Acórdão nº 00335/20.6BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Março de 2021
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 19 de Março de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:* I – RELATÓRIO 1.1.
A., LDA com sede no Centro Tecnológico e Empresarial de Arganil, na Rua (…), moveu a presente ação de contencioso pré-contratual (de impugnação do ato administrativo relativo à formação do contrato de empreitada), contra a ASSOCIAÇÃO FLORESTAL DO LIMA, pedindo a (i) declaração de ilegalidade da deliberação da Associação Florestal Vale de Lima, de 3 de junho de 2016, notificada a 26 de junho de 2020, por violação do Programa do Concurso e, bem assim, a (ii) declaração de nulidade ou anulação da decisão do júri, e a (ii) condenação do réu a elaborar novo relatório final com nova graduação dos concorrentes do Lote 2, colocando o autor em primeiro lugar, com a consequente adjudicação a si.
Alega, para tanto, em síntese que, a Associação Florestal do Lima, por deliberação da Direção, lançou Concurso Público Internacional n.º 2/2019 – Aquisição de Serviços de Estabilidade de Emergência Pós-Incêndio na Zona de Intervenção Florestal Serra de Santa Luzia e zona de Intervenção Florestal Lima Vez – Anúncios publicados em DR de 2 de março de 2020 e JOUE, de 3 de março de 2020; A esse concurso podiam apresentar-se concorrentes nacionais ou estrangeiros do espaço europeu, desde que preenchessem os requisitos do artigo 55.º do CCP; O referido concurso público desdobrava-se em 2 lotes independentes, o Lote 1, referente à intervenção da “Zona Florestal de Santa Luzia”, cujo preço-base era de € 225.534,73 e o Lote 2 respeitante à “Zona de Intervenção Florestal Lima Vez”, cujo preço base era de € 561.433,67; No dia 15 de maio de 2020, o relatório elaborado pelo Júri foi sujeito a audiência prévia e nele propunha-se a adjudicação do Lote 2 à empresa S. SA, tendo a autora apresentado reclamação, por discordar da avaliação que lhe foi atribuída no fator K 4, em consequência do modo como o Júri determinou o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta, calculado através da seguinte fórmula constante no programa do concurso: Desv=[(preço base – preço total da proposta) preço base] * 100%; Entende que de acordo com o Programa do Concurso, deveria ter uma pontuação de 100 no fator “valor da Proposta”, porquanto em função do cálculo determinado pela fórmula ali consagrada, chegou-se a um desvio de 9.993 entre o preço base e o preço total da proposta, enquanto a empresa “S.” obteve um desvio de 10,406, logo o desvio de 9.993 é superior a 90% do preço-base, ou seja, 90,007% e o desvio da empresa concorrente graduada em primeiro lugar é de 10.406, situando-se entre os 80% e os 90% do preço-base [89.594%], devendo obter, antes, uma pontuação de 50 pontos; Conclui que não foi respeitado o Programa de Concurso, por errada avaliação do 4.º fator, ocorrendo violação das peças do procedimento e violação de lei; Imputa ainda à deliberação impugnada vício decorrente da falta de fundamentação.
Por fim, sustenta que ocorreu uma errada qualificação profissional do adjudicatário, já que para o Lote 2, o preço-base dos serviços postos a concurso era de € 561,433,00 e a proposta do adjudicatário tem o valor de € 503,013,17, e o mesmo não possui o alvará com Classe 3, indispensável para ser admitida ao concurso, mas antes alvará que corresponde a obras de valor de € 75.000,00, subcategoria 13.º da 5.ª categoria; Assim, foram violados os princípios da transparência, concorrência, boa-fé e igualdade de tratamento, assim como foi violada a imposição de exigência de habilitações mínimas.
1.2.
Citada, entidade demandada contestou, alegando, em síntese, que o objeto da ação é a impugnação do ato de adjudicação respeitante ao Lote 2 referente à aquisição de serviços de estabilização de emergência pós-incêndios na zona de intervenção florestal Lima Vez, tomada pela Associação Florestal de Lima, a 3 de junho de 2020; Entende que não há violação do Programa do Concurso e das regras da contratação, na medida em que foi respeitado o Programa do Concurso, tendo-se sido aplicado o modelo de avaliação previsto na cláusula 21.ª do mesmo; Sustenta que da aplicação da fórmula prevista no Programa do Procedimento à proposta da autora para o Lote 2, apurou-se um desvio entre o preço-base e o preço da daquela de 9,993%, ou seja, um desvio = (561.433,67 - € 505.329,27/561.433,67 x 100% = (56.104,40/561 433,67) = 0,9993 x 100 = 9.993; Da aplicação da mesma fórmula ao preço total da proposta da concorrente S., SA, o desvio entre a mesma e o preço-base é de 10,406; Assim, ambas as propostas apresentam um desvio em relação ao preço-base inferior a 80%, pelo que, de acordo com a avaliação estabelecida para o 4.º fator – valor da proposta – a avaliação em causa para a proposta do autor e para a concorrente graduada em primeiro lugar foi de 25 pontos cada, ao contrário do que a autora entende; De acordo com a autora o desvio da sua proposta é superior a 90%, na medida em que entende que esse apuramento se faz subtraindo aos 100% o valor do desvio de 9,993%, raciocínio que está errado e que viola a cláusula 21.º do Programa do Procedimento; Mais alega não ter ocorrido a violação de nenhuns dos princípios apontados pela autora; Quanto à adjudicação do contrato relativo à prestação de serviços do Lote 2, a uma empresa que não possui alvará com classe 3, sustenta que o mesmo era bastante para a sua habilitação, uma vez que, atendendo aos preços unitários para o Lote 2 do Programa do Procedimento e Anexo II das especificações técnicas, constata-se que o objeto do concurso consistia essencialmente na realização de trabalhos florestais e apenas as obras de correção torrencial reclamam a realização de pequenas obras de trabalhos de construção civil, cujo valor ascende a € 41.200, representando 0,733% do valor previsto para o Lote face ao total de € 561.433,67; Desse modo, por se tratarem essencialmente de trabalhos florestais, na alínea c) do ponto 1 da cláusula 28.º do programa do concurso, apenas exigiu documento comprovativo da titularidade do CAE para aquela prestação de serviços e o alvará emitido pelo IMPIC, IP com as habilitações: 13.ª subcategoria – caminhos agrícolas e florestais – da 5.ª categoria; Observa que poderia nem sequer ter feito a referida exigência, uma vez que ao abrigo do artigo 3.º/1 da Portaria 372/2017, de 14 de dezembro, só tratando-se de um contrato de empreitada isso seria necessário; Conclui que a S. , SA é detentora de Alvará da classe 2, 5.ª categoria e 13.ª subcategoria [caminhos agrícolas e florestais] com o valor da classe de € 332.000, logo muito superior ao exigido no programa do procedimento [€ 75.000].
1.3.
Citada, a contrainteressada S., contestou, defendendo-se por impugnação, sustentando a improcedência da ação, alegando, em suma, que foi respeitado o modelo de avaliação das propostas previsto na cláusula 21.ª do Programa do Procedimento e que é titular do alvará exigido no n.º 1 da cláusula 28.º do programa do procedimento, apresentando uma versão dos factos em tudo análoga à exposta pela Ré na sua contestação.
1.4.
O TAF de Coimbra proferiu sentença sendo o seu dispositivo do seguinte teor: «Tudo visto e ponderado, e com base nos fundamentos expostos, julga-se improcedente a presente ação.
Custas a cargo da autora.
Notifique e registe».
1.5.
Inconformada com a decisão do TAF de Coimbra que julgou a ação improcedente a Autora interpôs recurso jurisdicional formulando as seguintes conclusões: «1. A matéria de facto dada como provada assentou exclusivamente nos elementos constantes dos autos e do respetivo processo administrativo, procedendo a uma interpretação que não está em sintonia com a realidade que emerge desses elementos e documentos, sendo visíveis as contradições e equívocos.
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O Tribunal “a quo”, deu como provado em 2.
dos factos provados que o artigo 21 do Programa de Procedimento Concursal determina, que o critério de adjudicação será aplicado a cada lote, e no que nos interessa, ao lote 2, de acordo com o critério da melhor relação preço/qualidade, conforme modelo de Avaliação de propostas constantes no Anexo IV.
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Nessa sequência, deu como provado, no mesmo ponto 2., que quanto ao modelo de avaliação de propostas constantes do Anexo IV, a fórmula aplicada foi de “AP =k1*0,4 + k2*0,4 + k3*0,15 + k4*0,05”, na medida em que os fatores de avaliação foram para k1 de 40%, para k2 de 40%, para k3 de 15% e para k4 de 5% (facto provado 2.).
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O Tribunal, de cuja decisão se recorre, considerou na mesma, que a discórdia entre as partes se centra na determinação do 4º fator – k4 – valor da proposta.
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E a esse propósito conclui (pág. 36) que “está provado que o valor da proposta se aferirá considerando que serão atribuídos 100 pontos se o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta for superior a 100%...” (o Tribunal escreveu 100%, por manifesto lapso, porque a percentagem constante do Programa de Concurso é superior a 90%; isso mesmo foi escrito na pag. 34 da sentença), “... serão dados 50 pontos se o desvio entre o preço-base e o preço total da proposta se situar entre os 80% e os 90% e terá apenas 25 pontos se houver um desvio entre o preço-base e o preço total da proposta inferior a 80% (facto provado 2.)”.
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E mais adiante, na pág. 40 refere a sentença que “está provado que a fórmula aprovada pelo júri para determinar o desvio referente ao 4º fator do critério de adjudicação foi a seguinte: Desv = [(preço base – preço total da proposta /preço base)*100% (facto provado sob o nº 6)”.
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E continua a Sra. Juíza que subscreveu a Sentença que “feitas as contas para a proposta da Autora verificamos que o desvio dá um valor de 0,099930, que multiplicado por 100% dá um desvio de 9,993%.
Por outro lado, quanto à proposta da contrainteressada S., adjudicatária, o desvio encontrado foi de 0,1040%, ou seja de 10,40%”.
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Concluindo que o desvio da Autora, é maior, porque nos dá uma diferença de 90,007% para a proposta da Autora e de 89,6% para a adjudicatária. “Ora, está provado que...
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