Acórdão nº 00735/12.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*I. Relatório O BANCO (...), S.A.

, pessoa colectiva n.º (…), com sede na Rua (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 07/02/2020, que julgou improcedente a presente Acção Administrativa Especial deduzida contra a entidade demandada Ministério das Finanças e da Administração Pública, onde peticionava a anulação do acto de indeferimento, datado de 15.12.2011, praticado pelo Chefe do Serviços de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de Finanças do Porto, cumulado com o pedido de condenação à prática de acto devido, consubstanciado no deferimento do requerimento de prova do preço efectivo na transmissão de imóveis, apresentado pelo autor, nos termos do disposto no artigo 139.º, n.º 6 do CIRC, com referência à alienação do prédio sito na freguesia de (...) e concelho de (...), inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1180-D.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1.ª A douta sentença recorrida julgou improcedente a ação administrativa especial deduzida pelo ora Recorrente contra o despacho do Chefe do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão (SACR), da Direção de Finanças do Porto, Exmo. Senhor Dr. A., datado de 15.12.2011, exarado na Informação n.º 30/2011 daquele Serviço, notificado através do Ofício n.º 74527/0208, com a mesma data, o qual determinou o indeferimento do requerimento de prova do preço efetivo na transmissão de imóveis, apresentado pelo Autor, ora Recorrente, em 11.11.2011, nos termos do disposto no artigo 139.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (Código do IRC), com referência à alienação do prédio urbano sito na freguesia de (...), concelho de (...), inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 1180-D; 2.ª Não pode, todavia, proceder o entendimento da sentença recorrida; 3.ª Salvaguardando o devido respeito, considera o Recorrente que a sentença em apreço incorre em nulidade por omissão de pronúncia, erro de julgamento da matéria de direito e erro de julgamento da matéria de facto; 4.ª Em primeiro lugar, entende o Recorrente que a sentença recorrida incorre em nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, na redação conferida pela Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro; 5.ª Efetivamente, na sentença recorrida não são apreciadas as seguintes inconstitucionalidades, tal como invocadas pelo Autor, ora Recorrente: i) violação do princípio do Estado de Direito e do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva, previstos nos artigos 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4 e 268.º, n.º 4, todos da CRP; ii) violação do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real, previsto no artigo 104.º, n.º 2, da CRP; iii) violação do princípio da igualdade tributária, previsto nos artigos 104.º, n.º 1 e n.º 2, e no artigo 13.º todos da CRP; 6.ª Em consequência, deverá o Tribunal ad quem conhecer em substituição as questões que o Tribunal a quo não apreciou (cf. artigo 665.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, na redação conferida pela Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro); 7.ª Verifica-se, em primeiro lugar, a violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, visto que o efeito imediato da consagração do regime legal previsto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC é o de que o sujeito passivo, ainda que absolutamente convicto da razão que lhe assiste, se retraia no que respeita à utilização do expediente legal em causa, sob pena de sacrificar o seu direito à reserva da intimidade da vida privada; 8.ª Com efeito, o sujeito passivo depara-se, perante aquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC, com uma situação em que ou autoriza a derrogação do seu sigilo bancário e obtém de terceiros as autorizações relativas a essa derrogação ou se vê irremediavelmente privado de afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC e, inclusive, de impugnar judicialmente a própria liquidação de imposto ou, se a este não houver lugar, as correções ao lucro tributável efetuadas por efeitos da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC; 9.ª Pelo que, não pode deixar de concluir-se, em sintonia com a jurisprudência firmada pelo TC no Acórdão n.º 442/2007, que o disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC origina que o sujeito passivo renuncie a “(…) um instrumento fundamental de tutela dos direitos (…)”, daí resultando uma evidente violação do princípio do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, a qual se materializa na decisão sub judice, que, por isso, deverá ser anulada com fundamento na violação das normas constantes dos artigos 2.º, 20.º, n.º 1 e n.º 4, e 268.º, n.º 4, todos da CRP; 10.ª Para além disso, a interpretação que do artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC faz a administração tributária no caso vertente ofende outros dois princípios, quais sejam, o da tributação das empresas pelo rendimento real vertido no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e o da igualdade contributiva consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP; 11.ª Com efeito, a presunção, quer do rendimento, quer do próprio valor de alienação do imóvel a considerar para efeitos de determinação do rendimento tributável em IRC, apenas poderá ser admissível se consubstanciar uma presunção relativa, ou seja e in casu, se for, na prática, possível efetuar a demonstração do valor real e efetivo da transmissão, razão pela qual, não o sendo, ocorre, no entendimento do Recorrente e salvo melhor opinião, uma manifesta violação do princípio constitucional da tributação pelo rendimento real previsto no artigo 104.º, n.º 3, da CRP; 12.ª Sucede que, à luz da redação do mencionado anterior artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, e ora aplicada pela administração tributária, o legislador tributário veio tornar, na prática, inilidível a presunção de rendimento consagrada no artigo 64.º, enformando aquela norma, no entendimento do Recorrente, da inconstitucionalidade; 13.ª Efetivamente, a mencionada Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, ao proceder ao aditamento ao artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC, da menção “(…) devendo para o efeito ser anexados os correspondentes documentos de autorização”, veio, na prática, converter o preço efetivo de alienação numa demonstração potencialmente impossível e, nessa medida, suscetível de violar, desde logo, não só o princípio da tributação pelo rendimento real, mas também, o princípio da igualdade contributiva; 14.ª Pelo que, em suma, o artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC, quando interpretado e aplicado da forma em que o fez a administração tributária no caso vertente, ou seja, no sentido de que a autorização de derrogação do sigilo bancário dos administradores ou gerentes constitui um requisito imprescindível ao afastamento da presunção de rendimento prevista no artigo 64.º do Código do IRC, padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da tributação pelo rendimento real consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e do princípio da igualdade contributiva, previsto, entre outros, nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP, impondo-se, também com esse fundamento, a imediata anulação do ato em crise; 15.ª A sentença recorrida incorre ainda em erro de julgamento sobre a matéria de direito, devendo, por conseguinte, ser objeto de anulação; 16.ª No que concerne ao primeiro erro de julgamento sobre a matéria de direito, aquele respeita à invocada inconstitucionalidade do artigo 139.º, n.º 6, do Código do IRC por violação do princípio da reserva à intimidade da vida privada, ínsito no artigo 26, n.º 1, da CRP; 17.ª De facto, tal violação consubstancia-se, desde logo, na circunstância de o eventual acesso à informação bancária do sujeito passivo e dos seus administradores, como condição do deferimento do requerimento apresentado nos termos do artigo 139.º do Código do IRC, determinar o alargamento do núcleo de pessoas que tomam conhecimento de informações protegidas, relativas ao sujeito passivo – e até de terceiros –, sem que este último tenha à sua disposição qualquer garantia de defesa ou alternativa que não seja a de autorizar o levantamento do sigilo bancário; 18.ª Ora, muito embora se reconheça o direito do Estado a cobrar impostos, assim como o objetivo de combate à fraude e evasão fiscal, tal não pode restringir, sem mais, o direito à intimidade da vida privada, quer do sujeito passivo, quer dos terceiros envolvidos; 19.ª O legislador pretendeu consagrar, naquele n.º 6 do artigo 139.º do Código do IRC um regime especial de derrogação do sigilo bancário que visou exigir ao sujeito passivo a apresentação das autorizações para aceder à sua informação bancária e à dos seus administradores, renunciando voluntariamente ao sigilo bancário e providenciando pela renúncia voluntária ao mesmo sigilo de um terceiro, seu administrador à data da transmissão, não tendo, para esse efeito, acautelado minimamente a possível violação daquele direito à reserva da intimidade da vida privada; 20.ª Todavia, não pode justificar-se um levantamento, de forma leviana, do sigilo bancário, com a existência do sigilo fiscal, pois se assim fosse, então não se justificaria o sigilo bancário perante a administração tributária, o que seria, com o devido respeito, absurdo; não pode o Estado, in casu, a administração tributária, pretender conhecer detalhes sobre a vida pessoal dos seus cidadãos de modo absolutamente discricionário e arbitrário, como o que ora se escrutina; 21.ª Por outras palavras, a atuação da administração tributária deve, assim, ser balizada pelos princípios jurídico-constitucionais que se impõem e que...

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