Acórdão nº 00026/03.2BUPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelCristina da Nova
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO Fazenda Pública e M., S.A.

inconformados com a sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial da liquidação adicional do IRC do período de 1998 dela recorrem, respetivamente.

*A Fazenda Pública, formula nas respetivas alegações (fls. 357-372) as seguintes conclusões que se reproduzem: «(…) A. A douta sentença sob recurso, concedendo provimento parcial aos presentes autos de impugnação, determinou a anulação das liquidações na parte em que foram desconsideradas as provisões por dívidas de fornecedores (€ 97.242,05), por encargos com franquias em produtos de “marca própria” (€ 2.018.357,46), por encargos com rendas (€ 839.233,99), na parte em que não foram deduzidas as diferenças de caixa negativas (€ 49.769,14) e por falta de dedução, neste exercício de 1998, do valor das provisões desconsideradas no exercício de 1997.

B. Com a ressalva do sempre devido respeito por melhor opinião, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto considera que, da prova produzida, não é possível extrair as conclusões que serviram de base à decisão proferida, padecendo a mesma de erro de julgamento em matéria de facto e consequente erro de julgamento em matéria de direito, como se demonstrará.

C. As provisões não dedutíveis no montante de € 97.242,05 resultam da não aceitação como custo para efeitos fiscais das provisões para cobrança duvidosa calculadas com base no n.º 2 do art.º 34.º do CIRC sobre saldos devedores de fornecedores que a sociedade dependente “M.” provisionou e considerou como custo fiscal do exercício.

D. Apenas poderão ser relevados os créditos sobre clientes resultantes das transacções de bens e serviços relacionados com a actividade produtiva da empresa devem ser qualificados como créditos resultantes da actividade normal, para efeitos do disposto na al. a), do n.º 1 do art.º 33.º do CIRC.

E. A este propósito dispõe o citado preceito sobre a epígrafe “Provisões fiscalmente dedutíveis” o seguinte: “Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões: a) as que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade”.

F. Sobre esta matéria, a douta sentença considera que “tem sido entendimento jurisprudencial que é admissível a constituição de provisões para cobrir créditos sobre fornecedores”, transcrevendo um excerto do douto Acórdão do TCAS de 30-06-2009, proc. n.º 2475/08, e mencionando “no mesmo sentido, TCAS, ac. de 20-06-2006, processo n.º 01138/06 e ac. de 25-03-2003, pr. n.º 7452/02”.

G. Sucede, porém, que, consultados os citados arestos (in www.dgsi.pt), não se afigura à Fazenda Pública que os mesmos possam servir de suporte jurisprudencial à matéria controvertida, pois não dizem respeito à mesma questão.

H. A questão deve ser resolvida aferindo-se da verificação ou não dos requisitos previstos na al. a), do n.º 1 do artigo 33º do CIRC: os créditos resultantes da actividade normal de uma empresa são os que decorram de operações de natureza comercial relacionados com a venda de bens ou prestações de serviços respeitantes à actividade principal da empresa, ou seja, as operações que envolvam transacções correntes.

I. Deve ainda ser aferida a justificação do risco de incobrabilidade associado a tais créditos e se tais créditos se encontram evidenciados na contabilidade como créditos de cobrança duvidosa, pelo que os saldos devedores de fornecedores provisionados pela sociedade dominada pela impugnante não correspondem a transacções correntes.

J. As circunstâncias fácticas que informam os “créditos” em questão e o risco de incobrabilidade dos mesmos advieram da verificação de um facto anormal consubstanciado numa apropriação indevida pelos fornecedores de importâncias que contratualmente acordaram entregar à empresa cliente.

K. Porém, não foi comprovado nos autos qual o período de mora que os referidos “créditos” ostentavam, pelo que, dificilmente se poderá admitir que os mesmos preenchem os requisitos necessários para serem provisionados de harmonia com o estatuído na al. a), n.º 1, artigo 33º do CIRC, cf. Ac. TCAS. 31-10-2006, proc. n.º 1247/03, in www.dgsi.pt.

L. Ora, a natureza imprevisível deste encargo não permite a aceitabilidade como custo de valores conhecidos e com diminuto risco de incobrabilidade, pois a impugnante sempre poderia ter efectuado o acerto das contas, mediante o exercício do direito de retenção no valor a pagar aos aludidos fornecedores, por conta do débito originado pelas facturas recepcionadas dos mesmos fornecedores.

M. Como se disse já, a finalidade da provisão em causa é a de compensar os créditos da actividade normal que, no fim de cada exercício, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade.

N. Pelo que, dúvidas não restam de que a decisão recorrida incorre na violação da norma constante da al. a), do n.º 1, do artigo 33º do CIRC, porquanto os requisitos nela previstos não se mostram cumpridos, que determina a anulação da sentença e a procedência da impugnação, na parte ora recorrida.

O. Por seu turno, a desconsideração como custo fiscal dos encargos relativos à franquia com marca própria (€ 2.018.357,46) encontra-se devidamente fundamentada no relatório inspectivo.

P. A remuneração paga pela “M.” à Impugnante pelo direito à utilização da marca “C.”, de 0,3% sobre o valor das vendas totais de mercadorias constitui um “custo supérfluo”. Pois que, Q. O custo incorrido é superior ao valor de realização, bem como a utilização do sinal distintivo da marca “C.” estava circunscrita, contratualmente a hipermercados e, como tal, não seria aplicável aos estabelecimentos comerciais da sociedade dependente M. e por último, pois tratava-se de uma marca própria, mas não da sociedade dependente “M.”, entendendo portanto os SIT, e bem na nossa modesta opinião, que não existiu qualquer benefício económico para a referida sociedade “M.”.

R. Não entendeu assim a aliás douta sentença, que considerou que “(…) a remuneração paga pela “M. , S.A.” à impugnante, pela utilização do sinal distintivo da marca “C.”, foi indispensável à manutenção da sua fonte produtiva.

S. Concluindo que “como emerge do facto instrumental em 4) da fundamentação de facto, há um objectivo estratégico na comercialização de produtos de “marca própria”. Os encargos despendidos revelam ser economicamente congruentes e visam satisfazer um interesse colectivo da empresa, pois que tem um escopo lucrativo, seja na comercialização directa desses produtos (com mais margem de lucro), seja pela negociação de margens de lucros mais favoráveis pela venda de produtos de fornecedores. Apesar de tal despesa não ter resultado, no exercício em questão, na obtenção de um lucro directo/imediato, a mesma foi indispensável para o atingir nos exercícios económicos seguintes (a médio/longo prazo).” T. No entanto, parece-nos que a questão terá de ser analisada num primeiro momento, não numa perspectiva económica, mas numa perspectiva jurídico-tributária: o custo reúne os requisitos de indispensabilidade? Existe uma correlação entre o custo e os proveitos da empresa M.? Há uma causa e efeito entre o custo suportado e os proveitos obtidos? U. A estas questões responderam os SIT de forma negativa quando consideraram que a remuneração em causa não reunia os requisitos de indispensabilidade, nem existia uma conexão entre a realização do custo e a obtenção do proveito.

V. A resposta dada é factualmente explicada, com os necessários cálculos e a respectiva fundamentação jurídico-tributária.

W. Em suma e contrariamente ao decidido pela Mma. Juíza “a quo” considera a Fazenda Pública, com o devido respeito por diferente entendimento, que os encargos com franquia com marca própria, no montante de € 2.018.357,46 não são passíveis de serem aceites como custo fiscal, dado não cumprirem os requisitos de indispensabilidade previstos no art.º 23.º do CIRC, pelo que, tendo sido decidido em sentido oposto, incorreu a douta a decisão sindicada em erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito, que determina a anulação da sentença e a procedência da impugnação, na parte ora recorrida.

X. Em conclusão quanto aos encargos com marca própria e com rendas, o mui douto decisório afirma também que “a impugnante demonstra que as despesas incorridas promoviam a obtenção de proveitos. Não pode a AT, portanto, sindicar a bondade e oportunidade das decisões económicas e empresarias da impugnante ou das suas sociedades dependentes, a partir do momento em que as mesmas se adequavam à estrutura produtiva e visam a obtenção de lucros”.

Y. Não pode a Fazenda Pública concordar com o entendimento sufrado na douta sentença quando ali é referido que a AT questionou as decisões económicas e empresariais da impugnante.

Z. Na verdade, à AT apenas compete, no quadro legal das suas atribuições e competências, proceder ao enquadramento dos factos tributários à legislação aplicável, o que fez em concreto com as situações apuradas nos presentes autos:

  1. A sociedade dependente “M.” celebrou em 01.01.1996 um contrato promessa de subarrendamento com a sociedade S. abrangendo 84 fracções do 1.º andar do Centro Comercial de (...), com vista à expansão da loja L202 aberta desde 02.08.1990.

  2. Por acordo firmado em 01.06.1998 a “M.” e a S. decidiram por fim ao contrato de subarrendamento com efeitos a 31.08.1998, tendo, posteriormente, celebrado novo acordo em que a data da revogação passaria para 31.12.1998.

  3. Este novo acordo estabeleceu, na al. b), que a “M.” continuaria a pagar as rendas e todas as despesas surgidas até essa data - 31.12.1998.

  4. O mesmo contrato previa, na sua al. c), a possibilidade da S. proceder a subarrendamentos de parte ou da totalidade das citadas fracções autónomas, recebendo em conformidade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT