Acórdão nº 02452/16.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução19 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:*I – RELATÓRIO 1.1.

C., LDA.

, com sede no (…), instaurou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Instância Central Cível, UP 2, ação declarativa com processo comum, contra M.

e mulher, M.

, residentes na Rua (…), ÁGUAS (...), S.A.

, com sede na Avenida (…), e INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A.

, com sede na Praça (…), pedindo a condenação solidária ou na medida das respetivas culpas ou responsabilidades destes a pagar-lhe a quantia global de 127.565,18 euros, a título de indemnização por danos patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Alega, para tanto, em síntese, dedicar-se ao comércio a retalho, entre outros, de flores, sendo proprietária das instalações sitas à margem da E.N. nº 13, no Lugar de (...), (...), (...), no sentido Porto/(...), onde exerce a sua atividade comercial e onde tem instaladas estufas; Essas instalações são atravessadas em toda a sua extensão e subsolo, no sentido nascente/poente, por um aqueduto subterrâneo, por onde é conduzida a água de uma ribeira, que vai desaguar num outro canal; Esse aqueduto dispõe de uma caixa de acesso e limpeza sita num caminho, que confronta do lado nascente, com as instalações da Autora, e de uma outra caixa de acesso e limpeza, sita à face da E.N. n.º 13, no sentido Porto/Vila Real, na berma desta e no limite de um terreno agrícola que confronta com as instalações da Autora, pelo lado sul, que é propriedade dos 1ºs Réus; Acontece que na noite de 21 para 22 de outubro de 2013, ocorreu um forte temporal, com queda abrupta de grande pluviosidade, que aumentou o caudal da mencionada ribeira e que provocou o rebentamento daquela galaria, fazendo com que a corrente da ribeira invadisse as instalações da Autora, inundando-as, e cuja água, no seu percurso, arrombou o portão que delimita essas instalações da E.N. e derrubou o muro que divide essas instalações dessa via, e destruindo e arrastando parte dos produtos nelas existentes, causando à Autora um prejuízo de 84.512,53 euros, a que acresce IVA à taxa de 23%, decorrente da destruição das mercadorias existentes no interior das instalações, e forçando a Autora a ter de fazer reparações nessas instalações, no que despendeu 19.199,00 euros, a que acresce IVA à taxa de 23%; Todos os Réus contribuíram por ação e por omissão para o rebentamento daquele aqueduto e subsequentes prejuízos causadas à Autora; Algum tempo antes desse temporal, os 1ºs Réus executaram obras na caixa de acesso e limpeza sita à face da E.N. 13, no sentido Porto/(...), na berma desta e no limite do terreno de que são proprietários e que confronta com as instalações da Autora; Essas obras consistiram no reforço da caixa com uma estrutura em cimento-armado, para o que colocaram madeira para a realização da respetiva “forma”, com o que obstruíram tal caixa; A Ré ÁGUAS (...) tinha, à data dos factos, a exploração e a gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento, em que se integrava a dita ribeira, e permitiu e pactuou com as obras levadas a cabo pelos 1ºs Réus, além de que estava encarregue de proceder à conservação, reparação, renovação e manutenção da referida ribeira, bem como do aqueduto por onde esta corria e das respetivas caixas de acesso, obrigações essas que incumpriu; A Ré Infraestruturas de Portugal. S.A., estava encarregue da administração da E.N., n.º 13, em cuja berma se situa a dita caixa de acesso e limpeza do aqueduto, por onde flui a ribeira, e permitiu e pactuou com as obras levadas a cabo pelos 1ªs Réus, além de que, no exercício da administração e gestão da E.N., incumbia-lhe proceder à conservação, reparação, renovação e manutenção da referida via e respetivas bermas, obrigações essas que também incumpriu.

1.2.

A Ré Infraestruturas de Portugal, S.A., contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Invocou a exceção dilatória da incompetência, em razão da matéria, dos tribunais judiciais para conhecerem da relação jurídica material controvertida submetida pelos Autores a julgamento e descrita na petição inicial, sustentando que essa competência se encontra deferida aos tribunais administrativos; Invocou a exceção perentória de força maior, alegando que na origem dos alegados factos relatados pela Autora esteve a forte pluviosidade que se fez sentir naquela noite, que se caracterizou por condições climatéricas excecionais, com ventos fortes da ordem dos 70 Kms/h. e com rajadas de 100 Kms./hora, em que atento o volume de precipitação que se fez sentir, não lhe seria possível garantir o encaminhamento das águas aí existentes nesse dia; Excecionou alegando que no âmbito das funções de fiscalização da rede, desenvolve várias vistorias às estradas que lhe estão concessionadas, incluindo a E.N. 13, que é patrulhada por uma unidade móvel de inspeção e apoio, patrulha essa que inspeciona o estado da via e da zona de estrada e que realiza um registo diário das vistorias que efetua e identifica quaisquer problemas na qualidade de rede e dos serviços prestados, e que de acordo com a informação prestada por essa patrulha, nas doze ocorrências reportadas entre 11 e 22 de outubro, não identificou nenhuma intervenção irregular na zona a que se reportam os Autores, com implicação direta na estrada e relativamente ao assunto dos autos; Impugnou parte da facticidade alegada pela Autora, incluindo que tivesse pactuado ou autorizado com as invocadas obras que esta alega terem sido realizadas pelos 1ºs Réu, sustentando desconhecer a realização das mesmas.

Conclui pedindo que por via da procedência da exceção dilatória da incompetência material dos tribunais judiciais para conhecer da relação jurídica controvertida descrita pela Autora na petição inicial, seja absolvida da instância e que, em todo o caso, a ação seja julgada improcedente e aquela absolvida do pedido.

1.3.

Os 1ºs Réus, M. e M.

, contestaram invocando a exceção perentória de força maior, alegando que na noite a que se reportam os Autores choveu com tal intensidade, que causou grandes inundações e a destruição da ponte de Modivas (E.N. 13) e da ponte de (...), impedindo o trânsito de pessoas e de carros durante meses, além de que foram múltiplos os muros que caíram, incluindo o da “Quinta da Lameira”, tudo isto na área do prédio dos Réus, pelo que esse acontecimento natural, embora fosse previsível para os Réus, era-lhes incontrolável, mais às respetivas consequências, concluindo que nenhuma culpa tiveram nos pretensos danos verificados nas instalações da Autora; Impugnaram, por desconhecimento, a quase totalidade da facticidade alegada pela Autora, negando que tivessem efetuado qualquer intervenção ao nível da caixa de acesso e limpeza invocada pela Autora e sustentando que os pretensos danos sofridos pela última foram causados pelas construções ilegais levadas a cabo por esta, que a nascente das suas instalações erigiu muros com 2 a 3 metros de altura, junto ao caminho aí existente, levando que a água se tivesse aglomerado junto a esses muros e ao derrube destes, que não aguentaram a água e levando que esta tivesse invadido as instalações da Autora, concluindo que foi a própria Autora que contribui, por ação e omissão, para os factos ocorridos nas suas instalações na fatídica noite que referem.

Pedem que a ação seja julgada improcedente, por não provada, e sejam absolvidos do pedido.

1.4.

A Ré “ÁGUAS (...)” contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Invocou a exceção dilatória da incompetência, em razão da matéria, dos tribunais judiciais para conhecerem da relação jurídica delineada pela Autora na petição inicial, alegando que essa competência pertence aos tribunais administrativos; Invocou a exceção dilatória da sua ilegitimidade passiva sustentando que a concessão feita pelo Estado à sua antecessora, não incluía a gestão, conservação ou fiscalização das linhas de água e quando o tramo da ribeira que a Autora descreve e que alegadamente terá sido obstruída, integrará o domínio público hídrico; Impugnou, por desconhecimento, a quase totalidade da facticidade alegada pela Autora.

Conclui a sua contestação pedindo que as invocadas exceções dilatórias sejam julgadas procedentes, com as legais consequências e, subsidiariamente, se julgue a ação improcedente.

1.5.

Por despacho de 24/02/2016, ao abrigo do princípio da adequação formal, convidou-se a Autora a pronunciar-se acerca da exceção da incompetência material do tribunal suscitada pelas 2ª e 3ª Réus nas respetivas contestações.

1.6.

A Autora aderiu a esse convite, concluindo pela improcedência dessa exceção.

1.7.

Realizou-se audiência prévia, em que se fixou o valor da ação em 127.565,18 euros e em que por decisão proferida nessa audiência realizada em 30/05/2016, transitada em julgado, se conheceu da exceção dilatória da incompetência material da jurisdição comum para conhecer da relação jurídica controvertida delineada pela Autora na petição inicial, julgando-a procedente e absolvendo todos os Réus da instância.

1.9.

Por requerimento entrado em juízo em 24 de junho de 2016, a Autora requereu a remessa do presente processo para o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o que, após contraditório dos Réus, foi deferido por despacho de 12/09/2016.

1.10.

Distribuídos aos autos como ação administrativa comum, proferiu-se despacho em 31/01/2017, convidando a Autora a aperfeiçoar a petição inicial, concretizando quais as mercadorias existentes no interior das suas instalações e que foram destruídas e a pronunciar-se quanto à exceção da ilegitimidade passiva deduzida pela Ré ÁGUAS (...).

1.11.

A Autora acatou esse convite, concluindo pela improcedência dessa exceção e concretizando aquela mercadoria a fls. 266 a 285 dos autos, concretização essa que foi impugnado pelos Réus.

1.12.

Realizou-se audiência prévia em 20/12/2017, em que se proferiu despacho saneador, em que se conheceu da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT