Acórdão nº 02943/11.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | Rosário Pais |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. F.
, devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 10.12.2018, pela qual foi julgada parcialmente procedente a oposição por ele deduzida à execução fiscal n.º 1821200201128353, contra si revertida para cobrança da quantia global de €66.449,07, proveniente de IVA, IRC e coimas dos anos de 2002 a 2008.
1.2. O Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «1. Por sentença proferida em 13.12.2018, foi decidido julgar parcialmente procedente a oposição à execução, ordenando a extinção dos processos de execução fiscal relativos a coimas e o prosseguimento dos restantes.
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É neste preciso segmento, de prosseguimento dos demais processos de execução fiscal, e por não poder concordar com o assim decidido, que, pretende, o oponente, por via do presente, recurso ver a decisão revogada.
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O julgador tem o dever de seleccionar, do que é alegado pelas partes, a realidade concreta que considera provada e necessária para a correcta apreciação e decisão da pretensão, à luz das possíveis soluções jurídicas.
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O processo, por respeito ao principio da descoberta material deve tender à reconstituição dos factos e da situação jurídica tal como efectivamente verificada, porquanto, e no moderno processo civil constata-se um reforço dos poderes do Juiz – principio do inquisitório – com vista a privilegiar a decisão de fundo sobre a puramente formal.
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Determina-se ao Juiz a incumbência de realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é licito conhecer (nº 1 do art 5.º do CPC).
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Assiste ao TCA o poder de modificar a decisão de facto fixada pelo Tribunal recorrido, ao abrigo do artigo 662.º do CPC aplicável ex vi art. 2.º al. e) do CPPT.
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Face ao alegado pela recorrente, devia ainda ter sido analisada e dada como provada, com relevo para a decisão, a seguinte factualidade: A sociedade devedora originária, pelo menos, desde Junho de 2003, encontrava-se sem exercer qualquer actividade comercial – Cfr. declarações de IVA juntas com a oposição Docs 1 a 6) 8. Resulta claro dos documentos juntos a ausência total de actividade por parte da devedora originária.
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Facto, que não assumindo mero valor instrumental, já que, se mostrava, e mostra, essencial à aplicação do regime jurídico em questão e indispensável para alcançar a composição do litígio e uma decisão materialmente justa, devia ter sido considerado na selecção da matéria de facto.
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Deve agora, aquela selecção ser ampliada, no sentido supra indicado.
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Considerou a sentença sob recurso, que provados os pressupostos da responsabilidade subsidiária e não tendo logrado provar, o oponente, como se impunha, a ausência de culpa na falta pagamento das dívidas Fiscais, objecto de reversão, devia ser responsável pelas dívidas da devedora originária nos termos da al. b) do art. 24.º da LGT.
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Alegou o oponente, e provou, a ausência de actividade no período em que o imposto foi posto a pagamento, e portanto, em causa estaria, o próprio exercício efectivo das funções de gerência nesse período.
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Invocando a experiência comum, não é expectável que numa sociedade que já não exerce a actividade para a qual foi criada (escopo social), o gerente continue a praticar actos quotidianos ou a tomar decisões que apenas se justificam, ou tem suporte, num contexto normal funcionamento.
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Como causa directa da cessação da actividade da sociedade devedora originária, aquando o terminus do prazo legal de pagamento da divida tributária há muito que o aqui oponente tinha deixado de exercer, de facto, as funções sociais.
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Sendo que, não tendo a AT apresentado factos que demonstrassem a culpa do oponente na insuficiência de bens da sociedade para pagamento da divida exequenda (art. 24.º nº 1 al. a) da lei geral Tributária), e não podendo, neste caso, valer-se, como fez, da presunção constante da al. b) do referido art. 24.º da LGT, imperioso seria e é concluir pela falta de verificação dos pressupostos legais da reversão, em violação do art. 24.º al. a) da LGT e art. 153.º do CPPT.
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Ao contrario do decidido pelo Tribunal recorrido, resulta da petição de oposição, alegação, suficientemente concretizada, de factos, capazes de justificar a ausência de culpa, do oponente, na falta de pagamento da divida fiscal.
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Alegou o oponente, e provou, ainda a origem da divida (liquidações oficiosas) e o critério utilizado pela AT, ou seja, as circunstâncias em que a divida surge, de forma apurar actuação do oponente perante a situação, e ainda as dificuldades económicas que impediram a manutenção da actividade por parte da devedora originária.
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Circunstâncias alheias à vontade da oponente e justificativas da impossibilidade de pagamento das dividas fiscais em discussão nos presentes autos.
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Contudo, e para corroborar os factos alegados, para além da prova documental junta, arrolou, o oponente, três testemunhas com conhecimento directo sobre os factos em discussão.
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Produção de prova que foi dispensada, decidindo a Mma. Juiz, conhecer imediatamente do pedido por, e no seu entender, e ainda que em causa matéria de fato, conter o processo todos os elementos necessários para o efeito.
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É da competência do Juiz, aferir da necessidade da produção de prova em face das questões colocadas, mas este só deve dispensar, a fase de instrução se a questão a decidir for apenas de direito e o processo fornecer todos os elementos necessários à prolação da sentença.
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Atendendo à natureza dos factos alegados (que não eram meramente conclusivos ou susceptíveis apenas de comprovação documental) seria de concluir, no caso concreto, pela utilidade e essencialidade no esclarecimento da factualidade invocada, da audição das testemunhas.
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A factualidade invocada pela oponente na medida em que se reporta diretamente ao pressuposto – culpa - de que dependa a responsabilização subsidiária do gerente pela divida da devedora originária, não pode deixar de ser considerada como susceptível de relevar para a decisão da causa.
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A decisão do tribunal a quo, ao não ordenar as diligências de prova requeridas pelo oponente, considerando que os elementos constantes do processo se mostravam suficientes, e depois decidindo pela ausência de prova no sentido de afastar a culpa do oponente, está inquinada de vicio que importa a sua revogação, e consequente remessa dos autos a primeira instância para ser produzida prova testemunhal sobre a factualidade alegada e supra-referida, relevante para a boa decisão da causa.
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Sempre se dirá que da Petição de oposição resulta uma alegação suficientemente concretizada dos factos susceptíveis de afastar a culpa do oponente na falta de pagamento da divida tributária.
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A cessação de actividade comercial da devedora originária, a partir do ano de 2003, constatável pelas declarações de IVA, foi ainda acompanhada da alegação de outros factos, capazes de sustentar a ausência de culpa do oponente pela falta de meios para fazer face ao pagamento da divida, surgida à revelia do expectável.
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Sempre se dirá que, a acrescida dificuldade da prova de factos negativos, como é o caso, face ao principio constitucional da proporcionalidade, deverá ter como consequência, uma menor exigência probatória por parte de quem analisa a situação.
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Alega, ainda, o oponente que não sendo de prever as dividas, atento ás circunstâncias do seu apuramento, nas datas que foram postas a pagamento, não poderia dispor dos meios necessários para elas fazer face, ressalvando o facto de não ter sido a devedora originária delas notificadas.
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A falta de notificação das liquidações, não se situa no âmbito da apreciação da legalidade da liquidação, antes sim, a da sua oponibilidade ao seu destinatário.
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Instaurada a execução sem que tenha sido notificada a devedora originária do acto tributário de liquidação, este é ineficaz, e por isso não produz os seus efeitos, obstando dessa forma que a divida possa ser exigida.
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E se não é passível de ser exigida à devedora originária, também e por maioria de razão não poderá ser exigida ao devedor subsidiário, aqui recorrente.
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A falta de notificação do acto tributário é fundamento de oposição à execução, e que a ser procedente, como deve ser, determina a procedência da oposição e consequente extinção da execução fiscal.
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Violou a sentença sob recurso o art. 24.º da LGT, artigo 153.º do CPPT, art. 114.º do CPPT e 77.º nº 6 da LGT e 36 nº do CPPT.
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Pelo que deve ser revogada julgando-se totalmente procedente e provada Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento total ao presente recurso revogando-se a sentença proferida, para, assim, se fazer sã, serena, merecida e objectiva JUSTIÇA!» 1.3. A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.
1.4. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer no sentido da improcedência do presente recurso, por concordar com o entendimento vertido na sentença recorrida.
Dispensados os vistos prévios (artigo 657.º, n.º 4, do CPC), cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
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