dos clientes da sociedade “P., LDA.”, cifram o montante de € 247.585,88; · Que as dificuldades financeiras da sociedade “P., LDA.”, se deveu à quebra de faturação, decorrente da crise económica e aumento da concorrência no setor, do aumento de custos e desvio de clientela, ocasionado com a renúncia dos gerentes M.

e R..

· Que A. exerceu a gerência da sociedade “P., LDA.”, de forma cuidada e diligente, por forma a assegurar a existência dos fundos adequados ao pagamento das dívidas sob cobrança nos processos executivos.” · A partir do ano de 2004, o volume de facturação da sociedade executada começou a diminuir em função dos primeiros sinais de crise económica, que se denotavam no nosso país.

· A partir de então, iniciaram-se as divergências entre os sócios da sociedade executada.

· Tais divergências entre os sócios culminaram entretanto com a saída de dois sócios gerentes, a saber, M. e R., o primeiro deles engenheiro civil, e o segundo desenhador técnico.

· A saída da sociedade dos dois referidos sócios representou para esta, por um lado, uma elevada perda de clientes que vieram a acompanhar os sócios · cedentes das quotas, e, por outro lado, um acréscimo de custos e encargos correntes, já que grande parte dos projectos de engenharia, arquitectura e especialidades eram elaborados por estes e passaram a ser encomendados a terceiros.

· A partir do momento em que os demais sócios saíram da sociedade, o opoente passou assumir, em exclusivo, as responsabilidades pelo destino da sociedade, e, do mesmo modo, a assumir, em exclusivo, as responsabilidades pessoais perante terceiros, que os anteriores sócios haviam assumido anteriormente.

· A partir do ano de 2006, os sinais de crise que já se denotavam desde 2004, foram-se agravando.

· A crise que se fez sentir na economia nacional, teve de imediato consequências quer no sector da construção civil, quer no sector das obras públicas.

· O arrefecimento da economia com a quebra notória da procura de bens oferecidos pelos vários sectores económicos e empresariais, veio a fazer com que diminuísse a procura de construção de pavilhões e loteamentos comerciais e industriais.

· Por outro lado, a quebra abrupta na concessão de crédito às empresas, determinou que estes congelassem os seus investimentos, deixando de realizar novas construções, quer de edifícios, quer de equipamentos industriais.

· A quebra na concessão de crédito estagnou o mercado imobiliário habitacional, originando no mercado a cessação da procura de habitações.

· Todas estas circunstâncias constituíram causa directa da diminuição na procura dos serviços prestados pela sociedade executada, que assim viu diminuir drástica e sucessivamente o seu volume de facturação.

· Face à diminuição da procura dos serviços prestados pela sociedade executada, e pelas demais empresas instaladas no sector, verificou-se uma extrema concorrência, circunstância exacta que foi determinante da necessidade de reduzir preços para assim tentar captar clientela.

· A diminuição da procura dos serviços prestados pela sociedade gerida pelo opoente causou à mesma graves problemas de tesouraria, pois que a diminuição de proveitos não foi acompanhada pela diminuição de encargos, especialmente no que concerne a encargos salariais.

· Por força da diminuição da facturação e dos proveitos, e da manutenção ou acréscimo dos encargos, desde o ano de 2006, que foi tendo a sociedade executada resultados negativos.

· Por força de dificuldades financeiras de clientes da sociedade executada, viu-se esta a braços com créditos incobráveis, num valor aproximado de € 250.000,00.

· Os clientes da sociedade executada pagavam os serviços por esta prestados com atraso que, em média, ultrapassava os 120 dias em relação a cada uma das prestações de serviços.

· O opoente, na sua qualidade de gerente da sociedade executada, requereu e fez prosseguir Procedimento Extrajudicial de Conciliação através do Gabinete PEC do IAPMEI.

· O preferido procedimento findou com a aprovação de um plano prestacional de regularização de dívidas ao Estado.

· Não conseguiu a sociedade executada cumprir o plano prestacional estabelecido.

· No sentido de alargar a sua actividade e assim aumentar os seus proveitos, tentou a sociedade executada outros mercados que não o nacional, elaborando projectos para o mercado Angolano.

· Tal tentativa não surtiu o efeito desejado, já que tais clientes, deixaram de pagar à sociedade executada a quantia de € 69.000,00.

- Com efeito, a factualidade que acima se refere, resultou comprovada, não só pela análise e leitura dos documentos juntos aos autos, como de igual modo, de ser considerada assente por força dos depoimentos prestados pelas testemunhas.

- Em concreto, afirmam as testemunhas que foram inquiridas com pelo conhecimento dos factos, duas circunstâncias que foram directamente causais da debilidade económica e financeira da sociedade executada, salientando a saída dos sócios da empresa que configurou uma quebra na carteira de clientes, e um acréscimo exponencial de custos, e a crise prolongada e profunda do sector da construção civil.

- Salientam também as testemunhas que depois de uma fase inicial em que a sociedade executada se dedicava à elaboração dos projectos para empreendimentos habitacionais e industriais de grande porte, passou a mesma por contingências de mercado, e a partir de 2006, a tratar de projectos de diminuta relevância, com menor volume de facturação, e essencialmente com uma reduzidíssima margem de lucro.

- Afirmaram também as testemunhas que a profunda crise económica sentida no sector da construção civil, teve como consequência a diminuição de proveitos, e o desequilíbrio das contas, com a acumulação de sucessivos prejuízos e resultados negativos, sendo que, taos resultados foram causais de problemas sérios de tesouraria.

- Tais problemas de tesouraria, e sempre de acordo com o depoimento das referidas testemunhas, foram por seu turno causas de impossibilidade de cumprimento das obrigações correntes da sociedade.

- Salientaram também tais testemunhas que a agravar as situações de dificuldade de tesouraria, ocorriam atrasos nos pagamentos dos clientes, que em média, ultrapassavam 120 dias, sendo certo que o volume de créditos incobráveis era por demais elevado, chegando quase aos € 250.000,00.

- Ora, sendo certo que, quer em relação à prova documental junta aos autos, quer no que tange à prova testemunhas, vigora no nosso sistema jurídico o princípio da livre apreciação da prova, o certo é que, nenhuma razão existe para que se não considere também provados os factos que atrás se mencionaram, até porque se trata de matéria de facto alegada, e que possui notório e relevante interesse para o desfecho da lide, sendo certo que, a comprovação de tais factos, resulta indubitavelmente dos documentos juntos aos autos, e do depoimento credível e concreta das testemunhas inquiridas.

- Consequentemente, enferma pois a Decisão sobre a matéria de facto de notório erro de omissão, erro esse resultante desde logo de uma inadequada aplicação da força probatória da documentação junta aos autos e ao principio da livre apreciação da prova, pois que, para além dos factos que deu por assentes, deveria incluir no rol dos factos assentes os que acima se descreveram, pois que dos mesmos se faz a devida prova, sendo certo que tal factualidade é relevante e com notório interesse para a decisão a proferir.

- Com efeito, de acordo com a doutrina e jurisprudência dominantes, para que haja responsabilização dos gerentes por dívidas fiscais das sociedades por si representadas, e assim, para...

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