Acórdão nº 00452/17.0BECBR-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelAlexandra Alendouro
Data da Resolução30 de Novembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO JJLS, vem interpor recurso, em separado, do despacho proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra nos autos de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, instaurados contra a UNIVERSIDADE DE COIMBRA, que julgou procedente a exceção de “inidoneidade do meio processual utilizado determinando, em consequência, a notificação do Recorrente para, querendo e em cinco dias, usar da faculdade prevista no artigo 110.º-A do CPTA*Em alegações, o Recorrente concluiu assim: 1) Ao reportar-se, em diversos segmentos e em grande parte, a questões e matérias que nada têm a ver com os presentes autos (competência do tribunal em razão da matéria, responsabilidade civil do Estado, pagamento de quantia por força de sentença, ação de execução…), o despacho recorrido é obscuro e como tal ininteligível, incorrendo na nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA, pelo que deve ser revogado.

2) Ademais, ao deter-se, em abstrato, sobre os pressupostos da intimação, referindo-se, indistinta e mescladamente, à indispensabilidade do meio e à sua subsidiariedade, sem que, a final, conclua de forma percetível qual é o pressuposto ou pressupostos que concretamente considera que não se verifica(m) no caso, o despacho recorrido é ambíguo e ininteligível (cfr. art. 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA), devendo ser revogado.

3) Sob outro enfoque, se não se entender que existe a invocada obscuridade, então temos necessariamente que concluir que o Tribunal a quo não decidiu o que se pedia, sendo prova disso, por um lado, a ponderação de razões não alegadas e que nada têm a ver com a situação sub judice, bem como a circunstância de se ter olvidado o essencial e que se alegou nos arts. 9.º a 11.º da pi. (cfr.

infra), o que gera as nulidades previstas nas als. d) e e) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, ex vi art. 1.º do CPTA e impõe a sua revogação.

4) Depois, a decisão recorrida afronta o caso julgado formal contido no despacho datado de 18/07/2017, que admitiu a petição de intimação, dando por verificados, nesse momento do despacho liminar que é o momento próprio para o efeito, os pressupostos necessários para o processo seguir a forma da intimação.

5) O despacho recorrido viola, assim, os arts. 620.º, n.º 1 do CPC (ex vi art. 1.º do CPTA) e 110.º, n.º 1 e 110.º-A, n.º 1 do CPTA, bem como os princípios pro actione, da economia processual e da tutela efetiva dos direitos e interesses dos particulares (cfr. arts. 7.º e 7.º-A do CPTA, 2.º do CPTA, 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP, respetivamente), subjacentes àquela solução legal, impondo-se a sua revogação.

6) Admitindo uma interpretação da decisão em que se força o sentido do julgado até lhe encontrar uma lógica minimamente coerente (por força das nulidades assacadas), há que dizer que a suspensão de eficácia a que se faz referência não é compatível com a pretensão do Requerente, já que o ato lesivo de reprovação do Requerente é um ato negativo (sem efeitos positivos) e não é passível de suspensão de eficácia, logo, a decisão recorrida incorreria em erro de julgamento, por violação do art. 109.º, n.º 1 do CPTA, devendo ser revogada.

7) Depois, a situação de urgência subjacente à necessidade da intimação, em relação à qual o Tribunal a quo entenderia que está incumprido o ónus alegatório, vem concretizada nos arts. 9.º, 10.º, 11.º e 12.º da pi., absolutamente desconsiderados pelo Tribunal que só se reporta ao último daqueles artigos.

8) A situação de urgência na tutela do direito decorre, pois, expressamente, dos factos alegados, sendo mesmo de conhecimento oficioso, pois está em causa a necessidade de tutela de direito fundamental análogo aos direitos, liberdades e garantias (cfr., neste sentido, art. 110.º-A, n.º 2 do CPTA).

9) Sob outro enfoque e ainda, constituiria sempre facto notório (o qual não carece de alegação nem de prova e sempre teria que ser considerado na decisão) o de que, pretendendo o Requerente o ingresso no curso de Ciências do Desporto no ano letivo de 2017/2018, ano letivo que se inicia em 11/09/2017 e termina necessariamente em 2018, o exercício desse direito de ingresso está sujeito a um prazo, coincidente com esse ano letivo.

10) Ou até, tal facto é instrumental ou é complemento ou concretização dos factos alegados pelo Requerente nos referenciados artigos da pi., pelo que sempre deveria ser considerado pelo Tribunal a quo na decisão, dando-se por verificada a situação de urgência na tutela do direito invocado.

11) Em suma, a decisão recorrida incorrerá em erro de julgamento, de facto (por desconsiderar a factologia alegada na pi.) e de direito, por violação do art. 109.º, n.º 1 do CPTA, ou ainda do art. 5.º, n.º 2, al. c) ou als. a) ou b) do CPC, ex vi art. 1.º do CPTA, impondo-se a sua revogação.

*A Recorrida apresentou contra-alegações, concluindo da seguinte forma: conclusões: “(…) Assim, é inidóneo o meio processual usado (intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias), já que é possível e suficiente o decretamento de uma providência cautelar - no qual seja formulado pedido de intimação de a recorrida admitir o recorrente, provisoriamente, ao concurso - no âmbito de uma ação administrativa, pelo que não houve qualquer erro de julgamento.

Termos em que deve o recurso ser julgado totalmente improcedente e, consequentemente, deve o despacho recorrida ser mantido na íntegra.”.

*O Ministério Público foi notificado nos termos do disposto no artigo 146.º do CPTA.

**II – Questões decidendas: As questões suscitadas no presente recurso jurisdicional delimitadas pelas conclusões das alegações – artigos 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 3, 4 e 5 e 639.º do CPC, aplicáveis ex vi artigos 1.º e 140.º do CPTA – resumem-se, em suma, a saber se o despacho recorrido padece das nulidades e erros de julgamento que lhe foram imputados.

Cumpre decidir.

**III – FUNDAMENTAÇÃO: 1/DE FACTO Neste segmento dão-se como reproduzidos o teor das peças processuais das partes, e do despacho impugnado.

O despacho impugnado tem o seguinte teor: “(…) Da exceção de inidoneidade do presente meio processual: O Requerido na sua resposta de fls. 59 e ss., vem invocar a inidoneidade do presente meio processual para a pretensão do Requerente.

Pronunciando-se sobre tal exceção, vem o Requerente diz não se verificar tal exceção e a assim se entender, deve dar-se lugar à previsão do artigo 110.º-A do CPTA.

Como é consabido, a competência (jurisdição) de um tribunal não se encontra dependente «...da legitimidade das partes nem da procedência da ação. É ponto a resolver de acordo com a identidade das partes e com os termos da pretensão do Autor (compreendidos aí os respetivos fundamentos), não importando averiguar quais deviam ser as partes e os termos dessa pretensão. …» (Manuel A. Domingues de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, pág. 91.) Ora, dispondo-se no artigo nº 1, al. g) do ETAF (Lei nº 13/2002, de 19 de Fevereiro, que «…1. — Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objeto: ... g) Questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa;…», pareceria que a questão que nos ocupa estaria, desde logo, resolvida no sentido de que a competência para conhecer da ação caberia à jurisdição administrativa.

Porém, a tal regra de cariz geral opõem-se as exclusões previstas expressamente nos n.ºs 2 e 3 da mencionada norma legal, designadamente, no que importa à resolução da questão que nos ocupa, o disposto na alínea a) do n° 3, em que se prescreve expressamente que: «…Ficam igualmente excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal: a) A apreciação das ações de responsabilidade por erro judiciário cometido por tribunais pertencentes a outras ordens de jurisdição, bem como das correspondentes ações de regresso; …»; de tal preceito legal crê-se poder concluir, sem qualquer dificuldade, que a responsabilidade civil extracontratual do Estado fundada em erro judiciário apenas deve ser conhecida pela jurisdição administrativa desde que respeitem a facto resultante da atividade dos tribunais administrativos, o que não é o caso, pois que é imputada apenas à sentença declarativa erro judiciário por ter desconsiderado a existência de títulos executivos.

Portanto, apenas relativamente aos erros imputados à decisão cautelar, quer na 1.ª instância, quer na segunda, que correu termos na jurisdição administrativa, seriam competentes os Tribunais Administrativos apreciar.

Em todo o caso, quer havendo imputação direta de responsabilidade do Estado por atraso na justiça e/ou por erro judiciário ou não, a verdade é que o que se pretende é atribuir essa responsabilidade ao Estado e com ela obter um ressarcimento para a autora da...

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