Acórdão nº 00716/10.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução15 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Proc. nº 716/10.3BEBRG Ageas Portugal, Companhia de Seguros, S.A.

, id. nos autos, interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Braga, que julgou improcedente acção administrativa comum ordinária por si intentada contra o Município de Barcelos, sendo interveniente principal Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A..

*A recorrente remata o seu recurso com as seguintes conclusões: 1 – A recorrente não concorda com a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo que absolveu a ré do pedido deduzido nos presentes autos.

2 – Salvo o devido respeito entende-se que, em face da factualidade provada, estão verificados todos os pressupostos para se concluir que o caminho/via onde ocorreu o acidente de trabalho /viação é do domínio público, incumbindo, por conseguinte, ao Réu Município de Barcelos os deveres de vigilância, fiscalização, reparação e conservação da via, bem como a sinalização dos locais de perigo.

3 – Todavia a Mm.ª Decisora concluiu que o aludido caminho é de natureza particular, encontrando-se sob a responsabilidade dos seus proprietários.

4 – Para a tomada desta decisão foi determinante o resultado da sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos junta aos presentes autos, num processo em que, nem a aqui Autora nem o Réu foram partes, nem chamados a intervir, inexistindo identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir.

5 – Assim, em nossa modesta opinião a Mm.ª Juiz a quo sobrevalorizou uma prova extra processual em detrimento da prova produzida em audiência de julgamento e demais prova documental junta aos autos.

6 - Com efeito o caminho/via onde ocorreu o acidente dos autos foi anteriormente a 01/03/2007, data do aludido evento, do domínio privado, para acesso às bouças que ali existiam.

7 – Porém uma faixa de terreno onde o dito caminho se integra, foi doado em 13/05/1983, por escritura pública ao Município de Barcelos, por JMSP.

8 – Acresce ainda referir que no local onde se mostra implantado o caminho, foi construída uma unidade fabril para confeção têxtil e instalações da empresa ARA Ld.ª , conforme alvarás de loteamento n.ºs 130/81 e 28/87, respetivamente, aprovados pela Câmara Municipal de Barcelos.

9 – O caminho em questão é pois utilizado para o trânsito de acesso à ARA e demais estabelecimentos industriais ali existentes, onde se incluem os proprietários das empresas, trabalhadores, vendedores, clientes, proprietários das bouças, em suma de livre acesso a quem por ali passe, ou circule.

10 – Foi ainda colocada na sua entrada, na zona que conflui com a EN 206, uma placa de toponímia, designando–o de Rua do Bonsucesso.

11 – Como resulta dos factos provados o caminho apresentava em 2007 uma largura de 5 metros e encontrava-se em deficiente estado de conservação.

12 - Acontece que os sinistrados MC e LM, trabalhadores da empresa ARA, quando se dirigiam para as instalações da mesma provindos da EN 206, efetuando o percurso pelo caminho/via, ao desviarem-se de outra viatura, as terras aluíram tendo a viatura e os dois ocupantes caído a uma poça de água.

13 – Sendo este acidente caracterizado como acidente de trabalho, a recorrente suportou todas as despesas, encargos e pagamento de pensões/capitais de remição aos sinistrados, no âmbito da responsabilidade infortunística laboral para si transferida, 14 – Cujo reembolso dos montantes pagos vem peticionar à Ré, por via da omissão do dever jurídico a que estava obrigado o Município de Barcelos, traduzido na vigilância, fiscalização, reparação, conservação e sinalização adequada das situações de perigo existentes na via pública, o que não aconteceu no caso em apreço, 15 – Circunstância agravada pelo facto de ser visível e notória a degradação e o deficiente estado de conservação da via.

16 – Tal omissão foi a causa adequada do acidente dos autos e dos danos sofridos pelos sinistrados.

17- Ao decidir como decidiu, a douta decisão recorrida fez uma incorreta e indevida interpretação e aplicação da lei, nomeadamente do disposto nos n.ºs art.ºs 483º, 487º e 493º do C.C., 421º, 619º, 620º e 621º do CPC e art.ºs 1º a 10º do D.L. 48051 de 21/11/67.

*O recorrido Município contra-alegou, concluindo: 1.º A Recorrente limita o objecto do presente recurso à impugnação da matéria de facto dada como assente na sentença recorrida sem, contudo, cumprir com o ónus que lhe é imposto no artigo 640º do CPC aplicável ex vi artigo 140.º do CPTA, pelo que deve o presente recurso ser rejeitado.

  1. Caberia à Autora a prova de factos suficiente para a verificação dos pressupostos de que depende a responsabilidade civil extracontratual do Réu Município e, mais concretamente a ilicitude, no caso, sob a omissão do dever de vigilância da conservação do caminho integrado no domínio público, atendendo à forma como a própria apelante configura o seu recurso, nas alegações que apresentou.

  2. Perante a impugnação do Município de Barcelos de que aquele caminho estivesse integrado no seu domínio público e perante uma situação de non liquet, o tribunal limitou-se a aplicar o ónus da prova, nos termos do qual, pelas razões acima apontadas caberia à Autora provar esse facto, sem que a Recorrente tivesse indicado, no presente recurso, qualquer prova que impusesse conclusão contrária*A interveniente principal Fidelidade também contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso.

*O Exmº Procurador-Geral Adjunto, notificado para efeitos do art.º 146º do CPTA, não emitiu parecer.

*Dispensando vistos, cumpre decidir.

*Os factos, que o tribunal “a quo” deu como provados: 1. Em reunião da Câmara Municipal de Barcelos de 6.11.1981 foi aprovado o processo de loteamento, em que era requerente JSG, pelo qual foi constituído um lote de terreno com a área de 4300m2, destinado à implantação de uma unidade fabril para confeção de têxtil, no prédio rústico com a área de 18000m2, inscrito na matriz predial rustica de Negreiros pelo artigo 856, sito no Lugar de SM, Negreiros, Barcelos, confrontando a Norte com JL, do sul com EN 206, do nascente com herdeiros de MSG e do poente com FFS, tendo sido emitido o alvará de loteamento n.º 130/81. – cfr. doc. de fls. 1 e ss. do pa.

  1. Consta da planta topográfica junta ao processo de loteamento referido em 1. que no prédio referido supra se mostra implantado um caminho designado de servidão, que deriva da Estrada Nacional 206, confrontando a nascente com herdeiros de MSG sendo o acesso ao lote constituído feito por esse caminho. – cfr. doc. de fls. s/n do pa junto aos autos.

  2. O referido loteamento foi averbado em nome de FGF, tendo sido emitido o alvará de loteamento n.º 11/82. – cfr. doc. de fls. 35 do pa junto aos autos.

  3. Em reunião de Camara Municipal de Barcelos de 29.4.1983 foi aprovado o processo de loteamento, em que era requerente JMSP, pelo qual o lote titulado pelo alvará 130/81, foi dividido em 2 lotes destinados a fins industriais, o lote 1 com a área de 1707m2 e o lote 2 com a área de 2448m2, e que são cedidos 145m2 de terreno ao domínio publico para acesso de entrada para o lote n.º 2, tendo sido emitido o alvará de loteamento n.º 63/83. – cfr. doc. de fls. 57 e ss. do pa apenso aos autos.

  4. Em 13.5.1983 foi celebrada escritura pública pela qual JMSP doa ao Município de Barcelos uma faixa de terreno com a área de 145m2, devidamente identificada na planta topográfica de fls. 57 que se dá aqui por integralmente reproduzida, a desintegrar do prédio rustico referido em 1. – cfr. doc. de fls. 57 e ss. do p.a. apenso aos autos.

  5. Em reunião de Camara Municipal de Barcelos de 19.12.1986 foi aprovado o processo de loteamento, em que era requerente JSG, pelo qual o lote 2 titulado pelo alvará 63/83, foi ampliado para a área de 3170 m2, tendo sido emitido o alvará de loteamento n.º 28/87. – cfr. doc. de fls. 69 e ss. do pa.

  6. As instalações da ARA, Lda. situam-se no lugar de SM, na freguesia de Negreiros, ocupando o lote n.º 2 titulado pelo alvará 28/87. – doc. de fls. 70 do pa apenso aos autos.

  7. O acesso da estrada nacional 206 para as instalações da ARA faz-se pelo caminho referido em 2. – doc. de fls. 70 do pa apenso aos autos.

  8. O caminho referido no ponto anterior era utilizado, anteriormente à edificação das instalações industriais, para acesso às bouças.

  9. O referido caminho confronta a nascente com uma bouça, propriedade de DFC. – cfr. doc. de fls.70 do p.a.

  10. Na parte do caminho anterior à curva de acesso às instalações da ARA, e confrontando com o lote n.º 2, existe na bouça a nascente uma poça. – cfr. doc. de fls.70 do p.a.

  11. Em 1.10.2001 foi proferida sentença, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos, no âmbito de processo em que eram autores JMSP e EM (1.ºs AA.) e JP e BC (2.ºs AA.) e réus, DFC e AG, da qual consta, além do mais, *II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Documentalmente, do acordo das partes e das respostas à matéria de facto resultam provados os seguintes factos: 1. No dia 12 de Fevereiro de 1982, a Câmara Municipal de Barcelos emitiu o alvará de loteamento n.º 11/82 autorizando JSG e FGF a constituir um lote de terreno, com a área de 4.300 m2. no prédio sito no lugar de SM, da freguesia de Negreiros, a confrontar do norte com JL, do sul com a Estrada Nacional 206, do nascente com herdeiros de MSG e do Poente com FGF, inscrito na matriz rústica da...

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