Acórdão nº 01180/21.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelTiago Miranda
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*Relatório A Fazenda Pública interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença de 3/09/2021, do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou procedente a reclamação apresentada por B., SUCURSAL PORTUGUESA, S.A. contra a decisão de graduação de créditos emitida pelo órgão de execução fiscal no incidente de reclamação e graduação de créditos corrido nos processos de execução fiscal nº 3425201301132318 e outras 188, instauradas contra a sociedade A., LDA, na qual decisão se determinara que se pagaria em primeiro lugar, com o produto da venda do automóvel matrícula XX-XX-XX, de marca BMW, por precípuas, as custas das execuções.

Termina a sua alegação com as seguintes conclusões: CONCLUSÕES: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que decidiu anular a decisão de verificação e graduação de créditos n.º 3425.2020.206, proferida em 03-12-2020, no processo executivo n.º 3425201301132318 e apensos, instaurados contra a sociedade A., LDA.

  1. Com a devida vénia, a Fazenda Pública não se pode conformar com tal decisão, quer quanto à apreciação e valoração da matéria de facto, quer quanto à apreciação e aplicação do direito, entendendo, portanto, que a sentença padece de erro quanto à apreciação da matéria de facto e de direito.

  2. Com efeito, entende a Fazenda Pública existir erro de julgamento de facto, face a uma errada análise e valoração da prova carreada para os autos, quer pelo órgão instrutor e decisor (Direcção de Finanças), quer pela Fazenda Pública, e de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto nos art.º 736, 738º e art.º 743º, ambos do CC, art.º 541º e art.º 788 n.º 4 al. a), ambos do CPC.

  3. A Fazenda Pública requer que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 662º do CPC, seja alterada a matéria de facto, acrescentando-se o ponto 19 aos factos provados, com o seguinte conteúdo: 19. A venda do bem penhorado, que tomou o n.º 3425.2019.68 (SIGVEC) abrangeu o total dos 189 processos de execução fiscal, cf. contestação da Fazenda Pública e documento 1 junto.

  4. Entende a Fazenda Pública de que não restam quaisquer dúvidas de que os créditos em causa são custas processuais relativas aos processos de execução fiscal [3425201301132318 e apensos] onde ocorreu a venda do bem penhorado, ou seja, são custas de execução.

  5. Realidade que decorre dos factos dados por provados na sentença nos seus pontos 2, 3 e 4, e que sai reforçado pelo ponto 19 que a Fazenda Pública requer que seja aditado aos factos dados como provado.

  6. Na verdade, a própria sentença começa por reconhecer que estamos a tratar de custas de execução e do princípio da precipuidade, mas depois, em tese ou fundamentação contraditória, acaba por ignorar tal realidade, seguindo caminho para uma decisão sem qualquer apoio factual e legal.

  7. Como prevê o artigo 541º do CPC (sob a epigrafe “Garantia de pagamento das custas”), aplicável por força da al. e) do art.º 2º e 246º, ambos do CPPT, as custas da execução saem precípuas do produto dos bens penhorados.

    I. Dito de outro modo, as custas da acção executiva nem sequer entram na graduação, pois o produto dos bens penhorados tem de ser aplicado no pagamento daquelas custas, antes de qualquer outro destino e mesmo à frente de qualquer credor privilegiado.

  8. A Fazenda Pública realça que a liquidação junta, conforme douta sentença no ponto 12 dos factos dados como provados, evidência que as custas dos processos em execução saíram precípuas do produto do bem penhorado e que o crédito reclamado pela aqui recorrida, por força da garantia real que o acompanha, ficou graduado em 1º lugar.

  9. Destarte, é manifesto que do produto da venda pagaram-se prioritariamente as custas da execução e só depois é que se procedeu à graduação pelos demais credores reclamantes, como ordena o disposto no artigo 541º do CPC.

    L. No entanto, o douto tribunal a quo, após reconhecer que os valores pagos em primeiro lugar se referem a custas da execução, e que os bens penhorados na execução garantem o pagamento precípuo, ou seja, fora de concurso, entendeu “que o bem penhorado é um veículo automóvel e, nestas situações, não é de admitir a reclamação de créditos pelo credor com privilégio creditório geral, mobiliário ou imobiliário, segundo estabelece o artigo 788.º, n.º 4, al. a) do CPC.” M. E concluiu que “Assim sendo, pese embora o crédito de custas não tenha de ser reclamado pelo órgão de execução (o n.º 2 do artigo 240.º do CPPT é norma especial, que afasta a aplicação da norma geral – artigo 788.º, n.º 4, al. a) do CPC), o mesmo perde a preferência decorrente do privilégio mobiliário geral que, em princípio, lhe assistiria, nos termos do n.º 1 do artigo 736.º do Código Civil, em resultado do bem penhorado ser um veículo automóvel (cfr. neste sentido, decidiu o Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 10-11-2010, tirado no processo n.º 0210/10 – disponível para consulta em www.dgsi.pt).” N. Com a devida vénia, a Fazenda Pública não vislumbra qualquer acerto nesta fundamentação, nem o acórdão mencionado é aplicável à situação destes autos.

  10. Na verdade, entende a Fazenda Pública que a al. a) do n.º 4 do artigo 788º do CPC não tem aplicabilidade no presente caso, porquanto, como vimos, estamos perante custas de execução, logo abrangidas pelo princípio da precipuidade, e não estamos a tratar de créditos abrangidos por privilégios, imobiliários ou mobiliários, gerais.

  11. Na verdade, tais créditos relativos a custas de execução a gozarem de privilégio, mobiliário ou imobiliário, seria [na senda do disposto no artigo 738º do CC, norma alusiva aos créditos por despesas de justiça e que foi inclusive, mas inocuamente, chamada para a decisão], um privilégio especial e não geral, como erradamente percepciona a sentença aqui em escrutínio.

  12. A sentença aqui em causa, para fundamentar o erro na decisão reclamada e a decisão de determinar a sua anulação, remete para o disposto no artigo 736º do CC, referindo que o crédito [de custas] perde a preferência decorrente do privilégio mobiliário geral que, em princípio, lhe assistiria, nos termos do n.º 1 do artigo 736.º do Código Civil, em resultado do bem penhorado ser um veículo automóvel R. E refere que existe uma decisão do STA, no processo 0210/10, de 10.11.2010, que decidiu no mesmo sentido, e que tal jurisprudência seria aplicável a este caso concreto.

  13. A Fazenda Pública não acompanha tal fundamentação e entende que a jurisprudência referida não revela uma situação igual à dos presentes autos, porquanto no referido acórdão do STA estava em causa [a admissão na graduação de]um crédito exequendo de IVA por força de garantia real proveniente da penhora, situação de facto e de direito diferente e incomparável com os presentes autos.

  14. Ademais, o disposto no artigo 736º do CC refere-se a privilégio mobiliário geral para garantia dos créditos por impostos indirectos e também pelos directos inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos dois anos anteriores, U. Enquanto que o que está em causa nestes autos são custas de execução e o privilégio especial que a lei lhe confere pelo disposto no artigo 541º do CPC.

    V. Em conclusão, entende a Fazenda Pública que a douta sentença em escrutínio fez uma errada apreciação dos factos e uma incorrecta interpretação e aplicação do direito, e por isso deverá ser revogada.

    Notificado, a Recorrida respondeu à alegação do Recorrente, terminando com as seguintes conclusões: III. CONCLUSÕES: 1. Vem o presente recurso, interposto pela AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, ora Recorrente, da douta decisão proferida pelo Tribunal de Ia Instância, o qual entendeu, e bem, julgar procedente a reclamação apresentada pela ora Recorrida e, em consequência, anulado a decisão reclamada.

    2. A douta sentença proferida pelo Tribunal a é, conforme demonstrado, insusceptível de qualquer censura, sendo o entendimento plasmado na mesma o único consentâneo com a letra e espírito da Lei.

    3. Vem a ora Recorrente, ao abrigo do disposto no n.° 1 do artigo 662.° do CPC, requerer em sede de recurso que seja alterada a decisão proferida, com acréscimo do ponto 19 aos factos provados, cujo teor deverá no entendimento da Recorrente ser: “A venda do bem penhorado, que tomou o n.° 3425.2019.68(SIGVEC) abrangeu o total dos 189 processos de execução fiscal, cf. Contestação da Fazenda Pública e documento 1 junto.” 4. Não podendo a ora Recorrida concordar com tal alteração da matéria de facto, porquanto apenas se poderá considerar como provado, tal como bem apreciou e decidiu o Tribunal a quo, que a penhora abrangeu sim os 189 processos de execução fiscal intentados contra a Executada, não podendo, como requer a Recorrente, considerar-se como provado que a venda abrangeu todos os processos executivos, porquanto a venda judicial ocorreu somente no âmbito do processo n.° 3425201301132318.

    5. Refira-se ainda que em sede de contestação apresentada a Recorrente refere que nos prints informativos relativos à adjudicação do veículo vem indicados todos os processos de execução fiscal onde foi efectuada a penhora, os quais correspondem na sua totalidade aos elencados na decisão de verificação e graduação de créditos, não alcançando a ora Recorrida o alegado pela Recorrente.

    6. Ora, do print referente à adjudicação de venda não consta qualquer menção quanto ao facto de a referida venda se reportar a todos os processos abrangidos pela penhora, o que aliás nem faria qualquer sentido, porquanto, atenta a reclamação de créditos da Credora garantida, ora Recorrida, era do conhecimento da ora Recorrente que a venda judicial em apreço nunca seria suficiente para liquidação do crédito exequendo.

    7. E do print correspondente ao documento único de cobrança junto aos autos pela Recorrente não alcança igualmente a ora Recorrida que do respectivo teor resulte que a venda tenha...

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