Acórdão nº 00010/09.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A., NIF (…) e I., NIF (…), residentes na Rua (…), interpuseram recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 06/03/2020, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRS e respectivos juros compensatórios, do ano de 2004, no montante de €25.329,86.

Os Recorrentes terminaram as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “i) Os impugnantes, ora recorrentes, invocaram a ilegalidade das correções efetuadas pela AT à sua situação tributária em sede de IRS do ano de 2004, e que motivaram a liquidação adicional de imposto e de juros compensatórios, no valor total de € 25.329,86; ii) A liquidação adicional resultou da desconsideração da exclusão de tributação, nos termos do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, das mais valias imobiliárias realizadas com a venda do prédio, designado por fração “S”, inscrito sob o artigo 10.599 da freguesia de (...), em Coimbra, que constituiu o local da sua habitação própria e permanente; iii) Foi a alienação deste imóvel é que produziu as mais-valias realizadas, as quais, não obstante caírem no âmbito da incidência da norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS, dado que foram reinvestidas na aquisição de materiais e de serviços de construção para construção do “prédio de destino”, devem os sujeitos passivos usufruir do benefício da exclusão de tributação previsto no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS; iv) Alienação do “prédio de partida” foi contextualizada nos termos de um contrato promessa de compra e venda celebrado em 3 de Agosto de 2001, entre os promitentes vendedores, os sujeitos passivos, e dois cidadãos portugueses com residência sinalizada no concelho de Aveiro, mas com residência efetiva na Venezuela, na qualidade de promitentes compradores; v) Com a outorga do contrato-promessa foi pago o valor do sinal e o início do pagamento do preço e na cláusula 3.ª do contrato-promessa foi estabelecida a calendarização de diversos pagamentos parciais do preço, os quais não foram integral e atempadamente cumpridos, conforme foi provado pela prova produzida; vi) Os promitentes compradores entraram em situação de incumprimento do contrato-promessa e os promitentes vendedores tiveram de recorrer à modalidade de notificação judicial avulsa para tentar realizar a notificação da data de realização da escritura do contrato prometido, com data marcada para 11 de Novembro de 2002; vii) As notificações dos promitentes compradores que os promitentes vendedores tentaram concretizar ficaram todas frustradas, visto que os promitentes compradores residiam na Venezuela, conforme foi provado pela petição da ação judicial ordinária n.º 153/03.6TBCBR, que correu termos na 2.ª Vara Mista do Tribunal de Coimbra; viii) Esta ação judicial foi interposta pelos promitentes compradores contra os promitentes vendedores, no sentido de obter a declaração negocial de venda e o cancelamento do ónus que incidia sobre o imóvel objeto do contrato promessa de compra e venda; ix) Os promitentes vendedores não só contestaram a ação judicial ordinária, bem como deduziram reconvenção; x) Esta ação judicial acabou por ser extinta por efeito da homologação da transação entre as partes conflituantes; xi) Os promitentes vendedores, não obstante os transtornos administrativos, legais e económicos provocados pelo incumprimento do contrato promessa, acordaram celebrar a transação e pôr fim à ação judicial, dado que a boa-fé com que sempre negociaram com os promitentes compradores, compreenderam que as reais e efetivas razões que motivaram o incumprimento do contrato promessa, que consistiram na situação de crise social, económica e política vivida na Venezuela, crise que era sobejamente conhecida por via dos órgãos de comunicação social, não eram imputáveis àqueles; xii) Se o contrato prometido tivesse sido cumprido, a escritura notarial de venda da fração “S”, sita em Coimbra, teria sido realizada antes do fim do ano de 2002, e não no dia 29 de Setembro de 2004, como se verificou; xiii) Em resultado da celebração do contrato-promessa, os contribuintes promoveram as diligências e procedimentos tendentes à emissão do alvará de construção pela Câmara de Aveiro, o qual, em virtude do incumprimento do contrato-promessa de venda do “prédio de partida”, teve de ser alvo de sucessivas prorrogações; xiv) As razões que provocaram o incumprimento do contrato-promessa não são imputáveis a qualquer uma das partes contratuais, mas sim a factos de força maior, isto é, à situação social económica e política da Venezuela, país de residência dos promitentes compradores, pelo que estes factos, dado que se projetaram através de efeitos jurídicos em Portugal deviam ser subsumidos na parte inicial da alínea b) do n.º 6 do artigo 10.º do CIRS; xv) Estes factos deviam ter sido ponderados e considerados pelo tribunal a quo, dado que são eles a causa da situação em que os impugnantes, ora recorrentes, se viram envolvidos; xvi) Se o contrato-promessa tivesse sido cumprido, a escritura notarial de venda da fração “S” tinha sido feita antes do termo do ano de 2002 e os contribuintes tinham feito, tranquilamente, o reinvestimento das mais-valias realizadas no âmbito da norma da alínea a) do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS e a AT não teria promovido a revogação do benefício fiscal relativo à exclusão da tributação das mais-valias; xvii) Em face do incumprimento do contrato-promessa, os contribuintes viram-se obrigados a fazer o reinvestimento prévio ou retroativo das mais-valias realizadas, por força da aplicação do princípio da realização, que conduz a que as mais-valias só se consideram realizadas na data da outorga da escritura notarial e do pagamento do preço da venda do imóvel fonte do rendimento sujeito a tributação; xviii) Contudo, importa trazer aqui à colação a jurisprudência firmada no acórdão do TCAS tirado no processo n.º 03734/10, de 03.02.2010, em que se estabelece que “o contrato promessa de compra e venda validamente celebrado constitui título jurídico suficiente para que qualquer importância entregue em seu cumprimento, ainda que a título de sinal, possa ser levada à conta de reinvestimento, para efeitos da alínea a) do n.º 5 do artigo 10.° do CIRS”; xix) Logo que foi possível celebrar a escritura pública de alienação da fração “S”, “prédio de partida”, os contribuintes procederam, em relação ao “prédio de destino” à realização de todos os procedimentos legais de modo a observar os requisitos legais conducentes à concretização da exclusão da tributação, nos termos do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, de modo a afastar a aplicação do n.º 6 daquele artigo, o que prova a boa-fé com que contribuintes lidaram com a situação; xx) Os negócios imobiliários realizados atinentes ao “prédio de partida” e ao “prédio de destino” foram motivados por razões inerentes à carreira profissional e académica do sujeito passivo A. e não a qualquer motivação de planeamento fiscal, de fraude ou de evasão fiscal; xxi) Foi provado o nexo de causalidade entre os fluxos financeiros entre o pagamento do preço da fração “S”, “prédio de partida”, e o reinvestimento das mais-valias realizadas na aquisição dos materiais e serviços para construção do “prédio de destino”; xxii) A correção da situação tributária dos sujeitos passivos e a realização da liquidação adicional de IRS do ano de 2004 teve por fundamento a circunstância de ter sido considerado que o reinvestimento prévio feito pelos contribuintes não poder ser integrado na alínea b) do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, dado, no entendimento da AT, aquela norma só abranger a aquisição de outro imóvel ou a aquisição do terreno e não a construção do “prédio de destino”; xxiii) O tribunal a quo adotou a mesma linha de interpretação restritiva quanto ao sentido normativo da alínea b) do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, e considerou que as correções à matéria tributável e a liquidação adicional de IRS do ano de 2004, não devia ser alvo de qualquer censura; xxiv) Todavia, esta interpretação restritiva da norma da alínea b) do n.º 5 do 10.º do CIRS é violadora dos princípios da igualdade tributária e da capacidade contributiva; xxv) O Tribunal constitucional tem afirmado que o princípio da capacidade contributiva, apesar de não se encontrar expressamente consagrado na Constituição, mais não será que a expressão do princípio da igualdade, entendido este em sentido material, no domínio dos impostos, ou seja, a igualdade no imposto. E nesse sentido, constitui o corolário tributário dos princípios da igualdade e da justiça fiscal (cfr. acórdãos n.ºs 197/2016 e 211/2017, do TC); xxvi) Nós entendemos, na linha de Rui Duarte Morais, que a norma da alínea b) do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS sempre abrangeu a construção do “prédio de destino”, e que a alteração que foi introduzida nesta norma pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de Dezembro, outro objetivo não teve senão clarificar que o reinvestimento retroativo também contemplava o reinvestimento na construção do novo imóvel e, assim, remover os obstáculos e dificuldades que foram criadas pela interpretação normativa e aplicação daquela norma legal; xxvii) As mais-valias imobiliárias realizadas foram efetivamente reinvestidas na aquisição do terreno e na construção do “prédio de destino” pelo que não há lugar a qualquer tributação, isto é, não existe rendimento, visto que este deve usufruir do benefício fiscal previsto no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS; xxviii) É inequívoco que o contribuinte deve beneficiar da exclusão de tributação prevista no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, visto que foi provado que a fonte do capital investido na construção do “prédio de destino” foi o capital recebido com a venda do “prédio de partida”, e que a ambos os prédios foi atribuído o fim de habitação própria e permanente dos sujeitos passivos; xxix) A decisão...

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