Acórdão nº 00932/19.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução02 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. R., devidamente identificada nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 17/01/2020, pela qual foi julgada improcedente a reclamação deduzida nos termos do artigo 276.º e seguintes do CPPT contra a decisão da Coordenadora da Secção de Processo Executivo de (...) do Instituto da Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., proferida no processo de execução fiscal n.º 0301200801247514, originalmente instaurado contra a sociedade “F., Lda”.

1.2.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: «A. Pelo que e ressalvado o devido respeito por diversa opinião, a douta sentença enferma de erro de julgamento em matéria de facto, por errada valoração dos factos assentes no probatório e, consequentemente, erro de julgamento em matéria de direito.

  1. A reclamante arguiu em síntese a falta de citação por requerimento apresentado no IGFSS em 29/04/2011, o qual não mereceu resposta do órgão de execução fiscal.

  2. Como consta dos autos, a reclamante só após a notificação da penhora do seu vencimento, datada de 05/04/2019, apresentou em 16/04/2019 no IGFSS um requerimento onde peticionava a pronúncia sobre o requerimento apresentado em 29/04/2011, o qual mereceu pronúncia do IGFSS em 18/04/2019, e sobre o qual apresentou a reclamação ora indeferida.

  3. Efetivamente e contrariamente ao doutamente decidido considera a reclamante que o despacho emanado pelo IGFSS que indefere a arguição de falta de citação é ilegal, reiterando que a citação nunca chegou ao seu conhecimento e, consequentemente, ilegal é o ato de penhora subsequente.

  4. O despacho do IGFSS enferma de vício de violação de lei por violação do direito à decisão, pelo que, tendo decidido no sentido de negar provimento ao peticionado pela reclamante e nos termos e fundamentos invocados, é entendimento desta que a sentença enferma de erro de julgamento em matéria de facto.

  5. Atenta a qualidade de responsável subsidiário e executada por reversão, a reclamante tinha obrigatoriamente de ser citada pessoalmente para a execução (cf. artigo 191º, no 3 do CPPT), o que como vimos, não foi, pois a citação-reversão enviada em 2010-03-22 por carta registada com aviso de receção para o domicílio fiscal daquela, nunca foi rececionado pela reclamante.

  6. E não se diga que a citação em apreço foi cumprida por o registo sido subscrito por terceira pessoa, que ficou com o encargo de a dar a conhecer à recorrida.

  7. Efetivamente não pode ter-se alguém como citado (chamado à ação pela primeira vez) e que o não cumprimento do disposto no art.º 241º do CPC apenas pode integrar uma mera irregularidade, que se deve considerar sanada por falta de arguição dentro do respetivo prazo, atento o disposto no art.º 198º, no 2 do CPC na redação à data vigente.

    I. A situação a dirimir nos presentes autos, contrariamente ao sustentado pelo douto decisório e na senda do despacho proferido pelo órgão de execução fiscal é que estamos perante uma verdadeira falta de citação, o que constitui uma nulidade insanável e de conhecimento oficioso.

  8. A reclamante demonstrou e comprovou através da prova testemunhal produzida que não chegou a ter conhecimento do ato, por motivo que não lhe foi imputável, como exige o art.º 190º, no 6, do CPPT, e decorre do depoimento prestado pela testemunha M., funcionária da executada originária que, contrariamente ao decidido foi elucidativo quando afirmou reconhecer como sua “patroa” O., afirmando não conhecer a reclamante R..

  9. Quanto a esta testemunha o Tribunal considerou que a mesma demonstrou ter um conhecimento direto dos factos em causa nos presentes autos, depondo de forma espontânea e sincera, afirmando no que se refere à correspondência em causa nos presentes autos, que foi a própria que levantou a correspondência na estação de correios, após entrega do aviso de levantamento assinado pelo destinatário, que levava acompanhada de fotocópia do documento de identificação da reclamante, conforme expresso na douta sentença.

    L. Afirmou desconhecer qual o destino das cartas que levantou nos Correios, as quais entregou à D. O., que lhe disse que “ia tratar do assunto”.

  10. Trata-se, in casu, de um depoimento consistente, tal como o próprio Tribunal a quo expressou, e que, do mesmo resulta que à reclamante não lhe pode ser assacada qualquer responsabilidade, na medida em que as cartas não lhe eram entregues pela mãe e como tal não poderia saber do respetivo conteúdo. E, nesse sentido, é errada a valoração que a decisão a final veio a acolher.

  11. Por seu turno, considera ainda a reclamante que as premissas do decisório no que ao depoimento da testemunha O., mãe da reclamante se refere, no sentido de que este depoimento limitou-se a produzir declarações vagas e genéricas, as quais não foram conclusivas para a demonstração dos factos alegados é erradamente valorado, padecendo tal valoração de algumas incongruências. Num primeiro momento, é afirmado tratar-se de um depoimento frágil, atenta a debilidade do estado de saúde da depoente e num segundo momento, refere que a testemunha se lembra de factos com clareza, nomeadamente, quando afirmou que não entregou as cartas à reclamante.

  12. Ora, não cremos ser possível afirmar-se que não foi produzida prova segura de que a reclamante não tomou conhecimento do conteúdo do ofício de citação por a sua mãe nunca a ter feito chegar ao conhecimento, pois, no modesto entender da reclamante foi feita essa prova. Ou pelo menos, o Tribunal se entendesse que a testemunha O. se encontrava debilitada por motivos de saúde, teria o dever de, no âmbito do poder inquisitório e da descoberta da verdade material previsto no art.º 13º do CPPT, ordenado a suspensão do depoimento e proferido despacho que determinasse que o depoimento fosse prestado em data a determinar, de molde a que a testemunha fulcral no caso, pudesse restabelecer-se e recuperar em termos de saúde.

  13. Esta situação constitui o Tribunal a quo em erro de julgamento em matéria de facto por manifesto deficit instrutório, o que expressamente se requer e devendo, em consequência, ser ordenada a baixa dos autos à 1ª instância para que a testemunha em questão possa prestar novo depoimento, desta vez na plenitude das suas faculdades mentais e físicas, em condições de saúde adequadas.

    Caso assim não se entenda e sem prescindir Q. A reclamante defendeu e defende que o despacho reclamado é ilegal por violação do direito à decisão previsto no artigo 56º da Lei Geral Tributária (LGT), uma vez que, tendo arguido a falta de citação por requerimento apresentado em 29/04/2011, o mesmo só obteve resposta em 18/04/2019, após insistência da reclamante, em 16/04/2019.

  14. Sucede, porém, que o incumprimento do dever de decidir, no âmbito do procedimento tributário em concreto, não tem enquadramento legal na presunção do indeferimento tácito, prevista no artigo 57º, no 5 da LGT, mas, ainda que por mera hipótese académica assim seja entendido, o incumprimento do prazo de decisão pela Administração inquina de ilegalidade a decisão proferida, ainda que intempestivamente, pelo que há um erro de julgamento em matéria de direito, por errada interpretação do disposto no art.º 56º da LGT.

  15. Afirma a reclamante que o despacho reclamado é ilegal por não indicar os meios e prazos de defesa, em violação do disposto no artigo 36º, no 2 e 3 do CPPT, sugerindo a douta sentença que o recurso ao disposto no art.º 37º do CPPT.

  16. Ora, é pacificamente aceite pela doutrina e jurisprudência que o preceito invocado não tem aplicação ao processo de execução fiscal, nem aos seus incidentes, na medida em que este processo e seus incidentes têm a natureza de processo judicial e o preceito em questão tem aplicabilidade em sede de procedimento administrativo gracioso. Tendo sido negado provimento ao vício que a reclamante assacou ao ato sindicado é evidente que, neste segmento, o aliás douto decisório incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, por errada interpretação e aplicação do art.º 37º do CPPT ao processo em causa.

  17. Relativamente à falta de citação e in casu constitui nulidade insanável na medida em que prejudicou a defesa do interessado que alegou e provou não ter tido conhecimento do ato por motivo que lhe não foi imputável.

    V. No caso dos autos, ficou demonstrado que foi remetido à reclamante, via correio registado com aviso de receção, ofício destinado à citação da executada para o PEF ora em causa, o qual foi assinado por terceiro (cf. facto provado n.º 11).

  18. Alega a reclamante que aquela “carta nunca chegou ao seu conhecimento, pois não residia em (...) à data e a pessoa que recebeu o aviso de receção não foi a própria, mas a sua mãe que nunca lhe fez chegar” (cf. artigo 18.º da petição inicial). Ora, os factos confessados pelos respetivos autores nos articulados deve ser também objeto de ponderação na decisão a tomar a final. E como é notório este facto não foi impugnado pelo IGFSS, o que, a contrário, implica a valoração do mesmo a favor da reclamante que o invocou e sobre o mesmo requereu a produção de prova testemunhal, nos termos do n.º 2 do art.º 465º do CPC.

    X. Acresce que o aviso de receção que acompanhou o ofício de citação se mostra assinado por pessoa diversa da reclamante e que efetivamente não lhe foi dado conhecimento da sua existência, como foi demonstrado e provado, pelo que não pode ser concluído como foi concluído que não ocorreu nos autos qualquer falta de citação.

  19. A interpretação dos factos e subsunção dos mesmos ao direito levada a cabo pela douta decisão não poderá, em circunstância alguma, substituir o ato omitido – a citação.

  20. A própria Exequente afirma, erradamente, que a citação pessoal foi confirmada em 22/02/2010, sendo certo que essa data apenas se reporta à entrega de uma carta registada com aviso de receção, mas a pessoa diversa da...

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