Acórdão nº 00594/07.0BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Outubro de 2021
Magistrado Responsável | Rosário Pais |
Data da Resolução | 14 de Outubro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* 1. RELATÓRIO 1.1. E., S.A.
, devidamente identificada nos autos, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel em 01.02.2013, pela qual foi julgada improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra as liquidações adicionais de IVA dos períodos de 0412T e de 0503T e respetivos juros compensatórios, no valor global de € 25.969,00.
1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «1. A argumentação expendida pelo Mº. Juiz “a quo” e a decisão proferida relativamente aos factos dados como provados e não provados padece de evidentes defeitos, não tendo existido qualquer aprofundamento na análise da questão, violando os mais elementares princípios que norteiam a função do julgador (maxime em processo fiscal), não existindo uma correcta análise da prova; 2. “A sentença judicial não pode reduzir-se a um puro silogismo lógico, não pode nem deve representar uma aplicação por assim dizer maquinal da lei geral e abstracta aos factos da causa (vd. Acórdão da R.L. de 12/10/93, CJ, Ano XVIII, T. IV), antes devendo o juiz fazer uma apreciação crítica das provas (artº 659º. nº 2, do C.P.C.), o que equivale a dizer que terá necessariamente de valorar e interpretar os factos apurados no julgamento à luz dos interesses e finalidades que o legislador quis defender, presentes nas normas jurídicas aplicáveis a cada hipótese, eivado desse sentido crítico, mandou proceder a diligências”. “E, na verdade, a prova relevante será não apenas a aduzida pelas partes, mas também e especialmente a prova que ao juiz se impõe diligenciar; 3. A sentença recorrida é nula por violação clara dos princípios basilares da defesa, do contraditório por se fundamentar em prova que não consta dos autos e à qual não foi dada à Impugnante oportunidade de pronunciar; 4. É passível de verificar que toda a motivação do Tribunal se funda única e exclusivamente nas conclusões do Relatório de Inspecção.
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O Tribunal “a quo” deu como provados os pressupostos e conclusões do relatório, na íntegra, não respondendo ou se pronunciando sobre a matéria controvertida nos articulados e que era essencial para a decisão da causa (como sendo a questão da venda ou não de uma unidade industrial e consequentemente a sua sujeição a IVA; os pressupostos da simulação).
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Essa obscuridade e inexistência dos factos provados, tendo em conta que é composta maioritariamente pelas transcrições de partes completas do relatório de inspecção, faz com que a sentença assuma uma configuração que leva a que sua nulidade – por não especificação dos fundamentos de facto para a decisão, não podendo o Tribunal limitar-se a proferir uma decisão jurídica de fundo com base na adesão, em bloco, à factualidade constante do RIT [arts. 125.º/1 do CPPT e 668.º/1-b) CPPT].
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Foi atribuída força probatória plena ao relatório inspectivo e não, como devia ter sido, aos documentos juntos pela Recorrente e não impugnados pela Autoridade Tributaria, esses sim com força probatória plena face a falta de impugnação.
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A decisão enferma, de erro de julgamento quanto à matéria de facto na medida em que o tribunal não valorizou devidamente a prova documental junta aos autos pela Recorrente, inflacionou o valor dos factos e dos juízos de valor constantes do relatório da inspecção, conferindo força probatória plena às considerações efectuadas pela inspectora tributária.
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O ponto 5.º dos factos provados deveria apenas tê-lo sido de forma parcial pois as empresas que embora tenham ligações não são geridas pelo J. mas cada empresa pelo seu gerente designado – conforme resulta das respectivas certidões permanentes das empresas junta aos autos.
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O ponto 6.º da matéria de facto dada como provada não é qualquer matéria de facto mas uma mera transcrição do relatório de inspecção que engloba matéria distinta.
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Incumbia à Meritíssima Juiz “a quo” ter de forma, clara, objectiva considerar os factos provados no que respeita à suposta venda de uma unidade produtiva e por isso fora da incidência de IVA, bem como, os factos que levam a considerar estarmos diante de negócios simulados.
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Ao ler aquele ponto 6 não se vislumbra o que se dá como provado ou não provado nem sequer o alcance da transcrição efectuada, pelo que, terá que ser tal ponto retirado dos factos provados por ali nenhum facto constar. A obscuridade de tal ponto coloca definitivamente em causa a sentença proferida, pois que, lendo-se a sua motivação e o direito aplicado concluir-se-á que só recorrendo a este ponto chegou a Meritíssima juiz à decisão proferida.
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Os factos são factos e não podem assentar em transcrições integrais dos relatórios inspectivos, infirmando assim a sentença de nulidade nos termos do disposto no artigo 125º, nº1 do CPPT, atenta a não especificação dos fundamentos de facto da decisão, pois que, tal nulidade abrange, quer a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo nº2 do artigo 123º do CPPT, quer a falta do exame crítico das provas, previsto no artigo 659º, nº3 do CPC.
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A formulação apresentada pela Mmo. Juiz, sob a veste de factualidade assente, só na aparência pode merecer tal designação, sendo para nós claro que, in casu, o tribunal a quo se demitiu, por completo, de discriminar os factos provados e que eram essenciais para que permitir julgar a pretensão apresentada pelo impugnante na petição inicial. Note-se, desde logo, que não vem discriminado o circunstancialismo fáctico subjacente aos negócios titulados pelas facturas, nem, por seu turno, os factos considerados para descredibilizar a contabilidade da Impugnante.
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Consequentemente a sentença recorrida é nula nos termos do disposto no artigo 125.º do C.P.P.T.
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Os factos dados como provados de 7.º a 13.º não relevam para a decisão da causa e apenas constavam do relatório de inspecção no que respeita às supostas correcções a fazer em sede de IRC e que a administração acabou por não fazer não sendo por isso, sequer matéria quesitada e com interesse para as liquidações de IVA que ora se discutem. Pelo que, devem os mesmos ser retirados.
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Foram, assim incorrectamente julgado os pontos 5 e 6 da matéria de facto dada como provada, bem como, o ponto 1 dos factos não provados que deveriam merecer resposta positivas tendo em conta os depoimento das testemunhas e os documentos juntos é inequívoca a vontade de comprar e de vender das partes.
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Dos depoimentos das testemunhas e da conjugação da na[á]lise das facturas (atendendo ao tipo de máquinas a[í]constantes e às que são necessárias para a construção de móveis) resulta e ficou demonstrado que as máquinas adquiridas àquela empresa não têm capacidade de só por si formar uma unidade autónoma e objectivamente apta ao exercício de um ramo de actividade independente. Não constituindo uma unidade autónoma estão efectivamente sujeita as regras gerais da incidência de IVA e por isso foi devidamente liquidado o mencionado IV[A], não sendo uma das situações de não sujeição nos termos do disposto no n.º4 do artigo 3.º do CIVA..
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Acresce que, a sentença recorrida não fez uma correcta aplicação e interpretação do Direito, fazendo uma errada aplicação das regras do ónus da prova, porquanto, antes de se poder onerar a recorrente com a prova de que as facturas em causa correspondiam a transacções efectivas, era à Administração Tributária que cabia demonstrar que tais facturas diziam respeito a operações simuladas, violando assim de forma crassa as regras gerais de repartição do ónus da prova e a regra da presunção de veracidade das declarações dos contribuintes, constantes nos artigo 74.º e 75.º, ambos da L.G.T.; 21. Conforme o disposto no artigo 75º. nº. 1 da L.G.T. as declarações dos contribuintes presumem-se verdadeiras e de boa fé, pelo que, nos temos do disposto no artigo 74.º, n.º1 do mesmo diploma cabe à Administração, quando pretende colocar em causa tais declarações, demonstrar os factos que são passíveis de abalar essa mesma credibilidade.
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Assim, colocando em causa o negócio realizado pela Impugnante de compra das máquinas a “C. Lda.”, que se encontra devidamente documentado e registado na contabilidade, teria que alegar e demonstrar relativamente a este concreto negócio (e nada mais) que o mesmo é simulado por forma a aplicar o n.º 3 do artigo 19.º do C.I.V.A.
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Como é jurisprudência pacífica, reiterada e uniforme, quando a liquidação adicional de IVA tem por fundamento o não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte, compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais legitimadores da sua actuação, o que significa que embora não tenha de fazer prova plena da simulação, isto é, a prova dos pressupostos exigidos pela lei civil, tem necessariamente que demonstrar indícios claros e directos dos quais se possa extrair essa simulação, não lhe bastando meras conclusões.
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No caso, a Administração Tributária considerou que a simulação decorre do facto de as máquinas adquiridas pela Recorrente terem sido anteriormente detidas por uma empresa com a qual a Impugnante tinha relações especiais, afigurando-se-lhe que a venda e compra do equipamento industrial teve por base outra verdade económica distinta, tendo como único objectivo impossibilitar a satisfação de créditos tributários devidos, não alegando o que quer que seja quanto à falte de vontade das partes em realizar o negocio.
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O facto é que a empresa que teve no negócio supostamente simulado, pelo menos à data, nenhumas d[í]vidas possuía de relevo, não podendo por isso ao realizar o negócio ter qualquer intuito de fugir com património e lesar credores! 26. São empresas sérias e bem consideradas no mercado à data dos factos, sendo prova disso o facto de nenhum dos “afamados” credores lesados ter impugnado qualquer um dos negócios realizados (e como diz a Administração lesivos para aqueles credores)...
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