Acórdão nº 00573/09.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Novembro de 2017

Data30 Novembro 2017
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: DST, S.A.

veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 29.09.2015, que julgou procedente a excepção da caducidade do direito de acção e, em consequência, absolveu o Réu Município de Guimarães do pedido formulado pela Autora de condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de 79.637,99 euros, relativa a juros pelo atraso no pagamento de facturas apresentadas no âmbito de uma empreitada, bem como os juros de mora vencidos, contabilizados à taxa legal em vigor, desde a data da citação do Réu até efectivo e integral pagamento, e julgou também verificada a inutilidade superveniente da lide reconvencional e, em consequência, julgou extinta a instância nesta parte.

Invocou para tanto, em síntese, que não se verifica a caducidade do direito de acção, por não ser aplicável o artigo 255º do Decreto-Lei nº 55/99, de 02.03, à situação dos autos.

O Recorrido contra-alegou defendendo a manutenção do decidido.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso e ser confirmada a sentença recorrida.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. Com o devido respeito, andou mal o Tribunal recorrido ao considerar que, uma vez que entre a data da entrada da presente acção e a da notificação à Autora, ora Apelante, da recusa do Réu, ora Apelado, em pagar os juros reclamados havia há muito decorrido o prazo de 132 dias do artigo 255.º do Decreto-Lei nº 59/99, será de proceder a excepção de caducidade do direito de acção da Autora, ora Apelante, pelo que absolveu o Réu, ora Apelado, do pedido.

  1. A prova produzida impunha decisão contrária àquela relativamente à qual agora se recorre quanto ao enquadramento jurídico que da mesma foi feito, nomeadamente quanto ao entendimento de que aos factos objecto da presente lide seria de aplicar o disposto no Decreto-Lei n.º 59/99, de 02.03, porquanto estaria em causa a execução de contrato de obra pública celebrado ao abrigo de tal diploma.

  2. Pelo contrato de cessão financeira, o aderente cede ao cessionário financeiro os seus créditos sobre terceiro mediante uma remuneração, pelo que, através deste contrato, o cessionário financeiro (factor) adianta ao aderente o valor dos serviços facturados e assume o risco pelo eventual incumprimento da liquidação das facturas por parte do terceiro devedor, sobre o qual a empresa “factorizada” as emitiu.

  3. O contrato de cessão financeira, reconduzível a uma cessão de créditos, consiste numa simples modificação subjectiva, por substituição, no lado activo da relação jurídica obrigacional, permanecendo intacta a identidade objectiva do crédito, ou seja, sem efeitos novatórios.

  4. Está-se, portanto, no domínio da transmissibilidade das obrigações, genericamente regulada pelos artigos 577º e 578º do Código Civil, de modo a que “o credor pode ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito, independentemente do consentimento do devedor”.

  5. A notificação da cessão dos créditos demonstra que no presente caso se está perante uma cessão financeira aberta, em que a concretização das cessões em execução do contrato-quadro de factoring assume plena eficácia perante o terceiro-devedor desde que lhe haja sido notificada ou por si aceite – cfr. artigo 583º, nº 1, do Código Civil –, o que veio a suceder.

  6. Com a notificação ao Réu, ora Apelado, da cessão de créditos entre a Autora, ora Apelante, e o BCP – cfr. alínea 8) da matéria de facto provada –, o cessionário financeiro passou a ser o único credor, conforme o artigo 583º, nº 1, Código Civil.

  7. Feita a cessão de créditos no âmbito do contrato de factoring, a relação jurídica existente entre o Réu, ora Apelado, enquanto devedor, e o BCP, agora enquanto credor, reporta-se unicamente à cessão financeira operada e não ao contrato de empreitada de obras públicas celebrado entre o primeiro e a Autora, ora Apelante.

  8. Pelo que, por conta dessa relação jurídica, discutir-se-ão apenas os direitos e obrigações inerentes aos créditos existentes entre as partes e não os direitos e obrigações decorrentes do contrato de empreitada de obra pública, o que significa que o regime legal do Decreto-Lei nº 59/99, nomeadamente o seu artigo 255.º, não tem qualquer relevância para a apreciação jurídica dos factos que ocorram no âmbito e por conta da relação existente entre o Réu, ora Apelado e o BCP.

  9. Tal como resulta do teor do ponto 10 da matéria de facto dada como provada, o BCP e a ora Autora, ora Apelante celebraram contrato de cessão de créditos mediante o qual o primeiro cedeu à segunda o direito aos juros de mora, vencidos e vincendos, que ao BCP seria lícito cobrar do Réu, ora Apelado, atentos os termos do contrato de factoring, por conta da mora deste último no pagamento das facturas objecto dessa mesma cessão financeira.

  10. Assim, que não se está no presente caso perante uma espécie de reversão do contrato de factoring celebrado originalmente entre a Autora, ora Apelante e o BCP, mas sim uma nova cessão de créditos, negócio este que tem por objecto um direito de crédito que nasce por conta da execução de um contrato de cessão financeira (factoring) previamente existente e ao qual o Réu, ora Apelado, deu o seu assentimento.

  11. É por esta razão que o legislador distingue entre cessão de créditos e cessão da posição contratual, prevendo diferentes regimes para os meios de defesa do terceiro-devedor consoante se esteja perante um caso ou outro; 13. Consagrando, para casos de cessão de créditos como aquele que constitui o objecto do presente demanda, que não são oponíveis ao credor-cessionário os meios de defesa do terceiro-devedor que provenham de factos posteriores ao conhecimento da cessão por parte deste último – cfr. artigo 585.º do C. Civil.

  12. Destarte, se não é aplicável ao contrato de factoring o regime jurídico do Decreto-Lei nº 59/99, nomeadamente o seu artigo 255.º, o mesmo também não é aplicável, por maioria de razão, ao contrato de cessão de créditos de juros celebrado posteriormente entre BCP e a Autora, ora Apelante, já que se a caducidade do direito de acção não era um meio de defesa oponível pelo terceiro-devedor ao cedente (BCP) também não o é, nos termos do artigo 585.º do Código Civil, ao cessionário do direito aos juros (Autora, ora Apelante).

  13. É assim irrelevante o facto de a Autora, ora Apelante, figurar como empreiteira-geral no contrato de empreitada no âmbito do qual foram cedidos os direitos de crédito detidos sobre o Réu, ora Apelado, relativamente às facturas emitidas e cedidas ao factoring porquanto o direito aos juros que a Autora, ora Apelante, invoca nasce por conta da execução de um contrato de cessão financeira (factoring) previamente existente e não por conta do contrato de empreitada celebrado.

  14. À relação jurídica controvertida é aplicável por força dos artigo 8.º e 9.º do Decreto-Lei nº 171/95, de 18.07, o regime geral do Código Civil e não o regime jurídico do Decreto-Lei nº 59/99, de 02.03, pelo que, tendo a acção sido intentada em Abril de 2009 e os juros objecto da mesma se começado a vencer em 2005 – cfr. pontos 12 e 32 da matéria de facto dado como provada –, a Autora, ora Apelante, estava em tempo de exigir judicialmente o seu pagamento à data da propositura da acção, bem como à data da citação do Réu, ora Apelado.

  15. Tendo o Tribunal recorrido julgado como provado que não foram liquidadas pelo Réu, ora Apelado, dentro do prazo estabelecido, diversas facturas e que, por conta de tais factos, se venceram juros de mora no montante de 79.637,99 euros, deveria ter julgado a presente acção totalmente procedente, por provada, e, em consequência, condenado o Réu, ora Apelado, no pagamento à Autora, ora Apelante, do montante peticionado.

  16. Nestes termos, o Tribunal recorrido, ao decidir como decidiu, fê-lo em manifesta contradição com os fundamentos invocados e com os factos que foram dados como provados, fazendo uma errada aplicação do Direito aos factos dados como provados e, assim, violou o disposto no artigo 255.º do Decreto-Lei nº 59/99, de...

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