Acórdão nº 00777/15.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Janeiro de 2021

Data28 Janeiro 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam em conferência na Seção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*1. RELATÓRIO A Recorrente, CONSTRUTORA (...) LDA, contribuinte fiscal n.º (…) não se conformou com a sentença emitida, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a impugnação judicial intentada contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) dos anos de 2007 e 2008 e respetivos juros compensatórios, que totalizam o valor global de € 480.056,98, e contra a decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa daqueles atos tributários.

A Recorrente interpôs o presente recurso, formulando nas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…) a) Está em causa nos presentes autos saber se a AT se encontrava legitimada a recorrer à avaliação indirecta num cenário em que a Recorrente embora tendo o tratamento da contabilidade atrasado ainda assim apresentou toda a documentação de suporte daquela bem como dois balancetes (analítico e sintético) elaborados relativamente ao exercício de 2007.

b) A AT, com o beneplácito do Tribunal recorrido, entendeu que sim, ao invés a Recorrente considera que não.

c) Como afirmado pela testemunha M., com depoimento registado em CD com inicio aos 00:01:31 e términus aos 00:21:50, aquando da inspecção à AT foram exibidos todos os documentos da contabilidade da Recorrente, documentos esses que seriam o suporte de todas as operações realizadas por aquela mas que os mesmos haviam cessado de ser tratados, em termos de preenchimento dos documentos contabilísticos que os reflectiriam, mesmo porque havia deixado de lhe ser paga a sua avença mensal pela Recorrente, sendo de referir que este depoimento não foi minimamente contestado até porque a Fazenda Pública não colocou a esta testemunha, ao contrário da outra que foi inquirida, uma única questão e facto aquele que joga com o constante do próprio Relatório de Inspecção, que refere a apresentação da documentação que seria o suporte da contabilidade em relação aos exercícios em causa.

d) A Recorrente até pode aceitar que tais documentos e por não ter sido apresentada uma contabilidade regularmente organizada não permitiriam a aplicação do princípio de presunção de verdade do declarado, mas algo diferente disso, completamente diferente dir-se-á, é a questão de o contribuinte, aqui Recorrente, poder demonstrar, que tais elementos por si disponibilizados são os correctos e não aqueles que a AT apurou.

e) A questão passa a ser a de saber se com os elementos/documentos disponibilizados pela Recorrente à inspecção, e ainda que não tratados em termos de lançamentos contabilísticos nos documentos respectivos, tal seria um facto impeditivo de, com base nos mesmos, se chegar de forma directa à matéria tributável da Recorrente ou não e a resposta a esta questão, que é a questão central, não pode deixar de ser no sentido de que os documentos da contabilidade da Recorrente relativos a 2007 e 2008 disponibilizados em sede inspectiva permitiriam à AT com base nos mesmos chegar de forma directa à matéria tributável da Recorrente.

f) Não se podendo a AT, nem o Tribunal diga-se, escudar-se na ausência de tratamento contabilístico dos documentos de suporte para ipso facto considerar preenchidos os pressupostos para recorrer à avaliação indirecta pois que tal ausência de tratamento desacompanhada da alegação e prova de que a mesma inviabilizaria o apuramento de forma directa da matéria tributável não permite o uso da avaliação indirecta e a AT no Relatório de Inspecção não externa uma única razão que possa levar a concluir que aquela ausência de tratamento era impeditivo do uso da avaliação directa.

g) Tal entendimento, a que a sentença deu apoio, é frontalmente violador do artigo 77°, n° 4 da LGT.

h) Ainda que a necessidade de tratamento dos documentos, de modo a ser necessária a realização de operações matemáticas até ao apuramento/lançamento nas declarações contabilísticas, fosse algo que se revelasse quiçá moroso tal não seria, ainda assim, argumento que permitisse a passagem da avaliação directa para a indirecta, pois que admitir o contrário traduzir-se-ia numa completa ausência de respeito pelo princípio do inquisitório a que a a AT se encontra vinculada - artigo 58° da LGT.

i) O raciocínio da Douta sentença só seria configurável num cenário em que o Tribunal não tivesse de considerar os elementos existentes por tratar na contabilidade da Recorrente assim como aqueles que foram juntos pela testemunha M.

a instâncias do próprio Tribunal, as é sabido que as coisas não se podem passar assim pois que todos esses elementos, em particular os juntos aos autos por M., não podiam deixar de ser considerados.

j) E contra tudo isto nem se venha com a conversa da AT, a que a sentença recorrida deu cobertura, de que, em particular no que tange a 2007, os balancetes analítico e sintético elaborados não seriam suficientes porque faltaria o balancete de encerramento uma vez que tal argumento não tem qualquer cabimento para demonstrar a impossibilidade de quantificação directa e exacta a partir Só dos dois primeiros e não o tem uma vez que o balancete de encerramento representa o saldo dos anteriores, ou seja, é o documento contabilístico para onde são transpostos os valores dos outros documentos da contabilidade.

k) Sendo, em consequência, no mínimo peregrino considerar que a não realização de uma mera operação de transposição de saldos seja obstativa de avaliar directamente a matéria tributável da Recorrente partindo dos disponibilizados balancetes analítico e sintético.

l) Quanto à questão de a AT presumir custos quando desconsiderou os efectivos e reais que lhe foram documentalmente exibidos por não se encontrarem contabilisticamente tratados é algo que a Recorrente já contraditou supra, m) Bem ao contrário do entendimento da Douta sentença a Recorrente provou que os rácios usados pela AT não poderiam ser aplicados, por manifesto excesso, à aqui Recorrente.

n) Com efeito a testemunha M., com depoimento registado em CD com inicio aos 00:01:31 e términus aos 00:21:50, esclareceu, na sua qualidade de contabilista certificado da Recorrente, com grande lucidez, que esta estava numa situação de falência técnica (sic) e que os seus capitais próprios tinham sido também esgotados (também sic) mais afirmando que nesse enquadramento a Recorrente não poderia ter obtido o rendimento tributável a que a AT havia chegado pois se o tivesse não se encontraria naquela situação de falência técnica assim como os seus capitais próprios não teriam sido todos consumidos, como já o haviam sido.

o) Pelo que pugna a Recorrente para que o probatório fixado seja alterado no sentido de lhe serem aditados como provados os factos de que a Recorrente se encontrava numa situação de insolvência de facto e em que os seus capitais próprios se apresentavam a negativo, sendo de acrescentar que tal era também o revelado pelos documentos que a referida testemunha juntou a instâncias do Tribunal.

p) Pelo que da articulação de tais documentos com a explicação que deles foi dada pela testemunha M. os supra referidos factos devem ser acrescentados ao probatório fixado.

q) Estando o capital próprio da Recorrente esgotado tal só pode significar que as várias rúbricas que o compõem, entre as quais a de resultados, terão de ser, forçosamente, negativas e como negativas que são a matéria tributável a que a AT chegou, em sede inspectiva, é não só um excesso manifesto como uma evidente impossibilidade, pois que a Recorrente não se encontrava em condições de obter os rendimentos que a AT lhe imputou.

r) Ou seja, não podiam ser aplicados rácios que se revelariam ajustados a sociedades a girar normalmente no comércio jurídico.

s) Havendo recurso a métodos indirectos, como na presente situação ocorreu, o Tribunal não se pode limitar a uma anulação parcial, o que apenas pode fazer quando a AT recorrer a métodos directos, isto uma vez que no caso de apuramento da matéria tributável, e subsequente imposto, com recurso a métodos indirectos o acto tributário torna-se indivisível.

t) Pois que admitir o contrário seria admitir que o Tribunal se substituísse à Administração na liquidação do imposto o que o princípio da separação de poderes não permite.

u) Violou a Douta sentença recorrida os artigos 87° b), 88° a) e 58° da LGT, assim como, por defeito, fez uma errónea interpretação da matéria de facto e que deve levar a que se adite ao probatório fixado que a Recorrente estava numa situação de falência técnica e que os seus capitais próprios tinham sido também esgotados.

Nestes termos e nos melhores de Direito deverá o presente recurso ser admitido e, em sequência, ser declarado procedente por provado e, ainda em sequência, ser revogada a sentença que assim não entendeu e declarada procedente a impugnação com a inerente anulação dos actos tributários colocados em crise, tudo o mais com as consequências legais.(…)” O Exmo. Procurador-Geral Adjunto deste tribunal emitiu parecer, tendo concluindo pela nulidade da sentença, uma vez que, a sentença recorrida não fez fundamentação da matéria de facto provada e não provada, no que concerne à prova testemunhal produzida, pugnando pela baixa dos autos à 1.ª instância.

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF e atendendo à situação atual de pandemia, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, submetendo-se à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, a quais são delimitada pelas conclusões das respetivas alegações, e pelo ilustre Procurador- Geral Adjunto, sendo as de saber se a sentença recorrida incorreu em: (i) nulidade (ii) erro de julgamento, por violação de lei, nomeadamente do art.º 87.° b), 88.° a) e 58.° da LGT, no que concerne aos pressupostos do recurso a...

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